Nasceu em São Pedro, cresceu em Santo António. Desde cedo que o destino quis que Cristiano Ronaldo andasse perto das nuvens — e ele próprio fez questão de aprender a chegar perto dos céus. Na Madeira, no Funchal, foi o quarto filho de Dolores e José Dinis e o irmão mais novo de Hugo, Elma e Kátia. Os quatro filhos do casal Aveiro partilhavam um único quarto e Ronaldo, tal como qualquer outro cliché, nunca quis mais nada que não uma bola nos pés e uma baliza pela frente.
Entrou no já mítico Andorinha, onde o pai era o responsável pelos equipamentos, aos sete anos e em 1992. “Ele já jogava muito bem à bola. Começava já desde a manhã, mais os outros miúdos, e passava o dia inteiro a jogar. Tinha o dom da bola e é por isso que se tornou o melhor jogador do mundo. Merece tudo”, contou recentemente Rui Silva, antigo funcionário do clube, à Agência Lusa.
Aos 10 anos, depois de dar nas vistas pelo modesto Andorinha nas competições regionais dos escalões de formação, deu o salto para o Nacional a troco de 22 bolas e dois equipamentos. Em 1997, quando Aurélio Pereira era o homem forte do scouting do Sporting, os leões descobriram Cristiano Ronaldo na Madeira — não pelas fintas, não pelos golos, não pelo potencial. Por uma dívida.
“Havia uma dívida da transferência do Franco [antigo central] que impedia o Nacional de inscrever jogadores se não pagasse direitos de formação, ao Sporting e ao Odivelas. O dr. Marques de Freitas, presidente do Núcleo do Sporting na Madeira e simultaneamente sócio do Nacional, contactou-me, disse que o Nacional tinha um miúdo muito bom e perguntou se podia haver um acerto de contas”, contou o mesmo Aurélio Pereira, há alguns anos, ao jornal Record.
O agora capitão da Seleção Nacional tinha 12 anos mas pouco ou nada demorou a mostrar ao olheiro leonino que aquilo que tinham dito dele não tinha sido manifestamente exagerado. “Hoje em dia seriam 25 mil euros. Mas cinco mil contos, em 1997, tinha outro som. Quando a hipótese me foi colocado nunca supus que pudesse ser possível. Mas, pelo respeito que tinha para com a pessoa, não quis ficar na dúvida. Face à insistência, disse-lhe: ‘O doutor manda-me o miúdo e paga as passagens’. Foi o Núcleo do Sporting na Madeira que pagou as duas passagens, porque ele viajou com o padrinho”, começou por recordar Aurélio Pereira.
“Fui ver e confirmei tudo o que eles tinham dito: uma desenvoltura fantástica, velocidade de execução, jogo aéreo, pé esquerdo, pé direito. Mas o que me impressionou foi ver a aceitação dele perante os outros, todos um ano mais velhos. A dada altura volta-se para trás e diz ‘ó miúdo, tem calma!’. Como é que era possível? ‘Ó miúdo, tem calma’… Quando ele era mais novo. Tive a sensação de que estavam todos completamente rendidos ao que tinha chegado naquele dia. Caiu no Sporting como um ovni. Aquele futebol de rua, o à vontade, o não ter medo de nada. Impressionou-me muito”, completou aquele que é considerado o pai da formação leonina e da Academia que, atualmente, leva precisamente o nome de Cristiano Ronaldo.
Sporting 31 jogos, cinco golos
Ronaldo foi para Lisboa enquanto criança, sozinho e longe dos pais e dos irmãos, para perseguir o sonho do futebol. Chegou a viver no Lar do Jogador, que tinha acesso pela entrada da antiga Nave de Alvalade (o último Pavilhão dos leões até à chegada do João Rocha), e também numa pensão na Avenida Duque de Loulé, bem perto do Marquês de Pombal, antes de fazer parte da primeira geração que viveu e cresceu na Academia de Alcochete.
Bom miúdo, sem grandes rebeldias ou caprichos, só pecava num capítulo: a escola. “Esforçava-se pouco e não tinha muito jeito. Era uma criança muito simpática, tinha muita energia mas era muito irrequieto e isso refletia-se no rendimento enquanto aluno. Era um menino com um olhar triste, um olhar muito triste. Ele tinha muitas saudades de casa. Ligava para casa a chorar para a mãe. Marcou-me por ser afetivo, por ser muito preocupado com a família”, contou Margarida Miranda, professora do capitão da Seleção, à Rádio Observador.
O foco, portanto, estava todo no futebol. Estreou-se pelos infantis numa vitória por 28-0 em Santa Iria da Azóia em que marcou 10 golos, teve de ser operado ao coração aos 15 anos devido a uma arritmia que ainda lhe colocou a carreira em stand by e chegou à equipa principal na época seguinte e por convicção de László Bölöni — que ficou particularmente impressionado com a capacidade de drible do português. Nessa temporada, para além de ser o primeiro formando da nova Academia a tornar-se profissional, assumiu-se também como o primeiro jogador a atuar pelos Sub-16, Sub-17, Sub-18, equipa B e equipa principal do Sporting num único ano.
Estreou-se em setembro de 2002, no início da única época completa que cumpriu nos leões, contra o Sp. Braga. No mês seguinte, numa partida que entretanto se tornou mítica, fez os primeiros golos pelo Sporting com um bis contra o Moreirense — numa noite fria em Moreira de Cónegos que tem sido constantemente rotulada como o início do conto de fadas. As exibições de Cristiano Ronaldo pela equipa leonina não passavam ao lado dos principais clubes da Europa e o jogador português chegou a ficar perto de assinar pelo Liverpool, pelo Barcelona ou pelo Arsenal (sendo que, neste último caso, chegou mesmo a viajar até Londres para conversar com o treinador Arsène Wenger).
Certo é que, apesar as abordagens, Ronaldo ficou em Alvalade até ao fim da época — fez 31 jogos, marcou cinco golos e assinou três assistências num ano em que o Sporting ficou em terceiro na Liga, a 27 pontos do campeão FC Porto. Até que, em agosto de 2003, tudo mudou. Os leões receberam e venceram o Manchester United na inauguração do novo Estádio José Alvalade e o avançado teve uma exibição brilhante que penalizou, essencialmente, o lateral irlandês John O’Shea.
Em 2013, logo depois de terminar a carreira de treinador, Alex Ferguson explicou a forma como a contratação de Cristiano Ronaldo por parte do Manchester United ficou fechada naquela noite de agosto, em Lisboa — e revelou que o plano inicial já era contratar o jogador, por já estar referenciado e sublinhado por Carlos Queiroz, mas deixá-lo emprestado por um ano ao Sporting.
“Os jogadores, no banco de suplentes, só me diziam: ‘Boss! Que jogador que ele é!’. E eu respondia ‘está tudo bem, temo-lo controlado’, como se o negócio já estivesse feito há 10 anos. Disse ao nosso roupeiro Albert para ir ao camarote presidencial e dizer ao Peter Kenyon, o diretor desportivo, para descer ao intervalo. E apertei com ele, disse que não podíamos sair do estádio sem o contratar. O Kenyon falou com as pessoas do Sporting e pediu autorização para o contratar. Ele estava com o empresário numa pequena cabine, no interior do estádio, quando lhe fomos dizer que gostávamos de o ter no Manchester United”, contou o escocês na autobiografia. No dia seguinte, Cristiano Ronaldo, a mãe, a irmã mais velha, Jorge Mendes e um advogado estavam num avião particular a caminho de Inglaterra.
Manchester United 292 jogos, 118 golos
Apesar de chegar com o rótulo de adolescente mais caro da história da Premier League, o jogador português foi apresentado sem pompa nem circunstância e em conjunto com Kléberson, brasileiro de 24 anos que tinha ajudado o Brasil a conquistar o Mundial do Japão e da Coreia no ano anterior e que até ali jogava no Athl. Paranaense. Ao lado dos dois, Alex Ferguson. Estádio vazio, pouca imprensa, pouco alarido. Kléberson era o primeiro brasileiro da história do clube, Ronaldo o primeiro português; mas nem isso entusiasmou os britânicos. Na altura, a notícia do The Guardian tinha como título: “Adolescente fica com a camisola número 7 de Beckham”. O agora capitão da Seleção Nacional até pediu para jogador com o 28 — número que usava no Sporting — mas Ferguson insistiu que aceitasse o sete.
Sete esse que tinha sido de George Best, Bryan Robson, Eric Cantona e, até ao ano anterior à chegada de Ronaldo, de David Beckham. O miúdo de 18 anos que chegou a Inglaterra com 25 jogos no Campeonato português, barba mal semeada e dentes desalinhados aceitou carregar o mítico número nas costas. E foi a primeira vez que o mundo viu uma das uniões camisola-número mais rentáveis da história do futebol. Este pormenor, ainda que para Ferguson fosse a certeza de que o português ia ser um dos símbolos da história do Manchester United, não caiu bem junto dos ingleses.
Nesse mesmo texto que dava conta da chegada de Cristiano Ronaldo, o The Guardian recordava que Ricardo Quaresma teria sido melhor investimento, já que “o jogador de 19 anos está acima de Ronaldo em termos de desenvolvimento”. Na estreia em Old Trafford, quatro dias depois da apresentação, não marcou nem fez uma grande exibição. Mas não foi preciso. Na altura, George Best chamou-lhe “indubitavelmente a estreia mais entusiasmante” que já tinha visto.
O primeiro golo apareceu em novembro, com um livre direto contra o Portsmouth, mas nem os seis que marcou ao longo dos 40 jogos em que participou durante a temporada — incluindo na final da Taça de Inglaterra, contribuindo para a conquista do título — serviram para convencer por inteiro os adeptos ingleses no geral e do Manchester United em particular. As fintas eram demasiado brasileiras, a rebeldia era demasiado irresponsável, as correrias ficavam demasiado perto do abismo.
“Tem as habilidades todas e faz a festa sozinho, já sabemos isso tudo, mas nada disso é suficiente se não conseguir fazer alguma coisa no fim. Mas temos de nos lembrar, claro, que o rapaz só tem 19 anos. Se tivermos isso em conta temos de dizer que ele tem um talento gigantesco. Os pés dele são hipnotizantes, por vezes. Se conseguir conciliar isso com cruzamentos consistentes, o futuro parece ser assustador”, chegou a dizer Alan Hansen, então comentador da BBC. E o futuro foi mesmo assustador.
Até 2009, Cristiano Ronaldo nunca fez menos de 40 jogos por temporada e marcou um total de 118 golos, conquistando três vezes a Premier League e atingindo o sonho de vencer a Liga dos Campeões em 2008, o mesmo ano em que levantou a Bola de Ouro pela primeira ocasião. Entretanto, num sucesso paralelo, tornou-se a principal referência da Seleção Nacional no pós-Luís Figo: deu nas vistas no Euro 2004, esteve no Mundial 2006 e brilhou no Euro 2008 antes de aparecer no Mundial 2010 já como capitão. Pelo meio, trocou Inglaterra por Espanha e deu início ao capítulo mais brilhante da própria carreira.
Real Madrid 438 jogos, 450 golos
Os 95 milhões que o Real Madrid pagou por Cristiano Ronaldo foram, na altura, um recorde mundial absoluto. Florentino Pérez queria repetir a era dos galácticos que tinha desenhado com Figo, Beckham, Ronaldo e companhia e para além do jogador português contratou Kaká, Benzema e Xabi Alonso num único verão.
Se em 2003 aterrou em Manchester enquanto miúdo de 18 anos que só tinha vencido uma Supertaça Cândido de Oliveira na vida, apresentado em conjunto com outro jogador e apenas com o treinador ao lado, em 2009 teve direito ao aparato todo. E não era para menos. Na altura, o jogador português saltou para o primeiro posto das transferências mais caras de sempre: custou mais de 95 milhões de euros aos cofres merengues. Consigo trazia três Campeonatos ingleses, uma Liga dos Campeões, uma Bota de Ouro e uma Bola de Ouro. Era, oficialmente, o melhor jogador do mundo. E foi assim que foi apresentado.
Se Old Trafford tinha as bancadas despidas naquele longínquo 13 de agosto de 2003, a 6 de julho de 2009 juntaram-se 80 mil pessoas no Santiago Bernabéu para ver chegar Cristiano Ronaldo (com o pormenor de que, dias antes, “apenas” 55 mil tinham assistido à apresentação de Kaká). Se seis anos antes apenas Alex Ferguson posou para as fotografias, em Madrid tinha Florentino Pérez, Alfredo Di Stéfano e Eusébio em pano de fundo. A apresentação do jogador madeirense bateu o recorde de uma outra, 25 anos antes – em 1984, 75 mil pessoas correram para o Stadio San Paolo para dar as boas vindas a Diego Armando Maradona, que acabara de chegar ao Nápoles.
O relvado do Santiago Bernabéu estava a ser retirado e os responsáveis do clube decidiram estender uma passadeira em tons de verde onde Cristiano Ronaldo desfilou, acenou e sorriu. Afinal, como o próprio revelou, estava a concretizar o sonho que tinha desde menino. Fez um breve discurso, gritou o ¡Hala Madrid! da praxe e deu início a uma das histórias mais bonitas do passado recente do futebol espanhol, europeu e internacional. Recebeu das mãos de Di Stéfano a camisola ‘9’, aquela que usou durante a primeira temporada em Madrid, enquanto Raúl ainda estava no plantel. No ano seguinte, agarrou a ‘7’ blanca que acabou por imortalizar.
Estreou-se com quatro jogos seguidos a marcar mas os 33 golos que apontou ao longo da temporada — e que fizeram dele o melhor marcador do Real Madrid — não foram suficientes para conquistar qualquer título nesse primeiro ano. A terceira época no Santiago Bernabéu, com José Mourinho ao comando e a primeira em que conseguiu ganhar a liga espanhola, trouxe-lhe um recorde pessoal absoluto de 60 golos numa única temporada. Tal como já era claro na altura em que deixou o Manchester United, Ronaldo tinha deixado de ser apenas um desequilibrador com influência no corredor e era agora um goleador, uma referência ofensiva, um predador de balizas que colecionava hat-tricks.
A chegada de Carlo Ancelotti ao Real Madrid, em 2013, abriu a porta ao período dourado da história recente dos merengues e teve ligação direta à era de Zidane. Entre 2014 e 2018, os espanhóis conquistaram quatro vezes a Liga dos Campeões, três delas de forma consecutiva, ganharam três Mundiais de Clubes e ainda foram campeões nacionais numa ocasião. Paralelamente, Cristiano Ronaldo venceu quatro Bolas de Ouro em cinco anos e subiu ao patamar de melhor jogador do mundo de forma praticamente unânime.
Enquanto vértice fulcral no triângulo ofensivo que partilhava com Benzema e Bale, o avançado português viveu a melhor fase da carreira com Zidane enquanto treinador. O francês percebeu que Ronaldo, já com mais de 30 anos, não tinha de jogar sempre 90 minutos — tinha de jogar sempre mas não precisava de cumprir cada instante de cada partida quando os resultados já estavam mais do que resolvidos. O jogador aprendeu a gerir o esforço, a preparar-se para os embates mais importantes e focar-se em ser decisivo quando tal lhe era exigido.
No fim, ao longo de nove temporadas e de praticamente uma década no Real Madrid, deixou os merengues enquanto melhor marcador da história do clube, melhor marcador de sempre na Liga dos Campeões, melhor marcador do clube na liga espanhola, jogador com mais jogos com três ou mais golos na história da liga espanhola e ainda o atleta com mais golos apontados numa única época pelo clube.
Na Seleção Nacional, depois dos Mundiais pouco conseguidos tanto em 2010 como em 2014 e do desapontante Euro 2012, Cristiano Ronaldo atingiu o único patamar que lhe faltava na carreira em 2016. Em França, num Campeonato da Europa onde Portugal só esteve porque o avançado fez um hat-trick no decisivo playoff de apuramento contra a Suécia, a seleção de Fernando Santos derrotou a equipa anfitriã e conquistou o primeiro troféu internacional da própria história. Ronaldo lesionou-se ainda na primeira parte da final, saindo do relvado de maca e em lágrimas, e assumiu o papel de principal motivador dos colegas até ao derradeiro instante do prolongamento. Saltou com o golo de Éder, empurrou o selecionador quando percebeu que estava ganho, abriu os braços em direção ao céu e chorou quando soou o apito final. Aconteça o que acontecer, foi o capitão que levou a Seleção Nacional ao degrau mais alto a que alguma vez tinha chegado.
Juventus 134 jogos, 101 golos
Em maio de 2018, ainda no relvado de Kiev e depois de conquistar a terceira Liga dos Campeões consecutiva com o Real Madrid, Cristiano Ronaldo deixou a ideia de que poderia não voltar a vestir a camisola merengue. O comentário surgiu na sequência de meses de avanços e recuos na negociação da renovação com Florentino Pérez — e o jogador partiu para a Rússia e para o Campeonato do Mundo já com a ideia de que não regressaria ao Santiago Bernabéu.
Depois do Mundial, onde Portugal foi eliminado nos oitavos de final pelo Uruguai, caiu a bomba: ao fim de quase uma década, Cristiano Ronaldo estava de saída do Real Madrid e ia rumar à Juventus, que fazia um completo all in para ir atrás da conquista da Liga dos Campeões que escapa desde 1996. Os 100 milhões que os italianos pagaram, na altura, foram um recorde na Serie A e o valor mais alto alguma vez pago por um jogador com mais de 30 anos.
“Foi uma decisão fácil. Vendo o poderio que a Juventus tem, para mim, é uma das melhores equipas do mundo. É uma decisão que vem acontecendo ao longo do tempo. Sempre quis jogar aqui e sempre o disse aos meus companheiros mais próximos. É um passo importante na minha carreira, o melhor clube italiano, com grandes jogadores e um grande presidente. É mais um desafio, sempre gostei de desafios. Há jogadores que com a minha idade vão finalizar a carreira para o Qatar ou China, eu venho rejuvenescer para um clube grande como este. Estou feliz, agradecido à Juventus pela oportunidade de continuar a minha brilhante carreira. Não vim aqui passar férias, vou tentar surpreender-vos uma vez mais. Quero brilhar, deixar a minha marca. Vou estar preparado e tenho a certeza de que vai correr bem. É um passo à frente na minha carreira”, atirou Ronaldo na apresentação em Turim, onde se estreou a marcar com um bis frente ao Sassuolo.
A passagem de três anos por Itália, que trouxe duas ligas, uma Taça e uma Supertaça, teve essencialmente uma frustração: a Liga dos Campeões. Cristiano Ronaldo foi uma contratação completamente virada e direcionada para a Europa mas a chegada do jogador português coincidiu com uma quebra de rendimento da Juventus e com algum desnorte a nível institucional e diretivo. Massimiliano Allegri saiu de forma algo inexplicável em junho de 2019, Maurizio Sarri durou uma época, Andrea Pirlo foi chamado com base naquilo que tinha feito como jogador e esquecendo a ausência de experiência e Allegri voltou em maio do ano passado.
Nas três épocas com Ronaldo, a Juventus nunca foi além dos quartos de final da Liga dos Campeões e perdeu até uma hegemonia interna que parecia impenetrável, perdendo o título de 2020/21 para o Inter Milão. No verão de 2021, depois de um Euro 2020 onde Portugal não foi além dos oitavos de final mas onde o avançado igualou o registo de Ali Daei enquanto melhor marcador de sempre por seleções, deixou Turim para trás das costas e apanhou um avião para Manchester. Primeiro, para o City; no fim, para o United.
Manchester United 54 jogos, 27 golos
Durante vários dias, como o próprio admitiu na recente entrevista a Piers Morgan, Cristiano Ronaldo teve tudo acertado com o Manchester City de Guardiola. Um telefonema de Alex Ferguson, porém, abriu a porta ao regresso a Old Trafford. “Segui o meu coração. Ele disse-me: ‘É impossível ires para o Manchester City’. E eu respondi ‘ok, boss'”, contou o português, que recuperou a camisola ‘7’ depois de Cavani aceitar abdicar do número e quebrou todos os recordes de vendas das camisolas nos primeiros dias depois da oficialização da contratação.
Voltou a estrear-se logo em setembro, contra o Newcastle e com dois golos, recebendo uma gigantesca ovação por parte dos adeptos. A época que o viu atingir o golo 800 da carreira, porém, não foi bem conseguida: Ole Gunnar Solskjaer foi despedido logo em novembro e o Manchester United optou por contratar Ralf Rangnick para suceder ao norueguês, deixando claro que o alemão iria ocupar a posição de forma interina e que no fim da temporada mudava-se para o cargo de diretor desportivo. Uma decisão que, como o próprio já assumiu, Ronaldo não entendeu.
“Depois de terem despedido o Solskjaer, contrataram o Ralf Rangnick, que é diretor desportivo. Ninguém percebeu. Um clube como o Manchester United contratar um diretor desportivo para treinador surpreendeu-me a mim e surpreendeu o mundo todo. Se nem sequer era treinador, como é que ia estar à frente do Manchester United? Nunca tinha ouvido falar dele”, atirou, também na entrevista a Piers Morgan.
Cristiano Ronaldo foi o melhor marcador da época dos red devils mas o Manchester United não foi além de um sexto lugar que não garantiu a qualificação para a Liga dos Campeões — ou seja, pela primeira vez na carreira, o avançado português ia disputar a Liga Europa. Ainda antes do fim da temporada desportiva, a família do capitão da Seleção foi afetada por uma tragédia inesperada com a morte de um dos filhos gémeos no momento do parto: um episódio que, como se percebeu nas últimas duas semanas, ditou o futuro desportivo do jogador.
Ronaldo não se apresentou na pré-época do Manchester United, citando “motivos pessoais”, e o mundo passou todo o mercado de transferências à espera de que o jogador português fosse anunciado num qualquer outro clube — entre Sporting, Nápoles, Chelsea, Bayern Munique ou Barcelona. No último dia da janela de mercado, nada mudou. E o avançado apresentou-se aos trabalhos, levantando ondas desde o primeiro dia ao sair mais cedo de Old Trafford e sem esperar pelo apito final num particular contra o Rayo Vallecano.
Perdendo o lugar no onze inicial, por opção e por não estar no melhor momento a nível físico após ter falhado toda a pré-época, Cristiano Ronaldo foi sendo utilizado essencialmente na Liga Europa e fez o primeiro golo da temporada de grande penalidade e contra o Sheriff. Seguiu-se a hecatombe do Manchester United contra o Manchester City em que não chegou a sair do banco, a partida contra o Tottenham em que recusou entrar a instantes do fim e o consequente castigo e também os dois jogos que falhou sem explicação aparente antes da paragem para o Mundial. No domingo antes de se apresentar na Cidade do Futebol, o mundo viu aquilo que não esperava ver.
Numa inesperada entrevista a Piers Morgan, Cristiano Ronaldo criticava o Manchester United e Erik ten Hag, acusava o clube de não ter acreditado nele quando a filha recém-nascida esteve hospitalizada e mostrava-se magoado por um sem fim de atitudes e alegados desrespeitos. Pouco mais de uma semana depois, os red devils responderam de forma efetiva e anunciaram a rescisão por mútuo acordo com o jogador português, que não vai voltar a vestir a camisola do clube onde se tornou o melhor do mundo.
20 anos depois de se ter estreado pelo Sporting, prestes a estrear-se naquele que será o quinto e último Mundial da carreira, o futuro de Cristiano Ronaldo é uma incógnita. E só poderia ser assim na vida do homem que nunca fez o expectável e que sempre quis andar perto das nuvens.