O candidato às presidenciais de 9 de outubro Venâncio Mondlane — que está em parte incerta, depois de fugir de Moçambique — diz que o plano de manifestações do movimento que lidera prevê uma “quarta fase” que será a “fase mais poderosa” e que vai afetar “profundamente” a economia nacional. Mas garante que não será violenta.
“Quando digo que é dolorosa é porque vai ser uma fase que vai afetar profundamente a economia nacional. Infelizmente, vamos ter de partir para esta fase”, afirmou em entrevista à CNN Portugal. Terá violência? “Claro que não”, assegurou. Mondlane, que reclama vitória nas presidenciais do país — depois de a Comissão Nacional de Eleições ter declarado o candidato da Frelimo como vencedor e ter dado a Mondlane o segundo lugar —, afirma que em nenhuma das fases anteriores de protestos os manifestantes tomaram iniciativa de atos violentos e que só reagiram em legítima defesa quando a polícia “usou força desproporcional”.
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Questionado sobre se pretende ir a Moçambique nesta quarta fase, responde que está a tentar criar condições para isso e que, aliás, queria ter conseguido “liderar a terceira fase” a partir do país. Mas não o fez porque recebeu vários pedidos de manifestantes para que se deslocasse a Maputo. “Se eles me autorizarem, eu vou. Não tenho problemas nenhuns. Bem que gostava de estar em Moçambique”, afirmou.
Mais tarde na entrevista, viria a sublinhar que o movimento que lidera é avesso à resolução do conflito por via militar ou armada e que uma próxima ação será visar setores essenciais para a economia moçambicana. “O que vamos fazer são manifestações dentro do direito constitucional que temos, que nos assegura que, havendo ordens ilegais, há um direito constitucional que nos assiste de não obedecer. Uma da questões que queremos fazer é manifestação em áreas logicamente que são cruciais para a economia de Moçambique. Não vamos forçar ninguém a aderir à nossa marcha”, acrescentou.
Venâncio Mondlane, que é apoiado pelo Podemos, diz que os confrontos no país entre manifestantes e a polícia já fizeram “mais de 100 mortos”, acima dos números que têm sido divulgados publicamente. “Está-se a falar de 40 mortos, é o que é conhecido publicamente, mas no terreno temos registo de mais de 100 mortos”, afirmou.
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Avançar com qualquer tipo de movimento armado não está em cima da mesa. “Está fora de questão. Tivemos 1 milhão e 500 mil pessoas que foram manifestar-se em Maputo e não houve nenhuma única pessoa que tivesse nem uma bomba caseira, nem uma arma. A nossa orientação sempre foi: nós somos um movimento civil e queremos alcançar o poder com base nas nossas ideias de um processo social alternativo”, declarou.
Mondlane desafiou Daniel Chapo para encontro, mas não obteve resposta
Venâncio Mondlane diz que está disponível para um encontro com Daniel Chapo, o candidato apoiado pela Frelimo e que viu a Comissão Nacional de Eleições a declará-lo vencedor. Mas ainda não obteve uma reação do opositor eleitoral a esse desafio, que foi feito a partir de diretos em redes sociais.
“Em todas as minhas lives [diretos] demonstrei abertura para o efeito, como avancei alguns termos de referência que podemos levar à mesa do diálogo.” Até este momento, a Frelimo e o candidato “não reagiu” às “manifestações de abertura de diálogo e dos termos de referência para o diálogo”.
Mondlane voltou a admitir um governo de unidade nacional. “No meu manifesto eleitoral falei disso. Que, ganhando, quero construir um governo baseado na meritocracia e não no fundamentalismo partidário”, acrescentou. Aliás, na Frelimo, “há pessoas competentes e integras” que podem integrar esse executivo. Mas considera que um governo de unidade nacional teria de “dar prioridade aos partidos que concorreram” e deve “incluir pessoas de mérito e de crédito social”.
Mondlane espera que Governo português seja “os altifalantes” de Moçambique na Europa
Do governo português, Venâncio Mondlane diz esperar que transmita a mensagem às instituições europeias de que está a acontecer uma violação “grave” dos direitos humanos em Moçambique.
Mondlane viu “pela positiva” as posições tomadas por alguns partidos políticos em Portugal “de forma um pouco mais ousada, muito acima da minha expectativa”, que puseram em causa os resultados anunciados pelos órgãos eleitorais de Moçambique.
Por uma questão de respeito pela soberania, compreende que o Governo português não possa “chegar a tanto”, “mas pelo menos pode pronunciar-se exigindo o respeito pelos direitos humanos de forma um pouco vigorosa”.
Pela relação histórica, linguística e cultural, Portugal “devia ser os altifalantes e porta-voz de Moçambique para o Espaço Europeu”. Mondlane indica ter a expectativa de que o Governo não só se pronuncie mas também passe uma mensagem ao Parlamento Europeu ou à Comissão Europeia não necessariamente de “forma favorável ao movimento contestatário”, mas que há direitos humanos que “estão a ser violados em Moçambique”.