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O pai de Pete Buttigrieg era maltês, daí o apelido, que tanto ruído tem criado, também nos Estados Unidos
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O pai de Pete Buttigrieg era maltês, daí o apelido, que tanto ruído tem criado, também nos Estados Unidos

Getty Images

O pai de Pete Buttigrieg era maltês, daí o apelido, que tanto ruído tem criado, também nos Estados Unidos

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Butt... quê? Saiba quem é e o que defende o homem que vai à frente na corrida para defrontar Trump (e já agora como se diz o seu nome)

Há quatro anos Obama falou nele, mas poucos o conheciam. Apesar de ainda se contarem votos no Iowa, Pete Buttigieg, ex-mayor gay de "nome impronunciável", começa a ser favorito à nomeação democrata.

Mayor Pete. O apelido maltês que herdou do pai é tão difícil de dizer que, para simplificar e não causar ruído, Peter Paul Montgomery Buttigieg, 38 anos, prefere que lhe chamem simplesmente assim, Mayor Pete, numa reminiscência ao cargo que ocupou durante dois mandatos, até ao primeiro dia de 2020, à frente dos destinos da pequena e pouco próspera cidade de South Bend, no Indiana — em pleno “Cinturão da Ferrugem”, outrora eldorado da indústria automóvel.

Não que lhe sirva de muito. Apesar de ter montado toda a sua campanha em torno do mote “Pete for America”, as perguntas, as confusões e as piadas são inevitáveis — basta dizer que, num questionário recente, só um terço dos leitores do New York Times que conseguiram identificá-lo souberam escrever o seu apelido de forma correta, sendo que os que erraram foram capazes de o fazer nada menos do que de 167 formas diferentes.

“Ele está a fazer um trabalho podre a gerir a sua própria cidade, um péssimo trabalho. Mas dizem que o Boot-edge-edge está dois pontos acima do Presidente Trump no estado do Texas. Eu digo: "Acho que não”. Eu acho que não. Não, eu não me preocupo muito com isso”
Donald Trump

Por isso mesmo, assim que percebeu que não ia conseguir vencê-los, para arrumar o assunto e passar às questões que verdadeiramente interessam, Pete Buttigieg resolveu juntar-se-lhes e fez com que no material de campanha constassem t-shirts e cartazes com auxiliares fonéticos: “Boot Edge Edge”, parece que é assim que se diz. Nas redes sociais, o marido, Chasten, oito anos mais novo e professor do segundo ciclo numa escola montessoriana, acrescentou outras três opções e deu a lição por terminada — também pode dizer-se Buddha-judge, Boot-a-judge ou Boo-tuh-judge. É escolher e passar à frente.

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Donald Trump, que poderá ter de disputar com ele as presidenciais de novembro, já lhe chamou tudo, acertada, errada e jocosamente (com uma referência à sua baixa estatura pelo meio): “É um nome impronunciável, por isso é eles lhe chamam… Mayor Pete. Mayor Pete… Mayor Pete, dá-me por aqui”. E apesar de fazer questão de garantir que não está minimamente preocupado com o possível contendor — “Ele está a fazer um trabalho podre a gerir a sua própria cidade, um péssimo trabalho. Mas dizem que o Boot-edge-edge está dois pontos acima do Presidente Trump no estado do Texas. Eu digo: ‘Acho que não’. Eu acho que não. Não, eu não me preocupo muito com isso” —, os ataques que já começou a desferir contra o democrata de South Bend subentendem o contrário.

Como da vez em que, ao telefone com o site Politico, o tentou aniquilar através da comparação com a criança-mascote que durante décadas deu a cara pela revista satírica MAD (e que inegavelmente tem alguns traços em comum com o democrata). “O Alfred E. Neuman não pode ser presidente dos Estados Unidos”, limitou-se Donald Trump, mordaz, a dizer. Pete Buttigieg, que se apresenta como o único candidato “canhoto maltês-americano-episcopaliano-gay-millenial-veterano de guerra” na corrida à Casa Branca, não se ficou e respondeu ao presidente, septuagenário, na mesma moeda: “Alfred E. Neuman. Tive de ir googlar… deve ser uma coisa geracional”.

Se o arranque no cáucaso do Iowa servir de diapasão para a eleição dos restantes delegados do partido e Buttigieg, que não tendo ganho sequer já fez o seu discurso de vitória, conseguir a mais do que improvável nomeação do partido para as eleições de 3 de novembro deste ano, uma coisa será certa: a animação nos debates, entre estas duas Américas em polos diametralmente opostos, estará mais do que garantida.

Pete Buttigrieg e o marido, Chasten, na festa de segunda-feira à noite, depois do caucus do Iowa

Getty Images

De consultor na McKinsey à corrida à presidência

Nascido a 19 de janeiro de 1982, filho único de dois professores, ele imigrante maltês, ela “hoosier” de gema (que é como nos Estados Unidos se chamam aos nascidos e criados no Indiana), Pete Buttigieg saiu de South Bend, uma das muitas cidades do midwest americano castigadas pela falência da indústria automóvel, para estudar e para cumprir o serviço militar. Em Oxford fez Filosofia e Política, em Harvard História e Literatura, e na Marinha foi oficial de inteligência.

Quando passou à reserva, em vez de voltar logo para a cidade natal, onde hoje vive, com o marido, justamente no bairro onde cresceu, Buttigieg trabalhou como consultor, entre 2007 e 2010, para a gigante mundial McKinsey & Company — um percurso que tem sido usado como arma de arremesso pelos seus detratores, tanto republicanos como democratas.

“Aquilo que as pessoas fazem com o seu tempo e talento é uma demonstração dos seus valores. E o Pete, por todo o seu historial, é objetivamente um homem inteligente e com um grande talento que, quando acabou os seus estudos, resolveu ir trabalhar para a McKinsey. E isso diz alguma coisa. É uma decisão mercenária que não demonstra nenhuma prioridade pessoal que não a progressão na carreira”, disse em dezembro ao Guardian Nate Levin-Aspenson, cofundador da secção de South Bend do Indivisible, o movimento liberal nascido em 2019 nos Estados Unidos como resposta à eleição de Donald Trump.

“Voltei da comissão e percebi que só se vive uma vez, e não estava interessado em continuar a não saber como seria estar apaixonado durante muito mais tempo. Por isso, assumi-me”
Pete Buttigieg

Neto de um coronel do Exército e de uma professora de piano, Pete Buttigieg aprendeu a tocar antes dos 4 anos e fala não apenas francês mas também maltês, norueguês, italiano, árabe, espanhol, língua gestual e persa, que terá aprendido durante as comissões que fez no Afeganistão — a última, em 2014, numa altura em que até já respondia como “Mayor Pete”, mas em que ainda não tinha admitido a homossexualidade, isso só aconteceria depois de muita luta interior e após o regresso a casa.

“Voltei da comissão e percebi que só se vive uma vez, e não estava interessado em continuar a não saber como seria estar apaixonado durante muito mais tempo. Por isso, assumi-me”, contou recentemente, já como primeiro candidato declaradamente gay à presidência dos EUA.

Tenente da Marinha, Buttigieg estava na reserva desde 2009 e à frente dos destinos da cidade, de 100 mil habitantes, desde 2011, mas em 2014 resolveu pedir uma licença sem vencimento e durante 7 meses serviu no Afeganistão, numa unidade de contraterrorismo onde, outras coisas, “tentou impedir que o dinheiro do narcotráfico chegasse aos insurgentes”, revelou depois de ser recebido em peso e festa no regresso a South Bend.

Donald Trump comparou Pete Buttigieg ao personagem-cara da revista MAD. O democrata diz que teve de ir googlar para saber quem era

MediaNews Group via Getty Images

Em entrevistas recentes tem puxado por essa experiência, que considera imprescindível para o cargo de presidente dos Estados Unidos — e que o atual, bem como os mais recentes antecessores, não tem. “Tenho mais experiência militar do que qualquer um que tenha entrado naquele gabinete desde George H. W. Bush”, é uma das variações da frase, que tem repetido nos últimos meses.

O problema com o eleitorado afro-americano e os apoios de bilionários

O que Buttigieg não tem — e isso, sim, pode ser um grande problema — é o apoio da comunidade afro-americana. O New York Times fez as contas ao número de atuais ou antigos oficiais eleitos negros ou hispânicos entre os apoiantes dos principais candidatos à nomeação democrata. E o resultado para Mayor Pete foi… SUV. O antigo vice-presidente Joe Biden tem 154, os senadors Kamala Harris, Bernie Sanders, Cory Brooker e Elizabeth Warren têm, respetivamente, tem 93, 91, 50 e 43, e Pete Buttigieg tem seis. Que é como quem diz, cabem todos no mesmo SUV (piada do diário com sede na 8ª Avenida).

A partir daqui, a coisa piora: uma sondagem recente deu-lhe zero por cento das intenções de voto dos democratas negros da Carolina do Sul — sendo que nas últimas décadas nenhum democrata logrou a nomeação sem cativar a base negra do partido, que tem precisamente na Carolina do Sul o seu bloco mais relevante.

“Ele tem de ir às comunidades e às zonas rurais, para que as pessoas saibam quem ele é. Isso significa que tem de viajar para o sul, de passar mais tempo por lá e de conhecer alguns líderes afro-americanos que o apoiem e lhe possam abrir portas”, disse ao jornal Sly James, ex-mayor de Kansas City, apoiante de Buttigieg desde setembro, como que a garantir que ainda há muito jogo para jogar. Mas só fora, porque em casa, em South Bend, é muito pouco provável que a equipa Mayor Pete consiga recuperar.

“Aquilo que as pessoas fazem com o seu tempo e talento é uma demonstração dos seus valores. E o Pete, por todo o seu historial, é objetivamente um homem inteligente e com um grande talento que, quando acabou os seus estudos, resolveu ir trabalhar para a McKinsey. E isso diz alguma coisa. É uma decisão mercenária que não demonstra nenhuma prioridade pessoal que não a progressão na carreira” 
Nate Levin-Aspenson, co-fundador da seção de South Bend do movimento Indivisible

Numa cidade em que cerca de 40% da população é negra ou de origem hispânica, as forças policiais são 90% brancas — e apesar de durante a campanha ter prometido equilibrar os rácios, a verdade é que pouco mudou na polícia de South Bend, frequentemente acusada de racismo, nos últimos nove anos. E o que mudou foi para pior, em junho passado, com a morte de Eric Logan, um homem negro, de 54 anos, atingido a tiro por Ryan O’Neill, um sargento, branco, da polícia local.

O’Neill estaria sozinho, a investigar uma série de roubos de automóveis, quando se deparou com Logan, pai e avô. Na versão do agente, contestada pela família da vítima, que instaurou um processo contra o departamento de polícia e a câmara municipal, Logan tê-lo-á ameaçado com uma faca, pelo que não terá tido outra opção senão a de disparar a arma de serviço. Apesar de o agente ter uma câmara de filmar incorporada na farda, as imagens nunca foram divulgadas e o caso acabou com um pedido de demissão de Ryan O’Neill — nitidamente insuficiente para reabilitar a imagem de Buttigieg entre grande parte do seu próprio eleitorado.

Considerado um moderado, sobretudo na comparação com candidatos mais à esquerda como Elizabeth Warren ou Bernie Sanders, Mayor Pete, liberal nos costumes, tem sido repetidamente comparado a Barack Obama  — e chegou a ser mencionado pelo próprio, numa entrevista à revista New Yorker, em 2016, como um dos potenciais candidatos à nomeação democrata no então longínquo 2020.

Nessa altura, Pete Buttigieg era descrito como “um gay com uma Bolsa Rhodes e veterano da Marinha duas vezes eleito mayor de South Bend, no Indiana”. Agora, que começa a assumir-se como um possível candidato à nomeação do partido (apesar de a votação ainda não estar fechada e de as estatísticas não passarem disso mesmo —desde 2000 que os democratas que se candidatam pela primeira vez e vencem no Iowa ganham a nomeação), é cada vez mais descrito como o favorito dos muito ricos — que é como quem diz, o candidato que mais dinheiro tem amealhado em contribuições para a campanha.

De acordo com a Forbes, foram 40 os multimilionários e respetivas mulheres que já fizeram doações ao candidato democrata, que em setembro já tinha atingido a fasquia dos 52 milhões de dólares angariados.

Gwyneth Paltrow organizou uma recolha de fundos para a campanha de Buttigrieg. Em 2014 fez o mesmo para Barack Obama

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Entre os seus beneméritos estarão Wendy Schmidt, a mulher de Eric Schmidt, ex-CEO da Google; Reed Hastings, CEO da Netflix; Jo Carole Lauder, mulher do presidente da Estée Lauder; e David Geffen. E também antigos apoiantes de Donald Trump, como Jennifer Pritzker, herdeira do império hoteleiro Hyatt, e Daryl Roth, mulher do investidor imobiliário e sócio do atual presidente, Steven Roth.

No capítulo celebridades, Mayor Pete também não está mal posicionado, com nomes maiores como os de Robert De Niro, Sharon Stone, Alan Cumming, Kevin Costner, Tom Ford, Ana Wintour, Ellen DeGeneres, Seth MacFarlane e Gwyneth Paltrow, que chegou a organizar uma recolha de fundos para a campanha na sua própria casa — como aliás fez para Barack Obama em 2014, apressaram-se a notar alguns jornais e revistas.

Se a História se repetir e, como Obama, ganhar a nomeação democrata, primeiro, e as eleições de 3 de novembro, depois, Buttigieg fará ele próprio duplamente História como primeiro presidente assumidamente gay dos Estados Unidos da América — e o mais novo no cargo. Com 38 anos acabados de completar, leva grande vantagem para Theodore Roosevelt, atual detentor do recorde, que tomou posse em setembro de 1901 a um mês e meio de chegar aos 43. Para compensar, Donald Trump foi o mais velho: tinha 70 anos e 220 dias quando se tornou o 45º presidente americano.

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