Mais um jantar de Natal do grupo parlamentar do PSD para Luís Montenegro, mas este com um sabor especial. Depois de ter participado nesta tradição como deputado, vice-presidente da bancada, líder parlamentar e finalmente como líder do partido da oposição, Montenegro teve o seu primeiro jantar de Natal com os deputados na qualidade de primeiro-ministro. Ainda assim, a receita servida, ou o discurso proferido, melhor dizendo, não foi muito diferente daquele que tem alimentado o discurso de campanha e pós-campanha eleitoral: a denúncia de uma suposta aliança entre o Partido Socialista e o Chega para bloquear a governação da Aliança Democrática.

“É estranhíssimo que estes dois partidos se relacionem de forma combinada para inviabilizar propostas do Governo ou viabilizar propostas de um dos parceiros”, começou por lamentar Luís Montenegro, aproveitando, aliás, uma nota já deixada pelo seu líder parlamentar e braço direito, Hugo Soares. De resto, o primeiro-ministro aproveitou aquilo que aconteceu esta segunda-feira na Madeira — a aprovação da moção de censura contra Miguel Albuquerque — para apresentar mais uma prova de que há uma aliança entre Pedro Nuno Santos e André Ventura.

“Hoje é um dia onde o PS e o Chega se juntaram para derrubar um governo da AD, que foi eleito e reeleito nos últimos 12 meses, e que teve duas confirmações eleitorais. Isto não é uma questão de gosto. É uma questão de respeito pela vontade do povo. Esta cultura do caos e do impasse é uma cultura que não faz falta à democracia portuguesa. O PS e o Chega não estão a respeitar a vontade legitimamente sufragada nas eleições e estão a contribuir para enfraquecer a democracia”, argumento o social-democrata.

[Já saiu o primeiro episódio de “A Caça ao Estripador de Lisboa”, o novo podcast Plus do Observador que conta a conturbada investigação ao assassino em série que há 30 anos aterrorizou o país e desafiou a PJ. Uma história de pistas falsas, escutas surpreendentes e armadilhas perigosas. Pode ouvir aqui, no Observador, e também na Apple Podcasts, no Spotify e no Youtube.]

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Antes, Montenegro já tinha dedicado uns minutos para criticar individualmente cada adversário. Primeiro, o PS, que “nos útlimos anos, fez campanhas implacáveis sobre a possibilidade de o PSD vir a ter qualquer tipo de convergência estratégica com o Chega”, através de um “ataque cerrado e injustificado”. Quanto ao Chega, argumento o social-democrata, “andou durante anos a afirmar que era essencial erradicar o socialismo em Portugal” para depois aprovar com o PS medidas em matéria de pensões e fiscalidade, por exemplo. Na primeira oportunidade, queixou-se Montenegro, os dois partidos juntaram forças e começaram a obstaculizar a Aliança Democrática.

Garantindo que o Governo e o grupo de deputados não perderão tempo com “crises existenciais”, “complexos, “ziguezagues” ou “jogos estéreis”, típicos de quem perde mais tempo a passar nas televisões, nos jornais, nas rádios e no TikTok (numa clara referência a André Ventura), Luís Montenegro ensaiou uma nova ideia-chave — manter “Portugal em Movimento“, disse ele — e fazer, nas próximas semanas, um balanço com resultados concretos dos últimos oito meses de governação para responder àqueles que dizem que o Executivo não tem nada para apresentar além de intenções, planos e powerpoints.

Respeitando o espírito da época, e antes das duas únicas intervenções da noite, Hugo Soares e Luís Montenegro trocaram prendas em nome da direção do grupo parlamentar e da direção do partido, respetivamente. O primeiro ofereceu ao presidente do PSD um livro com “todos os momentos da campanha eleitoral”; o segundo ofereceu ao líder parlamentar um “astrolábio e três medalhas que constituem um relógio noturno para não perder o sentido correto de orientação”.

Entre todas as leituras que se podem fazer sobre os presentes trocados, há uma que é evidente: os sociais-democratas sabem que têm até março de 2026 sensivelmente um ano para mostrar o que valem, carregar na tecla da vitimização, agigantar o fantasma da “maioria de bloqueio” e ir a toda a velocidade numa e só numa direção: eleições legislativas antecipadas que lhe permitam ter um maioria bem mais reforçada e superar a força acumulada de Pedro Nuno e Ventura.