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José Fernandes

José Fernandes

A noite em que Rangel e Pinto Luz deram o tiro de partida para o pós-autárquicas

Ao lado de Pinto Luz, Paulo Rangel deu mais um sinal de que vai estar na luta pela liderança do PSD e saiu com o rótulo de "vencedor de eleições". O tabu, esse, é para manter até às autárquicas.

O evento era aguardado com grande expectativa e há muito comentado nos bastidores sociais-democratas. Paulo Rangel e Miguel Pinto Luz, mais do que previsíveis aliados na disputa interna que se avizinha no PSD, iam estar juntos no jantar-comício de apoio a Marco Pina, candidato social-democrata à Câmara de Odivelas. Os dois chegaram separados à Quinta do Bretão, com largos minutos de diferença entre eles, mas com um discurso perfeitamente alinhado: o futuro da liderança do PSD não era tema para ali chamado.

Primeiro, foi Pinto Luz. “Estou aqui no jantar de encerramento de candidatura de um amigo. Sou presidente da comissão de honra de Marco Pina e é com enorme satisfação que estou aqui em Odivelas, nada mais tenho a acrescentar.”

Depois, Paulo Rangel. “Autárquicas, autárquicas, autárquicas. Nada mais“, cortou o eurodeputado, que se permitiu ainda a duas referências irónicas a Rui Rio. “Estou a apoiar os candidatos do PSD, seguindo, aliás, o apelo do doutor Rui Rio, que quer que todos nos envolvamos a fundo na campanha autárquica. É isso que eu vim aqui fazer. Sou um militante disciplinado.”

Contexto: na véspera do arranque oficial de campanha, com o tema da pré-candidatura de Rangel a ferver, a comissão permanente do PSD, núcleo duro de Rui Rio, enviou uma nota a todos os militantes onde exigia “lealdade e gratidão“. “Não é a altura para conjeturas, nem para debates internos sobre o futuro do PSD”, avisou a direção de Rio.

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Mas se era subtileza que Rangel e Pinto Luz esperavam — se é que a esperavam de facto — não foi subtileza que tiveram. Coube a Marco Pina apontar para o enorme paquiderme na sala.

“Paulo Rangel é uma das personalidades que ajudará a reerguer o centro-direita em Portugal. O nosso eurodeputado, que sabe o que é vencer eleições, estamos tão gastos, tão fartos de quem não vença”. Destinatário óbvio: Rui Rio.

Não que seja exatamente verdade: nas três vezes que foi a votos, europeias de 2009, 2014 e 2019, Rangel ganhou a primeira vez e perdeu as duas últimas. Mas com consequências e circunstâncias muito diferentes: em 2009, ajudou a penalizar José Sócrates; em 2014, mesmo perdendo, precipitou a crise interna no PS e o duelo entre António Costa e António José Seguro; e em 2019 deu a Rui Rio o pretexto perfeito para insistir na tese (que usaria também para justificar a queda de Assunção Cristas) de que uma oposição mais contundente é receita para o insucesso.

José Fernandes

Dois anos depois dessas europeias, nem todos os militantes sociais-democratas parecem concordar com Rui Rio, a começar por Marco Pina. Em alguns setores do partido, começa a nascer a convicção de que Rangel pode ser o homem certo para suceder a Rui Rio, ainda que continuem a existir muitas variáveis em jogo, como a vontade de Rio, o empenho de Luís Montenegro ou a capacidade de mobilização de Jorge Moreira da Silva.

A onda mediática (estiveram mais jornalistas esta quarta-feira, em Odivelas, do que em quase todas as ações de campanha de Carlos Moedas, em Lisboa) está criada e a política também: ainda que o partido esteja em plena campanha autárquica, a contagem de espingardas segue a todo a vapor nas estruturas do PSD, na comitiva que acompanha Rio, nos apoiantes de Rangel, nos fiéis de Montenegro e na boca de todos que, de uma forma ou de outra, ou são alguém ou querem ser alguém no PSD.

Daí a importância de Miguel Pinto Luz. A 9 de setembro, o Observador explicava porquê: com tudo pronto para avançar, Rangel parecia ter descoberto um dos fatores que faltava na equação: como conquistar os votos de Lisboa, uma das quatro grandes estruturas do PSD onde verdadeiramente se decidem as eleições internas.

Rangel ganha força no aparelho para tentar derrubar Rio

Nas últimas diretas, Miguel Pinto Luz, vice-presidente de Cascais, foi a jogo e conseguiu impor-se a Rui Rio e Luís Montenegro nos distritos de Lisboa e Setúbal. O resultado não permitiu passar à segunda volta, mas, numa corrida altamente bipolarizada, os expressivos 10% (12% se os votos da Madeira tivessem sido contabilizados) foram a prova de vitalidade de Pinto Luz no aparelho social-democrata.

Logo, pondo-se fora da corrida e apoiando ativamente Paulo Rangel, Miguel Pinto Luz pode ser decisivo para aumentar as hipóteses de vitória na disputa interna. O que a 9 de setembro era uma hipótese muito provável, hoje é um facto praticamente indesmentível: Rangel e Pinto Luz vão lutar juntos pela liderança do PSD.

E este foi apenas o primeiro ato desse caminho a dois, precisamente no dia em que Rui Rio e Francisco Rodrigues dos Santos se juntaram a Carlos Moedas num almoço em Lisboa. Mesmo recusando qualquer tipo de leitura política — aos jornalistas, Rangel chegou a fazê-lo de forma veemente — o sinal está dado para quem o quiser interpretar. E sem grandes arrependimentos.

“Sabemos que existiram leituras, especulações, teorias sobre o estarmos aqui juntos esta noite. Interessa-me pouco”, diria durante o discurso Miguel Pinto Luz. “Estamos hoje onde temos estado durante toda esta campanha, junto dos que dão a cara em candidaturas autárquicas por esse país fora, ao lado do nosso partido, a apoiar os nossos candidatos.”

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À boleia de Odivelas e da candidatura de Marco Pina, os dois, de resto, aproveitaram para ensaiar o discurso de oposição a António Costa. Pinto Luz definiu o tom: “O concelho de Odivelas é um paradigma da governação socialista: não avança, está estagnada, na Área Metropolitana de Lisboa está na cauda do pelotão.”

Rangel fechou a loja. “Dá-se aqui uma infeliz coincidência de que a incompetência da governação central socialista estar há muito tempo radicada na Câmara Municipal de Odivelas. Se querem ver o que será o destino do país com a governação de Costa e as suas promessas de bazuca é olhar para Odivelas e para o que foi o seu progresso nos últimos 20 anos.”

Estava cumprida esta parte do calendário. Os próximos dias e os resultados das eleições definirão o resto: quando, como, com quem e contra quem avançarão Rangel e Pinto Luz para a disputa pela liderança do PSD.

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