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1976: A hora dos militares
As primeiras eleições presidenciais em democracia foram disputadas em junho de 1976 e na senda da revolução de 1974, três dos principais candidatos eram militares, Ramalho Eanes, Otelo Saraiva de Carvalho e Pinheiro de Azevedo.
O único civil nesta corrida eleitoral foi Octávio Pato, apoiado pelo PCP, que ficaria em quarto lugar nas urnas (com 7,5% dos votos), com o general António Ramalho Eanes a ganhar destacado (com 61,5%) e o major Otelo Saraiva de Carvalho em segundo lugar (com 16,4%).
O almirante Pinheiro de Azevedo foi o terceiro mais votado (14% dos votos), depois de ter passado os últimos dias da agitada campanha eleitoral no hospital, na sequência de um ataque cardíaco sofrido pouco depois de uma conferência de imprensa no Porto.
Com três militares na corrida para suceder a um outro militar, Costa Gomes, a campanha acabou por incidir no papel das Forças Armadas, com o 25 de abril sempre presente nos discursos.
Eanes surge associado ao 25 de novembro de 1975, que pôs fim ao processo revolucionário, e a sua candidatura contou com o apoio dos principais partidos (PS, PPD e CDS) e de outros mais pequenos como o MRPP.
Otelo, figura central na revolução que pôs fim a 48 anos de ditadura, surge com uma candidatura associada ao 25 de abril e apoiada por uma coligação de pequenos partidos de extrema-esquerda.
“Eu estou convencido que o general Ramalho Eanes andou a torpedear o 25 de abril e eu próprio algumas vezes estive para o mandar prender, mas o Otelo nunca deixou”, afirmou Pinheiro de Azevedo, primeiro-ministro de então e o único candidato sem apoio partidário, no Porto, citado pelo Diário de Lisboa de 23 de junho de 1976.
O mesmo jornal dá conta de “pedradas e tiros à passagem por Lamego” da caravana de Otelo e de um morto e seis feridos por ocasião de uma deslocação da comitiva de Ramalho Eanes a Évora.
“Um crescendo de violência está a marcar inesperadamente a campanha para as eleições presidenciais: depois dos incidentes no norte do país à passagem da caravana de Otelo Saraiva de Carvalho, a cidade de Évora, que recebia o general Eanes foi ontem (dia 17 de junho) palco de correrias e tiros de que resultaram um morto e seis feridos”, referiu o jornal.
Na etapa final da campanha, Ramalho Eanes garantia em Lisboa, num comício na Alameda, que o fascismo acabou. “Não voltaremos ao período de antes do 25 de abril. O fascismo morreu neste país”, afirmou.
“A campanha correu o melhor possível, excedendo largamente as expectativas que nós tínhamos a princípio. De norte a sul do país e nas ilhas provou-se que continua vivo o espírito de 25 de abril”, disse Otelo à agência ANOP, num balanço de campanha, mostrando-se convicto de que haveria uma segunda volta. Não houve.
Ramalho Eanes foi eleito a 27 de junho de 1976, logo à primeira volta.
1980: Camarate ensombra ‘duelo’ de generais
A morte de Francisco Sá Carneiro e de Adelino Amaro da Costa a 04 de dezembro de 1980 marcou as presidenciais que viriam a ter lugar três dias depois, disputadas por Ramalho Eanes e Soares Carneiro.
O avião onde seguiam o então primeiro-ministro, Francisco Sá Carneiro, e o ministro da Defesa, Adelino Amaro da Costa, que iam assistir a um comício da candidatura de Soares Carneiro, no Porto, caiu em Camarate, quando descolava do aeroporto da Portela, em Lisboa, provocando a morte de todos os ocupantes.
Os candidatos às presidenciais suspenderam as suas campanhas nessa quinta-feira à noite.
A Comissão Nacional de Eleições (CNE) decidiu que a situação decorrente da morte do primeiro-ministro não constituiu “fundamento legal para o adiamento do ato eleitoral” e este realizou-se como previsto a 07 de dezembro de 1980.
As eleições foram disputadas sobretudo por dois generais, António Ramalho Eanes, que se recandidatou a Presidente da República como independente, e o general António Soares Carneiro, considerado um conservador e apoiado pela Aliança Democrática (AD), formada pelo PSD, CDS e PPM e liderada por Sá Carneiro.
Otelo Saraiva de Carvalho, o segundo candidato mais votado nas presidenciais de 1976 (com 16,4%), também se apresentou nesta corrida eleitoral, alcançando apenas 1,4% dos votos, enquanto candidatos como Galvão de Melo, Pires Veloso e Aires Rodrigues, não chegaram a 1%.
O candidato lançado pelo PCP, Carlos Brito, viria a desistir a escassos dias das eleições a favor de Eanes. “Não porque aprove a política e atuação deste enquanto Presidente da República, mas porque é a única alternativa para derrotar o candidato dos partidos reacionários”, explicou o PCP.
Eanes contou também com o apoio dos socialistas, apesar da resistência de Mário Soares, fundador do PS. “Era uma solução de facilidade: apesar de tudo, Eanes tinha força, era Presidente da República, eleitoralmente conhecido e popular em certas áreas e, sobretudo, beneficiava do prestígio que lhe conferia a função”, disse Soares numa conversa com a jornalista Maria João Avillez, confessando que ainda propôs que o PS escolhesse outro candidato, militar ou civil. “Mas a verdade é que não se improvisam candidatos”, afirmou.
A menos de dois meses das eleições, Soares acabou por retirar o seu apoio pessoal a Eanes, desagradado com a “ambiguidade” do candidato e suspendeu as suas funções de secretário-geral do PS até à realização das presidenciais.
Com Soares Carneiro, a AD, que vencera as legislativas disputadas pouco antes, em outubro, tenta cumprir o projeto “Um governo, uma maioria, um presidente”, mas o luto instalado no país após os acontecimentos de Camarate e a realização na véspera das eleições das cerimónias fúnebres de Sá Carneiro e Amaro da Costa, transmitidas pela televisão durante horas, não travaram a vitória de Eanes.
O general foi reeleito Presidente da República com 56,4% dos votos, ficando Soares Carneiro com 40,2%.
1986: A campanha mais longa
A campanha eleitoral para as presidenciais de 1986 foi a mais longa até agora, dado que o Presidente da República só seria escolhido na segunda volta, disputada por Mário Soares e Freitas do Amaral.
No início da campanha, cinco candidatos estavam na linha de partida, todos civis, mas só quatro foram a votos a 26 de janeiro de 1986. Ângelo Veloso, candidato do PCP, desistiu pouco antes a favor de Salgado Zenha, que foi apoiado também pelo PRD.
A primeira volta das eleições acabou por ser as ‘primárias’ da esquerda, disputadas pela independente Maria de Lurdes Pintasilgo, Salgado Zenha e Mário Soares, apoiado pelo PS, enquanto à direita Freitas do Amaral congregava os apoios de PSD e CDS e surgia como o favorito.
Freitas do Amaral teve a seu lado o recém-eleito primeiro-ministro de então, Cavaco Silva, que pedia estabilidade “para que fortaleça a esperança que nasceu em 06 de outubro”, data das legislativas que deram a vitória ao PSD, pondo fim ao bloco central (coligação PS/PSD) que Soares liderou.
A memória de Sá Carneiro e Amaro da Costa foi evocada em comícios do candidato, com a imprensa a descrever uma campanha em ambiente de festa e Freitas do Amaral a apelar à participação nas eleições. Ficaria à frente na primeira volta com 46,3% dos votos.
Mário Soares, que parecia à partida em desvantagem devido ao desgaste no cargo de primeiro-ministro, acabou por ficar em segundo lugar na votação de 26 de janeiro, com 25,4% dos votos.
Na primeira etapa da campanha, Soares foi agredido na Marinha Grande num protesto com palavras de ordem contra os salários em atraso, um incidente condenado pelos seus adversários na corrida eleitoral e que mais tarde seria considerado um ponto de viragem na candidatura. Soares foi referindo que a vitória seria “conseguir passar à segunda volta”.
A candidatura de Lurdes Pintasilgo, antiga primeira-ministra de um governo de iniciativa presidencial de Ramalho Eanes, surgiu como “uma resposta ao descrédito político gerado pelo sistema” e a sua campanha chegou a ser descrita como “a caravana do sonho”, mas nas urnas não viria a conseguir mais de 7,3% dos votos.
Salgado Zenha contou na campanha eleitoral com o apoio do presidente cessante, Ramalho Eanes, e a mulher do general, Manuela Eanes, participou na campanha ao lado do antigo dirigente do PS e ex-ministro de Soares. A imprensa deu conta de apelos de várias figuras do PS a Zenha para que desista. “Não desisto”, respondeu. Nas urnas viria a obter 20,8% dos votos.
Na segunda volta, a esquerda uniu-se para travar Freitas do Amaral. O PCP convocou um congresso extraordinário para decidir sobre o voto em Soares e acabou por tomar essa decisão.
Na televisão ficou o testemunho de uma popular que diz ter votado em Zenha, mas vai tomar “sais de frutos para votar em Soares”. E, na etapa final da campanha, Soares considera que o seu principal adversário já não é Freitas do Amaral, mas a abstenção.
“Não terei de mudar o discurso, a estratégia ou os aliados, a minha especialidade é a coerência e não a pirueta”, apontou, por sua vez, Freitas do Amaral à partida para a segunda volta.
A 16 de fevereiro de 1986, Mário Soares ganhou com 51,1% dos votos e Freitas do Amaral ficou com 48,8%, a menos de 140 mil votos.
1991: Debate aceso entre Soares e Basílio Horta anima campanha
Nas eleições presidenciais de 1991, Mário Soares foi reeleito Presidente da República, com mais de 70% dos votos, tendo como principal concorrente Basílio Horta e com o PCP a levar até ao fim a candidatura de Carlos Carvalhas.
A principal surpresa destas eleições viria do resultado da candidatura comunista, que alcançou 12,9% dos votos, enquanto Basílio Horta, apoiado apenas pelo CDS, obteve 14,1%.
“Sou socialista, como sempre fui”, lançou Soares ao anunciar a sua recandidatura, afirmando-se também “republicano e laico”. O presidente cessante demarcava-se assim do apoio que o PSD, na altura liderado pelo então primeiro-ministro Cavaco Silva, manifestara à sua reeleição, afirmando que não apoiaria qualquer candidatura alternativa a Soares.
“Para mim, uma pugna eleitoral com Mário Soares era um confronto supérfluo, que dificultaria a ação futura do Governo”, explicou Cavaco Silva na sua “Autobiografia Política”, considerando que para o PSD “o combate importante” não era a eleição presidencial de 1991, mas as legislativas que teriam lugar em outubro desse ano.
O espaço à direita acabou por ser preenchido por Basílio Horta, que viria a criticar Soares pelo seu papel na descolonização e protagonizou um acesso debate televisivo com o presidente e candidato, confrontando-o com as polémicas que então envolviam Macau. Na altura, o chefe de Estado tinha responsabilidade constitucional na administração do território e na escolha do governador.
Nesse debate, o candidato apoiado pelo CDS acusou Mário Soares de ser “padrinho da Emaudio”, em alusão a uma empresa com negócios em Macau. Face ao ar indignado de Soares, Basílio acrescentava que se referia a “padrinho no sentido de protetor”. “Eu sou uma pessoa impoluta. Sou um homem que toda a vida fez política não por dinheiro”, afirmou Soares, enquanto o seu adversário lançava: “os seus amigos não são”.
No final, Soares lamentou que os portugueses não tenham assistido a um debate “com a elevação” do que teve com Freitas do Amaral, seu adversário em 1986. “Não tive à minha frente um homem com a mesma qualidade”, disse.
As eleições, que tiveram lugar a 13 de janeiro de 1991, contaram ainda com a participação de um candidato da UDP, Carlos Marques, que obteve 2,5% dos votos.
O candidato apoiado pelo PCP, Carlos Carvalhas, assumiu no ano seguinte a liderança comunista, substituindo o histórico Álvaro Cunhal como secretário-geral do partido.
Soares conseguiu quase 3,5 milhões de votos e seria eleito para um segundo mandato ultrapassando o recorde de 3,2 milhões de votos obtido por Ramalho Eanes quando foi reeleito em 1980.
1996: Sampaio e Cavaco entre o diálogo e o país católico
Após meses de tabu, Cavaco Silva, primeiro-ministro durante dez anos, lançou-se na corrida presidencial de 1996 para defrontar o socialista Jorge Sampaio, numa campanha em que se falou do “Portugal católico”, de diálogo e de abrangência.
Jerónimo de Sousa, apoiado pelo PCP, e Alberto Matos, da UDP, também estiveram na linha de partida, mas não chegaram a ir a votos.
As eleições legislativas realizadas em outubro de 1995 tinham dado a vitória ao PS, pondo fim a uma década de governo PSD, oito dos quais com maioria absoluta.
Jorge Sampaio, presidente da Câmara de Lisboa, anunciou a sua candidatura logo no início desse ano, mas Cavaco Silva viria a manter durante meses a incerteza quanto à intenção de se candidatar a Belém.
Logo no arranque da campanha os apoiantes cavaquistas apontavam o passado “esquerdista” de Sampaio, lembrando que tinha sido secretário de Estado de um governo liderado por Vasco Gonçalves em 1975. Num debate televisivo, Cavaco ataca o passado de Sampaio, enquanto Jerónimo de Sousa critica o passado do ex-primeiro-ministro como governante e assumia-se contra o envio de tropas portuguesas para a Bósnia.
Sampaio queixa-se que a sua vida está a ser investigada, nomeadamente o primeiro casamento, que acabou em divórcio. Cavaco nega qualquer envolvimento da sua candidatura.
“Portugal é católico”, gritou Cavaco Silva no Minho, citado pela imprensa, que refere também as alusões do candidato à família “como célula da sociedade”. E Eurico de Melo, uma figura destacada do PSD, pediu o voto em Cavaco Silva “católico e bom chefe de família”.
Também no norte, Sampaio apelou ao seu adversário para que deixe de “dividir os portugueses” por convicções partidárias ou credos religiosos. “Não nos venham confundir agora andando 30 anos para trás”, afirmou em Viana do Castelo.
Ao longo da campanha, Cavaco Silva foi também alertando para “os perigos” da concentração de poderes na mesma cor política, numa alusão ao governo socialista e apelou aos eleitores para compararem a sua “obra” como primeiro-ministro e a “ausência de obra” de Sampaio, ao mesmo tempo que apontava a convergência entre PS e PCP, com a candidatura comunista a desistir a favor do candidato socialista.
Por seu lado, Sampaio insistiu, nos vários comícios realizados noite após noite, num espírito de abrangência, gritando “Portugal, Portugal, Portugal”, quando ouvia o seu nome. No final da campanha, a presença de ministros de António Guterres na campanha foi mais notória, abrindo caminho ao discurso do diálogo e da estabilidade face ao “perigo” de uma vitória de Cavaco retaliar a derrota do PSD nas legislativas.
Jorge Sampaio foi eleito à primeira volta com 53,91% dos votos e Cavaco Silva ficou com 46,09% e esperou mais dez anos para chegar a Belém.
2001: Campanha marcada pela polémica do urânio empobrecido
Jorge Sampaio foi reeleito Presidente da República a 14 de janeiro de 2001, com uma elevada abstenção, após uma campanha ‘contaminada’ pela polémica do uso de urânio empobrecido no Kosovo.
Garcia Pereira, Ferreira do Amaral, Fernando Rosas, António Abreu e Jorge Sampaio surgiram por esta ordem no boletim de voto dessas presidenciais, as primeiras em que os emigrantes puderam votar.
A campanha ficou marcada pelo uso de urânio empobrecido no Kosovo e seus possíveis efeitos nos militares portugueses que ali se encontravam em missão. A polémica surgiu após a morte do soldado Hugo Paulino semanas depois de ter regressado do Kosovo, onde participou numa missão da Nato entre março de 1999 e fevereiro de 2000.
Em janeiro de 2001, dias antes das eleições, o governo socialista de então, pela voz do ministro da Defesa, Júlio Castro Caldas, viria a reconhecer, em entrevista na televisão, que sabia que a NATO bombardeou o Kosovo com munições de urânio empobrecido. O ministro alegou que “não foi considerado que havia grau de ameaça nuclear” e a polémica instalada dificultou a campanha do ‘presidente-candidato’ Sampaio, apoiado pelo PS.
Em plena campanha, Jorge Sampaio, enquanto presidente cessante, teve de convocar o Conselho Superior de Defesa Nacional para analisar a continuação das forças militares portuguesas nas missões de paz nos Balcãs à luz das novas revelações.
O seu principal adversário, Ferreira do Amaral, do PSD, acusou Sampaio de falta de protagonismo e de “proteger o poder socialista”. Sampaio apelou no sentido de se evitar fazer “das presidenciais um julgamento do governo”.
António Abreu, candidato do PCP, também não poupou críticas ao governo sobre esta matéria, mas a principal surpresa da candidatura comunista acabou por ser a decisão do comité central do PCP de a levar até ao fim.
Mais à esquerda, Fernando Rosas, do BE, criticava o candidato comunista ao mesmo tempo que pedia a demissão do Chefe de Estado-Maior do Exército e do ministro da Defesa, enquanto o candidato apoiado pelo MRPP, Garcia Pereira, exigia a retirada imediata das tropas nacionais do Kosovo e reconhecia que Sampaio tinha a reeleição assegurada.
Jorge Sampaio tornou-se o terceiro Presidente da República a ser reeleito (conseguiu 55,5 por cento dos votos), repetindo o sucedido com Ramalho Eanes em 1980 e com Mário Soares em 1991, mas a abstenção acabou por rondar os 50%.
Durante a campanha, surgiu também a suspeita de que perto de 500 mil eleitores já falecidos constariam dos cadernos eleitorais, o que foi muito criticado pelos partidos da oposição, com o governo a considerar o número apontado “especulativo” e “exagerado”, dois anos depois de ter feito uma limpeza dos cadernos de recenseamento.
Ferreira do Amaral conseguiu 34,6% dos votos, António Abreu 5,1%, Fernando Rosas 3% e Garcia Pereira 1,5%.
2006: Embate entre Soares e Cavaco Silva na corrida para Belém
Cavaco Silva, Mário Soares e Manuel Alegre foram os principais candidatos nas presidenciais de 2006, com o primeiro a dramatizar a importância das eleições para o futuro do país e os dois socialistas a disputarem o mesmo espaço.
Francisco Louçã também se apresentou na corrida eleitoral com a pretensão de capitalizar o descontentamento à esquerda pela existência de duas candidaturas na área do PS e de mobilizar os abstencionistas.
As presidenciais de 2006 contaram ainda com dois candidatos repetentes: Jerónimo de Sousa, apoiado pelo PCP, que entrara na corrida eleitoral 10 anos antes, vindo a desistir a favor de Jorge Sampaio, e Garcia Pereira, do PCTP/MRPP, que já tinha concorrido nas eleições de 2001.
Durante a campanha, Cavaco Silva, apoiado pelo PSD e pelo CDS-PP, dramatizou a escolha do Chefe de Estado, sublinhando que as eleições iriam condicionar o futuro do país “nos próximos 10, 15 ou mais anos”. “É uma escolha muito diferente da que teve lugar em outras eleições presidenciais”, sublinhou o antigo primeiro-ministro do PSD, logo no arranque da campanha, prometendo ser uma voz dos que “não têm voz”.
Mário Soares, que esteve no Palácio de Belém entre 1986 e 1996, período que coincidiu com as funções de Cavaco Silva como primeiro-ministro, surgiu de novo como candidato nestas eleições, aos 81 anos, apoiado pelo PS e tendo a seu lado por várias vezes durante a campanha o primeiro-ministro de então, José Sócrates.
Soares apontou como adversário Cavaco Silva, que disse estar há dez anos a ‘mastigar’ a derrota com Jorge Sampaio.
Mas, na etapa final da campanha, Soares, que começara por ligar o “cavaquismo” a “interesses ilegítimos”, passou a omitir o seu principal adversário e deixou as críticas para os membros do governo que surgiram a seu lado. O candidato socialista concentrou-se então no combate à abstenção considerando-a o principal inimigo.
Também da área socialista, Manuel Alegre, apresentou-se na campanha sem apoios partidários e prometeu combater os interesses instalados pelos “donos da política”. Ao longo da campanha passou por locais que disse serem as suas referências e memórias, como o Forte de Peniche, homenageou os presos políticos e declarou que a sua candidatura era “um novo 25 de abril”.
Jerónimo de Sousa foi endurecendo o tom das críticas a Cavaco Silva ao longo da campanha e lembrou o passado do ex-primeiro-ministro, apontando a “deriva autoritária” e a possibilidade de vir a ser um presidente “frio e insensível”.
Garcia Pereira mostrou-se convicto de que a eleição ficaria decidida sem necessidade de uma segunda volta e distribuiu críticas pelos adversários. “Todos os candidatos, e à cabeça deles está o dr. Cavaco Silva, têm feito uma campanha onde não exprimem um ponto de vista concreto sobre uma única questão”, disse o candidato apoiado pelo PCTP/MRPP.
Marcelo Rebelo de Sousa, ex-líder do PSD, apareceu na campanha de Cavaco Silva pela primeira vez em Viseu, considerou-o o candidato “mais ajustado” para o lugar de Presidente da República e defendeu a sua eleição à primeira volta.
“É o que tem mais sensibilidade para ajudar o governo”, salientou, em declarações aos jornalistas.
Nas eleições disputadas a 22 de janeiro, Cavaco Silva foi eleito logo na primeira volta, ao alcançar 50,54%, Manuel Alegre surpreendeu em segundo lugar com 20,74% e Mário Soares surgiu apenas na terceira posição com 14,31%.
Jerónimo de Sousa foi o quarto mais votado com 8,64%, Francisco Louçã ficou com 5,32% dos votos e Garcia Pereira ficou com 0,44%.
2011: Campanha tropeça na crise e no caso BPN
O caso BPN e os sinais crescentes de crise estiveram patentes na campanha para as presidenciais de janeiro de 2011, com Cavaco Silva a recandidatar-se, tendo como principal adversário o socialista Manuel Alegre.
Os independentes Fernando Nobre e Defensor Moura, o comunista Francisco Lopes e o deputado regional madeirense José Manuel Coelho do Partido Nova Democracia também se apresentaram como candidatos nestas eleições.
Defensor Moura lançou o tema BPN num debate televisivo com Cavaco Silva, candidato apoiado por PSD e CDS-PP. Durante a campanha, o candidato independente e deputado socialista voltou a exigir explicações sobre as “trapalhadas” do presidente cessante e o universo BPN.
O Banco Português de Negócios (BPN), um banco privado criado em 1993, viria a dar origem a um escândalo mais de uma década depois, com o envolvimento de figuras ligadas ao ‘cavaquismo’. Devido à falta de liquidez, o banco acabou por ser nacionalizado, com custos para os contribuintes.
“O Presidente da República, como mais alto magistrado da Nação, tem obrigação de demonstrar que não tolera qualquer espécie de corrupção ou clientelismo”, considerou o candidato independente. Na campanha de Manuel Alegre, apoiado pelo PS e pelo Bloco de Esquerda, as referências a este caso vieram sobretudo do BE.
Em campanha no distrito de Braga, Cavaco Silva acusou os adversários de “vil baixeza”, dizendo que foi montada contra si uma “campanha de calúnias, de mentiras, de insinuações”.
“Cavaco Silva olha para nós como um aristocrata ofendido com o atrevimento da populaça e diz-nos que a crítica é vil baixeza. Mas, dr. Cavaco Silva, vil baixeza foi a fraude financeira que agora está a arruinar o país da quadrilha do BPN, dos seus ex-ministros, daqueles ex-ministros cheios de cumplicidades, que protegeram os seus, distribuindo o saque contra o nosso país, contra a nossa economia e contra o nosso povo”, atacou o líder do BE, Francisco Louçã, num comício da candidatura de Alegre.
A crise foi outro assunto em destaque ao longo do período eleitoral. Alegre chegou a sugerir a Cavaco Silva para interromper a campanha para “fazer diligências junto de chefes de Estado e de entidades da União Europeia” para travar a subida dos juros da dívida, em defesa da “soberania nacional”.
Cavaco ignorou o repto alegando que revelava “uma tal ignorância da política externa” que não merecia comentários. Num dia de campanha marcado pela divulgação dos dados de execução orçamental e pela projeção do Banco de Portugal, que apontava para a entrada do país em recessão em 2011, o candidato presidencial apoiado por PSD e CDS-PP criticou: “parece que há alguns que nem sabem” que o Fundo de Estabilização Europeu apenas entrará em Portugal “a pedido expresso do próprio Governo”.
“Se o Governo não pedir, ele nunca entrará em Portugal. Por isso eu tenho repetido e reafirmo que não se deve especular porque prejudica o país em relação às hipóteses, são apenas hipóteses, de Portugal ter que recorrer a instituições internacionais para conseguir refinanciar-se”, disse Cavaco Silva.
Na reta final da campanha, Cavaco Silva também afirmou que uma segunda volta das presidenciais teria custos “desde logo pela via da contenção do crédito e pela subida das taxas de juro”.
No Algarve, em frente à casa de férias de Cavaco Silva, José Manuel Coelho pediu aos eleitores para afastarem “os que enganam o povo”.
A 23 de janeiro de 2011, Cavaco Silva foi reeleito com 52,95% dos votos, Alegre alcançou 19,76%, Fernando Nobre 14%, Francisco Lopes 7,14%, José Manuel Coelho 4,5% e Defensor Moura 1,5%.
*Jornalista da Agência Lusa