Por algumas horas, Zinedine Zidane regressou aos tempos de jogador. Fez da decisão pessoal que já tinha tomado antes uma bola, andou naquelas fintas em roleta que deliciavam os amantes de futebol a quem queria saber o que se estava a passar e viu na reunião com Florentino Pérez, o presidente que apostou em si como técnico quando poucos acreditavam que tivesse aquele sucesso que outrora conseguiu com a camisola 10, a sua baliza prioritária. O líder do clube foi o primeiro a saber, na véspera, à noite; os jogadores receberam SMS esta manhã, no seguimento da reunião para definir os últimos pormenores da saída. Sempre em sigilo, o que apanhou todos fora de jogo.

Como seria de esperar, e mesmo com uma moção de censura a Mariano Rajoy, o tema está a dominar o dia em Espanha e em diferentes perspetivas. Do perfil escolhido por Florentino Pérez ao nome que irá suceder a Zidane, do impacto da notícia no balneário aos jogadores que ficarão a ganhar ou a perder com a troca no comando, passando ainda pelo futuro do francês como treinador, estas são as cinco grandes perguntas à procura de resposta.

O regresso ao treinador com currículo ou a aposta no perfil Zidane?

Florentino Pérez está pela segunda vez na presidência do Real Madrid. Resumindo a primeira vigência a uma única ideia, o líder dos merengues conseguiu enraizar o conceito de galácticos no clube (que começou com Figo e teve em Zidane o segundo expoente máximo) mas falhou na escolha de treinadores após a saída de Vicente Del Bosque, em 2003 (Carlos Queiroz, Camacho ou Vanderlei Luxembrugo foram tiros ao lado, sendo que o português ainda ganhou uma Supertaça); agora, esse é sempre um cuidado especial. Apostou sempre em treinadores com currículo mas sem terem propriamente a relação mais próxima com os jogadores. Mourinho e Ancelotti conseguiram ganhar (mais o italiano do que o português), Pellegrini e Rafa Benítez falharam. Até que chegou Zidane, um técnico mais novo, com menor experiência mas capaz de lidar mais facilmente com o balneário que ainda há pouco tempo ocupava. Esta será a grande dúvida de Florentino: procurar um perfil como o francês ou apostar num peso pesado.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

O argentino, os alemães ou a surpresa inesperada?

A imprensa espanhola divide-se em relação aos favoritos, mas há dois nomes que parecem ocupar a pole position na sucessão a Zinedine Zidane: Joachim Löw, selecionador da Alemanha que renovou recentemente até 2022 mas que deixou sempre a porta aberta para uma eventual tentativa de negociação de Florentino Pérez; e Mauricio Pochettino, argentino que está nos comandos do Tottenham há quatro anos, que também prolongou o seu vínculo na última época até 2023 mas que se tornou numa espécie de treinador da moda, não pelo que ganha mas pelo que consegue colocar a equipa a jogar. Além destes, Jürgen Klopp, germânico que levou o Liverpool à final da Liga dos Campeões de forma surpreendente, surge como uma espécie de terceira via, à frente de Arsène Wenger (que acabou contrato com o Arsenal 22 anos depois) ou Massimiliano Allegri (Juventus). Existem ainda dois nomes colocados na short list caso a opção recaia pelo “modelo Zidane”: Guti e Solari, técnicos mais jovens que também jogaram no clube durante alguns anos até iniciarem a carreira como treinadores no setor da formação dos merengues.

Prioridade: controlar os estilhaços da bomba no balneário

Em fevereiro, numa altura em que Zidane chegou a ser assobiado na sequência de alguns resultados menos positivos do Real, Sergio Ramos chegou a admitir que não se admirava que o técnico saísse mesmo que ganhasse a Liga dos Campeões, neste caso a terceira consecutiva. Hoje, muitos recordam essa tirada e tentam criar um nexo de causalidade que parece não existir: a notícia da saída do francês, que foi comunicada pouco antes aos jogadores via SMS, caiu como uma bomba no balneário dos merengues. A Marca ressalva que a maioria tinha ficado com a ideia de que poderia haver novidades em breve mas em torno de uma possível renovação. Em paralelo, e sustentando essa surpresa, o jornal explica que os pesos pesados sempre tiveram uma relação próxima com o técnico, que as mudanças depois da saída de Benítez fizeram toda a diferença e que, à exceção de jogadores com menos minutos como Morata ou James Rodríguez, houve apenas pequenos momentos de tensão numa ligação forte e próxima.

Os jogadores que ganham, os jogadores que perdem e… Ronaldo

O Sport faz uma análise individual ao plantel do Real Madrid depois da saída de Zidane e aponta três elementos que poderão ter mais dificuldades daqui para a frente: Keylor Navas, guarda-redes costa-riquenho que foi sempre a aposta número 1 do técnico ao ponto de ter sido vetada uma possível entrada de Kepa (isto sem falar do interesse em nomes de outras ligas, como Courtois); Varane, central que viu a sua trajetória nos merengues claramente subir desde que Zidane chegou, ganhando lugar a Pepe e fazendo com que nunca houvesse uma aposta clara na compra de um defesa de topo; e Benzema, uma espécie de “patinho feio” deste Real que foi dos atletas mais protegidos pelo técnico. Em contrapartida, a realidade poderá ser diferente para melhor para outro trio: Isco, que viveu muitas vezes à sombra do BBC (Bale-Benzema-Cristiano) e poderá ocupar um papel de maior protagonismo na equipa; Asensio, grande destaque no final de 2016/17 e no arranque da presente temporada que chegou à seleção espanhola mas acabou por ter menos minutos do que era esperado; e Dani Ceballos, médio contratado ao Betis que se destacou na seleção Sub-21, era apontado como uma das grandes esperanças mas “estagnou” nesta última época. Depois, há Cristiano Ronaldo: o português, que chegou a abrir a porta da saída após a final da Champions, fica sem um elemento de confiança e com quem ia gerindo da melhor forma o desgaste ao longo da temporada.

O que pode abalar o período sabático de Zidane?

Na conferência de imprensa de saída, Zinedine Zidane falou num período sabático a breve ou médio prazo, explicando que o facto de sair do Real Madrid não significava que fosse para uma outra equipa no dia seguinte. No entanto, e como a paixão de treinar continua intacta, o francês vai entrar na bolsa de nomes que são apontados às principais formações da Europa. Olhando para o cenário atual, só existem duas hipóteses fortes para Zidane: o Chelsea, que continua sem confirmar em definitivo Antonio Conte para a próxima época, ou uma seleção em caso de insucesso no Mundial, como a França. Depois, e numa perspetiva futura, há três conjuntos que se poderão virar para o gaulês caso continuem a ganhar no plano interno e a passar ao lado das contas na Liga dos Campeões: os franceses do PSG (Tuchel), os italianos da Juventus (Allegri) e os alemães do Bayern (Kovac).