Inflação, crescimento, juros da dívida e preços do petróleo e do gás. Estes são alguns dos indicadores económicos que terão de ser acompanhados de perto pelo Governo, à medida que se executa o próximo Orçamento do Estado.
Vai Portugal escapar mesmo à recessão? A inflação já estará mesmo a passar o pico? O mercado de trabalho vai continuar a ter o desempenho “notável” que tem tido? Conheça oito gráficos que vão dominar as atenções, no plano da economia, em 2023.
Inflação irá mesmo cair para 4% (mesmo assim o dobro do desejável)?
O Governo antecipa que a inflação irá ser de 4%, em média anual, em 2023. Essa é uma previsão consistente com aquilo que o Banco de Portugal disse esta quinta-feira – o supervisor não fez uma projeção concreta mas indicou que o pico da subida de preços será nesta reta final de 2022.
Mesmo que recue para 4%, o ritmo de encarecimento dos preços no consumidor ainda estará no dobro daquilo que é considerado um nível desejável de inflação. Porém, mesmo essa projeção está envolta em grande incerteza já que depende de fatores imprevisíveis como a guerra na Ucrânia e a evolução dos constrangimentos nas cadeias de abastecimento mundiais.
A inflação homóloga calculada pelo INE para setembro foi de 9,3%, muito perto dos 10% estimados pelo Eurostat para a média europeia. Mas o Banco de Portugal vê “alguns sinais de alívio”, designadamente o facto de as expectativas de preços dos empresários terem registado uma inflexão nas últimas semanas.
Portugal vai mesmo conseguir escapar à recessão técnica?
A definição comum para uma recessão técnica é existirem dois trimestres consecutivos de variações negativas no crescimento trimestral. A primeira estimativa para o crescimento no segundo trimestre apontou para um primeiro bloco de três meses em que a economia tinha baixado, mas o valor acabou por ser revisto para uma estagnação: 0%.
O Banco de Portugal comentou, no Boletim Económico divulgado esta quinta-feira, que “a economia em 2022 fica marcada pela antecipação da recuperação do nível pré-pandemia, que ocorreu logo no primeiro trimestre, e por uma desaceleração posterior, traduzida numa relativa estabilização do PIB“, o que vai ao encontro da estagnação calculada pelo INE para o segundo trimestre, o último para o qual já há dados.
Se para a maioria dos economistas é praticamente inevitável que a Alemanha tenha um período de recessão técnica nos próximos trimestres, devido às dificuldades no abastecimento energético e outros fatores associados, a projeção do Governo que vai estar plasmada na proposta de Orçamento do Estado não aponta para uma recessão em Portugal (isto embora a previsão feita no cenário macroeconómico, de um crescimento de 1,3%, seja uma estimativa para a evolução do Produto Interno Bruto — PIB — em todo o ano e não esteja detalhada a evolução trimestral, que é o que conta para a definição de recessão técnica).
Taxa de desemprego vai continuar em níveis baixos?
Depois de uma redução para 6,6% em 2021, a taxa de desemprego deverá diminuir novamente em 2022, situando-se em 5,8%, um “valor historicamente baixo”, afirmou na quinta-feira o Banco de Portugal.
O maior desafio para a economia portuguesa será conseguir que em 2023 a taxa de desemprego não se afaste dos níveis baixos que têm sido registados. É exatamente desse pressuposto que parte o cenário macroeconómico que irá estar na proposta de Orçamento do Estado para 2023: prevê-se uma estabilização nos 5,6%, tanto em 2022 e em 2023, segundo noticiou o Público.
Esta é uma previsão otimista, já que, como diz o Banco de Portugal, embora o mercado de trabalho continue a manter “um desempenho notável”, manifestou “alguns sinais de moderação ao longo do ano“. Irão esses “sinais de moderação” ser um falso alarme?
As perspetivas são positivas. A análise mais recente do supervisor financeiro afirma que “a percentagem de empresas que reporta dificuldades em contratar pessoal qualificado mantém a trajetória ascendente no terceiro trimestre de 2022, sendo o aumento particularmente notório no setor dos serviços”. Por outro lado, “o número de empregos vagos (isto é, criados pela primeira vez, não ocupados ou prestes a ficar vagos) em cada trimestre tem vindo a aumentar, atingido valores historicamente altos no segundo trimestre”, adianta o Banco de Portugal.
Euribor. Indexante mais usado em Portugal pode mais que duplicar
No Boletim Económico divulgado esta quinta-feira, o Banco de Portugal desvaloriza os riscos associados ao aumento das Euribor no próximo ano, isto caso se confirmem as expectativas de subida que estão implícitas na negociação recente de alguns instrumentos de mercado (como contratos futuros de taxas de juro e outros). Esses instrumentos complexos, neste momento, apontam para que as Euribor possam superar os 3% até ao final de 2023 – embora estes sejam preços de mercado sempre caracterizados por grande volatilidade.
As taxas Euribor subiram esta sexta-feira nos prazos a três, a seis e a 12 meses, prosseguindo a tendência de alguma estabilização nos últimos dias, depois de as taxas médias terem disparado em setembro. Os valores mais recentes para as taxas Euribor são 1,288% no prazo a três meses, 1,897% a seis meses e 2,552% no prazo a 12 meses.
E como é que isto compara com aquilo que nos dizem os tais instrumentos de mercado que, apesar da volatilidade, são os melhores reflexos das expectativas de como as Euribor vão evoluir? Os futuros de Euribor a três meses estão nesta altura a ser negociados a 2,35% para início de maio e a 3,02% para final de 2023.
Noutros prazos, os contratos de Euribor a seis meses estão a ser negociados a 2,65% para o início do ano e a 3,08% para o final de 2023. Ou seja, está a ser prevista uma quase duplicação dos indexantes mais usados em Portugal. Por seu lado, os futuros de Euribor a 12 meses está a negociar a 2,95% para março de 2023 e a 3,11% para outubro de 2023.
Preços do petróleo voltam a subir. Podem ameaçar as contas?
A notícia de que os países da OPEP+ vão cortar as quotas de produção em dois milhões de barris (por dia) fez os preços do petróleo voltarem aos ganhos expressivos, nos mercados internacionais.
Após essa notícia, os preços do petróleo negociado em Londres – o Brent, que serve de referência para as importações portuguesas – voltaram a aproximar-se do patamar dos 100 dólares por barril. Esta sexta-feira, estiveram a cotar acima dos 98 dólares.
E a tendência é para continuar a subir, segundo vários bancos de investimento incluindo o Goldman Sachs. O banco norte-americano aumentou a projeção do preço do Brent para 110 dólares por barril, em 2023. Essa será a média do preço em 2023, mas é possível que no primeiro trimestre do ano a cotação atinja os 115 dólares por barril, segundo a mesma pesquisa.
Ainda não são conhecidas as previsões para o preço do petróleo mas estas irão constar na proposta de Orçamento do Estado a entregar na Assembleia da República na próxima segunda-feira.
Gás natural afastou-se dos recordes mas ainda está em níveis preocupantes
Enquanto os líderes europeus não se entendem sobre a introdução de um limite máximo aos preços do gás natural, os preços da matéria-prima afastaram-se dos máximos históricos fixados nos primeiros meses após começar a guerra na Ucrânia. Porém, continuam em níveis preocupantes para a Europa.
Os preços do gás natural na Europa (TTF) estão a cotar na região dos 175 euros por megawatt-hora, o que é quase quatro vezes mais do que há um ano – e um custo 11 vezes superior à média dos preços ao longo do ano de 2020.
Não é habitual que a proposta de Orçamento do Estado, no cenário macroeconómico, contenha uma previsão para o preço do gás natural, mas este será um indicador essencial que o Governo irá acompanhar ao longo do ano, dada a importância do gás natural, desde logo, para inúmeros setores da indústria nacional, como tudo o que envolve siderurgia, indústria vidreira, metalomecânica, entre muitos outros.
Euro. Moeda única vai continuar abaixo do dólar?
Um outro indicador que o Governo terá de seguir de perto é a cotação do euro nos mercados cambiais, sobretudo na relação com a divisa norte-americana, o dólar. Nos últimos meses, o euro desceu abaixo da paridade em relação ao dólar, o que torna mais caras as importações que chegam a Portugal de produtos denominados em dólares – como o petróleo.
Por essa mesma razão, a desvalorização do euro face ao dólar é um fator indutor de subida dos preços (inflação) e leva a uma deterioração dos chamados “termos de troca”, uma matéria que o Banco de Portugal comentou no Boletim Económico divulgado na quinta-feira. “A perda acumulada de termos de troca da economia portuguesa em 2021 e 2022 não tem precedente desde a adoção do euro, implicando uma perda de rendimento real da economia”.
Dívida pública. Acabaram-se os anos do financiamento barato?
Os bancos centrais, como a Reserva Federal dos EUA e o Banco Central Europeu, estão a comunicar aos mercados que as subidas das taxas de juro vão continuar. Além do impacto para os indexantes como as Euribor, estas indicações monetárias fazem subir os custos de financiamento dos Estados – acabando com a era de juros baixos (e até negativos) que vingou nos últimos anos e que permitiu emitir nova dívida mais barata do que a dívida antiga que ia vencendo. Isso, por sinal, acabou.
Juros a subir. Dívida nova deixa de ser mais barata que a antiga
Portugal entrou em 2022 com taxas de juro a 10 anos nos 0,5% e, a poucas semanas do final do ano, os custos de financiamento no mesmo prazo superam os 3,3%, um aumento que tem subjacente também uma dilatação do prémio de risco em relação ao que paga a Alemanha. O Tesouro alemão começou o ano com juros a 10 anos perto de -0,2% e nesta fase tem custos de financiamento de 2,1%.
Ou seja, a diferença entre Alemanha e Portugal rondava os 70 pontos-base no início do ano, agora é mais de 120 pontos-base, o que traduz um encarecimento efetivo daquilo que o Tesouro português tem de pagar aos investidores para refinanciar a dívida pública.
Além do aumento da generalidade dos juros da dívida, o risco para os países mais endividados da Europa – como Portugal, Itália e Grécia – é que estes prémios de risco se dilatem ainda mais. As taxas de juro de Itália a 10 anos estão em 4,7% e da Grécia em 4,8%, níveis já elevados mas que ainda não levaram o BCE a ativar o seu novo programa de intervenção, o Mecanismo de Proteção da Transmissão. Se os juros e os prémios e risco continuarem a subir, a pressão para que o BCE intervenha vai acentuar-se.