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Das bandas de Seattle dos anos 90, Pearl Jam (aqui com o vocalista Eddie Vedder em primeiro plano, lá atrás o baterista Matt Cameron) é aquela que mais tem propensão para o palco grande, para o espetáculo visual, para a dimensão de festival.
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Das bandas de Seattle dos anos 90, Pearl Jam (aqui com o vocalista Eddie Vedder em primeiro plano, lá atrás o baterista Matt Cameron) é aquela que mais tem propensão para o palco grande, para o espetáculo visual, para a dimensão de festival.

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

Das bandas de Seattle dos anos 90, Pearl Jam (aqui com o vocalista Eddie Vedder em primeiro plano, lá atrás o baterista Matt Cameron) é aquela que mais tem propensão para o palco grande, para o espetáculo visual, para a dimensão de festival.

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

"Eu, os Pearl Jam e todos os outros": crónica de um velho-de-Algés no último dia de NOS Alive

No fim do NOS Alive, houve pelo menos um filho do grunge que, no meio da multidão, viu os americanos pela primeira vez ao vivo, "finalmente". O que encontrou foi uma superbanda.

À chegada

Sem dúvida que eles sabem como te manter entretido. Para onde quer que olhes que não seja o palco, encontras focos e motivos de distração. Pelo meio, ainda descobres outros palcos, mais pequenos. No teu tempo, o entretenimento eram as barracas de cerveja. E de pão com chouriço, de bifanas, de kebab, de caldo verde e de sandes de leitão. Mas, sobretudo, de cerveja. Nos anos 90 era assim. Hoje, aqui, não ficas quieto e sossegado nem que o queiras com muita força. Estás aqui para te divertir, a bem ou a mal. E, lá ao fundo, naquele palco grande, também tens a música e as atuações dos cabeças de cartaz. Nos outros palcos espalhados pelo recinto, tens artistas progressivamente menos conhecidos, num decréscimo diretamente proporcional entre a dimensão do palco e a notoriedade do artista. E há ainda a comédia, “stand-up is trending”. Que não te falte nada. Sais daqui entretido, te garanto.

Quando se esgotam os palcos, há os lounges. São às dezenas e estão invariavelmente cheios de gente a tirar selfies que atestam, junto do seu público das redes sociais, a presença do protagonista no evento. Por vezes também têm, diante da entrada, filas de dezenas de metros compostas por gente que ali está para receber o brinde, o bónus, o presente. Seja ele qual for, da minúscula embalagem com creme de pele até outra inanidade qualquer que, por razões certamente culturais, faz mexer o mais empedernido espectador português. Se é de borla, o público lutará pela oferta.

E quando já não há mais lounges, há as barracas de comes e bebes. Só que hoje em dia já não sabes se ainda se diz “barracas”, se ainda se diz “comes e bebes”, porque é tudo tão sofisticado que se torna difícil encontrar bifanas e caldo verde no meio de tantas bowls, de tanto sushi, de tanta fast-food chic.

O recinto do festival esgotou neste último dia, com 55 mil pessoas

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

Mas chega de lamúrias ácidas e ressentidas. Só servem para sublinhar o que, de forma atual e cool se chama de generational gap que, à medida que ficas mais velho, te vai doendo mais e mais. Dói-te até em sítios inesperados, como aquele onde guardas as saudades da juventude. Cresceste nos anos 90. Estão cá os Pearl Jam, estão cá as Breeders. O momento é para viver. Além disso, estas casas-de-banho são incomparavelmente melhores do aquelas que tinhas à disposição em 1997, por isso, tem mas é juízo. Vai lá para fora. Vai-te divertir.

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Declaração de intenções

Nem toda a gente acredita, mas a história é verdadeira. Nunca vi os Pearl Jam ao vivo. Sim, eles atuaram seis vezes em Portugal – hoje será a sétima –, a primeira delas (dupla), em 1996, em Cascais. Sim, eu cresci nos anos 90 e, sim, eu era do grunge. Só que eu era da outra fação do grunge, daquela mais trágica, mais ruidosa, mais destrutiva. Daquela mais órfã. Não vale a pena mencionar os nomes de quem não está, mas a verdade é que o grunge se dividia um bocadinho, aquilo não era tudo a mesma equipa. E eu era mais dos outros.

As Breeders são adolescentes já de uma certa idade, tal como boa parte do público presente no recinto do festival. São frescas, têm graça, têm garra e conservam uma juventude muito própria de quem não envelhece — não porque se recusa a envelhecer, mas antes porque não é capaz, porque não dá, porque manter-se jovem faz parte delas.

Não é que eu não gostasse dos Pearl Jam. Claro que gostava. O Ten é um grande disco — 1991 foi, para quem cresceu nos anos 90, o melhor ano de criação musical da adolescência, quiçá de toda a história — e o Vs. uma espécie de obra-prima, ou aquilo que, vindo dos Pearl Jam, mais se aproximou dessa definição. Mas depois veio o Vitalogy e a nossa relação arrefeceu. Quando chegámos ao No Code, já praticamente não nos falávamos. Ou, pelo menos, eu já não os ouvia. Hoje será, portanto, um dia de grandes revelações, com uma banda que se calhar desconheço e que muito provavelmente irá interpretar versões de alguns êxitos dos nineties que eu tão bem conheço. Não sei como os adolescentes de hoje reagirão a canções como Elderly Woman Behind the Counter in a Small Town, Corduroy, Black, Better Man ou Alive.

Primeiras horas

Enquanto o recinto se vai enchendo e enchendo, como se uma enxurrada de pessoas fosse inundando a Doca de Pedrouços e a entrada de Algés, os Blasted Mechanism aquecem o palco NOS, o principal. Os Blasted Mechanism já cá andam há muitos anos e isso também se reflete na reação entusiástica do público — um público que não é apenas generoso: é numeroso e, em muitos casos, a-caminho-de-idoso (fala o jornalista anteriormente conhecido como jovem, que cresceu nos longínquos anos 90). São velhos conhecidos de muitos dos que por aqui andam. Os Blasted Mechanism animam os palcos nacionais desde há muito, e músicas como Nadabrovitchka ainda ressoam nas cabeças de alguns dos que hoje vestem T-shirts a dizer “Pearl Jam”. Continuam em forma. Já não são quem eram, mas a era de The New Militia e episódios subsequentes não fica a dever às memórias de há 20 e de há 30 anos.

Blasted Mechanism

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

Antes da subida inconfundivelmente aparatosa dos Blasted Mechanism ao palco principal, houve tempo para espreitar o que se passava noutras paragens. No palco Heineken, Objeto Quase deixaram breves, mas boas impressões, e a ideia de haver ali boas canções. Merecem atenção. Já de King John foi tão difícil que se tornou impossível escutar com atenção. O som precário, no limiar do inteligível, deixou perdido o público, que procurava ouvir as canções. A banda, em palco, estoica, merecia mais cuidado — e mais respeito.

The Breeders

É a caminho da frente de palco para ver as Breeders — Jose Medeles e os bateristas anteriores que desculpem, mas aqui impera a maioria feminina das irmãs Kim e Kelley Deal, sublinhado pelo próprio nome da banda (já alguma vez tinham pensado nisso?), não há masculino para ninguém — que me deparo com a primeira T-shirt de Nirvana da noite. Bom presságio. Lá se foi o compromisso de não falar de quem não está, mas o motivo é justo: o grunge está morto, longa vida ao grunge!

Adiante, The Breeders: ei-las, já sessentonas, mas com a mesma garra e a mesma graça que tinham em 1993, ano agraciado com um senhor álbum, The Last Splash, uma das melhores coisinhas que aquela saudosa década deu ao mundo. E foi com Saints, uma das melhores faixas do disco — todas as opiniões são discutíveis, esta é a minha —, que as Breeders abriram o concerto, “neste sítio lindo”. Esta opinião é de Kim Deal, guitarrista, vocalista, líder musical, espiritual e tudo, que acrescenta “a vista daqui é linda”.

Ao longo do concerto, há momentos absolutamente raros: descontraídas, lidam com o erro e com os enganos — não foram muitos, mas existiram — e com os esquecimentos como se fossem pessoas com idade para já não dar demasiada importância a isso. E fazem muito bem, isto é um concerto, não é um exame académico. E toda a gente confia que Kim e Kelley Deal saibam as próprias letras, isto não é nenhuma prova oral, não têm de recitar palavra por palavra.

The Breeders

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

Quando, no alinhamento, surge Cannonball, a letra pouco interessa. Mesmo no disco, a poesia não se percebe bem. “In the shade, in the shade”, é tudo o que importa e é tudo o que resta dessa canção infantil já muito antiga. Quando surge Gigantic, antecedida de explicação — como se fosse necessária —, “eu já toquei numa banda que se chamava os Pixies”, é pedida a ajuda do público, que reage bem e canta como se esperava.

As Breeders são adolescentes já de uma certa idade, tal como boa parte do público presente no recinto do festival. São frescas, têm graça, têm garra e conservam uma juventude muito própria de quem não envelhece — não porque se recusa a envelhecer, mas antes porque não é capaz, porque não dá, porque manter-se jovem faz parte delas. Por mais que as rugas lhes cavem o rosto e por mais que as veias lhes saiam da pele dos braços e das mãos. A tal pele que, mesmo que seja pele de velha, lhes serve perfeitamente. A única coisa que aqui não lhes serve na perfeição é o tamanho do palco, que lhes fica grande. E não é porque não o merecem, é só porque a energia delas se dispersa e se perde no espaço amplo e aberto, quase infinito, que vai da boca de cena em diante.

À espera

É curioso que os Sum 41 tenham vindo celebrar o fim da própria banda com o público do NOS Alive. Não é ironia. É que fica a impressão de que a maior parte dos presentes não tinha especial afinidade com a banda, também ela formada em meados dos anos 90. Houve crowd-surfing? Houve. Mas isso significa que as pessoas estavam a ouvir com atenção e a vibrar? A questão fica no ar.

Agora que os Sum 41 anunciam o seu fim, fico com a ideia de que fazem o que está certo e de que, no meio de todo o artifício, de todos os confetti, de todas as luzes e fumos e fogos e gritos e rifes, eles estão conscientes de que as fórmulas juvenis também têm o seu prazo. E, quando as pessoas envelhecem, nem sempre essa fórmula envelhece com elas. Ter músicos já entradotes, todos cinquentões, a trazer ao palco canções adequadas a alunos do secundário, chega a um ponto em que deixa de fazer sentido. Os momentos altos da atuação acabam por ser aqueles em que se evocam terceiros — por exemplo, AC/DC no arranque, The Queen, algures, a cantar We Will Rock You, o rife inconfundível de Smoke on the Water, dos Deep Purple. E isso diz muito do que são os Sum 41 para este público.

Eddie Vedder, diante do coro e das palmas sincronizadas de mais de 50 mil pessoas, agradece aos deuses. Primeiro, olhando para os céus. Depois, ajoelhando-se perante quem o idolatra. Estava emocionado, o bom velho Vedder. Estávamos todos.

É neste ponto que decido rumar, uma vez mais, ao palco Heineken, em busca de qualquer coisa fresca e vigorosa, mas acima de tudo surpreendente — eu, velho do Restelo, conheço muito pouco do que esta juventude tem andado a fazer. Em palco, um rapaz a tocar guitarra, uma rapariga de saia, a tocar baixo, e um baterista. “Quem são?”, pergunto à pessoa do lado. “Não sei dizer”, respondem-me. Pergunto a outra pessoa, “quem são estes?” E a resposta repete-se, “não sei dizer”. Caramba, mas ninguém sabe quem são eles, será possível? Dizem-me que não é isso, que sabem perfeitamente quem eles são, só não sabem dizer o nome. Consulto o cartaz: Khruangbin. OK, também não sei como é que isto se diz. Agora, a música — que delícia. Um groove funky, com house à mistura, uma linha de baixo vincada, batida, metida, precisa, implacável. E a guitarra, uma evocação magnífica das melhores melodias dos Shadows, do Velho Oeste, da selvajeria dos cowboys aos tiros num deserto cheio de catos. Caramba, já valeu a pena o fim dos Sum 41.

O tiro no escuro

O concerto mais aguardado começa com Daughter. É um excelente começo, mas, momentos depois, o que nos chega aos ouvidos é um tiro. Não é literatura, não há aqui metáfora. Foi um tiro, mesmo. “Dispararam sobre Donald Trump”, a notícia corre veloz. Parece que foi num comício. Parece que foi numa orelha. Parece que foi de raspão. Não foi aqui, foi na América, mas há coisas a que não conseguimos escapar. É o que dá vir para concertos com smartphones. Nunca ouvimos só o que queremos. Há ruído nefasto por toda a parte.

Concentração. Voltemos ao concerto. Os hits dos noventas impõem-se às músicas que, lá pelo meio, parecem preencher espaços, intervalos, territórios vazios para quem, como eu, cresceu a ouvir as canções dos discos primordiais. Jeremy, Even Flow — Mike McCready passa mais de três minutos a solar com a guitarra atrás da nuca —, Elderly Woman Behind the Counter in a Small Town, que bom que é ouvir o público inteiro, como um só. Por falar em Mike McCready: alguém comenta, não sem maldade, que “parece o meu professor de Geografia a tocar numa banda de covers”. Não é fácil discordar, mas podem debater, talvez melhorar a ideia. “É como se o Keith Richards fosse o meu professor de Geografia.” Está melhor. “O Keith Richards, mas em velho.” Está ótimo. Está perfeito. Não mexam mais.

Pearl Jam

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

Esta hora e meia não passou num instante. Pelo contrário, arrastou-se um bocadinho. Já é tarde, já não vou para novo, e toda a gente sabe que ainda vem aí o encore. Chega então Eddie Vedder com a guitarra acústica e canta Imagine. John Lennon a estas horas, é claro que vai dar uma multidão de lanternas de telemóvel. Aliás: é o próprio cantor que as requisita. A resposta é óbvia.

Mas talvez tudo tenha um propósito, um motivo, um destino. Talvez, neste caso, esse propósito fosse fazer de prelúdio para um dos momentos mais altos do concerto: Black. Finalmente a adolescência, os sonhos contemplativos, todos os disparates do mundo, o verão com uma vida inteira pela frente. Não me recordo se é sobre isto a letra. Presumo que não seja, a avaliar pelo título e pela frase repetida “tatooed everything”. Mas é para isso que me remete. Para essa tempo longínquo, cheio de inocência, cheio de futuro. E, no fim da canção, Eddie Vedder, diante do coro e das palmas sincronizadas de mais de 50 mil pessoas, agradece aos deuses. Primeiro, olhando para os céus. Depois, ajoelhando-se perante quem o idolatra. Estava emocionado, o bom velho Vedder. Estávamos todos.

Não foi a última música da setlist, nunca é (descubro facilmente, eu que nunca os tinha visto): Alive, momento alto mais do que esperado. Entre a multidão, muito coro, muita luz, muita emoção. Está quase no fim e eu percebo claramente porque é que nunca os tinha visto ao vivo. Das bandas de Seattle dos anos 90, Pearl Jam é aquela que mais tem propensão para o palco grande, para o espetáculo visual, para a dimensão de festival. Eles são a superbanda. Está tudo certo. A minha equipa continua a não ser esta. Mas ainda bem que os vi, finalmente.

O NOS Alive regressa em 2025 nos dias 10, 11 e 12 de julho, mais uma vez no Passeio Marítimo de Algés.

 
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