Passos Coelho não esteve em regime de exclusividade para receber o complemento salarial enquanto era deputado, mas afinal esteve em regime de exclusividade para receber o subsídio de reintegração concedido pela Assembleia da República quando abandonou funções. Confuso? Enquanto esteve no Parlamento, o então deputado não requereu o regime de exclusividade, por isso, não recebeu durante os quatro anos da última legislatura em que foi deputado (1995-1999) o complemento salarial de 10% a que teria direito se tivesse pedido a exclusividade. Contudo, quando saiu da Assembleia, foi-lhe reconhecido o direito a receber o subsídio de reintegração, pago a deputados em exclusividade.

A Assembleia da República confirmou que Passos Coelho recebeu, depois de sair do Parlamento, o valor referente ao subsídio de reintegração enquanto deputado nos anos de 1995 a 1999. Num comunicado depois da notícia do Público desta terça-feira, os serviços da secretaria-geral da Assembleia da República dizem que Passos não requereu a declaração de exclusividade para efeitos de salário mensal, mas que lhe foi atribuído, posteriormente, o subsídio de reintegração, assinado já em 2000 por “de facto” não ter auferido outro salário durante a legislatura. De acordo com a lei 26/95, tinham direito a receber o subsídio os deputados que não tivessem completado 12 anos de exercício de funções públicas e que estivessem em regime de exclusividade.

O Público levanta esta terça-feira a questão por, alegadamente, Passos Coelho ter recebido, no período entre 1995 e 1999, rendimentos da Tecnoforma ao mesmo tempo que tinha o regime de exclusividade no Parlamento, enquanto deputado. A questão coloca-se porque se o então deputado terá recebido dinheiro da empresa, não o declarou às Finanças, o que lhe serviu para receber mais tarde o subsídio de reintegração. Questão que oficialmente o gabinete de Passos Coelho ainda não esclareceu.

Em comunicado enviado esta tarde, a Assembleia da República adensa a questão dizendo que não “não existe uma declaração de exclusividade relativa ao período que medeia entre novembro de 1995 e 1999” e que por isso “também não foi pago o complemento de 10% que corresponde a essa declaração”.

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No entanto, esse subsídio foi aprovado posteriormente, já em 2000 depois de analisadas as declarações de rendimentos – onde não consta qualquer referência a valores pagos pela Tecnoforma. Segundo a Assembleia da República, existe um parecer do auditor jurídico da Assembleia, que foi homologado pelo então Presidente da Assembleia da República, António Almeida Santos (PS), em que é dito que Passos tem direito ao subsídio de reintegração, por não ter “de facto” auferido de outros rendimentos enquanto deputado. Ou seja, diz o parecer, “para efeitos de atribuição daquele subsídio, não atende à questão formal da existência ou inexistência da declaração de exclusividade, mas sim à situação factual relativa aos dados sobre os rendimentos do período em causa”.

A questão foi levantada a semana passada quando a revista “Sábado” referia pagamentos alegadamente feitos pela Tecnoforma, no valor de cerca de 150 mil euros durante os três anos em que dirigiu o Centro Português para a Cooperação (CPPC), exatamente os três pelos quais recebeu o subsídio de reintegração pago pelo Parlamento. Já em declarações ao Público, ex-patrão de Passos Coelho, presidente da Tecnoforma, assegurou que teria feito pagamentos por trabalho prestado ao serviço do CPPC.

Depois da notícia da Sábado, dando conta de uma investigação do Ministério Público aos pagamentos alegadamente feitos ao primeiro-ministro, enquanto deputado, a Procuradoria-Geral da República confirmou a existência de um inquérito, mas dizendo que “não corre, até à data, contra pessoa determinada”.