Um telefonema de 45 minutos resultou num anúncio histórico. Mais de 50 anos depois, os Estados Unidos e Cuba vão reiniciar relações diplomáticas, anunciaram esta quarta-feira o presidente norte-americano, Barack Obama, e o presidente cubano, Raúl Castro, em discursos simultâneos.
“Vamos pôr fim a uma abordagem datada que durante décadas falhou os nossos interesses. Vamos começar a normalizar as relações entre os dois países”, disse Obama, num discurso televisivo. O acordo, continuou, “vai dar início a um novo capítulo entre os países do continente americano”.
"To the Cuban people, America extends a hand of friendship." —President Obama
Watch the full video. #CubaPolicy http://t.co/Qrzp5zODZk— White House Archived (@ObamaWhiteHouse) December 17, 2014
Os Estados Unidos vão reabrir a embaixada em Havana, encerrada há mais de meio século, rever a designação de Cuba como um Estado que apoia o terrorismo (o país foi colocado nessa lista em 1982) e aliviar as restrições a viagens e relações comerciais. Cuba comprometeu-se a libertar 53 prisioneiros identificados como presos políticos pelos Estados Unidos.
O embargo imposto pelos EUA em 1960 (que se tornou total um ano depois) não foi levantado, mas Obama promete lançar novamente o debate. “Estes cinquenta anos demonstraram que o isolamento não funciona”, disse o presidente norte-americano. “É tempo de uma nova abordagem”, continuou.
Ao mesmo tempo que Obama discursava, também Raúl Castro falava na televisão cubana. “Conseguimos encontrar solução para alguns temas que interessam aos dois países”, disse, pedindo ao povo cubano que respeitasse e reconhecesse a decisão de Obama. Mas o presidente cubano sublinhou que este acordo não resolvia “o principal problema”, ou seja, o embargo, que Raúl Castro designou de “bloqueio. “O bloqueio tem muitos prejuízos humanos e económicos para o nosso país e deve terminar”, disse.
O anúncio surge depois da libertação de Alan Gross, um construtor civil norte-americano preso há cinco anos em Cuba, que o acusava de espionagem. E é o desfecho de 18 meses de negociações secretas entre os dois países, mediadas pelo Vaticano. Gross chegou esta quarta-feira de manhã aos Estados Unidos. Os EUA enviaram para Cuba três espiões cubanos detidos desde 2001, em troca da libertação de um agente norte-americano preso na ilha há quase 20 anos. Gross não foi, segundo os EUA, parte desta troca e a sua libertação ocorreu por razões humanitárias. O construtor civil perdeu mais de 45 quilos na prisão e estava a perder a visão no olho direito. Em abril fez uma greve de fome que durou nove dias.
As relações diplomáticas entre os Estados Unidos e Cuba foram interrompidas em janeiro de 1961, dois anos depois da chegada ao poder de Fidel Castro. Em 2006, Raúl Castro sucedeu ao irmão Fidel à frente dos destinos do país.
O telefonema da noite de terça-feira entre Obama e Raúl Castro foi o primeiro contacto formal entre os líderes dos dois países em mais de cinquenta anos. A Casa Branca divulgou esta fotografia, tirada durante a conversa entre os dois presidentes.
President Obama speaks with President Raúl Castro of Cuba before announcing his #CubaPolicy: http://t.co/ZeORP4H0jr pic.twitter.com/dJMxK2IAor
— White House Archived (@ObamaWhiteHouse) December 17, 2014
Há um ano, os dois presidentes cumprimentaram-se durante as cerimónias fúnebres de Nelson Mandela na África do Sul.
Os republicanos norte-americanos ficaram em choque com o discurso de Barack Obama. O Politico escreve mesmo que a direita ficou “lívida” com a manobra do presidente para normalizar as relações com Cuba.
No entanto há sentimentos contraditórios entre os políticos republicanos porque, por um lado, foram vários os que manifestaram contentamento pela libertação do cidadão norte-americano Alan Gross, que esteve preso durante cinco anos em Cuba, por outro, os mesmos políticos lamentaram o que essa libertação significou, e houve mesmo quem falasse em “escândalo”, como foi o caso de Mario Diaz-Balart, deputado da Florida, porque, entende o republicano, a negociação da libertação fez com que o governo americano se vergasse perante a “chantagem” do regime castrista.
O senador Lindsey Graham, que é um dos porta-vozes do partido para assuntos de política externa, manifestou no Tweet a opinião: é uma péssima ideia.
Marco Rubio, senador e potencial candidato republicano à presidência, que é filho de imigrantes cubanos, em declarações à Fox News, disse que o facto de os EUA abrirem uma embaixada em Cuba não vai resultar em mais liberdade económica ou democracia no país. Rubio prometeu tentar desviar os esforços da Casa Branca acusando a administração de Obama de “acarinhar ditadores e tiranos”.