A fadista Celeste Rodrigues, de 95 anos, que na sexta-feira sobe ao palco do TivoliBBVA, em Lisboa, disse à Lusa que “cantar é sempre uma alegria, mas ainda mais nesta idade”.
A fadista iniciou a carreira há 73 anos, ao aceitar o convite feito pelo empresário José Miguel (1908-1972), detentor de vários teatros e casas de fado, entre os quais o Café Casablanca. Do seu repertório constam, entre outros temas, “A Lenda das Algas” e o “Fado das Queixas”.
“Cantar é sempre uma alegria, mas ainda mais nesta idade, porque não é fácil ter ainda um bocadinho de voz para me atrever a cantar”, disse a fadista, em entrevista à agência Lusa. “Celeste tem uma caixinha de música na garganta, à qual alia uma interpretação sentida”, disse à Lusa a fadista Argentina Santos, de 92 anos, com quem Celeste Rodrigues trabalhou.
“Eu canto como posso”, disse por seu lado Celeste Rodrigues, que se afirmou “muito contente” por “juntar tantos amigos em palco”, a propósito do concerto de sexta-feira. “Espero que esta reunião de amigos — que eu tenho muitos — seja tão forte quanto eu penso que é a amizade, e que tenha gente que goste de ouvir cantar fado e que foste de mim”, afirmou.
No palco da avenida da Liberdade, além da homenageada, atuam os fadistas Teresinha Landeiro, Fábia Rebordão, Katia Guerreiro, Duarte, Helder Moutinho e Jorge Fernando, acompanhados pelos músicos Pedro Castro, na guitarra portuguesa, André Ramos, na viola, e Francisco Gaspar, na viola baixo, e ainda, para acompanhar a bisavó, Gaspar Varela, na guitarra portuguesa.
“Acho que o fado é uma música linda, maravilhosa, com palavras bonitas ainda mais maravilhoso fica, portanto, é natural que faça sucesso. E entra dentro de nós, está nas veias de todos os portugueses”, disse a fadista, que, no passado mês de abril, atuou no Town Hall, em Nova Iorque, no âmbito do II Festival do Fado da cidade norte-americana.
Referindo-se ao alinhamento que vai apresentar no TivoliBBVA, afirmou que vai abrir com o “Fado Celeste” e interpretar “alguns sucessos antigos e de agora”. Alguns dos fados do seu repertório serão interpretados por fadistas que atuam.
Celeste Rodrigues afirmou-se “muito contente por os mais novos pegarem” nos seus fados, até porque já não tem idade, como considerou, para cantar certos fados, nomeadamente, os de amor. “Já não tenho idade para falar de amor, já não namoro, não posso dar a mesma força aos fados que falam de amor e que eu cantava antigamente. E gosto de ouvir os mais novos cantá-los”, disse à Lusa a fadista, que garantiu não se poder queixar de nada.
“O Meu Xaile”, “Saudade vai-te Embora”, “Esteja quedo” e “Olha a Mala” são alguns dos seus sucessos da fadista nascido em 1923 no Fundão, na Beira Baixa. Celeste Rodrigues, depois do convite para cantar no Casablanca, fez parte de uma companhia teatral que seguiu em digressão para o Brasil, e em que era vedeta a sua irmã Amália Rodrigues, e que apresentava a opereta “Rosa Cantadeira” e a revista “Bossa Nova”.
Ao longo da carreira fez parte dos elencos de várias casas de fados, como o Café Latino, o Marialvas, Adega Mesquita, Tipóia e Adega Machado e a Parreirinha de Alfama, de Argentina Santos.
Além do Brasil, onde regressaria no início da década de 1950 a fadista atuou em Espanha e em África, ainda antes das independências, em territórios como o do então Congo Belga, nos países que se encontravam então sob administração britânica e em Angola e Moçambique.
Em 1953 casou-se com o ator Varela Silva e, em 1957, tornou-se proprietária do restaurante típico A Viela, ao qual renunciará quatro anos mais tarde. Ainda em finais da década de 1950 foi das primeiras fadistas a atuar na televisão, ainda no período experimental da RTP, no teatro da Feira Popular, e “a primeira a enfrentar as câmaras, quando os estúdios do Lumiar passaram da fase de experiências para as emissões regulares”, segundo o “Álbum da Canção”, de maio de 1967.
Em 2005, o encenador Ricardo Pais, então diretor do Teatro Nacional São João, no Porto, convidou a fadista a participar no espetáculo “Cabelo Branco é Saudade”, ao lado de Argentina Santos, Alcindo de Carvalho (1932-2010) e Ricardo Ribeiro, e com o qual fez uma digressão europeia.
Em 2007 editou o álbum “Fado Celeste”, no qual gravou fados tradicionais e inéditos com letras de autores contemporâneos, como Helder Moutinho, José Luís Gordo e Tiago Torres da Silva. Nesse ano foi homenageada pela Associação Portuguesa dos Amigos do Fado (APAF), no Museu do Fado, num reconhecimento da “voz bonita, capacidade interpretativa e regularidade de uma carreira”, segundo declarações de Julieta Estrela de Castro, presidente da APAF à agência Lusa.
Em 2010, estreou o documentário sobre a sua vida, “Fado Celeste”, realizado pelo seu neto Diogo Varela Silva, e recebeu a Medalha de Prata da Cidade de Lisboa, no cinema S. Jorge. Em 2015, pelos seus 70 anos de carreira, a secção Heart Beat do Festival DocLisboa, abriu com uma remontagem do documentário, intitulado, apenas, “Celeste”.
Em 2012 o Presidente da República Aníbal Cavaco Silva condecorou-a com a Ordem do Infante D. Henrique, grau de comendador. A fadista continua a cantar, regularmente, em casas de fado, designadamente no Café Luso e na Mesa de Frades, em Lisboa.