Neste jogo da cadeira toda a gente fica de pé. Lugares sentados não faltam, mas são obras de arte. Mais concretamente: 40 cadeiras tiradas das esplanadas e transformadas em objetos de museu depois de terem sido intervencionadas por 40 artistas. O objetivo? Fazer uma “Homenagem à Cadeira Portuguesa”, na exposição que acabou de abrir ao público na Casa de Santa Maria, em Cascais, e se prolonga até ao final de janeiro.
“Mais do que mobiliário, a cadeira portuguesa é design urbano, porque carateriza o espaço das nossas cidades há várias décadas e, no fundo, é a cadeira de todos os portugueses”, diz Nuno Ladeiro, arquiteto e diretor da exposição que pretende mostrar que “a cadeira em que tropeçamos todos os dias e na qual já nem reparamos, porque é do domínio público, deve ser estudada e homenageada”.
Para fazer a homenagem, comissariada por António Roquette Ferro e organizada no âmbito do Ano do Design Português, foram convocados vários artistas, não só designers mas também pintores, arquitetos, até um escritor. Entre os que responderam positivamente ao desafio — “intervir na cadeira de forma artística e sem esquecer a identidade portuguesa” — contam-se nomes como Álvaro Siza Vieira, Leonel Moura, Sofia Areal, José de Guimarães e Jorge Silva. Há cadeiras com xailes, prontas para uma noite de fado, “cadeiras móveis”, com a imagem do elétrico amarelo, e cadeiras irreconhecíveis, como a que foi toda desmontada ou a que se multiplicou por duas e se transformou numa “conversadeira”.
Mas o que é isto da “cadeira portuguesa”?
Apesar de estar disseminada pelas esplanadas do país, na verdade conhece-se muito pouco desta peça de mobiliário. “Não se sabe quem a criou, é de design anónimo, e por isso ganhou este nome — é de todos nós”, diz Nuno Ladeiro, acrescentando: “Independentemente de ter havido um autor, sabe-se que a fábrica Adico, que ainda hoje existe, já fabricava a cadeira nos anos 30 do século XX.” Terá sido nessa altura que se viram os primeiros exemplares sobre a calçada lisboeta, quatro pernas e umas costas arredondadas num material — aço curvado — que mostra “as influências da escola alemã Bauhaus e de alguns dos pioneiros do design como Marcel Breuer, Mies van der Rohe e Mart Stam”.
Primeiro nas grandes cidades e em espaços de tertúlias como o Café Nicola e A Brasileira, a cadeira acabou por ir de férias e começou a surgir também em locais de veraneio, tal como o diretor da exposição pôde comprovar ao consultar os arquivos fotográficos da Adico, que ainda hoje a produz e exporta para o estrangeiro.
Para momentos de lazer ao ar livre, e mesmo sem entrar nas salas de aula, a cadeira portuguesa acabou por fazer escola e muito rapidamente foram surgindo versões posteriores, como a célebre Gonçalo, criada pelo metalúrgico Gonçalo Rodrigues dos Santos nos anos 50 e que é, segundo Ladeiro, “uma das muitas derivações que a cadeira portuguesa teve”.
A par das 40 obras em exposição, o arquiteto que dirige a Dimensão Nova vai mostrar também o protótipo que ele próprio desenhou e que propõe um redesign do modelo vintage, protótipo esse que irá entrar em produção no início do próximo ano e ser colocado à venda através da fábrica italiana Colico.
“Pessoalmente tenho uma certa obsessão por redesenhar objetos que acho que podem ser redesenhados”, diz o diretor da exposição, que se debruça sobre esta cadeira pela terceira vez, depois de uma estreia na Expo 98.
“Analisando a sua história, o design não é invenção. Há designers que são inventores, e há inventores que são designers, mas o design é uma constante evolução, um redesenhar permanente. É isso que tem feito, por exemplo, o Philippe Starck. Infelizmente, muitos dos nossos designers olham mais para o que está lá fora do que para o que nós temos, e esta é”, conclui Nuno Ladeiro, “uma forma de olharem para a cadeira portuguesa”.
Façam o favor de se sentar. Ou melhor, de ficar de pé, para admirar a cadeira portuguesa de frente.
O quê: Exposição “Homenagem à Cadeira Portuguesa”
Onde: Casa de Santa Maria: Praceta Farol, Cascais (21 481 5382)
Quando: 24 de outubro a 31 de janeiro de 2016. Terça a sexta das 10h00 às 17h00; sábado e domingo das 10h00 às 13h00 e das 14h00 às 17h00
Preço: 3€ (o bilhete faz parte de um pack que inclui a visita à Casa de Santa Maria e ao Farol Museu de Santa Marta). Descontos aplicáveis disponíveis aqui.