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JOSÉ COELHO/LUSA

JOSÉ COELHO/LUSA

Direção de Rio lamenta anúncio de Morais Sarmento. Tropas de Rangel satisfeitas

Morais Sarmento avisou Rio de que iria manifestar posição neutra nestas diretas. Núcleo duro do líder social-democrata surpreendido com timing escolhido e termos utilizados. Hostes de Rangel celebram.

O confirmar de um distanciamento que se vinha cavando há muito. A decisão de Nuno Morais Sarmento em anunciar publicamente que não ia apoiar Rui Rio nas próximas eleições internas do PSD deixou uma sensação agridoce na direção social-democrata. Por um lado, foi um momento de clarificação — já todos tinham percebido o desligamento crescente. Ao mesmo tempo, ninguém ignora que o momento escolhido e os termos usados pelo vice-presidente do partido foram um golpe duro na confiança das tropas rioístas. No lado de Paulo Rangel, o momento foi celebrado: “Foi melhor do que um apoio formal.”

Na segunda-feira, a Comissão Política Nacional (CPN) do PSD reuniu-se para debater vários temas, entre os quais uma eventual coligação pré-eleitoral com o CDS. No final da reunião da direção alargada do partido, Morais Sarmento pediu alguns minutos a sós com Rui Rio para comunicar o que pretendia dizer na entrevista daquela noite à SIC, agendada dali a poucas horas.

Da conversa entre os dois pouco ou nada se sabe. Mas, ao dia de hoje, a sensação geral na direção de Rui Rio é a de que Morais Sarmento não terá transmitido na exata magnitude aquilo que iria revelar mais tarde. O resultado da entrevista acabou, por isso, por ter algum efeito surpresa.

O vice do PSD não só disse que estava indisponível para voltar a ocupar o cargo, como insistiu que não apoiaria qualquer um dos dois candidatos e elogiou as virtudes de ambos, ao ponto de dizer que Paulo Rangel estava tão bem preparado para ocupar o cargo de primeiro-ministro — contrariando, precisamente, a imagem que Rui Rio  se tem esforçado por vender sobre o adversário, a de alguém sem tempo para ter um programa alternativa ao de António Costa e conquistar o país.

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“Preparado? Paulo Rangel está tanto quanto Rui Rio. Mais vale cada um dizer as qualidades que tem, qualquer deles abre mais futuro que António Costa, qualquer deles tem obrigação de ganhar a António Costa. São dois fantásticos candidatos. [Rangel] não geriu a Câmara do Porto. Rui Rio não terá tido os mesmos contactos internacionais”, chegou a comparar Morais Sarmento.

A forma como o fez gelou alguns altos dirigentes do PSD. “Podia não continuar e não fazer isto. O dizer que não dá apoio nenhum tem obviamente um significado político: está mais para lá do que para cá”, lamenta-se na direção de Rui Rio. “Enfim, acaba por ser melhor porque clarifica tudo: todos sabiam que estava mais próximo de Paulo Rangel nesta altura.”

À imagem de Balsemão

A verdade é que a entrevista de Morais Sarmento e a repercussão imediata que teve causou um óbvio regozijo nas hostes rangelistas. Ainda o vice de Rio estava a falar na SIC e começaram a circular fotografias tiradas aos ecrãs das televisões com um oráculo que não deixava margem para segundas e terceiras interpretações. “Não vou apoiar qualquer um dos candidatos”, podia ler-se.

Na reação pública à entrevista de Morais Sarmento, Paulo Rangel preferiu uma reação comedida, não deixando, ainda assim, de notar que era “significativo” que um vice-presidente de Rio não se atravessasse pela recandidatura do atual presidente. Não era preciso esfregar sal na ferida: o ponto estava marcado.

Entre os principais apoiantes de Rangel há quem compare as declarações de Morais Sarmento com as de Francisco Pinto Balsemão, também ele um apoiante de primeira hora de Rui Rio — chegou a incentivá-lo a avançar para as presidenciais de 2016, e foi seu apoiante contra Pedro Santana Lopes e Luís Montenegro. Desta vez, o militante número um do PSD ficou a meio da ponte.

“Posiciono-me dizendo que é bom que os partidos estejam agitados, é sinal que não adormeceram, que vai ganhar o melhor e eu não vou pronunciar-me sobre qual é que vou apoiar. Dou-me muito bem com os dois, acho que são ambos muito válidos”, disse aos microfones da Antena 1. Não muito diferente do que diria Morais Sarmento dias depois.

A forma como o Morais Sarmento fez o anúncio gelou alguns altos dirigentes do PSD. “Podia não continuar e não fazer isto. O dizer que não dá apoio nenhum tem obviamente um significado político: está mais para lá do que para cá”, lamenta-se na direção de Rui Rio. “Enfim, acaba por ser melhor porque clarifica tudo: todos sabiam que estava mais próximo de Paulo Rangel nesta altura.”

O filme de um afastamento anunciado

A par de David Justino, Nuno Morais Sarmento era o vice de Rui Rio com maior lastro político. Ex-ministro da Presidência com Durão Barroso e depois com Pedro Santana Lopes, esteve na origem da candidatura de Rui Rio à presidência do PSD muito antes de ela sair efetivamente do papel. Tornou-se, com naturalidade, uma voz importante no núcleo duro do líder social-democrata — até por ter, algumas vezes, uma opinião diferente da maioria dos dirigentes.

O envolvimento de Morais Sarmento no processo de decisão começou a ser paulatinamente menor nos últimos meses, mesmo antes das eleições autárquicas. Até por razões de impedimento físico, como assumiu o próprio em entrevista à SIC, perfeitamente atendíveis pela restante direção do partido.

“Vinha faltando cada vez mais às reuniões. Ou então só aparecia no fim”, confessa ao Observador um dos homens próximos de Rui Rio. “Não houve um corte repentino, as coisas foram decorrendo com naturalidade”, concorda outro alto dirigente social-democrata. “E Rui Rio sempre contemporizou com essas ausências.”

A saída de Nuno Morais Sarmento da direção de Rui Rio terá sido equacionada dadas as circunstâncias no Congresso de 2020. Na altura, houve notícias nunca confirmadas de que o ex-ministro poderia deixar o núcleo mais restrito do líder social-democrata. Morais Sarmento acabou por ficar e, apesar das ausências, continuou a ser uma das vozes mais importantes na definição estratégia do partido.

Em parte, como fez questão de sublinhar em entrevista à SIC, Morais Sarmento foi um dos que com mais veemência ia apontando as autárquicas de 2021 como o alfa e ómega da estratégia que os sociais-democratas deveriam seguir para recuperar o poder.

Na verdade, como sempre defendeu o ex-ministro, as legislativas de 2019 foram encaradas desde o minuto zero como um ponto intermédio de um objetivo maior: recuperar a implantação territorial do partido, inverter a tendência registada nas autárquicas anteriores, precipitar o desgaste do Governo de António Costa e, por fim, vencer as legislativas.

O facto de a saída ter sido um processo gradual não significa que não tenha deixado alguma mágoa. “O gesto não surpreendeu ninguém, mas poderia perfeitamente ter evitado dizer o que disse nesta altura do campeonato. É o que é”, desabafa fonte da direção social-democrata.

Entre os principais apoiantes de Rangel há quem compare as declarações de Morais Sarmento com as de Francisco Pinto Balsemão, também ele um apoiante de primeira hora de Rui Rio -- chegou a incentivá-lo a avançar para as presidenciais de 2016, e foi seu apoiante contra Pedro Santana Lopes e Luís Montenegro. Desta vez, o militante número um do PSD ficou a meio da ponte.

De resto, a proximidade de Nuno Morais Sarmento a Paulo Rangel é um dado adquirido e assumido por todas as partes. Os dois são amigos de longa data, partilharam experiências governativas, estiveram juntos em vários momentos dos respetivos percursos políticos e têm afinidade intelectual.

Aliás, em 2010, Morais Sarmento escolheu estar do lado de Rangel contra um super-favorito Pedro Passos Coelho. Apesar do desfecho anunciado, o antigo ministro preferiu mesmo assim apoiar o agora candidato à liderança do PSD.

Antes disso, em 2008, os dois já tinham sido figuras de proa na era de Manuela Ferreira Leite, o primeiro como presidente do Conselho de Jurisdição, o segundo como líder parlamentar e depois cabeça de lista às europeias — Ferreira Leite, de resto, foi quem cozinhou essa candidatura, depois Rui Rio ter recusado deixar a Câmara Municipal do Porto para entrar na corrida à liderança do PSD.

Por isso, assim que a candidatura de Rangel se tornou o segredo mais mal-guardado nos bastidores do PSD, tornou-se evidente para todos de que Morais Sarmento estaria daí em diante numa situação delicada e naturalmente dividido. “Sabíamos que isto estava a acontecer. Nunca pensámos foi que acontecesse nestes termos”, sublinha fonte da direção social-democrata.

O primeiro sinal público dessa “clarificação” surgiu ainda no início de outubro, também na SIC. Depois de David Justino ter acusado Paulo Rangel de ter sido desleal para com Rui Rio, Morais Sarmento esteve no “Expresso da Meia-Noite” a dizer exatamente o contrário.

“Não comete nada de errado, muito menos será traiçoeiro. Eu não tenho essa leitura”, assumiu na altura Morais Sarmento, contrariando a narrativa dominante que os apoiantes de Rui Rio iam tentando criar junto dos militantes do partidos e da opinião pública e publicada. A divergência de opinião entre os dois mais importantes ‘vices’ de Rio fez correr, naturalmente, alguma tinta. Mas ninguém conseguiu antecipar o iria acontecer a seguir.

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