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As portagens das pontes sobre o Tejo são atualizadas pela inflação homóloga até setembro do ano anterior. Para a Brisa, outubro é o mês de referência
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As portagens das pontes sobre o Tejo são atualizadas pela inflação homóloga até setembro do ano anterior. Para a Brisa, outubro é o mês de referência

MARIO CRUZ/LUSA

As portagens das pontes sobre o Tejo são atualizadas pela inflação homóloga até setembro do ano anterior. Para a Brisa, outubro é o mês de referência

MARIO CRUZ/LUSA

Das portagens às pensões e prestações sociais. Os aumentos que a inflação mais alta em 30 anos pode trazer em 2023

A maior inflação em 30 anos pode gerar uma cadeia de aumentos em 2023. Não são apenas alguns preços que sobem. Pensões e prestações sociais também seguem a inflação. Se o Governo nada fizer.

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A inflação vai continuar a marcar vários preços no próximo ano, mesmo que a escalada abrande nos próximos meses. O índice de preço ao consumidor atingiu os 9,1% em julho, face ao mesmo mês de 2021,  o registo mais alto em quase 30 anos (desde novembro de 1992) destacou o Instituto Nacional de Estatísticas (INE) numa estimativa rápida que será validada a 10 de agosto.

A inflação homóloga e a inflação média nos últimos 12 meses — que em julho terá ficado nos 4,7% — servem de referencial para calcular a atualização anual de vários preços como os das portagens e rendas, mas também de um conjunto alargado de prestações sociais, desde as pensões até aos abonos e subsídios que são calculados com base no IAS (indexante de apoios sociais). A evolução anual destes dois tipos de prestações sociais é o resultado da combinação de dois indicadores que vão ter este ano a maior subida verificada nas últimas décadas (desde o início do milénio): a inflação média dos últimos 12 meses e o crescimento médio da economia dos últimos dois anos.

Esta colagem entre a inflação, por um lado, e os preços dos produtos e as prestações sociais, por outro lado, está consagrada em diplomas legais e em contratos comerciais. Há também situações em que a regra da atualização à taxa da inflação está prevista, mas nem sempre é aplicada por decisão política, como aconteceu com o IAS durante seis anos, entre 2010 e 2016.

Aconteceu também este ano com o preço dos transportes públicos e com as propinas. Estas ficaram congeladas por uma alteração proposta pelo PS ao Orçamento do Estado para 2022. Já as pensões de alimento subiram 1,3% este ano, uma atualização automática aplicada em janeiro que reflete a taxa média de inflação apurada pelo INE em 2021.

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Ainda que exista um relativo automatismo nestas atualizações, em que a inflação média ou homóloga mensal determinam a evolução de preços e rendimentos no próximo ano, há margem de manobra para o Governo atuar no sentido de travar aumentos que se antecipam gravosos na atual conjuntura de inflação alta, seja através de iniciativas legislativas, seja negociando com os operadores privados que cobram os serviços.

António Costa já disse que estava a preparar mais medidas anti-inflação. Presume-se que o novo pacote que o comentador Marques Mendes descreveu como “robusto” se centre nos impactos que estão já a ser sentidos pelas famílias pelos sucessivos aumentos — dos bens alimentares, aos transportes e energia —, havendo já alertas e apelos para a tomada de medidas que travem o efeito da inflação mais alta em 3o anos no próximo ano.

Concessionárias de autoestradas disponíveis para negociar alívio nas portagens

No caso das concessionárias das autoestradas foi já colocada em público a disponibilidade para negociar contratos de forma a acomodar um aumento menos agressivo do que o previsto contratualmente.

A concessão principal da Brisa termina em 2035

O presidente da Brisa, António Pires de Lima, alertou para o impacto que a aceleração da inflação na atualização das portagens em 2023. No caso da Brisa, a principal concessionária das autoestradas em Portugal, a conta aos aumentos é feita com base na inflação homóloga registada em outubro (sem habitação), com os valores da atualização arredondados para cinco cêntimos. Em julho este indicador chegou aos 9,1%.

Em entrevista ao Jornal de Negócios, Pires de Lima, passou a bola para o Estado, mas mostrou a disponibilidade para renegociar uma solução que passasse por prolongar o prazo da concessão.

Pires de Lima. “Se o Estado não fizer nada, o aumento [das portagens] será o que corresponde à inflação”

Esse foi um padrão seguido no passado em outras decisões políticas relacionadas com portagens que reduziram as receitas contratualmente previstas ou de investimentos adicionais em troços não remunerados. A concessão principal da Brisa termina no final de 2035.

O tema não se esgota na Brisa e o Observador sabe que outras concessionárias estão disponíveis para uma eventual negociação que suavize os aumentos das portagens que podem ter um efeito em cadeia nos custos das empresas, dada o peso do transporte rodoviário em Portugal. No caso da Lusoponte que explora as travessias do Tejo a conta à subida das portagens fecha mais cedo, em setembro, tendo também por base a inflação homóloga sem habitação. Também a rede de autoestradas cuja receita é da Infraestruturas de Portugal, que inclui as concessões das ex-Scut e as mais recentes lançadas no Governo de José Sócrates, segue a regra da inflação.

Ainda assim, fontes contactadas pelo Observador no setor consideram que é cedo para colocar o problema. Depois de conhecidas as taxas de inflação de setembro e outubro, as empresas fazem a proposta de atualização ao Estado que tem ainda algum tempo para se pronunciar. Mas se não for tomada qualquer iniciativa por parte do concedente — o Estado — as portagens sobem mesmo. O Observador questionou os ministérios das Infraestruturas e das Finanças sobre esta possibilidade, mas não obteve respostas.

Rendas. Travão geral ou apoios dirigidos a famílias carenciadas

A iniciativa política poderá também ser necessária para evitar um aumento acentuado das rendas no próximo ano. Na semana passada entrou no Parlamento um projeto-lei do Bloco de Esquerda com uma norma travão que limita a atualização das rendas em 2023 à inflação registada em 2021, saltando o atual ano. Os contratos de arrendamento após 1990 seguem a atualização anual pela inflação. O regime legal prevê que essa atualização seja feita em função do coeficiente que é calculado pelo Instituto Nacional de Estatísticas e que reflete a variação média do índice de preços ao consumidor nos últimos 12 meses até final de agosto e sem a componente de habitação.

A concessão principal da Brisa termina em 2035

Esse índice poderá chegar aos 5%, admite o Bloco na proposta legislativa na qual alerta para a situação insustentável que este aumento pode gerar para muitas famílias para quem este é o maior encargo. O partido propõe que seja excecionalmente aplicado o coeficiente de 1,0043 definido para este ano. Apesar de esta atualização ser quase automática na renovação dos contratos anuais, as associações de proprietários ouvidas pelo jornal Eco defendem que os senhorios não deverão aplicar aumentos tão expressivos como os permitidos pela lei. Por exemplo, uma renda de 600 euros subiria 30 euros por mês, enquanto numa renda de 1000 euros, o aumento seria de 50 euros mensal caso em agosto a inflação média anual esteja nos 5%.

Renda mediana de novos contratos de arrendamento sobe 6,4% no 1.º trimestre

O Observador questionou o Ministério das Infraestruturas sobre a adoção de medidas para travar a escalada das rendas, mas não obteve resposta. O deputado do PS, Carlos Pereira, admitiu ao Jornal de Negócios, que o partido do Governo deverá dirigir apoios nesta matéria às famílias carenciadas. Ao Observador o deputado confirma que essa é a orientação geral das medidas que têm sido adotadas para combater os efeitos da inflação no poder de compra e considerou que um travão generalizado na atualização das rendas poderia ter efeitos negativos no estímulo à oferta de mais casas no mercado de arrendamento. Carlos Pereira remeteu contudo para o pacote anti-inflação que o Executivo irá apresentar em setembro.

Transportes públicos. A inflação está prevista, mas este ano não foi aplicada

Nos transportes, o índice de preços ao consumidor também entra na fórmula que determina a evolução da TAT (taxa de atualização tarifária). Esta taxa é calculada anualmente pela Autoridade Metropolitana dos Transportes, mas a sua aplicação pode variar de contrato a contrato e depende da decisão da entidade metropolitana ou regional de transportes. Este ano, a TAT determinou um aumento de 0,57%, mas esta atualização não foi transferida para o custo do passe intermodal nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto.

Operadores de transportes têm pedido a revisão extraordinária das tarifas

MARIO CRUZ/LUSA

Segundo explicou ao Observador o presidente da ANTRAL (Associação Nacional dos Transportes Rodoviários em Automóveis Ligeiros), Luís Cabaço Martins, as autoridades de transportes compensaram os operadores pela diferença. A TAT, nos termos da portaria que define a sua atualização, irá certamente resultar num aumento muito mais substancial em 2023, mas a decisão de o aplicar está nas mãos das autoridades regionais ou metropolitanas.

Ou seja, a atualização prevista na lei acaba por não ser obrigatória. O dirigente da associação defende que o atual quadro legal deve ser alterado para evitar o conflito de interesses que atualmente está associado a esta decisão. Se decidirem aumentar os preços, as autoridades têm de suportar o ónus dessa decisão perante os cidadãos que foram também os eleitores que votaram nas autárquicas da qual saíram os responsáveis por estas entidades. Se congelarem os preços, terão de suportar o custo dessa decisão, compensando os operadores.

O regime tarifário dos transportes públicos também prevê aumentos extraordinários, mas já não colados à inflação, no caso de se registarem agravamentos de custos com o combustível e mão de obra. Este ano, os operadores já pediram várias vezes essa atualização excecional, mas até agora, e segundo o responsável da ANTRAL, apenas a autoridade do Algarve autorizou uma revisão parcial das tarifas.

Prestações sociais e pensões podem ter maior subida em décadas em 2023

Não é só do lado dos preços que a inflação é o indicador mais importante para atualizações. Também acontece nos rendimentos e prestações. No indexante de apoio social (IAS) a atualização foi interrompida durante um longo período de sete anos, entre 2010 e 2016, que correspondeu a um ciclo de crise económica e de inflações relativamente baixas, mas esse congelamento foi uma decisão política aprovada nos vários orçamentos do Estado em três governos — o segundo de Sócrates, o de Passos Coelho e o primeiro ano de António Costa como primeiro-ministro. A variação do IAS voltou a ficar a zeros em 2021, por efeito da pandemia no crescimento económico e na inflação.

Inflação serve de referência à atualização de pensões e várias prestações sociais

Manuel Almeida/LUSA

De acordo com a lei de bases da Segurança Social, o IAS é atualizado em resultado de dois fatores: o índice de variação média dos preços ao consumidor (sem habitação) dos últimos 12 meses disponível em dezembro, acrescido de 20% do crescimento real do PIB tendo como referência o crescimento médio dos últimos dois anos com um limite mínimo de 0,5%. Desde 2007, o maior aumento do IAS aconteceu em 2009 por força da inflação. A percentagem de 2,9% foi também aplicada ao aumento dos salários da função pública, uma das decisões mais polémicas do segundo governo de José Sócrates dadas as dificuldades financeiras que o Estado já atravessava e que levaram ao resgate em 2011. Em 2021, o IAS foi atualizado em 1,3% para 443,2 euros.

Este indexante influencia os valores a pagar num conjunto vasto de prestações: subsídio de doença, prestações por morte, despesas de funeral, a atribuição do abono de família, na atribuição de bolsas de estudo e no direito à isenção das taxas moderadoras no SNS. E passou a determinar desde 2021, o valor mínimo do subsídio de desemprego. O IAS tem ainda influência nas deduções para o IRS, nas contribuições para a Segurança Social, nas várias prestações atribuídas pela Segurança Social, na atribuição de bolsas de estudo, e até nas taxas moderadoras do Serviço Nacional de Saúde.

António Costa já sinalizou que em 2023 haverá um “grande aumento de pensões”. Não por opção política, mas como consequência da aplicação da lei de atualização das mesmas, como fez questão de sublinhar o Presidente da República. Marcelo Rebelo de Sousa lembrou igualmente que este aumento será excecional. Ou seja não se irá repetir em 2023.

Aumento “histórico” das pensões? Marcelo lembra que advém da lei e acredita que será excecional

Por lei a atualização das pensões resulta da conjugação entre a inflação (variação média dos últimos 12 meses do índice de preços ao consumidor sem habitação, disponível em novembro do ano anterior) e o crescimento do produto interno bruto. O cálculo da atualização considera a taxa de crescimento média dos últimos dois anos, se for superior a 3%, como será — em 2021 a economia cresceu 4,9% face ao pior ano da pandemia e este ano as projeções mais otimistas apontam para um crescimento superior a 6%. Para as pensões menores ou iguais a dois IAS (886,4 euros este ano), o aumento será o valor da inflação mais 20% do crescimento do PIB (e mais 12,5% no caso das pensões entre dois e seis IAS, 2.659,2 euros). Nas pensões maiores, será igual à taxa de inflação.

Aumento de pensões e salários obrigam a atualizar escalões IRS em 2023

Ao contrário do que sucede com o IAS e as pensões, não existe um diploma legal que determine o cálculo das atualizações salariais no Estado nem que vincule a sua obrigação. Os aumentos dos salários da Função Pública resultam da decisão política e dos processos de negociação com sindicatos representativos desses trabalhadores. Este ano, o Governo determinou uma atualização de 0,9% já prevista aquando da proposta orçamental apresentada em outubro de 2021 e que foi chumbada, e que não foi revista no Orçamento aprovado em abril, apesar de serem já evidentes sinais de aceleração de preços acima desse patamar.

Comboios parados na Estação de Santa Apolónia durante a greve de trabalhadores da Infraestruturas de Portugal, em Lisboa, 2 de julho de 2021. Os trabalhadores exigem aumento de salários, o cumprimento integral do clausulado do Acordo Coletivo de Trabalho, a negociação coletiva, a atualização do valor do subsídio de refeição e a integração do abono de irregularidade de horário no conceito de retribuição. MÁRIO CRUZ/LUSA

Trabalhadores do Estado e das empresas públicas têm feito várias greves a exigir aumentos salariais

MÁRIO CRUZ/LUSA

Em 2021, a então ministra da Administração Pública, Alexandra Leitão, justificou o número dos 0,9% com a inflação média anual dos últimos 12 meses, calculada a 30 de novembro, mas “subtraindo da inflação de 12 meses — 0,1% de deflação — que se verificou em 2020″. A inflação média dos 12 meses que terminam em julho está, segundo a nota rápida do INE, nos 4,7%.

Esta situação — que tem gerado uma onda de greves nos serviços e empresas públicas — irá ser revista para 2023, mas a dimensão da proposta de atualização salarial só deverá ser conhecida no quadro da preparação do Orçamento do Estado para esse ano.

E quando os salários sobem, tal como as pensões, por causa da inflação, há outra variante que tem de ser ajustada, para neutralizar o impacto fiscal dessas valorizações: os escalões do IRS. Se essa correção não for feita, como explica o fiscalista Luís Leon, haverá um agravamento fiscal sobre os rendimentos de trabalhadores e pensionistas, na medida em que maiores fatias do rendimento serão apanhadas por taxas de IRS mais elevadas, dada a natureza progressiva deste imposto.

Os escalões do IRS que este ano não foram ajustados à inflação, tendo o Governo argumentado com a alteração feita aos limites dos escalões que passou pelo desdobramento de dois escalões e que beneficiou todos os contribuintes até esse patamar. A exceção foi o mínimo de existência, que determina o rendimento que está isento de IRS, que foi atualizado em linha com a subida do salário mínimo.

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