Apesar da crise e das restrições financeiras, o Serviço Nacional de Saúde tem vindo a responder aos doentes com mais qualidade. A conclusão é da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) e consta do relatório “Reviews of Health Care Quality: Portugal”, elaborado a pedido do Ministério da Saúde, que será apresentado esta quarta-feira à tarde, em Lisboa. Os peritos deixam contudo críticas e recomendações ao Governo no sentido de assegurar que todos os utentes têm acesso a cuidados de saúde com qualidade.

“O sistema de saúde português tem respondido bem às pressões financeiras dos últimos anos, equilibrando com êxito as prioridades de consolidação financeira e de melhoria contínua da qualidade “, referem as conclusões do relatório.

“No geral, o sistema de saúde português parece estar a prestar cuidados de elevada qualidade a um baixo custo”, lê-se ainda no documento.

Como bons exemplos, a OCDE aponta, por exemplo, os indicadores de internamentos evitáveis hospitalares por asma, doença pulmonar obstrutiva crónica e diabetes, sublinhando que “são das mais baixas taxas da OCDE”. É ainda frisada a acentuada redução na mortalidade por doença isquémica do coração desde 1990, que atualmente é a quarta mais baixa entre os países da OCDE.

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Contudo, a OCDE lembra que a mortalidade por AVC isquémico é mais elevada do que a média da OCDE, que as infeções associadas aos cuidados de saúde parecem ser mais comuns em Portugal do que nos outros países e que também nas cesarianas Portugal é o quinto país com taxas mais elevadas. E que há ainda uma baixa prescrição de genéricos quando comparado com outros países, bem como períodos de internamento mais longos, em algumas situações. Continua ainda a ser preocupante a prescrição excessiva de antibióticos de largo espectro, lê-se no documento.

Em relação ao financiamento, o relatório considera que apesar da quebra acentuada depois de 2008, com a crise financeira global, Portugal ainda gasta uma maior percentagem do PIB em saúde (9,5%) do que a maioria dos países da OCDE. Contudo, os gastos ‘per capita’ continuam abaixo da média dos estados membros. Sobre o sistema de saúde no seu todo, a OCDE considera que “Portugal tem uma arquitetura de qualidade robusta que, ao invés de muitos países, cobre todo o sistema de saúde”.

Aliás, uma “das características mais marcantes da resposta do sistema de saúde português à crise tem sido o compromisso com a qualidade e a preservação de um sistema universal financiado publicamente”.

No rol dos elogios surge ainda menção às “reformas em torno da compra e utilização de produtos farmacêuticos e de dispositivos médicos que tem sido particularmente bem sucedida”, assim como à inovação na utilização de “fundos públicos para pagar a fornecedores”. Também o sistema de informação montado por este Governo merece um elogio dos peritos da OCDE que consideram que “Portugal tem uma impressionante quantidade de informação” sobre cuidados de saúde primários e hospitalares, bem como sobre indicadores de saúde da população.

Maior aposta nos cuidados de saúde primários e maior equidade

Uma das áreas em que a OCDE mais se debruça é na dos cuidados na comunidade, nomedamente os cuidados de saúde primários (centros de saúde).

Os peritos desta organização sublinham que “as reformas recentes nos cuidados de saúde primários têm sido bem sucedidas no aumento da qualidade, acessibilidade, eficiência e continuidade dos cuidados”, referindo-se à criação das unidades de saúde familiares.

Ainda assim, a organização recomenda uma “reflexão estratégica” nesta área, no sentido de promover o “equilíbrio” entre os tradicionais centros de saúde (unidades de cuidados de saúde personalizados) e as unidades de saúde familiar, de forma a garantir a equidade, ou seja, que “os cuidados de elevada qualidade são acessíveis a toda a população portuguesa”.

É que, neste momento, “metade da população tem acesso a cuidados de melhor qualidade do que a outra metade”.

Para corrigir esta situação, os peritos da OCDE aconselham uma de duas opções: ou Portugal fixa uma data para transformar todos os cuidados de saúde personalizados em unidades de saúde familiares ou então introduz também alguns incentivos de desempenho nas primeiras unidades, à semelhança do que acontece nas USF.

A promoção da equidade passa ainda por “conseguir uniformizar os procedimentos clínicos” e conseguir que todos os profissionais adiram às normas de orientação clínica.

A Organização defende também que Portugal deve apostar no aumento da resposta a nível comunitário para a oferta de reabilitação, cuidados pós-agudos e resposta a urgências, por exemplo, de forma a “melhorar a qualidade dos cuidados” , a libertar os hospitais e a “reduzir despesa”.

“Estima-se que 30% da atividade hospitalar poderia ser feita na comunidade e que cerca de 20 milhões de euros poderiam ser poupados todos os anos com a transferência de mais cuidados de enfermagem para fora dos hospitais”, lê-se no relatório.

Enfermeiros devem ser mais bem aproveitados

Uma palavra ainda dirigida aos recursos humanos. “Nos cuidados de saúde primários os enfermeiros aparentam ser insuficientes e subaproveitados, apesar de Portugal formar e exportar um grande número de enfermeiros todos os anos”, lê-se no relatório que aponta como eventuais principais razões os baixos salários, quando comparados com os países vizinhos, e o baixo recrutamento destes profissionais.

A questão, dizem os peritos, é que os enfermeiros “poderiam ser mais bem aproveitados em ambiente de cuidados de saúde primários, nomeadamente assumindo uma gama mais ampla de responsabilidades e tarefas”. Lembre-se que estão já a decorrer 35 experiências-piloto no âmbito do diploma que criou a figura do enfermeiro de família, nos centros de saúde.

[Artigo atualizado às 11h20 com mais informação sobre o relatório da OCDE]