Imagine um jogo de xadrez entre a administração do Grupo Volkswagen e a comissão de trabalhadores. Os primeiros tentaram resolver os graves problemas que o consórcio alemão atravessa ao propor o encerramento de pelo menos três fábricas, o despedimento de 30.000 empregados e a redução dos salários em 10%, a que os segundos responderam avançando com uma greve em nove das fábricas do grupo, para forçar uma negociação. Depois destas trocas de peças iniciais, seguiu-se uma reunião em Wolfsburg onde tudo descarrilou.

Na principal fábrica (e sede) do grupo alemão, estiveram nos dois lados do tabuleiro a administração, representada pelo CEO Oliver Blume, e 20.000 trabalhadores e respectivos sindicatos, com o ministro do Trabalho germânico, Hubertus Heil, a fazer de árbitro da partida. Blume, que é um homem nomeado pelas famílias Porsche e Piech, como tem sido a generalidade dos CEO — excepção feita para Herbert Diess, que veio da BMW quando foi necessário “limpar” as confusões provocadas pelo escândalo Dieselgate — defendeu mais uma vez os cortes e reduções, visando incrementar a competitividade e os lucros do grupo, sem os quais não há investimentos. Mas Daniela Cavallo, a responsável pelo Conselho dos Trabalhadores da VW, argumentou que os cortes iriam amputar a capacidade de produção do grupo, apontando o dedo aos administradores e aos principais accionistas, ou seja, as famílias Porsche e Piech com 31,4% (mas com 53,3% dos direitos de voto), Estado da Baixa Saxónia com 11,8% (20% dos votos) e fundo de investimentos do Qatar com 10,5% (17% dos votos).

E, para reforçar a sua mensagem, Cavallo tirou uma carta da manga ao recordar que as famílias Porsche e Piech, mesmo em tempos de quebras de vendas e redução da facturação e dos lucros, continuam a retirar do Grupo VW 1 milhão de euros por semana sob a forma de dividendos. Como se estes lucros garantidos não bastassem, faça chuva ou sol, Cavallo lembrou que esta prática foi iniciada em 2014 e, desde então, mantém uma regularidade similar à de um relógio suíço.

Daniela Cavallo admitiu pretender chegar a acordo até ao Natal, à custa de compromissos aplicáveis a ambos lados. Caso contrário, avança a responsável pelos trabalhadores que fez parar 100.000 esta semana, todos vão perder. E, de acordo com fontes do grupo, este tem entre 12 a 14 meses para inverter a situação. A próxima ronda de negociações arranca a 9 de Dezembro.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR