O Chega passou o fim de semana na capital do Ribatejo, onde as touradas fazem parte da tradição. As inspirações do partido relativamente ao mundo rural não ficaram à porta, fizeram-se ouvir as bandeiras de sempre e para terminar há prémios para todos os gostos, todos dentro de uma praça de touros.

Prémio “Saída em ombros pela porta grande”: André Ventura

Entrou dono de um partido acantonado no protesto, saiu a discutir lugares num futuro governo de direita. Deixou o adversário PSD a ter de se clarificar sobre um tema que o queima muito: aceita ou não levar para o governo este Chega a crescer nas sondagens. André Ventura teve a sala consigo, depois da manobra de esvaziar a Convenção de oposição interna ou possíveis tensões (com o fim do método de Hondt nas eleições das listas de delegados).

Com isto, Ventura ainda conseguiu um púlpito bem mais controlado (sem os extremismos ouvidos noutras convenções do partido). Saiu com várias voltas à arena, flores, aclamação, em ombros. Não é muito diferente das outras vezes, num partido em que se grita mais vezes “Ventura” do que “Chega” e que continua a tentar convencer que não é um partido de um homem só.

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Prémio “Forcado da cara”: António Tânger Corrêa

Quem vai à frente assume o maior risco da pega e se alguém o fez na Convenção foi António Tânger Corrêa. Sem diplomacia, a lembrar as suas lutas no CDS contra o MRPP, reclamou a rua para a direita populista portuguesa. “Foi uma limpeza”, disse sobre aqueles tempos, enquanto pedia aos militantes do Chega para “saírem do sofá” e não deixarem a rua entregue à esquerda. Acabou por ser uma das linhas mais importante  das intervenções de Ventura nesta reunião.

Prémio “Apoderado”: Diogo Pacheco Amorim

O apoderado está para uma tourada como um agente de futebol. É o gestor, o homem que orienta o protagonista e gere a carreira. Todos sabem que André Ventura é o homem forte dentro do partido, mas Diogo Pacheco Amorim é um dos que tem uma palavra a dizer, um dos que consegue impor ideias, um dos mais respeitados do partido. Na reunião magna, foi o primeiro no palco a recusar uma geringonça de direita e, em entrevista ao Observador, concretizou a ideia: ou o Chega tem um lugar no governo ou não fará parte desse governo. Num partido em que as vozes nem sempre se multiplicam, Pacheco Amorim é um dos poucos que se faz ouvir.

Prémio “Brinde”: Luís Montenegro/PSD

Na tauromaquia, o brinde é o momento em que o protagonista dedica a atuação a uma personalidade. Na Convenção do Chega Luís Montenegro foi o brindado – e em mais intervenções do que o próprio líder do Governo em funções. Sai desta Convenção com o Chega à perna, criticado pelo estilo de oposição à direita que faz e com um grande interrogação nas costas: está ou não disponível para sentar o Chega num futuro Conselho de Ministros que venha a liderar? O PSD fez-se representar na Convenção por Miguel Pinto Luz (que nas diretas do PSD em 2019 foi o único candidato a admitir alianças com o Chega) e nas suas declarações à saída, o efeito imediato do brinde de que o PSD foi alvo esteve à vista: um desconfortável ‘logo se vê’.

Prémio “Tribuna”: Ana Catarina Mendes/Governo

Entrou mesmo em cima da intervenção de André Ventura – os outros convidados já tinham chegado antes – e saiu mal o líder do Chega gritou que “António Costa já chegou ao fim”, mesmo antes de rematar o discurso. A ministra Ana Catarina Mendes correu coxia acima, falou rapidamente para condenar o “discurso” de ódio e saiu como quem não quer ouvir mais nada. Fez os mínimos numa representação que fez questão de descrever como “institucional”, mas que o partido a que pertence (e os outros à esquerda também) encaram de outra forma criando esta bizarria: o partido que apoia o Governo recusa o convite do Chega por ser uma “linha vermelha”, mas o Governo apoiado pelo PS põe o pé para lá dessa mesma linha.

Prémio “Silêncio”: Nuno Afonso

Numa tourada, as palmas definem o grau de satisfação do público com o desempenho dos protagonistas. O silêncio é a forma que o público tem de demonstrar que não gostou desse desempenho. Nuno Afonso ficou entre o silenciado e o silêncio que Ventura foi dizendo aos militantes que gostava de ver sobre este assunto. Foram várias as vezes que avisou que os portugueses não querem saber dessas questões. Pedras no caminho? Apanho-as todas e atiro-as para longe. Um dia faço um partido à minha medida.

Prémio “Aficionado”: O grupo parlamentar do Chega

“Os 12 guerreiros.” É a formulação bélica que os militantes do Chega usam para se referir aos deputados do partido na Assembleia da República — há até quem tenha dito que agora a ARTV até passou a fazer sentido. São o braço armado de André Ventura e não abandonam o líder nem por nada. São 12 mas falam a uma só voz, sem um desvio. No final das contas, mesmo o único que já teve problemas de maior na bancada, Mithá Ribeiro, colocou-se de pé para aplaudir o líder durante a reunião magna, saiu da vice-presidência, mas apareceu em Santarém e não vira as costas ao presidente do partido.

Prémio “Diretor de corrida”: Tribunal Constitucional

Já declarou a ilegalidade das alterações aos estatutos do Chega por três vezes (em 2020, 2021 e 2022), obrigando à repetição de congressos e a história pode não ficar por aqui. Desta vez, o Chega deu a volta ao chumbo voltando aos estatutos iniciais, mas a alteração à forma de eleição das listas de delegados, que pôs fim ao método de representação proporcional, pode voltar a pôr em risco esta reunião. O Tribunal Constitucional será, mais uma vez, o garante do funcionamento dos regulamentos nesta arena política.

Prémio “Lenço branco”: João Tilly

A mostragem do lenço branco é uma indicação de que o desempenho está a ser positivo e que o protagonista merece ser acompanhado de música por parte da banda de música presente. João Tilly subiu ao púlpito para fazer um questionário aos militantes do Chega, numa referência às perguntas para os governantes. Encenou, fez teatro, mas no final, mesmo sem que a direção de Ventura desse indicação de apoio em nenhuma lista ao Conselho Nacional, conseguiu ser o mais votado, o que lhe permite continuar à frente deste órgão do partido.