894kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

Defesa de Vítor Escária diz que houve "leviandade" do MP, mas não explica origem dos 75 mil euros em notas descobertos em São Bento

Ex-chefe de gabinete do primeiro-ministro diz que medidas de coação aplicadas na Operação Influencer são nulas e que o processo deveria estar a ser investigado apenas no Supremo Tribunal de Justiça.

É o contra-ataque de Vítor Escária. O ex-chefe de gabinete do primeiro-ministro diz que os pressupostos legais do crime de tráfico de influências que lhe é imputado não foram cumpridos por falta de indícios sobre o momento e a forma de consumação do crime — e acrescenta que nem sequer está demonstrada a entrega por Diogo Lacerda Machado de qualquer vantagem para si.

“Não é minimamente credível ou crível, desde logo ao nível da experiência comum e do sentido da vida, que Vítor Escária se dispusesse a cometer crimes, a bem de um projeto, contentando-se altruisticamente com a compensação monetária dada a um terceiro”, lê-se no recurso que será decidido pela Relação de Lisboa e ao qual o Observador teve acesso.

Lacerda Machado diz que nunca invocou o nome do “seu amigo António Costa” nem falou com o primeiro-ministro sobre o data center

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Contudo, nem uma palavra é dita sobre os cerca de 75 mil euros que as buscas lideradas pelo procurador Rosário Teixeira descobriram em caixas de vinho e em livros espalhados pelo gabinete de Escária na residência oficial do primeiro-ministro.

A defesa, liderada pelo advogado Tiago Rodrigues Bastos, considera ainda nulas as medidas de coação impostas ao seu cliente (proibição de viajar para o estrangeiro e entrega de passaporte) pelo Tribunal Central de Instrução Criminal por entender que o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) é o único tribunal competente.

A investigação visa Costa e isso faz com que existam implicações para todos os arguidos

O argumento da defesa de Vitor Escária para afirmar que apenas o STJ pode decidir sobre os inquéritos da Operação Influencer é simples de explicar. Como o inquérito visa vários suspeitos, sendo um deles o primeiro-ministro António Costa, só este facto “comporta implicações para todos” os arguidos.

“É por demais evidente que a investigação visava também o primeiro-ministro”, lê-se no recurso, sendo “indiferente” que António Costa “tenha sido ou não constituído arguido, ponto é que seja incontornavelmente visado num procedimento criminal”, enfatiza a defesa de Vitor Escária.

"É por demais evidente que a investigação visava também o primeiro-ministro", lê-se no recurso, sendo "indiferente" que António Costa "tenha sido ou não constituído arguido, ponto é que seja incontornavelmente visado num procedimento criminal", enfatiza a defesa de Vitor Escária. Assim sendo, o foro especial de que o primeiro-ministro beneficia, deve ser estendido a todos os arguidos, diz a defesa.

Assim sendo, consideram os advogados Tiago Rodrigues Bastos e Filipa Elias, o foro especial de que o primeiro-ministro beneficia tem de ser estendido a todos. Logo, os autos têm de ser tramitados pelo STJ, conclui a defesa.

Ora, o que aconteceu é que o Tribunal Central de Instrução Criminal “praticou atos jurisdicionais”, como o interrogatório dos arguidos e a decisão sobre as medidas de coação, que seriam alegadamente competência do Supremo.

A defesa invoca o artigo 27 do Código de Processo Penal, que dispõe que no caso de processos conexos serem competência de tribunais de diferente hierarquia, “é competente para todos o tribunal de hierarquia ou espécie mais elevada”.

Erros justificam controle político do MP?

Daí que a defesa de Vítor Escária assegure que o despacho de medidas de coação padece de nulidade por via da incompetência do Tribunal Central de Instrução Criminal para decidir o caso.

A “leviandade do MP” e os pressupostos do crime de tráfico de influência

O crime de tráfico de influência tem vários pressupostos legais, sendo que um deles é a solicitação ou aceitação por parte de quem pode influenciar de uma vantagem patrimonial ou não patrimonial — independentemente de a mesma ser para si ou para terceiro. Outro requisito tem a ver com a consumação do crime, que aconteceu com essa solicitação ou aceitação, sendo indiferente se a influência é real ou se foi efetivamente executada.

Ora, a defesa de Vitor Escária faz questão de dizer no seu recurso que o Ministério Público não localiza o momento e a forma de consumação do crime, incorrendo o juiz de instrução Nuno Dias Costa no mesmo alegado erro.

Operação Influencer. Como o MP investiga o “plano criminoso” que envolve António Costa através do senhor “0,5%”

Isto é, a defesa diz que o MP apenas terá apresentado uma prova indiciária de que Vítor Escária terá “aceitado as solicitações de Diogo Lacerda Machado para abusar da sua influência junto de decisores públicos”: a famosa reunião de 22 de dezembro de 2022. Trata-se de uma reunião que, segundo o despacho de indiciação, teria ocorrido na sede nacional do PS mas que, afinal, ocorreu no gabinete de Escária na residência oficial do primeiro-ministro.

A defesa de Escária não deixa de assinalar o erro do local da reunião — apelidando o mesmo como uma “leviandade” ou “a vontade de se apimentar a ‘estória'”, lê-se no texto do recurso.

Certo é que o local onde a reunião veio a ocorrer, a residência oficial de primeiro-ministro, é apresentada pela defesa de Vitor Escária como a correta porque era em São Bento que Escária “desempenhava as suas tarefas institucionais, como foi receber os promotores do projeto de Start Campus.”

Trata-se de uma reunião que, segundo o despacho de indiciação, teria ocorrido na sede nacional do PS mas que, afinal, ocorreu no gabinete de Escária na residência oficial do primeiro-ministro. A defesa de Escária não deixa de assinalar o erro do local da reunião — apelidando o mesmo como uma "leviandade" ou "a vontade de se apimentar a 'estória'", lê-se no texto do recurso.

A defesa explica que a “reunião mostra-se compreendida no quadro funcional do chefe de gabinete do primeiro-ministro”. “Nessa qualidade, Vítor Escária recebeu os promotores do projeto Start Campus, como recebeu outros com relevância para o país”, explicam os seus advogados.

Seja como for, a defesa “não vê como é que se pode considerar indiciado o pacto corruptivo com base numa reunião, desde logo pela simples circunstância de ter ocorrido, mas também porque nela foram abordadas as preocupações dos promotores, tendo Escária, alegadamente, prestado o seu apoio ao projeto”.

Defesa não vê indícios da entrega de qualquer vantagem a Vítor Escária

O mesmo diz a defesa sobre uma alegada influência de Escária junto de Nuno Banza, presidente do Instituto Nacional de Conservação da Natureza com vista à emissão de um parecer favorável em relação à Avaliação de Impacte Ambiental da primeira fase de construção do projeto do data center.

“Tanto mais que a investigação há muito que se encontrava em curso” mas não há, diz a defesa, “elementos inequívocos tanto da influência exercida por Vítor Escária” ou da “venda da influência por parte de Vítor Escária a Diogo Lacerda Machado”, lê-se no texto do recurso.

Apreendidos 75 mil e 800 euros em notas no escritório do chefe de gabinete de António Costa

Em relação à alegada vantagem entregue a Vítor Escária — outro pressuposto do crime de tráfico de influência — a defesa também não viu qualquer indício recolhido nos autos.

Neste ponto, os advogados Tiago Rodrigues Bastos e Filipa Elias ignoram a descoberta de cerca de 75 mil euros em numerário no gabinete de Vítor Escária nas buscas que foram realizadas na residência oficial do primeiro-ministro no dia 7 de novembro de 2023. O facto de o MP ainda não ter qualificado do ponto de vista juridico-penal tal descoberta pode explicar o silêncio da defesa.

Em declarações à imprensa, num intervalo dos interrogatórios dos cinco arguidos detidos na Operação Influencer, o advogado Tiago Rodrigues Bastos avançou com a explicação de que se tratava de uma remuneração por serviços de consultoria e de docência prestados em Angola.

Neste ponto, os advogados Tiago Rodrigues Bastos e Filipa Elias ignoram a descoberta de cerca de 75 mil euros em numerário no gabinete de Vítor Escária nas buscas que foram realizadas na residência oficial do primeiro-ministro no dia 7 de novembro de 2023. O facto de o MP ainda não ter qualificado do ponto de vista juridico-penal tal descoberta pode explicar o silêncio da defesa.

No recurso, a defesa apenas faz referência a uma parte das contrapartidas que o MP imputa a Diogo Lacerda Machado: o salário pelos serviços de consultadoria prestados a um dos acionistas da empresas Start Campus. Os advogados de Escária ignoram a segunda contrapartida que corresponde a um contrato promessa respeitante a 0,5 % do capital social da empresa do data center.

“Não só está por demonstrar, sequer indiciariamente, a afirmação de que aquela avença constiuía o pagamento de uma actividade ilícita (…), como não é minimamente credível ou crível, desde logo ao nível da experiência comum e do sentido da vida, que Vítor Escária se dispusesse a cometer crimes, a bem de um projeto, contentando-se, altruisticamente, com a compensação monetária dada a um terceiro”, afirmam os advogados daquele que era à data chefe de gabinete do primeiro-ministro e exercia as suas funções em regime de exclusividade.

Instituto da Conservação da Natureza foi apenas um dos 19 decisores sobre a Avaliação de Impacto Ambiental

A defesa de Vítor Escária tentou igualmente desconstruir a importância do parecer do Instituto da Conservação da Natureza e Florestas (ICNF) sobre a Avaliação de Impacto Ambiental da primeira fase de construção do projeto do data center em Sines.

Segundo a defesa, o MP quis fazer crer que, por um lado, “qualquer parecer favorável seria ilícito” devido ao facto de a construção do data center ocorrer em plena Zona Especial de Conservação” e, por outro lado, “o parecer favorável do ICNF e a decisão favorável da Avaliação de Impacto Ambiental são uma e só coisa e tudo sob a alçada de Nuno Banza, presidente do ICNF”, lê-se no texto do recurso.

Influencer. “Inação da justiça mina democracia”

Tiago Rodrigues Bastos e a sua colega Filipa Elias são taxativos: “Nem a construção de uma ZEC é por si ilegal, nem o ICNF determina o sentido do parecer final da Avaliação de Impacto Ambiental”.

Para fundamentar essa afirmação, a defesa juntou o parecer final da Comissão de Avaliação, o qual tem três informações relevantes:

  • A comissão é constituída por nove entidades, nomeadamente a Agência Portuguesa do Ambiente, a Direção-Geral do Património Cultural, a Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, entre outras.
  • O ICNF faz parte dessa comissão, mas o seu representante é Sandro Nóbrega — “que não consta que tenha sido pressionado para o que quer que fosse”, afirma a defesa
  • E a AIA não foi feita ignorando a incidência em ZEC, sendo que o ICNF emitiu mesmo um parecer que contraria as afirmações de Nuno Banza de ecossistemas “intocáveis” referidas no despacho de indiciação do MP. “[Do] ponto de vista dos sistemas ecológicos, considera-se ser de emitir parecer favorável condicionado ao cumprimento das disposições constantes no capítulo final do presente documento”, cita-se no recurso da defesa.

Logo, diz a defesa de Vitor Escária, a conclusão de que “o parecer favorável do ICNF é ílícito — conclusão que o MP lança com vista ao preenchimento da decisão ilícita favorável exigida pelos requisitos do crime de tráfico de influência — mostra-se completamente destituída de fundamento”, acusa a defesa.

Não há qualquer perigo de fuga de Vítor Escária: “Seria facilmente descoberto”

Tal como aconteceu com Diogo Lacerda Machado, o juiz Nuno Dias Costa deu como indiciado o perigo de fuga invocado pelo MP para Vitor Escária. Contudo, e ao contrário de Diogo Lacerda Machado, Escária não teve de depositar nenhuma caução. Ficou apenas sem o passaporte e proibido de sair do país.

A defesa de Escária quer revogar essa medida de coação, por entender que a mesma é “desproporcional” e “desnecessária”, alegando que não há qualquer perigo de fuga do seu cliente. “Além dos factos indiciados e o crime imputado com base nos mesmos não jusitificarem, por si, qualquer ‘necessidade’ de fuga, não existe qualquer indício na atuação do ora recorrente, bem pelo contrário, de pretender eximir-se à ação da Justiça.”

"Além dos factos indiciados e o crime imputado com base nos mesmos não jusitificarem, por si, qualquer 'necessidade' de fuga, não existe qualquer indício na atuação do ora recorrente, bem pelo contrário, de pretender eximir-se à ação da Justiça."

“O arguido tem a sua vida em Portugal, tudo o que fez no estrangeiro foi esporádico e sempre no exercício da sua profissão de economista, pelo que das duas uma: ou ia para o estrangeiro trabalhar como consultor/professor e facilmente seria descoberto ou ia para o estrangeiro trabalhar ocultando a sua identidade para não ser descoberto, dedicando-se a uma actividade diferente da sua, afastado de tudo e de todos”. “Ora nem uma nem outra são hipóteses são minimamente plausíveis”, asseguram os advogados de Escária.

“Com toda a franqueza, a ‘fuga à justiça’ (…) com todas as consequências que a mesma acarretaria num mundo global e cada vez mais ‘pequeno’, afigura-se de acordo com as regras da experiência comum, bem pior do que qualquer condenação, fosse ela qual fosse”, conclui a defesa.

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça até artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.