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Os EUA alegam que as minas terrestres antipessoais enviadas a partir desta quarta-feira para a Ucrânia são “mais seguras”, mas não é por acaso que dezenas de países as classificam como armas proibidas há mais de 25 anos. A luz verde norte-americana para a utilização deste tipo de armamento pelo exército ucraniano foi revelada por uma fonte não identificada à agência de notícias France–Presse na noite desta terça-feira e acabou por ser confirmada pouco depois pelo secretário da Defesa dos EUA, Lloyd Austin, em declarações aos jornalistas a partir de Laos.

Austin alega que a mudança na política de cedência de armamento segue a alteração de tática dos russos. Ou seja, se as tropas terrestres russas estão a liderar no campo de batalha, a Ucrânia tem “necessidade de ferramentas que possam ajudar a abrandar os esforços ofensivos por parte dos russos”.

A decisão do envio das minas antipessoais surgiu horas após fontes do Pentágono terem dito que os EUA iam enviar para a Ucrânia 275 milhões de dólares (260 milhões de euros) em novas armas, antes de Donald Trump tomar posse como Presidente dos EUA, a 20 de janeiro de 2025.

O que são minas terrestres antipessoais?

As minas terrestres, de uma forma geral, são dispositivos com capacidade explosiva escondidos no solo, projetados para detonar quando alguma coisa ou alguém se aproxima ou pisa o dispositivo. As minas antitanque são desenhadas para destruir veículos blindados, enquanto as antipessoais são criadas com o objetivo de atingir militares que se desloquem a pé.

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Este tipo de minas, como destaca a revista Veja, pode ser usado em diversas circunstâncias no cenário de guerra — para proteger instalações críticas, preparar uma emboscada ou até mesmo com o objetivo de alterar a rota das forças inimigas. São normalmente colocadas no terreno manualmente, mas também podem ser espalhadas com recurso a aeronaves militares ou rockets ou por veículos terrestres especializados.

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Segundo o secretário da Defesa dos EUA, as minas terrestres que vão começar a chegar à Ucrânia “não são persistentes”. “Podemos controlar quando se auto-ativariam, se auto-detonariam e isso torná-las-ia muito mais seguras. Mais seguras do que eventualmente outras armas que estão a criar por conta própria [na Ucrânia]”, alegou Lloyd Austin.

Minas antipessoais são proibidas em mais de 150 países desde 1997

As minas terrestres antipessoais são criticadas há várias décadas por organizações não governamentais e ativistas individuais por representarem uma ameaça persistente contra civis. Uma mina terrestre deste tipo pode ser ativada, ao toque, por qualquer pessoa, já que o aparelho não tem capacidade de identificar se quem o pisa é um militar ou um civil. Além disso, após os conflitos armados, as minas que não foram ativadas são muitas vezes deixadas para trás, aumentado a probabilidade de serem ativadas por civis que não têm conhecimento da sua existência em determinado local.

Por outro lado, quando não são removidas e há suspeitas ou provas de que minam determinada parcela de território, podem provocar a deslocação forçada da população civil, dificultar a prestação de ajuda humanitária e impedir a exploração agrícola em áreas extensas.

As minas antipessoais foram proibidas pela Convenção de Ottawaassinada em 1997 por 133 países, incluindo Portugal. Atualmente, há 164 países a subscrever o tratado. No texto da convenção destaca-se que este tipo de armamento causou “grande sofrimento” ao longo de décadas e que “continua a matar e a ferir civis e transeuntes muito depois do fim dos conflitos”.

O tratado proíbe de forma abrangente as minas antipessoais e exige que os países destruam os arsenais, limpem as áreas afetadas pelas minas e prestem assistência às vítimas.

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“Desde a sua criação, há mais de duas décadas, a Convenção levou a uma paralisação virtual da produção global de minas antipessoais e a uma redução drástica da sua implantação. Mais de 40 milhões de minas armazenadas foram destruídas e foi prestada assistência aos sobreviventes e às populações que vivem nas zonas afetadas”, destaca a Organização das Nações Unidas (ONU).

EUA e Rússia são dois dos países não peticionários da convenção. Já a Ucrânia, prestes a dar usos às minas antipessoais perante a agressão russa, assinou o tratado em 1999.

Em junho de 2022, o Presidente Joe Biden estabeleceu o objetivo dos EUA de aderir ao tratado e realinhar a política dos EUA com a maioria das proibições fundamentais do tratado. A intenção não produziu efeitos até hoje. Isto depois de em janeiro de 2020, o então presidente e atual presidente eleito, Donald Trump, ter cancelado uma política que teria eliminado todas as minas antipessoais do arsenal dos EUA.

Myanmar lidera lista de países com maior número de vítimas de minas antipessoais em 2023

Precisamente esta quarta-feira, o dia em que foi conhecido o envio e respetiva autorização de utilização de minas terrestres antipessoais dos EUA para a Ucrânia, a Human Rights Watch divulgou o relatório Landmine Monitor 2024. O documento destaca a utilização deste tipo de minas por países em conflito, como a Rússia e Myanmar. “O novo uso de minas antipessoais por países que não aderiram [à convenção] ameaça tanto as vidas de civis como a eficácia deste tratado que salva vidas”, lê-se no relatório.

Em 2023, houve pelo menos 5.757 novas vítimas causadas por minas terrestres e resíduos explosivos de guerra em 53 países. Os civis representaram 84% de todas as vítimas registadas no ano passado, enquanto que as crianças representaram 37% desse total.

Segundo a Human Rights Watch, a Rússia tem utilizado minas terrestres antipessoais repetidamente na Ucrânia desde a invasão em grande escala do país, a 24 de fevereiro de 2022, causando centenas de vítimas e vastas extensões de terra contaminada.

Já as forças armadas de Myanmar têm utilizado este tipo de minas continuamente desde 1999. O país está, em 2023, pela primeira vez, no topo da lista de países com o maior número de vítimas provocadas por este tipo de armamento. Estas minas mataram ou feriram 1.003 pessoas no ano passado no país. Antes, a Síria teve o maior número de vítimas anuais durante três anos consecutivos.

Os relatórios indicam que o Corpo da Guarda Revolucionária Islâmica do governo iraniano e a Coreia do Norte também utilizaram com frequência minas antipessoais durante 2023 e no primeiro semestre de 2024.