Maputo está a enfrentar uma crise de combustíveis devido à tensão social após o anúncio dos resultados das eleições gerais, com a generalidade dos postos encerrados e os poucos que funcionam com filas de centenas de metros.

“Já fui a quatro bombas (…) Está um caos. Está um caos, não tenho palavras para dizer, está muito mal”, descreve Ilídio Sarmento, que percorreu a cidade à procura de combustível para a viatura.

Colocou-se na fila para abastecer num posto na avenida Eduardo Mondlane, que começava noutra avenida, a 24 de Julho, paralela, e aguentou mais de uma hora e meia.

“Foi a única que encontrei, não posso desistir agora”, lamenta, ainda a algumas dezenas de metros do abastecimento.

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Já Hermenegildo Macausse faz contas à vida, dentro do carro, ao fim de mais de duas horas numa fila que se prolongava por dois quarteirões: “Já percorri outras bombas, umas não têm combustível, outras têm, mas com restrições”.

Descrevendo a situação que se vive em Maputo como “muito complicada”, e ainda com mais de uma dezena de viaturas pela frente até chegar ao abastecimento, ainda acredita que vai conseguir encher o tanque: “Penso que sim, vamos ser otimistas”.

Já Edson da Costa chegou a pé ao posto de abastecimento, aguardando junto às dezenas que fazem uma fila lateral para encher garrafões de cinco litros. O carro ficou em casa, parado, sem combustível, depois de já ter tentado reabastecer na quinta-feira, sem sucesso.

“Hoje (sexta-feira) vou ver se consigo”, afirma, descrevendo o cenário logo de seguida: “Triste, complicado. É uma situação que não sei como é que vamos aguentar”.

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Na mão tem o único garrafão de água, vazio, que conseguiu arranjar e mesmo assim enfrenta as limitações que os postos estão a colocar, na tentativa de fornecer combustível ao máximo de clientes possível, cenário que se regista pelo segundo dia consecutivo.

“É aquilo que consegui, pelo menos cinco litros para circular hoje (sexta-feira) ou amanhã (…) O carro está em casa, estacionado”, diz.

Enquanto isso, Stélio Mata não tem nãos a medir para servir gasolina e gasóleo: “Estamos a ter enchente à procura de combustível”.

O problema é que com a agitação social que afeta Moçambique, incluindo barricadas, nomeadamente nas cidades de Maputo e da Matola, o reabastecimento de combustível não chega ao centro da cidade.

Para já “dá para abastecer”, conta Stélio, admitindo que nunca viveu cenário igual, tal é a procura.

“Como isto não, é a primeira vez”, diz.

O centro de Maputo voltou esta sexta-feira a acordar deserto, sem transportes públicos a funcionar, num clima de tensão social após o anúncio dos resultados das eleições gerais moçambicanas.

Numa ronda pela cidade foi possível constatar que a generalidade das instituições, bancos, empresas, comércios e restaurantes estão fechados.

Moçambique vive novo dia de tensão social na sequência do anúncio dos resultados finais das eleições gerais, marcados nos anteriores por saques, vandalizações e barricadas, nomeadamente em Maputo.

Pelo menos 252 pessoas morreram nas manifestações pós-eleitorais desde 21 de outubro, metade das quais apenas desde o anúncio dos resultados finais, na segunda-feira, segundo novo balanço da plataforma eleitoral Decide.

Ainda desde segunda-feira, aquela ONG contabilizou 224 pessoas baleadas, número que sobe para 569 desde o início da contestação, em 21 de outubro, além de 4.175 detidos.

O Conselho Constitucional de Moçambique proclamou na segunda-feira Daniel Chapo, candidato apoiado pela Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo, no poder), como vencedor da eleição a Presidente da República, com 65,17% dos votos, sucedendo no cargo a Filipe Nyusi, bem como a vitória da Frelimo, que manteve a maioria parlamentar, nas eleições gerais de 09 de outubro.

Este anúncio provocou o caos em todo o país, com manifestantes pró-Venâncio Mondlane — que segundo o Conselho Constitucional obteve apenas 24% dos votos — nas ruas, barricadas, pilhagens e confrontos com a polícia, que tem vindo a realizar disparos para tentar a desmobilização.