Artigo em atualização durante o dia de campanha
Coincidência das coincidências: chamava-se António Costa. António Quadras Costa. Trata-se de um agricultor de uma pequena exploração entre Beja e Évora, que esta quarta-feira decidiu marcar presença num almoço com Rui Rio e empresários, na Vidigueira. Foi ao evento a convite do líder da distrital laranja, mas fez um ponto prévio. António [Rio não ouviu bem o apelido, é pena], apresentou-se como um não-militante do PSD e, na verdade, também como um não-simpatizante. Pelo menos, não-simpatizante de Rui Rio enquanto líder do PSD.
“Não sou militante do PSD, nem sequer tenho tido uma grande empatia com o presidente do PSD, se me permite a sinceridade. Mas tenho tido grande empatia com Rui Rio candidato a primeiro-ministro de Portugal, pela impressão de autenticidade serenidade e seriedade que tem mostrado aos portugueses. É um exemplo de seriedade, que é o que faz falta aos políticos”, disse o agricultor, explicando que talvez tenha sido por esta sua recente mudança de perceção que o líder da distrital de Beja o convidou para o convívio.
Sinceridade com sinceridade se paga, e se há coisa que Rui Rio não se esquece de dizer todos os dias é que vai dizer sempre o que pensa — mesmo que isso seja politicamente incorreto. Rui Rio até percebe bem a razão de este agricultor ter essa perceção e diz que essa é a perceção que a “média” dos portugueses tem de si, devido a algumas “estratégias que tem havido para tapar, esconder” quem ele verdadeiramente é.
Mas, explicou, Rui Rio é sempre o mesmo: a tal pessoa com “seriedade” que António Costa (o agricultor) referia. “O presidente do partido é o mesmo que é candidato a primeiro-ministro, e é o mesmo que esteve 12 anos no Porto, é exatamente o mesmo, só ligeiramente mais velho, e com um bocadinho mais de experiência, mas é o mesmo. A questão é haver condições para as pessoas verem exatamente de quem se trata e não haver estratégias para tapar, esconder, de tal maneira que produz nas pessoas o sentimento que produziu em si”, disse num almoço com poucas dezenas de empresários do setor agrícola do distrito de Beja.
300 metros de rua, pouca gente, e Tancos: “É leviano envolver o Presidente da República”
“Temos de ganhar isto! Doutor Rui Rio, doutor Rui Rio?”. Uma senhora parava na Rua Capitão João Francisco de Sousa, em Beja, para cumprimentar o líder do PSD, que por ali passava, acompanhado de uma dúzia de ‘jotas’ cantantes. Mas Rui Rio preparava-se para limitar o contacto a um aceno e um sorriso. “Doutor Rui Rio?”. Perante a vontade da senhora para conversar, lá se aproximou e cumprimentou-a. “Prazer em conhecê-lo, temos de ganhar isto!”. Sorridente, Rui Rio disse que sim, agradeceu a força e seguiu.
A caravana do PSD está em Beja, terra fértil em comunistas e socialistas, e o dia começou frouxo para os sociais-democratas. Na agenda, estava marcado um “contacto com a população” às 10h, que começaria num café da cidade, mas a voltinha começou cerca de 15 minutos antes. Ao todo, da pousada onde estava hospedado à praça onde estava montado o Fórum TSF, onde Rui Rio iria participar, não foram mais do que 300 metros e duas canetas (plastic free) distribuídas. Para primeiro “contacto com a população” nesta reta final até às urnas, pouco contacto houve.
Mas Rio, que tem dito que não quer uma campanha de “gritaria”, estava disposto a falar. Primeiro aos microfones da TSF, depois aos jornalistas, à margem de uma visita à Adega Ribafreixo, na Vidigueira. Havia assuntos que precisavam de ser esclarecidos: afinal, o aviso enigmático que lançou na noite passada, a antever uma nova “encenação” de António Costa, era mesmo sobre a acusação do caso Tancos que está prestes a ser conhecida? Rui Rio diz que não. “O que eu estava a dizer é que o líder do PS já nos habituou a dar espetáculo em momentos especiais, e a dramatizar quando as coisas não lhe correm de feição, por isso o que disse foi que, mais dia menos dia, pode acontecer outra vez”, afirmou, esclarecendo que o aviso não era concretamente sobre o caso Tancos.
Um role-play, uma sala pequena (mas à pinha) e um enigmático aviso. A talk de Rio no Aliança
Garantindo não ter informações privilegiadas, o líder do PSD disse apenas que é preciso “esperar pela acusação”. Já sobre o “envolvimento” e as declarações de Marcelo Rebelo de Sousa, pede cuidado: “Temos de ter cuidado quando envolvemos o nome do Presidente da República, qualquer que ele seja”. Mais: “Eu acho que é leviano envolver o Presidente da República numa polémica destas, não o devemos fazer”, insistiu, referindo-se ao facto de Marcelo ter reagido à notícia da TVI a partir de Nova Iorque, reiterando que não foi informado sobre o alegado encobrimento na recuperação das armas de Tancos e dizendo mesmo que “é bom que fique claro que o Presidente não é criminoso”.
Portanto, o enigmático aviso da noite anterior, em plena campanha, era apenas um aviso sobre o “tique” que António Costa tem de dramatizar tudo quando as coisas não lhe correm bem. E que pode surgir a qualquer momento. “Foi o que fez com os professores, porque estávamos em pleno familygate“, disse, acusando Costa de fabricar casos mediáticos para encobrir outros que afetam o seu governo. Pode acontecer outra vez.
“Estamos a subir, tenho a certeza!”
Mas a campanha corre mal a António Costa? Rio acha que sim e que, ao mesmo tempo, corre bem ao PSD. No dia em que saiu uma sondagem da Pitagórica a encurtar a distância entre o PS (36%) e o PSD (28,5%) em 7,5 pontos percentuais, Rio, que não acredita em sondagens, não tem dúvidas de que, pelo que sente na rua, “o PSD está a subir e o PS a descer um bocado”. “Não tenho dúvidas nenhumas disso”, disse. E repetiu: “Estamos a subir! Tenho a certeza”.
Para Rio a sondagem da rua é melhor que as outras que, não tem dúvidas, muitas vezes são “encomendadas” — e “pagas” — tanto por “opositores de dentro como de fora”. “Por exemplo, antes do Conselho Nacional do golpe de Estado [quando Luís Montenegro o desafiou], apareceu uma sondagens que dava ao PSD 19%, e eu garanto-vos que o PSD nunca teve 19% dos votos, isso é tudo fabricado para desmoralizar uns partidos e moralizar outros”, disse, acrescentando que o PCP também sofre do mesmo mal. Quanto ao líder do PSD, garante não encomendar sondagens: “Não encomendo nem pago sondagens, tenho até ao dia 6 para fazer o melhor que posso e sei”.
Os “hipócritas” e o “desplante” de Centeno
As críticas aos críticos, contudo, não se ficaram pela insinuação de sondagens encomendadas. Rui Rio garante todos os dias que não se vai render ao politicamente correto e que vai dizer sempre o que pensa. Vai daí, teve de dizer o que lhe ia na alma, depois de Marques Mendes ter aparecido ontem a fazer campanha ao lado da cabeça de lista do PSD por Leiria: “As pessoas que durante um ano e tal procuraram destruir a minha liderança e a direção nacional e que agora aparecem a fazer campanha são hipócritas. É hipocrisia”, disse, recusando apontar nomes. “É uma questão de postura na política”, disse, admitindo que o politicamente correto seria dizer que o partido estava unido e pacificado. Quando não está.
Mas havia ainda mais um contra-ataque na manga: dirigido a Mário Centeno. Questionado no Fórum TSF sobre o ataque da noite passada do ministro das Finanças, no comício socialista, Rui Rio disse que não aceitava lições de rigor financeiro de Mário Centeno e acusou o ministro das Finanças de “desplante” quando disse que a direita pretende “gastar” o esforço dos portugueses com “mais uma temporada da série do choque fiscal”.
Para Rio, “é quase anedótico” o ministro das Finanças socialista dar-lhe lições de rigor. “O dr. Mário Centeno chegou à política há muito pouco tempo. Pelos vistos não observou o que se passou nos últimos 20 ou 30 anos em Portugal. Vir explicar-me a mim o que é pôr as contas certas e arrumar as finanças — se tem o desplante de o dizer a mim — não sabe o que está a dizer. Não tem noção. Ensinar-me o que é rigor financeiro?”, atirou.
É o ataque e o contra-ataque que Rui Rio quer evitar, numa campanha que pretende que seja diferente das outras e mais focada no esclarecimento dos eleitores. Há dias, contudo, em que é difícil resistir.