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A campanha de Kamala Harris tem realçado o contributo dos pequenos financiadores.
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A campanha de Kamala Harris tem realçado o contributo dos pequenos financiadores.

POOL/AFP via Getty Images

A campanha de Kamala Harris tem realçado o contributo dos pequenos financiadores.

POOL/AFP via Getty Images

Financiadores tiraram o tapete a Biden e estenderam passadeira a Harris. O que lhes dá tanta força?

Sem limites para campanhas partidárias, os milhões que os financiadores entregam aos candidatos adquirem importância reforçada nas eleições dos Estados Unidos da América.

Em 24 horas conseguiu 100 milhões de dólares. Numa semana atingiu os 200 milhões. E num mês 300 milhões. Kamala Harris, que deverá ser nomeada oficialmente como candidata democrata às eleições presidenciais de novembro nos Estados Unidos da América, conseguiu conquistar os financiadores depois de ter sido a escolhida após a desistência de Joe Biden.

Não é por acaso que os financiadores tiram e estendem a passadeira vermelha aos candidatos. E da mesma forma que puxaram o tapete a Biden, estenderam-no a Harris.

[Já saiu o primeiro episódio de “Um rei na boca do Inferno”, o novo podcast Plus do Observador que conta a história de como os nazis tinham um plano para raptar em Portugal, em julho de 1940, o rei inglês que abdicou do trono por amor]

O debate entre Trump e Biden, a 27 de junho (já 28 em Portugal), que demonstrou um fraco desempenho do atual Presidente, foi o gatilho que faltava para a pressão final sobre Biden.

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Muitos ataques pessoais e até uma discussão sobre golfe. Debate com Trump deixa Democratas preocupados com capacidade de Biden

Não demorou até que essa pressão fosse solidificada com vários democratas a elevarem a voz, com uma crucial posição de Nancy Pelosi e umas mensagens, sob anonimato, de Barack Obama. Era o golpe que faltava numa ação que já tinha levado alguns dos maiores financiadores democratas a congelarem as doações. Sem apoio dos pares e sem mais dinheiro, a candidatura de Biden estava condenada. O anúncio da desistência chegou a 21 de julho. “É do interesse do meu partido e do país que eu desista”, declarou, numa mensagem na rede X.

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Vincent Pons, professor da Harvard Business School, não tem dúvidas de que “grandes financiadores pressionaram para que Joe Biden desistisse da corrida, ameaçando não continuar a financiar a campanha presidencial democrata se Biden continuasse no boletim de voto”. Ainda assim, considera ao Observador ser difícil determinar se foi essa pressão dos grandes financiadores o fator central para a decisão de Biden, já que também estava a enfrentar pressão acrescida de muitos outros atores, incluindo importantes jornais, como o New York Times, e de vários membros do próprio Partido Democrata.

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O que são os Super PAC?

O dinheiro doado diretamente às campanhas ou aos partidos tem limites (em termos individuais), mas não há tetos para as entregas aos designados Super PAC, os comités de ação política independentes criados para que financiadores possam entregar doações e que promovem, de forma autónoma das campanhas, ações promocionais e grandes campanhas publicitárias. E os gastos destes Super PAC também não têm limites, como também não há limites para os recursos próprios dos candidatos. Os gastos ilimitados veem com uma restrição — a impossibilidade de se recorrer a financiamento público que está disponível, mas com muitas limitações e, como tal, praticamente não utilizado.

Fonte: Comissão Federal de Eleições (dos EUA)

É pelos Super PAC que passam, por isso, grandes quantidades de fundos. Desde 2010, depois de uma decisão judicial em defesa da liberdade de expressão, que é possível também a empresas (os particulares já podiam desde 1976) entregarem o que quiserem a estas estruturas para atividades políticas e campanhas sobre um determinado tema, ainda que não estejam autorizadas a trabalhar diretamente com as campanhas partidárias e candidaturas.

Ou seja, conforme explica ao Observador Bruno Wilhelm Speck, professor na Universidade de São Paulo, no estudo sobre O financiamento de partidos e campanhas eleitorais nos Estados Unidos, “com a decisão de janeiro de 2010 Citizens United vs. Federal Election Commission, as empresas ganharam o direito de aportar recursos ilimitados em campanhas publicitárias também durante o processo eleitoral, desde que não fizessem proselitismo direto para determinados candidatos e não repassassem recursos diretamente para os cofres das campanhas. As limitações quanto às contribuições aos partidos e candidatos permanecem em vigor”.

Sem limites de dinheiro e de gastos, são estas entidades que acabam por deter um grande poder. Foi um desses Super PAC, o Future Forward, que congelou o dinheiro que tinha recebido até ao início de julho até que Biden desistisse, segundo noticiou então o New York Times. Em janeiro, este Super PAC tinha reservado, noticiou a CNN, 250 milhões de dólares para anúncios na televisão e publicidade digital nos estados mais disputados. Agora, numa informação mais recente, de 25 de julho, do Washington Post, indica-se que em três semanas esta entidade pretende gastar 50 milhões de dólares em seis estados com anúncios para promover a campanha de Kamala Harris antes da convenção democrata a partir de 19 de agosto. Também o American Bridge 21st Century, outro Super PAC, vai relançar esta semana a sua ação publicitária em Michigan.

Isto depois de, segundo dados da AdImpact, o apoio a Biden ter reservado em anúncios pouco mais de 300 milhões de dólares até à data da sua desistência, mais do dobro do que tinha sido feito no apoio a Trump.

As campanhas eleitorais nos Estados Unidos são caras. Muito caras. No último ciclo eleitoral para a Presidência, em 2020, do qual Biden saiu vencedor e Trump derrotado, o custo atingiu os 6 mil milhões de dólares (cerca de 5,5 mil milhões de euros), segundo dados da Open Secrets, mais do dobro do ciclo anterior.

Neste ciclo o valor poderá ser ultrapassado. Em 2020, a pandemia atirou grandes somas dos financiamentos para as televisões, em anúncios muito caros, mas também para as redes sociais.

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Reid Hoffman é um dos maiores financiadores das campanhas a favor de Biden e Harris

Bloomberg via Getty Images

Conflitos de interesse com os financiamentos?

A questão não é nova nesta campanha. Os milhões atirados para cima das eleições por parte de empresários, companhias e grupos de interesses deixam sempre a dúvida no ar. O poder desses grupos nas eleições determinará, depois, decisões a seu favor?

“O papel do dinheiro na política [nos EUA] é muito grande”, salienta ao Observador Bruno Wilhelm Speck. Para este professor, a influência destes grandes financiadores nas políticas futuras é um debate grande e até populista. Será que influenciam o conteúdo político? Wilhelm Speck acredita que estes grandes financiadores garantem, acima de tudo, o acesso aos políticos.

Reid Hoffman, cofundador do LinkedIn e um dos maiores financiadores dos democratas, foi um dos primeiros a apoiar Kamala Harris. As suas doações ao Super PAC Future Forward já superavam os 7 milhões este ano e logo que Harris avançou, o multimilionário anunciou o reforço do apoio para a campanha, declarando, segundo a CNN, esperar que Harris seja a próxima Presidente dos Estados Unidos. Mas esse apoio já chegou com uma exigência: despedir a presidente da Federal Trade Comission, Lina Khan, que tem sido o rosto dos processos contras as grandes tecnológicas. “Espero que a remova [do cargo]”, declarou. Lina Khan foi nomeada pela Administração Biden e até já foi elogiada pelo candidato a vice-presidente republicano JD Vance.

“As quantidades gastas nas campanhas nos Estados Unidos geram habitualmente a preocupação legítima de que o papel do dinheiro na política dos Estados Unidos possa dar aos financiadores privados muito poder, com o risco de influenciar os políticos a favor dos seus interesses”, admite Vincent Pons, acrescentando que, no entanto, neste caso “os financiadores privados, que pressionaram Biden a desistir, estavam alinhados com o interesse dos eleitores democratas, muitos dos quais esperavam poder votar num candidato diferente”.

O papel dos pequenos financiadores

É verdade que o papel dos grandes financiadores é crucial para uma campanha nos Estados Unidos, mas Bruno Wilhelm Speck realça também o papel dos pequenos. E recorda as comunicações da campanha de Kamala Harris tanto sobre o dinheiro arrecadado em poucos dias como também sobre o número de pequenos doares e os que o fizeram pela primeira vez.

Segundo a campanha de Kamala Harris, a candidatura amealhou mais de 300 milhões de dólares só em julho, o que compara com os cerca de 140 milhões de dólares amealhados por Trump, que ainda teve, nesse mês, uma subida de fundos depois do atentado que sofreu, avança a AP. E estes montantes não são os fundos totais.

A campanha de Harris especifica que dois terços das doações de julho foram feitas por pessoas que contribuíram pela primeira vez no atual ciclo eleitoral. No total, três milhões de pessoas, que realizaram 4,2 milhões de contribuições, entregaram dinheiro à campanha. E desse total, dois milhões fizeram-no pela primeira vez. Além disso, 94% das doações de julho foram de depósitos abaixo dos 200 dólares. Bruno Wilhelm Speck explica a importância deste anúncio. É que a campanha quer realçar que o apoio está enraizado na população e que o apoio popular é significativo para uma candidata que só agora entrou na corrida.

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