“Reconhecer que as alterações climáticas representam uma ameaça urgente e potencialmente irreversível para as sociedades e para o planeta, e que portanto requer a maior cooperação possível de todos os países” é uma das premissas do documento que reuniu consenso de todas as partes envolvidas (195 países e a União Europeia) – o Acordo de Paris.
“[Assim], as partes, quando desenvolverem ações para combater as alterações climáticas, devem respeitar, promover e ter em consideração as respetivas obrigações em relação aos direitos humanos, o direito à saúde, os direitos dos povos indígenas, das comunidades locais, dos migrantes, das crianças, das pessoas com deficiência e das pessoas em situação vulnerável e [ainda] o direito ao desenvolvimento, à igualdade de género, à capacitação das mulheres e à equidade internacional.”
O Acordo de Paris foi aceite este sábado pelas partes e será simbolicamente assinado no dia 22 de abril de 2016, Dia da Terra, depois de traduzido para as seis línguas oficiais. Entrará oficialmente em vigor assim que pelo menos 55 países, que representem 55% das emissões globais de gases com efeito de estufa, ratifiquem o acordo. Para já, conheça os pontos principais do acordo.
1. Limitar o aumento da temperatura
Estabelece uma meta a longo prazo que limita a subida da temperatura a um valor “bem abaixo dos 2 graus Celsius”, em relação aos níveis pré-industriais. A partir deste patamar dos 2º C, os cientistas antecipam grandes impactos e catástrofes ambientais. Se nada for feito em relação ao estado atual, ou se não se for mais ambicioso que as propostas atuais, a temperatura deverá aumentar perto de 3º C. O documento refere que se deve ir mais longe e tentar travar o aquecimento a 1,5º C, nível que os países mais vulneráveis defendem como necessário para garantir a sua sobrevivência.
O Acordo de Paris “convida o Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas a divulgar um relatório especial em 2018 sobre os impactos do aumento da temperatura média global em 1,5º C em relação ao período pré-industrial e sobre os efeitos globais relacionados com as emissões de gases com efeito de estufa”.
2. Reduzir emissões de gases com efeito de estufa
Fixa um objetivo para conter o crescimento dos gases de efeito estufa, “o mais cedo possível”, através da promoção de reduções rápidas das emissões, de acordo com as melhores recomendações científicas disponíveis. Apesar de não quantificar metas, a referência científica remete para o último relatório do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas, segundo o qual só a descarbonização (zero emissões) da economia até 2050 permitirá cumprir o limite de 1,5 graus de aumento de temperatura.
Mas no acordo a referência vai para o “balanço entre as emissões de gases com efeito de estufa de origem antropogénica pelas fontes e as remoções por sumidouros [de carbono] na segunda metade do século”. Estes sumidouros são, por exemplo, as florestas, daí que se refira no acordo a necessidade de preservação das mesmas.
“Os países desenvolvidos devem continuar a assumir a liderança através da implementação de metas de redução de emissão absoluta em toda a economia. Os países em desenvolvimento devem continuar a reforçar os seus esforços de mitigação, e são incentivados a deslocar-se, ao longo do tempo, para as metas de redução de emissões ou de limitação de toda a economia, à luz das diferentes condições nacionais.”
185 países já apresentaram voluntariamente os planos de ação nacionais (INDC, na sigla em inglês para intended nationally determined contributions) que pretendem implementar para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa até 2030. Os que ainda não o fizeram são convidados a fazê-lo até à próxima Conferência do Clima em Marrocos, em novembro de 2016. O acordo “anota com preocupação que os níveis de emissões de gases com efeito de estufa em 2025 e 2030, resultantes das intenções de contribuição determinadas a nível nacional [INDC] não caem dentro dos cenários de menor custo dos 2º C”, ou seja, as propostas voluntárias dos países são insuficientes.
3. Aumentar a ambição
As partes, quer tenham definido estratégias para 2025 quer para 2030, devem revê-las até 2020 e depois a cada cinco anos, de uma forma cada vez mais ambiciosa. Pede-se ainda que sejam reavaliados a partir de 2018 os contributos já apresentados para o horizonte de 2020, data em que se espera que entre em vigor o compromisso de Paris. Este sistema de avaliação periódica é relevante porque os planos de combate às alterações climáticas já submetidos a nível nacional até 2030, não são suficientes para colocar o mundo na rota que lhe permitirá limitar a dois graus a subida da temperatura.
O que se conseguir fazer até 2020, e depois desta data, vão determinar o sucesso deste acordo. Por um lado, é enfatizado que para se conseguir manter o aumento da temperatura abaixo dos 2º C é preciso rever, até 2020, as metas de mitigação – redução das emissões de gases com efeito de estufa. Por outro, que quanto mais ambiciosas forem as metas até 2020, melhor conseguiremos lidar com a situação depois disso, porque só as metas ambiciosas até lá podem diminuir os custos da ações de mitigação e adaptação futuros.
4. Transparência na informação fornecida
As partes concordaram que, na comunicação das contribuições nacionais, de forma a garantir a “clareza, transparência e compreensão”, “podem incluir, conforme apropriado”, “informação quantificável nos pontos de referência, prazos ou períodos de implementação, alcance e cobertura, processos de planeamento, suposições e abordagens metodológicas, incluindo aqueles para a estimativa e contabilização das emissões de gases de efeito estufa de origem antropogénica”.
O acordo pede ainda que os países informem se as contribuições são “justas e ambiciosas, à luz das circunstâncias nacionais, e de que forma contribuem para o compromisso da Convenção [Convenção Quadro das Nações Unidas para as Alterações Climáticas, UNFCCC]”. Os países em desenvolvimento podem solicitar ajuda para alcançar os requisitos de transparência.
Serão elaboradas recomendações sobre a “necessidade de promover transparência, rigor, plenitude, consistência e comparabilidade”, assim como evitar duplicação da comunicação dos dados. Estas recomendações devem ter em consideração a consistência entre a metodologia usada para avaliar as metas nacionais e a metodologia dos relatórios internacionais.
“O quadro de transparência deve desenvolver e reforçar os mecanismos de transparência no âmbito da Convenção, reconhecendo as circunstâncias especiais dos países menos desenvolvidos e dos pequenos Estados-ilha em desenvolvimento, e ser executado de uma maneira facilitadora, não-intrusiva, não punitiva, respeitosa da soberania nacional e evitando colocar peso excessivo sobre as partes.”
5. Financiamento
Financiamento por parte dos países ricos aos países mais pobres de forma a promover escolhas de baixo carbono e para ajudar a lidar com os efeitos ambientais das alterações climáticas, tanto nas ações de mitigação como nas de adaptação. Os países desenvolvidos devem continuar a disponibilizar 100 mil milhões de dólares por ano até 2025, e reforçar os apoios financeiros depois dessa data. Uma das premissas do acordo lembra “a necessidade de promover o acesso universal a energias sustentáveis, em particular em África”.
6. Acordo universal, mas diferenciado
Ao contrário do Protocolo de Quioto, que apresentava metas apenas para os países desenvolvidos, o Acordo de Paris pretendia ser universal – que todos os países contribuíssem para a resolução do problema. A universalidade foi conseguida, mas apenas com a diferenciação entre os países desenvolvidos e os países em desenvolvimento. Esta diferenciação refere-se às metas e esforços a fazer para cortar as emissões e à contribuição para o financiamento aos países mais pobres.
O Acordo de Paris vai reger-se pelos mesmo princípios que a UNFCCC, “incluindo o princípio da equidade e das responsabilidades comuns, mas diferenciadas, e respetivas capacidades, à luz das diferentes circunstâncias nacionais”. Mas reforça que os países desenvolvidos têm de “assumir a liderança” no que toca a “estilos de vida sustentáveis e padrões de consumo e produção sustentáveis”, de forma a evitar as alterações climáticas.
7. Acordo vinculativo
A grande ambição do acordo vinculativo (legally binding) foi perdida. Apesar do presidente da COP21, o ministro Laurent Fabius, continuar a referir compromissos vinculativos, não há metas de redução de emissões nacionais, uma cedência à medida dos Estados Unidos, o segundo maior poluidor mundial que não subscreveu o Protocolo de Quioto. No Acordo de Paris, a ideia de “legally binding” estava no Artigo 17 que caiu e a palavra “binding” não surge em nenhum outro momento do documento.
Atualizado às 00h17, de dia 13 de dezembro