António Guterres voltou esta quarta-feira a São Bento, mas na qualidade de secretário-Geral das Nações Unidas, para um encontro com Luís Montenegro. E, tendo sido informado em território nacional do “primeiro raio de luz” no que toca ao conflito no Líbano — a notícia de um cessar-fogo entre o Hezbollah e Israel –, foi também a partir dali que decidiu deixar um aviso às partes envolvidas: o cessar-fogo deve ser “respeitado integralmente” para dar lugar a uma solução política.
Em São Bento, Guterres falou do “sinal auspicioso” do cessar-fogo, o primeiro na “escuridão dos últimos meses”. “É um momento de grande importância, sobretudo para os civis, que pagavam um preço enorme por o conflito se estar a arrastar e a ganhar dimensões cada vez mais preocupantes”, registou.
Depois, deixou o alerta: “É essencial que aqueles que assinaram o compromisso do cessar-fogo o respeitem integralmente e que este compromisso abra caminho a uma solução política para a situação libanesa”, frisou, garantindo que a missão de paz da ONU no Líbano mostrará “total empenhamento” na verificação do cumprimento deste acordo.
E fez questão de criticar a “sensação de impunidade” que se vive enquanto os “conflitos se multiplicam”. “Há uma sensação de impunidade, que várias potências até de pequena e média dimensão se podem dar ao luxo de fazer o que quiserem sem que nada lhes aconteça, (…) e é fundamental marcar a importância do respeito pelo direito internacional”, sublinhou.
O secretário-geral das Nações Unidas reservou, de resto, alguns minutos para deixar uma série de elogios a Portugal e à diplomacia portuguesa, descrevendo a forma como é vista pelos outros países. Logo de início, transmitiu a Montenegro a “profunda gratidão e apreço” pela “contribuição exemplar” do país para o funcionamento do sistema das Nações Unidas e para a “perspetiva do multilateralismo”.
Depois, ao identificar desafios que podem mesmo ser “ameaças existenciais” à Humanidade (questões climáticas, inteligência artificial sem controlo, desigualdades e conflitos) e a necessidade de reformar “instituições profundamente desatualizadas”, assegurou que “em todas estas batalhas” Portugal tem tido um papel “ativo e influente“.
“Portugal tem uma posição respeitada por todos os outros interlocutores, mesmo as maiores potências. É visto como um país ponte, que aproxima os outros quando estão desavindos, e é dado como exemplo pelas suas preocupações com os valores fundamentais do direito internacional”, assegurou, elogiando em particular o contributo da força portuguesa na República Centro-Africana.
Montenegro quer “condicionantes” para veto na ONU
Também o primeiro-ministro falou aos jornalistas no final da “longa conversa” privada com o secretário-geral das Nações Unidas, frisando que Portugal está “empenhado” em colaborar para o mandato “prosseguir na senda do que tem sido, com um foco muito grande no multilateralismo” e na salvaguarda dos direitos humanos, mesmo reconhecendo que a circunstância é difícil “para todos” — incluindo Guterres e a ONU.
Falando também na necessidade de abrir uma reforma institucional na ONU, Luís Montenegro identificou ainda “objetivamente um problema” com a regra do poder de veto no Conselho de Segurança da instituição: “Há bloqueios na capacidade decisória e de implementar decisões no Conselho de Segurança”. A posição portuguesa, explicou, é de defender que o direito de veto seja “mais condicionado”, para que as votações sejam mais “ágeis” e não haja “forças de bloqueio. Além disso, Portugal defende que se concretize uma abertura do órgão de decisão a países como o Brasil a Índia e países africanos.
Também Montenegro falou no mesmo sentido em que Guterres tinha falado sobre o papel de Portugal no contexto internacional, definindo o país como um “construtor de pontes entre nações” e lembrando o “reconhecimento do valor da política e diplomacia portuguesa” nas instituições internacionais — lembrando o papel do próprio Guterres, de Durão Barroso como presidente da Comissão Europeia, de Maria Luís Albuquerque como comissária e de António Costa como presidente do Conselho Europeu (prestes a tomar posse).
Montenegro aproveitou ainda o momento para frisar que Portugal está ao lado de “todos os que são afetados pela falta de ajuda humanitária no Médio Oriente, estejam de que lado estiverem”, e particularmente preocupado com a situação de Moçambique: “Empenhar-nos-emos em poder garantir uma contenção e que não haja uma escalada de violência, para que se ultrapasse o impasse que está criado e a conflitualidade nas ruas”.