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Os pedidos de documentação feitos pelos deputados à comissão parlamentar de inquérito à TAP já estão a seguir para os destinatários, que têm 10 dias para responder. E só o grupo TAP — muitos pedidos são dirigidos à TAP SA e à TAP SGPS — vai ser chamado a enviar mais de 100 documentos e pedidos de informação no quadro do inquérito à gestão da transportadora e à tutela política da mesma. Incluindo todas as comunicações trocadas entre os principais intervenientes.
De acordo com os pedidos apresentados pelos partidos — e consultados pelo Observador — , e que foram todos aprovados na comissão de inquérito esta quarta-feira, são solicitados contratos de trabalho e financeiros, pareceres jurídicos e financeiros, procedimentos de contratação de empresas e pessoas, consultorias e listas de prémios e indemnizações pagas a a ex-administradores e quadros que saíram da empresa, para além dos que envolvem a saída antecipada de Alexandra Reis, bem como bónus previstos para o futuro (como o atribuído à atual presidente executiva).
Mais de 20 diretores e chefias saíram da TAP nos últimos dois anos. Quem saiu e para onde foi?
Da longa lista que rumou ao grupo TAP constam ainda todas comunicações e notas trocadas entre os gestores da empresa, advogados, os membros do Governo que tutelam a TAP, o que inclui as comunicações eletrónicas, como emails, mas não só. O PSD acrescenta “qualquer que tenha sido o formato”, o que pode abrir a porta a SMS e whatsApp (até porque foi noticiado que foi através desta rede social que Pedro Nuno Santos deu o seu O.K. aos 500 mil euros pagos de indemnização a Alexandra Reis).
São também requisitadas atas de reuniões, relatórios financeiros, listagens de funcionários com direito a automóvel e outras regalias, para além de dados relacionados com o plano de reestruturação. A começar pelo próprio plano integral sem as truncagens com que foi divulgado em 2021 — e que é pedido pela generalidade dos partidos — e por dados sobre a sua execução, como os cortes salariais e as negociações de saídas da empresa. Há igualmente pedidos que remetem para a anunciada privatização da TAP, nomeadamente no que toca à contratação da consultora Evercore.
Para além da TAP, terão de dar resposta o Governo (ministérios das Finanças e Infraestruturas), organismos como a Inspeção-Geral de Finanças, Autoridade Tributária e Segurança Social, empresas públicas como a NAV e Parpública, mas também a Comissão Europeia. E ainda pessoas singulares, com destaque para Alexandra Reis.
PS, PCP e Bloco recuam ao negócio de Neeleman com a frota da Airbus na privatização
Há solicitações que recuam a um período que, à primeira vista, parece estar fora do objeto da comissão de inquérito criada na sequência do caso da indemnização paga a Alexandra Reis. Em causa estão as solicitações apresentadas por Bloco de Esquerda, PCP e PS relacionados com o processo de recapitalização privada da TAP realizada pelo acionista David Neeleman, na sequência da privatização conduzida pelo Governo do PSD/CDS em 2015 e com recurso a fundos da própria transportadora, que resultaram da renegociação da frota encomendada à Airbus.
O caso já era conhecido, tendo inclusive sido objeto de uma queixa ao Ministério Público feita pelo Ministério das Infraestruturas, na sequência da auditoria pedida à administração da TAP. Nas últimas semanas, o jornal Eco revelou um conjunto de documentos sobre essa operação, incluindo a auditoria entregue pela administração de Christine Ourmiàres-Widener ao ex-ministro Pedro Nuno Santos.
TAP: Negócio com Airbus mostra que operação em 2015 “não foi bem uma privatização”, diz Galamba
Estas revelações já levaram os socialistas, numa iniciativa paralela ao inquérito parlamentar, a chamar ao Parlamento (à comissão de Economia e Obras Públicas) antigos responsáveis políticos do PSD — o ex-ministro Pires de Lima e o ex-secretário de Estado Sérgio Monteiro, bem como o secretários de Estado do Tesouro e Infraestruturas que fecharam a venda da TAP no segundo Governo de Passos Coelho (que foi praticamente a única decisão que tomou durou o mês que durou até cair no Parlamento), Miguel Pinto Luz e Isabel Castelo Branco, e o ex-presidente da Parpública, Pedro Pinto.
O objeto da comissão proposto pelo Bloco de Esquerda, e viabilizado com a abstenção do PS, visa “avaliar o exercício da tutela política da gestão da TAP, em particular no período entre 2020 e 2022, sob controlo público, nomeadamente”: e são elencados sete pontos relacionados com o caso de Alexandra Reis, como as remunerações, bónus e compensações pagas a gestores, mas também centrados na informação trocada com o acionista e o envolvimento dos decisores públicos nas decisões da empresa e eventuais danos que possam ter lesado o interesse público.
Mas há duas expressões na formulação deste objeto que abrem a porta a um escrutínio com maior cobertura temporal — porque ao apontarem na direção dos pontos acima referidos, não excluem de forma expressa outros temas: “em particular” e o “nomeadamente”. No entanto, só quando forem votados os pedidos de audição é que poderá ser ponderado o raio de ação temporal e temático da comissão de inquérito e a sua compatibilidade com um prazo exigente de três meses, que o presidente da comissão, Jorge Seguro Sanches, já deu nota de querer cumprir.
Até agora, apenas o PCP assume que quer alargar o âmbito da comissão de inquérito para abranger o processo de privatização de 2015, fundamentando novamente esse pedido com “os escândalos relativos à compra de aviões e às remunerações dos administradores privados”.
Este alargamento permitiria escrutinar a recapitalização privada de David Neeleman, mas também a gestão liderada por Antonoaldo Neves e as condições que levaram os governos socialistas a negociar uma reversão parcial da venda de 2015, para retomar 50% do capital. Por outro lado, não incluiria a gestão que ficou privada, a compra já em pandemia da posição do empresário americano por 55 milhões de euros e que retomou o controlo público da TAP, bem como a opção do Governo de enquadrar a ajuda pública à TAP no regime de resgate e reestruturação, que obrigou a uma longa negociação com a Comissão Europeia.
PCP quer alargar âmbito e pede impostos e contribuições pagas… pela Ryanair
Neste pressuposto, há pedidos de documentos por parte dos comunistas que remetem para temas mais paralelos ao objeto atual da comissão de inquérito e que envolvem até outras empresas, neste caso a Ryanair, a empresa low-cost que lutou em Bruxelas e na opinião pública contra as ajudas públicas à TAP. O PCP pede à Autoridade Tributária e à Segurança Social dados sobre as receitas fiscais e tributárias das empresas do grupo TAP e da Ryanair dos últimos dez anos, bem como apoios concedidos pelo Turismo de Portugal às duas empresas.
Mesmo sem pedir o alargamento do objeto, alguns dos pedidos dos partidos parecem ir mais longe do que o estabelecido para objeto da comissão. Para além das questões relacionadas com a troca de modelos de aviões — A350 por A330 — negociada por David Neeleman com a Airbus, há pedidos sobre entradas, saídas e indemnizações pagas a administradores e acionistas por períodos que vão até 10 anos (PCP e Bloco) ou desde 2019, ainda em gestão privada (PSD e IL), e sobre a privatização feita em 2015 (Bloco de Esquerda).
PSD e Chega lideram pedidos. Chega pergunta tudo sobre tripulantes
Os partidos com maior número de solicitações são o PSD — 42 — e o Chega e o Bloco de Esquerda — 35. Os sociais-democratas e o Bloco de Esquerda são exaustivos nos pedidos de entrega de comunicações relacionadas com todos os envolvidos no caso Alexandra Reis. As comunicações solicitadas incluem os escritórios de advogados — a SRS Advogados e a Morais Leitão, Galvão Teles — um pedido que também é apresentado pelos socialistas.
O PSD acrescenta um nome que tem ficado fora do radar — o secretário de Estado das Finanças, João Nuno Mendes, que estava no Governo quando a saída foi negociada, mas sem a tutela da TAP. O PSD quer ainda conhecer todas as despesas de deslocação em trabalho comparticipadas pela empresa e os custos previstos com a intenção de mudar a sede para o Parque das Nações.
Não há pedidos especificamente relacionados com o ministro das Finanças, Fernando Medina, mas o objeto do inquérito cobre explicitamente a decisão de nomear Alexandra Reis para a presidência da NAV (Navegação Aérea) tomada por Pedro Nuno Santos e Fernando Medina em junho do ano passado. Apenas o Chega pede o contrato celebrado entre a NAV e a gestora que foi presidente da NAV até novembro, quando foi convidada pelo ministro das Finanças para secretária de Estado do Tesouro, cargo da qual se demitiu após terem sido confirmadas as condições da sua saída antecipada da TAP.
O Chega é o partido que mais pedidos de informação faz sobre a gestão operacional da TAP após a reestruturação. São pedidos especialmente detalhados no que toca aos tripulantes de cabine, incluindo baixas, assistências à família, burnouts, horas voadas, despedimentos e reintegrações, processos disciplinares, cortes salariais e poupanças geradas, entre outros. Esta categoria profissional realizou uma greve em dezembro e chegou a ter marcada uma greve de sete dias em janeiro que foi cancelada após negociações. O Chega pede também os contratos de todos os diretores contratados externamente fora de Portugal, destacando o caso de Karolina Machura Tiba (diretora que foi contratada à polaca Lot para chefiar o pessoal de cabine), e as indemnizações pagas por voos cancelados, também requeridas pelos social-democratas.
Bloco e IL de olho na anunciada privatização
O Bloco de Esquerda inclui na sua lista todos os relatórios de acompanhamento semestral da execução do plano de reestruturação, bem como apresentações e documentos de apoio às reuniões do steering committee do transformation office, um comité interno que avalia as políticas de transformação da empresa e as propostas para leasing automóvel feitas em 2021 para a renovação da frota.
Entre os pedidos do BE estão os documentos relativos à preparação da anunciada privatização da TAP, incluindo a contratação do assessor, mas também a lista de empresas convidadas, propostas já recebidas e respetiva análise. A privatização é igualmente foco das solicitações da Iniciativa Liberal que pede documentos que levaram à escolha da Evercore, bem como o mandato dado a esta consultora. O partido solicita contratos de leasing de aviões e contratos de financiamento bancário superiores a 20 milhões de euros, cartas de conforto e garantias públicas, bem como side letters a esses contratos e todos os custos financeiros a ele associados, para além de estudos de natureza estratégica feitos desde 2019.
A IL pede ainda a troca de correspondência entre o Governo e a Comissão Europeia, a DG Comp, a propósito da negociação e acompanhamento do plano de reestruturação. No que respeita à intervenção no dossiê TAP, destaque ainda para os pedidos de audição que o PCP tem preparados para a vice-presidente de Margrethe Vestager (responsável pela concorrência) e Violeta Bulc, comissária europeia dos Transportes.
O PCP sinalizou já uma lista de 21 personalidades que pretende ouvir e cujo elenco reflete o pedido de alargamento do objeto desta comissão de inquérito e que abrange os antigos acionistas privados David Neeleman e Humberto Pedrosa (que saiu em 2021), os ex-ministro e secretário de Estado do PSD/CDS, Pires de Lima e Sérgio Monteiro, o antecessor de Pedro Nuno Santos, Pedro Marques, José Luís Arnault, presidente da ANA e antigo dirigente e ministro do PSD e o ex-presidente da ANAC, para além de vários dirigentes dos sindicatos da TAP e gestores e ex-gestores como Miguel Frasquilho.
O Chega divulgou uma lista de 10 nomes onde, para além dos ex-ministros e ex-secretários de Estado, gestores da TAP e o atual ministro das Finanças, inclui um ex-presidente da NAV e os presidentes da Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) e dos sindicatos dos pilotos e dos tripulantes.