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@ Jose Xavier

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Cientista polar português conta histórias antárticas

Na Antártida, os sons e os cheiros são extremos. Ou tudo ou nada. Mas o continente gelado tem encantos que o cientista polar José Xavier não quer deixar de partilhar.

Sempre foi fascinado pelo mar. Escolher biologia marinha foi apenas um passo natural para continuar a fazer aquilo de que mais gostava. A paixão de quem trabalha com tanto prazer como se o trabalho fosse um momento de lazer levaram-no longe, muito longe, até à Antártida. José Xavier realizou a maior expedição antártica alguma vez feita por um português e escreveu para o contar. Mas não foi a primeira nem a última vez que viajou até ao continente gelado.

Quando chegou ao instituto British Antarctic Survey, em Cambridge, no Reino Unido, acreditava que uma semana lhe bastaria para ver o que quer que fosse. “É mesmo preciso ir mais de duas semanas para a Antártida? Depois de um dia ou dois não estará já tudo visto?”, perguntava no livro “Experiência antárctica – relatos de um cientista polar português”, da editora Gradiva. Mas, passado um ano, quando lhe perguntaram se queria ir, a resposta já tinha mudado: “Sim. O máximo de tempo possível”. É um cientista empenhado, participa em vários grupos de trabalho, viaja pelo mundo em reuniões, mas não deixa de fazer uma das coisas que considera mais importante: contar às pessoas o que é ser um cientista polar.

“Num dia sem vento, se o mar não estiver agitado, não se ouve nada. Mas numa colónia de 60 mil pinguins mal consegues falar com o colega ao teu lado.”
José Xavier, biólogo marinho

Assume-se um apaixonado pela ciência, em particular pela ciência polar, e deixa-se deslumbrar com os momentos únicos no continente gelado. A Antártida é um continente de extremos. “Num dia sem vento, se o mar não estiver agitado, não se ouve nada. Mas numa colónia de 60 mil pinguins mal consegues falar com o colega ao teu lado”, conta o investigador que, na Antártida, estuda aqueles animais, assim como albatrozes e focas. Em relação aos cheiros, também se notam os extremos. “O mar não tem cheiro como aqui em Portugal, mas os albatrozes cheiram bem e os pinguins também quando saem da água.” Já uma colónia de pinguins cheia de dejetos ao sol tem um cheiro intenso, tal como os lobos-marinhos que passam várias semanas sem ir ao mar para guardarem o harém.

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“Ser cientista é como outra profissão qualquer, só é preciso ser dedicado”, diz ao Observador José Xavier. “É preciso desmontar o monstro de que a ciência é muito complicada.” E é com este objetivo que vai às escolas, que fala com o público e que apresenta o livro que conta como é estar na Antártida nove meses seguidos. Também pretende incentivar os jovens a lutar pelos sonhos que têm. “Não espero que todos queiram ser biólogos marinhos, mas quero que todos ‘deem o litro’ na escola para poderem ser os melhores profissionais possível”, diz o biólogo, acrescentando que todos nós, em especial os jovens, precisamos de pontos de referência em várias áreas. E, como amante do desporto, aponta os exemplos lutadores do futebolista Cristiano Ronaldo ou do surfista Tiago Pires.

Desde muito cedo, na Universidade do Algarve, José Xavier percebeu que queria ser cientista. “No segundo ano, percebi que só as aulas não chegavam, era tudo muito passivo e eu queria mesmo ser cientista. Por isso, desde muito cedo comecei a integrar projetos científicos e a ajudar estudantes de mestrado.” Mantendo a curiosidade que tinha desde criança e trabalhando muito, chegou a Cambridge onde fez estágio com Paul Rodhouse, investigador no British Antarctic Survey. Um ano depois, rumava ao continente gelado.

“Não espero que todos queiram ser biólogos marinhos, mas quero que todos ‘deem o litro’ na escola para poderem ser os melhores profissionais possível.”
José Xavier, biólogo marinho

A trabalhar em ciência polar desde 1997, José Xavier sempre considerou que a divulgação do trabalho de cientista era muito importante. Desde 2005, quando se constituiu o Comité Português para o Ano Polar Internacional (2007-2008) que tem levado os cientistas a comunicar a ciência que desenvolvem. “Ir às escolas é a melhor maneira de aprender a comunicar, porque é preciso adaptar a linguagem”, diz José Xavier. Os programas Propolar – Programa Polar Português – e Latitude 60º! foram um contributo importante para a divulgação da investigação. O objetivo é o de mostrar que Portugal, apesar de ter uma história recente na ciência polar, tem feito boa investigação e tem cientistas conhecidos internacionalmente: a equipa da Universidade de Coimbra que trabalha tanto no Ártico como na Antártida com recursos marinhos e alterações climáticas, a equipa de Universidade do Algarve que estuda como as alterações climáticas estão a afetar as populações de peixes ou a equipa da Universidade de Évora que estuda a atmosfera sobre a Antártida.

O biólogo fala com um entusiasmo difícil de conter das experiências que tem desenvolvido na Antártida, mas relembra que é um trabalho exigente e requer muita dedicação. “E tens de estar psicologicamente preparado, porque vais passar vários meses isolado com as mesmas pessoas.” Por um lado, é preciso selecionar elementos que consigam lidar com a pressão e que não criem conflitos. Por outro, é preciso estar muito bem preparado em termos de segurança e primeiros socorros. “O hospital mais próximo é a mil quilómetros”, lembra José Xavier, referindo que, se for preciso, também têm de fazer de dentistas. “Tudo isto nos torna pessoas melhores, com melhores conceitos de segurança e de como te hás-de comportar com as outras pessoas.”

Fazer uma campanha na Antártida muda a forma como se encara a vida e aprende-se a ser mais condescendente, diz o biólogo. Além de fazerem investigação durante todo o tempo que conseguem, também têm outras tarefas como limpar a base uma vez por semana, limpar os geradores, ir buscar água ou cozinhar de quatro em quatro dias. “Agora já não fico em pânico quando tenho de preparar o jantar para os amigos”, conta entre gargalhadas. Mas também se desaprendem certas coisas como lembrar que se tem de levar a chave quando se sai de casa. “Na Antártida não precisas de chave para nada, nem cartões, nem telemóvel, nem relógio. Mas quando voltas tens de estar super-concentrado para não te esqueceres de nada e rezares para não te esqueceres da chave dentro de casa.” E tem de se habituar a ver mais do que quatro caras por dia. O que vale é que quando José Xavier volta de uma expedição “todas as pessoas parecem ‘muita’ giras”.

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Preparar um projeto de investigação para desenvolver na Antártida pode demorar dois ou três anos. Tudo é planeado ao pormenor para rentabilizar ao máximo o tempo, porque a investigação no extremo sul do planeta é muito cara. José Xavier estima que, por cada pessoa que esteja na base, sejam gastos cerca de 120 euros por dia ou cerca de 128 mil euros para pagar o navio. Além de estabelecer os objetivos específicos da campanha e de preparar os investigadores sobre as principais normas de segurança é preciso garantir que se encontram em boa forma física para aguentarem as caminhas longas e as condições atmosféricas adversas.

Trabalha-se todos os dias desde as oito da manhã, porque “a ciência não pode parar”, mas o trabalho é sempre feito com prazer. De cada caminhada, numa ilha que José Xavier partilhava com quatro pessoas e com 700 mil animais, era possível trazer uma história nova. Uma vez viu uma ave com apenas cinco ou dez quilogramas, um petrel-gigante, a “gritar” contra um elefante-marinho de quatro toneladas, conseguindo fazê-lo sair do caminho. O biólogo tentou fazer o mesmo com um lobo-marinho de duzentos quilos, mas não teve tanta sorte e teve de fazer um desvio no caminho para chegar ao destino. E, quando o trabalho científico está bem avançado, é possível tirar umas horas para se dedicarem à fotografia ou ao vídeo.

As equipas do Instituto do Mar da Universidade de Coimbra e do British Antarctic Survey, às quais José Xavier pertence, têm tentado perceber como é que as espécies se estão a adaptar às alterações climáticas – o que está a acontecer às algas e aos peixes e aos animais que deles se alimentam. No estudo que desenvolve com albatrozes-viajeiros verificou que estes animais têm tido mais dificuldade em encontrar alimento e que possuem um dos mais altos níveis de mercúrio (um poluente) entre os níveis conhecidos para os restantes vertebrados. Os vários trabalhos que desenvolvem com as cadeias alimentares vão permitir propor novas medidas de conservação e gestão do ecossistema marinho antártico.

Para ouvir José Xavier falar com entusiasmo da experiência antártica ou ficar a conhecer algumas das mais belas imagens da ilha, pode aproveitar esta quinta-feira, dia 6, às 19h00 na Livraria Bertrand do Dolce Vita, em Coimbra.

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