O Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos deu o primeiro alerta para a eventual existência de uma lista ou bolsa VIP de contribuintes em janeiro deste ano. Nesta reunião esteve presente o diretor-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), António Brigas Afonso, que se demitiu esta quarta-feira, adiantou ao Observador, o presidente do sindicato, Paulo Ralha.

O encontro realizou-se logo a seguir às ações de formação desenvolvidas no dia 20 de janeiro, em que um alto quadro do Fisco revelou a existência de uma bolsa ou pacote VIP (very important persons) de contribuintes mediáticos, ligados sobretudo à esfera politica, em ações de formação em que participaram centenas de inspetores estagiários.

Nesta reunião com o sindicato, António Brigas Afonso pouco disse. Já o subdiretor-geral de justiça tributária terá apoiado a abertura de processos disciplinares em casos de acesso indevido ou não justificado a declarações fiscais. Ninguém na reunião confirmou a existência de um filtro ou alerta informático para detetar acessos a declarações de personalidades mediáticas, ligadas sobretudo à esfera política.

Na mensagem de despedida, o diretor-geral demissionário nega a existência de uma lista, mas refere que foram testados novos métodos de proteção dos dados pessoais dos contribuintes e contra acessos ilícitos, que não terão sido implementados.

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O aumento exponencial do número de processos disciplinares já tinha sido abordado em dezembro entre o Sindicato dos Trabalhadores de Impostos e o subdiretor de Recursos Humanos da Autoridade Tributária que respondeu que o tema o ultrapassava. Por esta altura, ainda não havia uma ligação clara entre os processos e os dados fiscais dos tais contribuintes VIP, embora houvesse desconfiança de que existiria uma relação com a divulgação, em outubro de 2014, de dados fiscais do primeiro-ministro, no quadro do caso Tecnoforma.

Mails de aviso

Para além dos processos disciplinares, havia ainda “centenas de mails” a circular entre os funcionários do Fisco a avisar os colegas para terem cuidado nos acessos ao sistema informático porque estariam a ser vigiados.

De acordo com o presidente do sindicato foram já instaurados 33 processos disciplinares, há outros cinco casos em averiguação e mais de 100 pessoas notificadas para serem ouvidas. O número normal de processos deste tipo era dois ou três por ano, acrescenta Paulo Ralha. O Sindicado dos Trabalhadores dos Impostos é ouvido esta quinta-feira na comissão de orçamento e finanças do Parlamento. Sexta-feira será a vez do secretário de estado dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio, e do diretor-geral demissionário, António Brigas Afonso.

Gravações revelam bolsa e pacote VIP

Para alem destes dados, o sindicato tem várias gravações das ações de formação realizadas no dia 20 de janeiro, em que o diretor dos serviços de auditoria da AT se refere à existência de uma espécie de lista de contribuintes VIP. A gravação das declarações de Vítor Lourenço, divulgada pela revista Visão, revela que de manhã, na Torre do Tombo foi usada a expressão bolsa VIP de contribuintes perante 300 inspetores estagiários. Na tarde do mesmo dia, o responsável usou a expressão pacote VIP numa audiência de 200 pessoas.

O sindicato dos impostos ainda não foi contactado para facultar esta informação no quadro da investigação pedida à Inspeção-Geral de Finanças (IGF). Paulo Ralha manifesta aliás desconfiança em relação à independência de uma auditoria da IGF, lembrando que esta entidade, que é responsável pelo controlo interno do Estado, depende também da ministra das Finanças, tal como a Autoridade Tributária. Seria preferível que a auditoria fosse realizada por uma entidade externa e independente, sob a tutela da Procuradoria-Geral da República.