O Observatório Português de Saúde acusa o Ministério de estar em “silêncio” e “negação” face aos “evidentes” efeitos negativos da crise na saúde, criticando a ausência de estudos que os monitorizem e de medidas que os minimizem.

Perante este “estado de negação”, o OPSS escolheu este ano o título “Saúde – Síndroma de negação” para o Relatório de Primavera 2014, que será hoje apresentado em Lisboa.

A crítica do Observatório Português dos Sistemas de Saúde (OPSS) é extensível às autoridades europeias com responsabilidades nesta área, que acusam de se manter em “silêncio total”, não obstante serem responsáveis por muitas das decisões que têm sido tomadas relativas à saúde.

O Observatório considera evidente que há um conjunto de dados que indiciam um impacto negativo da crise sobre a saúde das pessoas e lembra ter já chamado a atenção para este aspeto em anos anteriores.

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“O OPSS tem vindo a chamar a atenção, através dos últimos cinco Relatórios de Primavera, para a crise e para os seus impactos na área da saúde – mas mantém-se a ausência de um diagnóstico oficial rigoroso sobre o tema, a partir do qual se possam organizar respostas apropriadas”.

No relatório, o OPSS relembra que os efeitos negativos da crise sobre a saúde seriam evitáveis se se investisse nesta área, o que não só serviria para “proteger as pessoas da crise”, como poderia ter “um papel importante na recuperação económica”.

“Apesar disso, não se vislumbram sinais indiciadores de uma política intersectorial de saúde que tenha como objetivo monitorizar indicadores de impacte e acautelar ou minimizar os previsíveis efeitos da crise, nomeadamente nos grupos mais vulneráveis”, critica.

Em vez disso, “parece ser evidente um manifesto esforço” da UE e do Governo português de “negar” essa evidência, evitando a discussão e a adoção de medidas de prevenção ou de combate.

De facto, há mais de um ano – um dia após a divulgação do Relatório de Primavera 2013 – o ministro da Saúde comprometeu-se a fazer um estudo alargado sobre os efeitos da crise económica e financeira na saúde dos portugueses, o que nunca aconteceu.

Já esta semana, Paulo Macedo anunciou que a Organização Mundial de Saúde vai avaliar os efeitos da crise na saúde em Portugal.

Para o observatório, verifica-se uma “interrupção” e, até mesmo, uma “regressão” nas medidas de descentralização – a “matriz genética do SNS ao longo dos seus mais de 30 anos”.

“Nos últimos anos, tem-se verificado um conjunto de ações e medidas de política que evidenciam uma interrupção, se não uma regressão, no processo de descentralização no sistema de saúde público”, afirma, acusando o Governo de, simultaneamente, desenvolver um “processo de “desconcentração” através da devolução de alguns hospitais às Misericórdias.

Segundo o OPSS, as diversas medidas de centralização adotadas, como a lei dos compromissos, a burocratização dos processos de aquisição e contratação, ou o controlo central dos investimentos e da informação, desmotivam e desresponsabilizam as lideranças das organizações de saúde.

A curto prazo estas barreiras burocráticas e a incerteza quanto aos recursos disponíveis, impedem o planeamento estratégico, a contratualização plurianual e a sustentabilidade das organizações, considera.

O relatório vai mais longe e afirma que as estruturas regionais e locais estão transformadas em “simples correias de transmissão de decisões centralmente tomadas”, o que retira eficácia, massa crítica, experiência e capacidade de inovação, para encontrar soluções.

“Através do centralismo silencia-se um conjunto diversificado de players e por essa via esta opção representa hoje um elevado fator de risco no desempenho futuro do SNS”, acrescenta.

O grande problema disto é que “do outro lado estão pessoas em sofrimento e com um desenvolvimento cada vez mais hipotecado”.