Como acha que vão evoluir as finanças da sua família ao longo de 2019? Irão melhorar muito? Melhorar pouco? Ou receia que irão piorar (ou piorar muito)? Outra questão: acredita que vai conseguir colocar mais dinheiro de lado ou está convencido de que será muito difícil poupar mais? E na economia nacional, apostaria que os próximos 12 meses serão de aceleração da retoma ou considera mais provável que a conjuntura possa piorar? Estas são algumas das perguntas a que, a julgar pelo último inquérito do INE, cada vez mais gente tem vindo a dar respostas menos animadoras. Com o Banco de Portugal a prever uma desaceleração nas exportações, qual é o risco de a economia gelar se o consumo arrefecer?
As perguntas que são feitas no inquérito do INE
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Em sua opinião, a situação financeira do seu lar (agregado familiar), nos próximos 12 meses irá: 1. Melhorar muito; 2. Melhorar um pouco; 3. Manter-se; 4. Piorar um pouco; 5. Piorar muito; 6. Não sabe.
Em sua opinião, a situação económica geral do País, nos próximos 12 meses irá: 1. Melhorar muito; 2. Melhorar um pouco; 3. Manter-se; 4. Piorar um pouco; 5. Piorar muito; 6. Não sabe.
Em sua opinião, nos próximos 12 meses, o desemprego no País, irá: 1. Aumentar muito; 2. Aumentar um pouco; 3. Ficar na mesma; 4. Diminuir pouco; 5. Diminuir muito; 6. Não sabe.
Nos próximos 12 meses pensa que, pessoalmente lhe será possível poupar/pôr algum dinheiro de lado: 1. Sim, de certeza absoluta; 2. Provavelmente sim; 3. Provavelmente não; 4. Não, de certeza absoluta; 5. Não sabe.
O indicador de confiança dos consumidores baixou nos últimos dois meses de 2018, novembro e dezembro, retomando o movimento descendente que se iniciou em junho. O índice do Instituto Nacional de Estatística (INE) tinha tocado novos máximos históricos no mês anterior — maio — mas a contração que se regista desde então, de forma quase ininterrupta, sinaliza que podemos estar perante um ponto de inflexão na tendência de otimismo por parte dos consumidores.
Os -2,2 pontos de dezembro seguiram-se aos -1,8 pontos de novembro, ou seja, o indicador foi ainda mais negativo e afastou-se um pouco mais dos 3,3 pontos (positivos) que se registavam em maio. Ainda assim, o indicador está, ainda, em níveis bem melhores do que os registos na ordem dos -50 pontos que se viveram no pico da crise financeira — e o cenário não é, também, tão negativo como a estagnação (próxima dos -5 pontos) que se registou entre o final de 2015 e o verão de 2016, que coincidiu com o período pós-eleições em que os mercados voltaram, por alguns longos meses, a olhar com desconfiança para Portugal.
Este é um indicador que se caracteriza por alguma volatilidade (daí se utilizarem, essencialmente, médias móveis de três meses) e é construído de uma forma muito especial. Em qualquer análise sobre este dado, há que fazer uma ressalva metodológica importante: o indicador de confiança do consumidor não é indicativo de níveis absolutos de bem-estar mas, sim, de uma apreciação qualitativa face à tendência de determinada situação. Isto significa que não se pode dizer que as pessoas estão a ver a economia, no geral, pior do que viam em maio (em economês, o stock) mas, sim, que em maio era mais predominante a opinião de que as coisas iriam melhorar face à situação que existia naquela altura (o fluxo, ou seja, a variação).
Sendo um indicador que vale, sobretudo, pelas pistas que pode dar sobre a perceção das famílias — que pode ou não, depois, ter reflexo prático no que realmente acaba por acontecer — “o comportamento do indicador de confiança do consumidor aponta para uma ligeira moderação do ritmo de crescimento do consumo privado em 2019“, concorda Paula Carvalho, economista-chefe do BPI, que lidera o Departamento de Estudos Económicos e Financeiros do banco. Uma das razões que, para a economista, podem estar na base desta perda de otimismo está relacionada com “os ainda elevados níveis de endividamento das famílias“, que apesar de não se preverem aumentos súbitos já começam a interiorizar que as taxas de juro que têm permitido poupar muitos euros nas prestações dos créditos não irão durar para sempre.
Paula Carvalho acrescenta que muitas pessoas também já estarão a interiorizar a “necessidade de reposição num contexto global (económico, financeiro e político) mais incerto“, pelo que essa pode ser uma das razões que terão levado os inquiridos a moderar o otimismo nos últimos meses. Para já, os dados não parecem suportar a ideia de que a poupança já estará a ser uma prioridade, mas o cenário pode mudar ao longo de 2019, ano em que além da reposição de rendimentos na Função Pública e nas pensões de reforma haverá um aumento do salário mínimo e o cálculo dos reembolsos de IRS (para privado e público) poderá ser, em muitos casos, mais favorável do que nos anos anteriores (pela forma como o Governo desenhou o alívio fiscal de 2018 e 2019).
Poupança “claramente abaixo da média europeia” preocupa
Cada uma das quatro perguntas produz um sub-indicador que permite ter uma ideia sobre onde é que o otimismo se está a desvanecer mais rapidamente. Se, no mês de maio, a rubrica sobre a situação familiar nos 12 meses seguintes estava no 4,8 pontos, em dezembro tinha caído para 3,9 pontos. Uma quebra bem maior, porém, está identificada na opinião dos consumidores sobre a situação económica no país nos próximos 12 meses: se nos primeiros meses do ano o índice oscilou perto de uns impressionantes 10 pontos — indicando que estava bem enraizada a opinião de que a retoma iria acelerar nos 12 meses seguintes –, agora esse indicador não passa dos 1,5 pontos, ainda positivo mas longe dos valores mais elevados.
Onde os inquiridos parecem ver menos espaço para mais melhorias é na taxa de desemprego. O Banco de Portugal estimou no mês passado que a taxa de desemprego tenha fechado 2018 nos 7% (média anual), depois dos 8,9% de 2017, e antecipou que a taxa de desemprego irá baixar para 5,3% em 2021, o que seriam os valores mais baixos vistos em Portugal desde 2002. Mas o inquérito do INE indica que é cada vez menos predominante a ideia de que irá haver descidas significativas da taxa de desemprego daqui para a frente, depois da melhoria registada nos últimos anos.
O indicador sobre a capacidade de poupança é que continua tão desolador quanto tem sido desde a criação da moeda única, há 20 anos. Quando se pergunta às pessoas se “Pessoalmente, acha que lhe será possível colocar algum dinheiro de lado?”, a ponderação das respostas leva a um indicador (negativo) de -19,5 pontos, não muito longe da média histórica de -27 pontos (um pouco mais negativa devido à perceção de incapacidade de poupar ainda mais gravosa que marcou os anos do programa de ajustamento económico e financeiro.
Não parece, portanto, haver uma grande perceção de que possa inverter-se a tendência que tem vindo a preocupar o governador do Banco de Portugal. Numa audição parlamentar em meados de dezembro, Carlos Costa mostrou-se preocupado com a baixa taxa de poupança dos particulares, que voltou a descer no primeiro semestre deste ano e continuou abaixo da média europeia. A taxa de poupança diminuiu de 3,9% no primeiro semestre de 2017 para 3,3% no primeiro semestre deste ano, segundo dados do banco central. “A persistência de baixas taxas de poupança intensifica a vulnerabilidade” que o governador identifica na economia portuguesa, já que a taxa de poupança dos particulares se situa “claramente abaixo da média” da área euro, comentou o responsável.
Não é fácil adivinhar a tendência para o consumo privado, mas Paula Carvalho está confiante de que, apesar da “moderação” do otimismo, “o consumo das famílias deve continuar a subir de forma robusta, dada a evolução favorável esperada para o mercado de trabalho e para o enquadramento financeiro”, pelo que, na opinião da economista-chefe do BPI, não será por esta razão que a economia portuguesa irá “gelar”. A economista admite um crescimento acima de 2% no consumo das famílias em 2019, o que ficaria em linha com os 1,9% que estão previstos no Orçamento do Estado para 2019 (onde o próprio Governo já reconhece uma desaceleração do consumo face aos 2,3% de 2017 e aos 2,4% de 2016).
Os dados do INE mostram, por exemplo, que as pessoas parecem ter ganho, nos últimos meses, menores perspetivas de virem a realizar “compras importantes” nos próximos 12 meses.
A expectativa do Governo é que, com o consumo público também menor do que no ano passado (um aumento de 0,2%, contra o crescimento de 1% de 2018), seja o investimento a suportar a economia em 2019, acelerando para um crescimento de 7% (contra os 5,2% de 2018). O problema é que, a julgar pelo indicador de confiança na área das empresas, também não são muito animadores os dados sobre a confiança dos empresários — na indústria transformadora o indicador está negativo há três meses e nos serviços a tendência do índice, ainda que positivo, tem sido desfavorável nos últimos cinco meses.
O Banco de Portugal, que divulgou em dezembro mais um boletim económico (semestral) também continua a prever uma aceleração do consumo privado de 2% em 2019, mas está mais pessimista do que o Governo sobre o grau de abrandamento das exportações, que devem aumentar apenas 3,7% (o Orçamento do Estado confia em 4,6% para 2019, depois de um 2018 também mais positivo do que prevê o Banco de Portugal). É, sobretudo, por essa desaceleração das exportações que o Banco de Portugal está menos otimista do que o Governo na previsão de crescimento para 2019 — 1,8% versus 2,2% previstos no último Orçamento feito por Mário Centeno.
Banco de Portugal corta previsões. Vêm aí quatro anos de desaceleração na economia