Quando tomou a palavra, na conferência de imprensa de apresentação da ARCO Lisboa 2017, esta sexta-feira de manhã, Carlos Urroz começou por falar português, mas logo mudou para o espanhol, a língua materna, deixando um comentário em jeito de graça: “Toda a equipa está a aprender português.”
Parece irrelevante, mas talvez não seja. Provavelmente, o diretor da feira internacional de arte contemporânea estava a dizer, por outras palavras, que tão cedo a ARCO não sairá de Portugal.
A segunda edição acontece entre 18 a 21 de maio, na Cordoaria Nacional, em Lisboa, e em relação à primeira, em 2016, regista ligeiras alterações. Se a feira veio de Espanha para ficar, é prudente o otimismo dos organizadores — foi esse o tom da conferência de imprensa.
O orçamento é de um milhão de euros, tal como no ano passado, disse Carlos Urroz. “Mas o critério de avaliação da feira não está no orçamento, antes no nível de qualidade” das obras apresentadas pelas galerias, acrescentou Eduardo López-Puertas, diretor de IFEMA (Institución Ferial de Madrid, que gere a Arco Madrid desde há 36 anos e criou a versão lisboeta).
O mesmo responsável descreveu a ARCO Lisboa como um “grande acontecimento artístico e social” e disse que a IFEMA “está a trabalhar para a feira se torne uma referência e contribua para consolidar Lisboa como foco da arte contemporânea.”
“No ano passado havia incerteza sobre se as galerias e o público responderiam, e a verdade é que o ponto de partida, em 2017, é já muito diferente”, afirmou Carlos Urroz. “O projeto cresceu, não tanto em tamanho, mas na qualidade dos conteúdos. Os colecionadores e convidados estrangeiros sentiram que estavam numa cidade única, não apenas em mais uma feira, sentiram que a ARCO estava muito centrada em dar valor à arte e às instituições portuguesas.”
As galerias presentes — 58 no total, das quais 27 portuguesas — vão pagar valores iguais aos de 2016 para terem um stand na Cordoaria: oito a 12 mil euros, conforme o espaço que ocupam. São mais 13 galerias que em 2016.
Estão representadas algumas das “mais importantes de Portugal”, descrevem os organizadores, como a Cristina Guerra, Pedro Cera ou Vera Cortês (de Lisboa) e Múrias Centeno, Quadrado Azul ou Fernando Santos (do Porto). Em termos internacionais, Carlos Urroz destacou a Zak Branicka, de Berlim, a Elba Benítez, de Madrid, e a Monitor, de Roma.
O critério de seleção de galerias é o mesmo de 2016: convite internacional para candidaturas e análise por um comité constituído pelo diretor do evento, por três galerias estrangeiras e por duas portuguesas (Cristina Guerra e Múrias Centeno).
O formato de apresentação também é o mesmo: cada galeria escolhe um artista para destacar no seu stand. A título de exemplo: a Filomena Soares destaca João Penalva; a Miguel Nabinho escolheu Salomé Lamas; a João Esteves Oliveira sugere Júlio Pomar; a Múrias Centeno aposta na dupla Musa paradisiaca (Eduardo Guerra and Miguel Ferrão); e a Horrach Moya, de Palma de Maiorca, põe Joana Vasconcelos sob o foco.
Novidade este ano é a secção “Opening”, com oito galerias que abriram há menos de sete anos, portuguesas e não só (do total de 58). Foram selecionadas pelo curador português João Laia.
A galerista Cristina Guerra, do comité organizador, mostrou-se convencida de que a feira “vai ser um êxito maior do que no ano passado, em virtude do envolvimento das galerias e instituições”. “Em todo o lado se tem vindo a falar de Lisboa e da feira”, afirmou esta profissional, que leva 16 anos no meio e frequenta o circuito europeu de feiras de arte.
Arco Lisboa “não defraudou expectativas”, mas mostrou “incúria” dos museus
Ainda assim, Cristina Guerra chamou a atenção para o que considera ser “o trabalho de puxar pela arte contemporânea”.
“Temos sido nós, os privados, as galerias, a fazer isso. Precisamos de melhores pessoas à frente das instituições, espero que o Ministério da Cultura tenha mais atenção e os diretores de museu também”, criticou, referindo-se às instituições que, regra geral, através da aquisição de obras, são vistas como fontes de credibilização das feiras de arte.
Em paralelo, vários museus e galerias associam a sua programação à da ARCO Lisboa, tendo exposições para datas próximas das da feira. Alguns destaques:
- Serralves mostra-se no Torreão Nascente da Cordoaria numa exposição intitulada “O Olhar do Artista”, com obras de Helena Almeida, Lourdes Castro, Wolfgang Tillmans, Richard Serra e Paula Rego, entre outros;
- no MAAT – Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia os artistas João Onofre, Ana Pérez-Quiroga e Carlos Garaicoa inauguram exposições;
- no Museu do Oriente, a mostra “O Olhar da Sibila: Corporalidade e Transfiguração” exibe obras de Vieira da Silva, Noé Sendas, Ângela Ferreira ou Julião Sarmento;
- o Museu Nacional de Arte Antiga inaugura “Madonna: Tesouros dos Museus do Vaticano”, conjunto de 50 obras de diferentes épocas, pertencentes às famosas coleções de arte do Vaticano, que vão estar pela primeira vez me Portugal e incluem trabalhos de artistas tão diversos como Fra Angelico, Rafael ou Marc Chagall.
Nota ainda para os conferências abertas ao público, intituladas “Master Talks”, que decorrerão na Casa da América Latina, mesmo ao lado da Cordoaria. Descritas como “palestras magistrais”, vão trazer a Lisboa Manuel Borja-Villel, diretor do Museu Rainha Sofía, em Madrid; James Lingwood, codiretor da produtora Artangel; e Hans Ulrich Obrist, responsável pelas Serpentine Galleries, em Londres.
Carlos Urroz aproveitou a conferência de imprensa para fazer um breve balanço da primeira edição, no ano passado, atualizando para 15 mil o número de visitantes. A organização tinha falado em cerca de 13 mil, logo a seguir ao encerramento da ARCO 2016, mas agora, contando não só os bilhetes vendidos mas também visitantes profissionais e convidados, o número subiu, disse o diretor. Numa sugestão de que a Cordoaria já se tornou pequena para a feira, Urroz afirmou que a “capacidade de gerar entradas é limitada”.