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Igor Zhovkva, 42 anos, chefe de gabinete adjunto do Presidente Zelensky, e o seu principal conselheiro diplomático, preferiu dar esta entrevista ao Observador num hotel de Kiev em vez de nos receber no seu gabinete no Palácio Presidencial na Rua Bankova. “Podia ter sido lá, mas iam ter de passar por tantos procedimentos de segurança, tão demorados, que assim é mais simples”.
Revela que ainda esta sexta-feira foram interceptados dois mísseis que se dirigiam a Kiev, pelo que não é possível garantir a 100% a segurança de chefes de governo estrangeiros que visitem a cidade como António Costa — e está aliás convencido de que a Rússia fez de propósito para bombardear a capital ucraniana durante a visita de António Guterres. Sobre o papel da ONU, depois de ter criticado a ida do secretário geral a Moscovo, Zhovkva admite agora que pode ter dado um contributo positivo para a libertação dos civis de Mariupol.
No elevador, o chefe de gabinete adjunto de Zelensky quis saber em que zonas da Ucrânia o Observador tinha estado em reportagem além de Kiev desde o início da guerra (de Kharkiv a Mikolaiv, passando por Odessa, Lviv, Ivano-Frankisk e Zaporizhya). E comentou que depois desta entrevista e de outra que deu a uma televisão portuguesa se arrisca a ser uma pessoa conhecida em Portugal, antes da visita oficial a Lisboa que tem agendada para os primeiros dias de Junho.
Ao longo de uma hora de entrevista, anunciou as expectativas de que António Costa, na sua visita a Kiev, declare um apoio mais firme à candidatura da Ucrânia à adesão à União Europeia, que espera ver aceite no Conselho Europeu de Junho. Não quis entrar em detalhes sobre o armamento que vai receber de Portugal, na sequência do pedido feito por Zelensky ao parlamento português, para não dar informações secretas ao inimigo, mas diz que assim que receberem essas armas oferecidas pelos países ocidentais a Ucrânia vencerá a guerra.
Não reconheceu logo o nome de Igor Khashin, mas depois mostrou-se a par da polémica em Portugal por ser um russo a receber refugiados ucranianos e a recolher dados sensíveis sobre a localização dos militares na Ucrânia. Não discutiu pessoalmente o tema com o presidente Zelensky, mas avisou que Portugal deve estar alerta para ações de espionagem dos russos no seu território.
Ainda houve tempo para falar das posições do PCP, que tem acompanhado, do caso do ucraniano que morreu depois das agressões dos inspetores do SEF, do desejo de que Portugal apadrinhe a reconstrução de uma zona específica da Ucrânia, e do que vai pedir ao jogador do Benfica Yaremchuk, assim que ele se juntar à seleção ucraniana para disputar a presença no mundial do Qatar.
“Espero que o vosso primeiro-ministro traga alguns detalhes sobre fornecimento de armas”
Depois de um bombardeamento ter atingido Kiev durante a visita do secretário-geral da ONU, acha que há mais condições de segurança para António Costa vir a Kiev ou há o risco de a Rússia poder aproveitar a visita de um primeiro-ministro da UE para enviar mais um aviso intimidatório?
Com os russos não se pode ter certezas de nada, especialmente no que diz respeito a segurança, nem a 100% nem sequer a 50%, vou ser muito honesto consigo. Ainda hoje dois mísseis disparados contra a região de Kiev foram intercetados pelos nossos sistemas de defesa aéreos. Isto é o que eles estão a fazer e o que provavelmente vão continuar a fazer contra qualquer cidade ucraniana, já nenhum lugar é seguro na Ucrânia. Nem em Kiev, nem em Kharkiv, Lviv ou qualquer outra região. Eles estão a disparar estes mísseis balísticos porque não sabem como lutar no mundo moderno, conseguem disparar os mísseis a partir do Mar Cáspio e é o que estão a fazer. Mas o primeiro-ministro português vai de certeza ter todas as condições e medidas de segurança necessárias e a viagem vai ser segura.
Esta quarta-feira o Presidente da República portuguesa anunciou publicamente que o primeiro-ministro estaria na Ucrânia até ao fim de semana. Não tem sido habitual saber-se de uma visita de um chefe de governo a Kiev com tanta antecedência. Acha que a divulgação de uma informação destas pode agravar os riscos de segurança do primeiro-ministro?
Nunca comento fugas de informação, só comento informação oficial…
Sim, mas foi dito pelo nosso Chefe de Estado…
Querem que comente o vosso chefe de Estado? Não, definitivamente não vou comentar! Mas, uma vez mais, é muito importante que as nossas relações tenham chegado a esta dimensão, o vosso país está a ajudar-nos muito e em muitas áreas. Na entrega de armamento, no apoio às sanções da União Europeia, no acolhimento às nossas pessoas deslocadas, têm recebido os ucranianos que tiveram de fugir do país. Vocês já tinham a maior comunidade ucraniana, mas sei que o número de ucranianos duplicou agora em tempo de guerra. Espero que não estejam a incomodar-vos, são mesmo bons europeus, de um país habituado ao trabalho árduo, têm conhecimentos, sabem falar várias línguas, incluindo o português, e querem trabalhar no vosso país mas, assim que a situação estiver melhor aqui, a maior parte dos ucranianos vai querer regressar. Isto mostra que a primeira visita oficial de sempre de um primeiro-ministro de Portugal vai ser muito importante para os nossos dois países, aconteça quando acontecer.
Em tempos de paz, a visita de um chefe de Governo é antecedida de reuniões preparatórias para decidir o essencial, ficando apenas alguns detalhes pendentes de acertos nas reuniões presenciais entre as altas figuras dos estados. O que é que espera que o primeiro-ministro português traga nesta visita?
Espero que o vosso primeiro-ministro anuncie um apoio adicional de Portugal ao nível político, espero também que ele traga alguns detalhes no que diz respeito a mais apoios do vosso país em termos de fornecimento de armas. Precisamos de mais armas para começarmos a desenvolver as cidades e ajudarmos a Ucrânia a ganhar a batalha no Donbass e a reaver todos os territórios capturados. Vai ser muito interessante ouvir o que está a acontecer no que diz respeito ao sexto pacote de sanções da União Europeia, porque a discussão tem sido intensa, mas contamos com todos os países para o apoiarem. O embargo ao petróleo é muito importante porque cada euro ou dólar que a Rússia ganha ao negociar com a União Europeia petróleo, gás ou outras mercadorias é imediatamente gasto na indústria militar russa e dá-lhes mais capacidade para usarem mais mísseis balísticos e para matarem mais civis e soldados ucranianos. Também contamos seguramente que o vosso primeiro-ministro esteja pronto para falar sobre a futura reconstrução da Ucrânia, porque depois de ganharmos vamos precisar imediatamente de reconstruir os territórios da Ucrânia. O meu Presidente sugere a todos os países da União Europeia que escolham uma cidade ou uma região da Ucrânia e que se tornem mecenas ou patronos dessa cidade ou região. Imaginem, em breve, poderá haver um pequeno pedaço de Portugal em regiões que hoje estão destruídas mas que vão poder ser reconstruídas através de investidores ou empresas portuguesas.
Há alguma cidade em particular pensada para receber esse apoio de Portugal?
Isso depende do vosso Governo, da escolha do vosso Governo. Alguns países já confirmaram que vão ajudar a reconstruir esta ou aquela zona, portanto — e não querendo pressionar o vosso primeiro-ministro — seria bom que ele tivesse esta ideia em mente.
Há alguma cidade ou alguma região em particular que ache que pudesse ser apropriada para a ajuda portuguesa? Talvez alguma cidade junto ao mar?
Podemos dar pistas, mas… Sim, seria natural alguma localidade junto ao mar, mas, como disse, cabe ao vosso governo e às vossas empresas pensar sobre isto, mas acho que é uma ideia muito boa. E vamos seguramente falar sobre a integração da Ucrânia na Europa com o vosso primeiro-ministro.
No discurso ao parlamento português, em 21 de abril, há um mês, o Presidente Zelensky apelou expressamente a Portugal que lhe cedesse Tanques Leopard, veículos blindados de transporte de pessoal e mísseis antinavio Harpoon. Sabe se vão conseguir que Portugal ceda à Ucrânia algum deste equipamento?
Não vou fazer comentários sobre os detalhes do fornecimento de armas, porque é obviamente uma informação secreta e não queremos que o país agressor fique na posse dela, mas entre os itens que mencionou está tudo o que precisamos. Falou em armas terrestres, é definitivamente o que precisamos, precisamos de sistemas de artilharia, de mais veículos e tanques. Falou de mísseis anti-navio e também precisamos deles porque todos os portos estão bloqueados pela Federação Russa, os portos do Mar Negro, do Mar de Azov, o que implica várias coisas. Em primeiro lugar, continuam a bombardear cidades ucranianas a partir dos navios, estão a bombardear a cidade de Odessa, por exemplo, a partir dos navios de guerra, portanto precisamos de mísseis anti-navio para os parar. Em segundo lugar, como os portos estão bloqueados, é impossível para nós exportarmos os nossos cereais e outras colheitas para os países da União Europeia e para o resto do mundo, como o Médio Oriente ou África, temos muita mercadoria que estamos prontos para exportar, apesar da guerra. Ou seja, a Ucrânia está preocupada com a segurança alimentar do mundo, mas infelizmente não podemos exportar as mesmas quantidades por outros meios, como comboio, estradas ou rio, temos uma capacidade muito limitada. É por isso que toda a comunidade internacional, os países europeus, e Portugal, entre eles, têm de pensar como desbloquear ou pelo menos estabelecer corredores seguros no Mar Negro para começar imediatamente as exportações de bens ucranianos. Se assim não for, o mundo inteiro corre sérios perigos de ter uma crise alimentar mesmo muito grande.
Adesão à UE. “O mais lógico é o PM português apoiar o seu povo na vontade de estar ao lado da Ucrânia”
No fim de Março, quando falou ao Conselho europeu, o Presidente Zelensky colocou Portugal num grupo de países que não estava convencido a apoiar a adesão da Ucrânia à União Europeia. A expressão que usou quando enumerou os países foi “Portugal… almost”. Houve alguma mudança nessa avaliação? Espera que o primeiro-ministro declare em Kiev o apoio de Portugal a uma entrada mais rápida da Ucrânia na UE?
Seguramente que esperamos isso do vosso primeiro ministro por uma simples razão: não encontramos um motivo para a Ucrânia não ter o estatuto de candidato já em junho. Deixe-me recordar que nós não fizemos uma candidatura para aderir à UE apenas em tempo de guerra, antes nós já tínhamos preenchido com sucesso os critérios, 65% deles já estão preenchidos. A União Europeia deu um aval positivo ao nível das nossas obrigações. Depois, preenchemos o questionário que a Comissão Europeia nos enviou, 500 páginas que foram submetidas em quatro semanas. Há países que demoram anos a fazê-lo. Fizemo-lo em tempo de guerra, submetemos esta informação, agora a Comissão Europeia está a fazer um parecer. Provavelmente esta opinião será positiva e no princípio de junho devemos dar o próximo passo para o estatuto de candidato, e no final de junho, quando houver sessão do Conselho Europeu, não deverá haver restrições. Verifiquei as últimas projeções do Eurobarómetro, em que as cidades de vários países responderam se apoiavam a entrada da Ucrânia na UE. E em Portugal, 90% apoiam a nossa entrada. Por isso o mais lógico é o primeiro ministro português apoiar o seu povo na vontade de estar ao lado da Ucrânia. E já os têm agora. Por isso não entenderíamos se, no final de junho, por razões burocráticas, estas ou aquelas, não houvesse uma unanimidade na decisão de reconhecer o estatuto. Os soldados ucranianos que estão a combater os russos não entenderiam. Mães e crianças ucranianas, — que estão aqui escondidas em Kiev dos russos, preferem estar na União Europeia do que no mundo russo, — não entenderiam. Agora, mais de 95% dos ucranianos apoiam a entrada na UE, é o maior número de sempre desde a independência. Mas imagine, se nada for decidido em junho, provavelmente perdermos a fé na União Europeia. E não penso que será o melhor cenário para a UE. É preciso defender agora não apenas a Ucrânia, mas todo o continente europeu. E nós merecemos fazer parte da vossa família.
É um processo muito complexo. Imagina que seja criada uma situação especial para a Ucrânia, de não entrar imediatamente na União Europeia, ter um papel excecional, fazer parte, mas não completamente?
Ninguém nos diz que a Ucrânia vai entrar imediatamente na UE. O estatuto de candidato é apenas o princípio do processo, as negociações de acesso devem continuar e é um processo muito complexo. Não vamos comprometer nenhum passo da candidatura, vamos passo a passo, vamos respeitar cada estado da negociação. Mas no final queremos mostrar que somos membros. Não apenas uma filiação ou uma associação, que é o que alguns estão a tentar sugerir. Nós somos iguais a países como Portugal ou Espanha quando se candidataram. Nós merecemos estar lá. Nós temos algo a trazer à União Europeia. Pensemos no critério da segurança. A Ucrânia precisa deste critério? Definitivamente, porque a defesa da União Europeia, as suas forças armadas, é das mais fortes. Mas a Ucrânia traria algo a um mercado único? Sim. Em tempos de guerra, nós juntámo-nos ao sistema de energia europeu e desligámo-nos do russo, e agora vamos vender energia excedente para os vossos mercados. Depois, em tempos de guerra, nós estamos preparados para exportar para os países europeus os nossos cereais, é por isso que provavelmente a União Europeia impôs zero taxas alfandegárias para exportação de bens da Ucrânia.
E em relação à adesão à NATO?
Bem…a NATO… Bem… Se perguntar aos ucranianos, mais do que, penso, 85% antes da guerra queria juntar-se à NATO, não teríamos este número há cinco anos. Nós consideramos que seria a melhor forma de garantir a segurança da Ucrânia. Infelizmente não nos foi dada a oportunidade. Não nos foi dada uma perspetiva ou alguma esperança de nos tornarmos membros da NATO, apesar da política de portas abertas, mas agora temos de pensar noutras possibilidades de segurança para a Ucrânia depois de ganharmos a guerra.
Quais outras possibilidades de segurança?
Como o meu presidente está a negociar com os líderes dos EUA, Reino Unido, França, Alemanha para possibilidade de garantias de segurança depois da guerra. Lembro que temos um memorandum infame em que o único mecanismo para dar segurança à Ucrânia é através de consultoria, esta consultoria não conseguiu evitar a invasão russa da Crimeia em 2014, nem a guerra agora em 2022. Agora precisamos de um sistema estrito de garantias, um tratado ou um pacto, onde possamos ter mecanismos legais, aprovados no parlamento, caso a Rússia volte a atacar-nos. Precisamos de um novo estatuto, para a Ucrânia não ter de voltar a pedir para fechar o espaço aéreo ou para ter armamento.
Além do primeiro-ministro, também o Presidente da Assembleia da República anunciou que foi convidado para vir à Ucrânia. Já houve algumas conversações para convidar o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa para vir a Kiev?
Qualquer líder estrangeiro, incluindo de Portugal, é bem-vindo à Ucrânia desde que ele ou ela tragam resultados concretos.
Dois anos antes da guerra, em 2020, um ucraniano chamado Ihor Homenyuk foi agredido pelos serviços de fronteiras e acabou por morrer quando queria entrar em Portugal. Os agentes foram entretanto condenados. Este caso ainda dificultou as relações entre Portugal e a Ucrânia agora durante a guerra?
Honestamente lembro-me ligeiramente desse caso, mas não penso que esse caso em particular tenha piorado a nossa ótima relação bilateral.
Acha que o processo ficou resolvido de forma aceitável?
Desde que aqueles que são responsáveis sejam punidos e trazidos à justiça, isso é o mais importante.
Polémicas do PCP. “Se alguém está mais confortável neste Mundo Russo, tudo bem…”
Em Portugal, o Partido Comunista recusou estar presente no Parlamento quando o Presidente Zelensky discursou e tem criticado a Ucrânia. Como acompanham estas polémicas? Sente que estão a ofender a Ucrânia?
Relembro que eles também não chamam guerra à guerra, inventam outros termos. Talvez tenham mais inclinação para usar estes termos inventados pelos russos, “operação militar especial”, que é algo muito longe da verdade. Bem, não ficamos ofendidos, compreendemos as raízes da posição deles. Se o Partido Comunista ainda existe e está ativo, se está politicamente vivo, isso significa que provavelmente ainda sonha com… Não sei, talvez com o regresso a um sistema bipolar ou algo do género, quando tudo era mais fácil de compreender. Agora também parece que a Rússia está a tentar regressar a este sistema bipolar, há um “eles” e “o resto do mundo”. Só que desta vez eles são os agressores, são agressores claros, e cada país e cada partido deve entender quem é o agressor e quem não é e deve entender que isto é uma guerra, não é uma operação. Que isto são russos a matar ucranianos, que invadiram o nosso território e não o contrário. Não invadimos um único centímetro de território russo, é a Rússia quem quebra todas as regras da ordem internacional. É a Rússia que combate os valores europeus. É a Rússia quem quer fazer evaporar a nação ucraniana do mapa da Europa. É a Rússia quem quer destruir completamente cidades como Mariupol, cuja maioria são falantes de russo. Kharkiv, cuja maioria são falantes de russo. Odessa, cuja maioria são falantes de russo. Isto é provavelmente aquilo a que se chama o Russkiy Mir, o Mundo Russo. Portanto, se alguém está mais confortável neste Mundo Russo, tudo bem… Mas nós na Ucrânia estamos muito mais confortáveis com o Mundo Europeu, com a família europeia, com a União Europeia.
Na Ucrânia há agora 11 partidos que foram proibidos, alguns com representação no Parlamento. Isto demonstra de alguma forma que a Ucrânia não é uma democracia madura?Bem, esses partidos trabalhavam para o país agressor ou eram inspirados por ele, por vezes até de forma financeira, e sem dúvida que não podem existir em tempos de guerra. No que diz respeito aos deputados desses partidos, perderam as suas posições como fações no Parlamento, mas formaram um grupo com um novo nome. Têm todos os direitos de um grupo político, que são algo limitados quando comparados com as das fações políticos. E ok, vamos ver, durante o período de guerra será assim que funcionará. Os cidadãos ucranianos não se podem dar ao luxo de ter a funcionar partidos que estão do lado do agressor em vez de estarem do lado da Ucrânia.
Antes da guerra havia obviamente algumas pessoas pró-russas na Ucrânia. Provavelmente esse número reduziu-se. Mas não será de forma nenhuma permitido aos eleitores de alguns desses partidos que expressem a sua visão, mesmo que seja pró-russa? Por que não deixá-los ir a eleições? Teme que ainda consigam uma votação relevante?
Em primeiro lugar, não temos eleições marcadas num futuro próximo…
Mas quando houver eleições?
Bem, quando houver eleições falaremos disso. Depois da vitória não creio que muita gente vá votar nos partidos pró-russos. Talvez nem todos acreditassem que a Rússia ia invadir a Ucrânia e começar uma guerra, mas começou. As pessoas razoáveis vão pensar duas vezes. Mais uma vez, não é útil especular agora, em tempos de guerra não é possível ter eleições. Estamos unidos contra o inimigo. Qualquer narrativa russa para separar a Ucrânia é impossível neste momento. Deixem-nos ganhar a guerra juntos, juntos convosco, juntos com Portugal, juntos com o resto dos nossos parceiros europeus. E depois poderemos regressar às questões políticas.
Russos a recolher dados de ucranianos em Portugal. “É preciso reagir a isto com firmeza”
A sociedade portuguesa uniu-se para enviar donativos para a Ucrânia e muita gente meteu-se em carros e foi de Portugal para a Polónia para resgatar alguém. Já falámos sobre estes esforços. Mas nem tudo foi perfeito. Conhece o nome Igor Kashin?
Não.
É russo e em Portugal recebeu vários ucranianos, recolheu os seus dados e perguntou às famílias pela localização de soldados na Ucrânia. A embaixada ucraniana falou sobre isto…
Sim, recordo-me. Não me lembrava do nome dele, mas recordo-me da história.
Foi um grande escândalo em Portugal. Tem receio que os russos possam ter acesso a informação sensível como esta, que desvende a localização do exército ucraniano?
Isto é definitivamente parte da guerra híbrida que a Rússia está a levar a cabo contra a Ucrânia desde 2014 ou até antes. Porque eles não estão a lutar contra nós apenas no campo de batalha, apenas na frente diplomática. Também estão a lutar contra nós nos media e aqui, através desta atividade importante que é ajudar os ucranianos. Mas, em primeiro lugar: provavelmente os ucranianos são capazes de se ajudar a si próprios. Em segundo lugar: os ucranianos preferem pedir ajuda às autoridades europeias, às pessoas hospitaleiras na Europa, em vez de pedir a uns espiões infiltrados ou algo do género que estão a tentar recolher informação sensível sobre os familiares que podem estar na linha da frente. Sem dúvida que é preciso reagir a isto com firmeza e espero que tenha sido essa a reação no vosso país. Para além disto, infelizmente, tanto no vosso país como em outros países devemos esperar que surjam mais casos destes. Porque este sistema de infiltração em países com estes ditos agentes é algo que está disseminado. Quer dizer, eles herdaram isto da União Soviética e, acredite em mim, estão a canalizar muito dinheiro e muitos esforços para isto. Investiram imenso dinheiro aqui na Ucrânia para tentarem infiltrar agentes em todas as autoridades, nas forças armadas, nas forças especiais. É por isso que esperavam ser recebidos de braços abertos quando invadiram a Ucrânia, que não foi o que aconteceu, nem de perto nem de longe. Em vez de os receber de braços abertos, os ucranianos estão a lutar contra eles, estão a matá-los. Os civis levam a cabo guerra de guerrilha, até nas zonas ocupadas. Eles por acaso conseguiram impor algum tipo de autoridade nos territórios ocupados temporariamente? Em Kherson e em Melitopol as pessoas protestam todos os dias, levam bandeiras ucranianas e cantam o hino nacional. Ainda hoje vi que numa das zonas ocupadas os trabalhadores ucranianos das urgências fizeram um protesto por terem detido o seu chefe. [Os russos] nunca terão uma receção calorosa na Ucrânia, apesar de terem tentado infiltrar-se aqui. Portanto sugiro-vos que sigam o exemplo ucraniano, deixem de ter medo da Rússia. Nós já não temos medo da Rússia. Sabemos como lutar contra ela, sabemos como vencer e não há dúvidas de que vamos vencer.
Neste contexto, acha que a Rússia pode tentar infiltrar espiões Portugal?
Vejo os países a expulsarem os diplomatas e tudo o mais, mas sugiro-vos que se mantenham atentos a isto, porque eles não vão parar de o tentar fazer em todos os países da União Europeia, da NATO, e em todo o mundo.
Sabe se este caso em particular alguma vez foi discutido com o Presidente Zelensky?Pessoalmente, não falei sobre isso com ele. Mas se é algo que estava no radar dos nossos serviços de segurança, de certeza que discutiram o assunto com ele.
A relação diária com Zelensky. “Nunca podes perder uma palavra proferida pelo Presidente”
Como é um dia no gabinete do Presidente desde que a guerra começou? O que é que mudou?Nos primeiros dias da guerra, quando a situação era muito difícil, houve várias mudanças. Não podíamos trabalhar no gabinete. Agora que a situação está melhor já trabalhamos aqui.
Já se sentem mais seguros agora em Kiev para trabalharem no palácio presidencial?
Nada pode ser garantido a 100% e quando as sirenes tocam na cidade fica-se sempre um bocadinho preocupado. Mas sim, Kiev está a renascer, pode ver isso. Parte das pessoas que fugiram estão a regressar, vê-se muitos carros nas ruas. E Kiev em maio é maravilhosa, portanto está a voltar à vida. Se me perguntar se é possível que haja avanços das forças russas nos arredores de Kiev, sim, infelizmente não podemos excluir nada. Mas as nossas forças armadas e as defesas territoriais estão bem preparadas e equipadas e não voltará a acontecer nada remotamente parecido [com o que aconteceu].
As fotografias do Presidente Zelensky antes e depois da guerra mostram que ele envelheceu muito nestes 84 dias de guerra. Como acha que ele está a lidar com este período?
Estou orgulhoso do meu Presidente e sinto-me honrado por fazer parte da equipa dele. Ele é um exemplo não apenas para os ucranianos, embora o seja, sem dúvida. Há pouco perguntava-me sobre aquelas forças políticas [pró-russas]… Atualmente toda a gente neste país apoia o Presidente. Mas ele também é um exemplo para o resto do mundo. Veja, a revista Time ontem escolheu-o como Personalidade do Ano, não escolheu outro político ou empresário. Porque ele deu um grande exemplo de força, de determinação, de coragem. E provavelmente é a única pessoa no mundo que não tem medo de Putin. Estas são circunstâncias difíceis para ele, hoje faz exatamente três anos que ele tomou posse. Quantas coisas mudaram ao longo de três anos neste país? Houve coisas positivas, ele levou a cabo muitas reformas em áreas diferentes. Agora estamos em guerra, mas tenho a certeza que vamos vencer, restaurar o nosso país e torná-lo ainda melhor.
Quanto tempo acha que esse apoio ao presidente pode durar? Começa a haver alguma tensão pela dificuldade de abastecer os carros de combustíveis, ou pela falta de medicamentos. Teme que a longo prazo este apoio ao presidente possa diminuir?
Certamente, porque a principal preocupação é vencer a guerra, independentemente de a Rússia a querer prolongar, querer arrastar isto por mais e mais tempo. Mas com esta unidade, com esta coragem, com esta determinação do povo ucraniano vamos sem dúvida ultrapassar as possíveis dificuldades económicas de que fala. Achamos que isto se resolverá em breve, mas o mais importante agora é vencer a guerra e tornarmo-nos num país próspero.
Como é a sua relação com o Presidente Zelensky? Reúnem-se diariamente? Como é que o ajuda?
Reúno-me com o Presidente todos os dias, porque todos os dias, para além da liderança na guerra, ele está envolvido em atividades diplomáticas de peso. Temos várias chamadas por dia com líderes internacionais, ele fala online aos Parlamentos, recebe convidados estrangeiros… Agora inventámos este novo formato em que ele fala nas universidades de vários países aos jovens estudantes. Todos os dias há várias atividades no plano internacional em que nós, a equipa que o aconselha na política externa, estamos envolvidos.
Está sempre envolvido na preparação dessas reuniões e desses discursos?
O meu Presidente está preparado para tudo, parece que nem sequer precisa de tópicos de conversa sobre o que quer que seja, sabe falar com os líderes de todas as nações do mundo, sabe o que dizer. Ouvi uma vez um dos meus colegas diplomatas dizer: ‘Atualmente qualquer pessoa ouve atentamente todas as palavras que o Presidente Zelensky pronuncia”.
Mesmo que não fale em inglês…
Não é em inglês, mas o inglês dele é muito bom e melhorou ao longo do tempo. Também fala em inglês, quando está a falar com os seus homólogos estrangeiros. Podes não ouvir uma palavra dita por outro Presidente de outro Estado poderoso, mas nunca podes perder uma palavra proferida pelo Presidente Zelensky.
Como chefe de gabinete adjunto, qual foi o maior dilema que enfrentou desde que começou a guerra ou a decisão mais importante que teve de ajudar a tomar?
Acho que, dentro das minhas principais responsabilidades, a decisão de submeter a candidatura à União Europeia foi a decisão mais importante em tempo de guerra. É preciso coragem e força para fazer este esforço e o Presidente fê-lo.
A nível pessoal, como é que a guerra mudou a sua vida nos primeiros dias? Pensou sair do país ou Pôs a família no estrangeiro por questões de segurança?
Não, a minha família nunca saiu do país, nem por um só dia. Estão comigo, aqui em Kiev. Quanto à minha rotina habitual, sim, tenho menos horas para dormir, mais intensidade.
Quantas horas dorme por dia?
Depende, mas gosto daquilo que o meu Presidente diz: “Vamos descansar muito depois de ganharmos, mas para já temos de trabalhar e de passar noites sem dormir”. Mas isto é a coragem de toda a gente, dos soldados, dos civis que ficaram aqui, das pessoas que apoiam a cidade e que a mantêm em funcionamento… Toda a gente mostra a sua força e coragem e é por isso que estamos a ganhar. Putin fez mal as contas em várias coisas, mas calculou mesmo mal o desejo de liberdade dos ucranianos e o seu desejo intenso de defender a própria terra.
“Russos ainda esperam conseguir alguma vitória de peso para eles — mas nunca acontecerá”
Quais foram os maiores erros de Putin?
Foram três. Calculou mal a força do seu exército, o mito de que era o segundo exército mais forte do mundo — que nunca foi — evaporou-se na Ucrânia. Segundo erro: calculou mal a força do exército ucraniano, que sabe lutar, que consegue lutar com mais do que um equipamento e sabe combater numa guerra moderna. E o terceiro erro foi ter calculado mal o nível de união do mundo em relação à Ucrânia, porque nós estamos a ser tratados como uma grande nação europeia que quer estar entre os seus iguais e não com as pessoas que ainda pensam no passado, em vez de no futuro.
Nas cidades que ocupam, vemos isso em Kherson, os russos andam de casa em casa atrás dos altos funcionários do Estado. Sente-se um alvo do inimigo? Sentiu que podiam vir atrás de si se tivessem conseguido entrar em Kiev?
Sim, porque havia muitos grupos subversivos russos aqui e provavelmente ainda há porque, convém lembrar, estes agentes infiltraram-se profundamente em todas as cidades da Ucrânia. Mas, uma vez mais, se passares o tempo todo a pensar na tua segurança isso impede-te de fazer a parte mais importante do trabalho que és obrigado a fazer na tua posição. É por isso que acho que tudo vai ficar bem e que juntos vamos vencer.
As negociações com a Rússia estão suspensas. Que condições são necessárias para poderem ser retomadas?
É preciso que os russos comecem a pensar se querem chegar a um resultado durante as negociações. Durante as negociações, estamos a ouvir as posições uns dos outros. Os russos começaram por não ouvir a Ucrânia nas primeiras rondas de negociação. Limitavam-se a traçar linhas vermelhas, a fazer chantagem. Depois, começaram a ser um pouco mais construtivos, em Istambul, mas agora parece que voltaram à tática inicial.
Sentiu que chegaram a ser construtivos?
Pelo menos, eles receberam as propostas da Ucrânia em Istambul e prometeram dar uma resposta a essas propostas. Eu não sou membro da delegação, por isso não poderei dar detalhes a esses respeito. Mas, neste momento, não há vontade do lado deles. E nunca foram sérios sobre estas negociações. Estiveram sempre a contar com o sucesso no terreno. Primeiro, contavam conquistar Kiev em três ou cinco dias; depois, contavam conquistar toda a zona leste da Ucrânia; depois, [contavam conquistar] alguma parte da Ucrânia, ter um corredor [até à Transnístria] ou algo do género. Mas, tendo falhado em tudo no terreno, ainda esperam conseguir alguma vitória de peso para eles — o que nunca acontecerá. Nós vamos seguramente falar com eles sobre dois importantes pré-requisitos. Um cessar-fogo, porque numa negociação a sério deve haver um verdadeiro cessar-fogo. Não negoceias debaixo de mísseis. E, em segundo, eles têm de declarar a retirada dos militares e começar a retirar. Só depois há condições para as negociações. Porque mesmo depois da vitória da Ucrânia deve haver um acordo.
Se não houver cessar fogo e não retirarem, não haverá condições para voltar a negociar?
Tanto quanto me lembro, eles prometeram fazer um cessar-fogo durante a primeira ronda de negociações. O que nunca aconteceu. Nós não queremos negociar nos termos russos. Nunca, jamais. Nunca quisemos. Mas estávamos prontos para nos sentarmos à mesa. Agora, depois de Bucha, Borodyanka, Irpin, Gostomel, é ainda mais difícil sentarmo-nos à mesa com eles. Novamente, não faço parte da delegação mas não consigo imaginar-me à mesa frente a uma pessoa que é também responsável por estas atrocidades.
Consegue ajudar-nos a perceber o que aconteceu com Dennis Kireev, um dos primeiros negociadores que apareceu morto?
Não consigo dizer-lhe nada a esses respeito, não estive envolvido nas negociações.
Por ser um segredo de guerra? Estava a passar informação aos russos?
Não, não, não consigo dar-lhe qualquer informação. Não sei nada sobre isso.
Se e quando presidente Zelensky e Putin se encontrarem cara a cara, provavelmente terá um papel aqui. O que falta para este frente a frente poder acontecer? Houve algum convite ou conversações para um encontro deste género?
Desde o início da guerra, o meu Presidente não afastou a possibilidade de uma solução diplomática para esta guerra. Mais uma vez — e sabe que muitos líderes estrangeiros sugeriram que fossem eles a mediar estas negociações, falaram com Putin sobre isso e não houve resposta; a única resposta era a de que ainda não era tempo; provavelmente, ele não estava a ser sério sobre estas negociações, não as queria. Como podes sentar-te com uma pessoa que não quer negociar? Mas, mais uma vez, nós estamos a combater a guerra e queremos acabar ela. Desde o primeiro dia, queremos pôr um fim a esta guerra. Agora, estamos absolutamente convictos de que vamos terminar esta guerra com uma vitória da Ucrânia.
Retirada de civis de Mariupol. “Provavelmente Guterres foi parcialmente responsável”
Quem pensa que seria a melhor pessoa para mediar estas negociações?
Não interessa. Nao precisamos de mediadores ou intermediários durante as negociações. Mas, se qualquer pessoa mostra a sua boa vontade para ajudar… nós não estamos a recusar qualquer ajuda. O resultado é que não aparece. Não é preciso falar agora se a pessoa [do outro lado] não está pronta para chegar a algum resultado.
O Papa Francisco, o Presidente Biden e o Presidente Macron ainda não vieram a Kiev. Pensa que esses visitas poderiam fazer alguma diferença?
Nós convidámo-los a todos a vir e penso que quando chegar a altura certa e eles estiverem prontos, virão. Seguramente, as suas visitas seriam muito importantes para a Ucrânia.
Acha que estão a atrasar estas deslocações por razões de segurança?
Nós não estamos a atrasar nada. É melhor perguntar às equipas deles. Mais de uma dúzia de líderes estrangeiros já visitaram Kiev. E penso que essa é a melhor garantia de que essas visitas podem continuar.
Pensa que os líderes que não vêem mostram falta de coragem para visitar uma cidade que pode ser atingida a qualquer momento?
Os três primeiros-ministros que vieram logo no início, [Petr] Fiala [da República Checa], que conheci em Praga e a quem pude agradecer novamente em nome do Presidente pela visita, mas também os primeiros-ministros da Polónia e da Eslovénia, foram os mais corajosos a vir. Sim, toda a gente que dá esse sinal de apoio ao vir a Kiev é uma pessoa corajosa, seja homem ou mulher. Porque muitas líderes mulheres também visitaram Kiev neste período.
Antes de o secretário-geral da ONU, António Guterres, vir a Kiev esteve em Moscovo e criticou-o por isso numa entrevista que deu à NBC. A visita mudou a sua avaliação do papel do secretário-geral da ONU?
Eu critiquei mais a sequência da visita do que a visita [a Moscovo] em si mesmo. Mas em função da visita, as Nações Unidas começaram a desempenhar um papel mais relevante na dimensão humanitária, nos corredores humanitários. Foi muito bom que, depois da visita, algumas questões práticas aconteceram no que diz respeito à retirada de pessoas da zona sul da Ucrânia.
Pensa que Guterres deu um contributo positivo para a libertação dos civis de Mariupol?Poderia dizer-se que o seu papel pessoal foi também muito importante, assim como de todo o sistema da ONU.
Diria que essa intervenção teve um efeito prático naquilo que acabou por acontecer em Mariupol e ajudou a convencer os russos a permitirem a retirada de civis de Azovstal?
Sim, sim, é possível. Pelo menos ele falou com Putin. E ele disse-nos que esse assunto foi suscitado por ele. Se as coisas aconteceram de determinada forma, isso significa que provavelmente ele foi parcialmente responsável.
Os bombardeamentos que coincidiram com a visita de Guterres foram propositados por ele estar cá? Viu aí uma espécie de sinal?
Não foi seguramente uma coincidência. Os russos gostam de simbolismo. Recordo-lhe de como eles bombardearam a área na fronteira ocidental da Ucrânia enquanto o Presidente dos EUA estava na Polónia. Entendo que foi mais do que uma mera coincidência.
Foi propositado?
Sim, foi seguramente de propósito e enquanto o secretário-geral da ONU ainda estava na cidade. Isso mostra o nível da atitude deles. Se toda a gente permite que eles se comportem assim e ninguém retira consequências disto, isso significa que ele [Putin] vai continuar a agir assim daqui para a frente. É por isso que toda a gente tem de unir-se contra esta agressão.
Acha que a ONU já devia ter nomeado um negociador para ajudar a resolver este conflito?
Porque é que precisamos de um negociador especial? Precisamos de uma reforma das Nações Unidas, incluindo do Conselho de Segurança. É isso que o meu Presidente defendeu claramente. Ou se reforma ou se acaba [com este modelo] porque temos um agressor no P5 [grupo de membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU] e este agressor pode bloquear qualquer resolução positiva. Portanto, para que é que precisamos dele nas Nações Unidas? Infelizmente, não há vontade política para fazer essa reforma.
Quando acha que esta guerra pode terminar?
Terminará logo que os nossos aliados ocidentais nos forneçam armamento pesado suficiente. É disso que precisamos muito. Sabemos como combater.
Mas primeiro têm de treinar os militares no uso dessas armas…
Não, não, não. Essa é uma narrativa russa, que os ucranianos não sabem combater com armamento moderno. Nós sabemos.
Não é uma narrativa russa. Até um assessor do presidente Zelensky [Arestovich] admitiu que precisariam desse tempo de treino…
Bem, leva algum tempo, sim, e já está a acontecer, por isso não pensem que não sabemos combater com equipamento moderno. A UE deu-nos equipamento e isso significa que estamos prontos para combater com ele.
Acha que há hipótese de a guerra acabar antes do fim do ano ou ainda vai arrastar-se anos?
Não posso especular sobre isso, não sou um especialista militar, não estou no terreno, mas, seguramente, a Ucrânia não está interessada em arrastar esta guerra por um longo período.
Lançaram agora a United 24, para recolher donativos de todo o mundo, que tem o ex-jogador de futebol e treinador Schevchenko como embaixador. O ucraniano mais conhecido em Portugal talvez seja o jogador do Benfica Yaremchuk. Gosta dele?
Seguramente. Ele é maravilhoso.
Vão envolvê-lo de alguma forma nesta iniciativa?
Sim, penso que estaremos em contacto com ele, incluindo na United 24. E ele também poderá ser útil no nosso pedido de adesão à União Europeia, porque, devo lembrar, a nossa seleção nacional ainda tem de jogar a qualificação para o Qatar, ainda temos dois jogos contra a Escócia e, se ganharmos, contra o País de Gales. Seguramente que o Yaremchuk vai jogar e seguramente que vamos ganhar, mas, como ele está a jogar num dos clubes europeus mais importantes, ele também estará a interceder para que a Ucrânia se torne um Estado-membro. A Seleção Nacional ucraniana tem estado envolvida neste desafio e o Yaremchuk, assim que chegar — porque creio que ainda está a jogar no vosso campeonato — irá treinar com a nossa seleção. Até porque, como sabe, o campeonato nacional ucraniano não está a decorrer, por razões óbvias. Mas sim, como pessoa conhecida, como os jogadores de futebol e outras figuras do desporto, irão apoiar ativamente a Ucrânia. Vocês vão ver, ele vai surpreender-vos pela positiva.