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A Clínica dos Arcos, em Lisboa, já realiza um terço dos abortos por opção da mulher efetuados no país
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A Clínica dos Arcos, em Lisboa, já realiza um terço dos abortos por opção da mulher efetuados no país

LUSA

A Clínica dos Arcos, em Lisboa, já realiza um terço dos abortos por opção da mulher efetuados no país

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Há médicos “objetores” que na verdade não são contra o aborto. Plano do Governo pode passar pelos privados

Há médicos a declarar objeção de consciência para aliviar carga de trabalho e por pressão. SNS admite que número de objetores é "limitativo" em alguns hospitais. Solução pode passar pelos privados.

O número de profissionais de saúde que declararam ser objetores de consciência à prática do aborto — um direito que está consagrado na lei aprovada em 2007 sobre a interrupção voluntária da gravidez (IVG) — “é particularmente limitativo” em alguns hospitais, admitiu fonte oficial da Direção Executiva do Serviço Nacional de Saúde (SNS) ao Observador. Esse é um dos “constrangimentos no acesso” das mulheres aos cuidados de saúde relativos ao aborto que a estrutura tutelada pelo Ministério da Saúde está a avaliar neste momento, a par de outros, como dificuldades na referenciação, burocracia nos circuitos e limitações na capacidade de resposta assistencial.

Entre os hospitais que, estando na rede de referenciação na Grande Lisboa, não realizam abortos por objeção de consciência de todos os médicos no serviço de ginecologia e obstetrícia estão o Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca (Amadora-Sintra) e o Hospital de São Francisco Xavier, confirmou o Observador. Há outros exemplos a nível nacional: no Centro Hospitalar Médio Tejo, tendo apenas médicos objetores de consciência no serviço, dois médicos prestadores de serviços realizam as interrupções voluntárias da gravidez no pólo de Abrantes. O Hospital Amato Lusitano e o de Portalegre, embora façam parte da rede de referenciação, também encaminham os casos para outras entidades, públicas ou privadas.

Sara Proença, dirigente na Federação Nacional dos Médicos, confirmou ao Observador: “As pessoas não tiraram uma especialidade de ginecologia e obstetrícia para fazer uma atividade tão pouco diferenciada”, considerou a médica: “Há quem se declare objetor porque não quer fazer essas consultas, senão só faziam isso e horas extras”.

O direito dos médicos a serem objetores de consciência em relação à prática do aborto está consagrado na lei nº 16 de 2007. Nesses casos, a objeção de consciência deve ser comunicada por escrito ao diretor clínico ou ao diretor de enfermagem dos estabelecimentos de saúde onde o profissional de saúde trabalhe e em que se pratiquem interrupções voluntárias da gravidez. Mas a lei não obriga os médicos a revelarem os motivos pelos quais são objetores de consciência.

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Acontece que nem sempre os médicos que declaram ser objetores de consciência são efetivamente contra a prática do aborto. Sara Proença, médica ginecologista e dirigente na Federação Nacional dos Médicos (FNAM), explicou ao Observador que a falta de interesse profissional nos atos médicos associados à IVG motiva alguns médicos a declarar objeção de consciência para não estarem envolvidos na prestação deste tipo de cuidados, que podem ser considerados menos relevantes. “As pessoas não tiraram uma especialidade de ginecologia e obstetrícia para fazer uma atividade tão pouco diferenciada”, considerou a médica: “Há quem se declare objetor porque não quer fazer essas consultas, se não só faziam isso e horas extras”.

A falta de recursos humanos no SNS também explica que alguns médicos que, não sendo contra o aborto, se declarem objetores de consciência, numa tentativa de aliviarem a carga de trabalho. “A interrupção voluntária da gravidez gera muitos atos médicos”, afirma Sara Proença, acrescentando: é necessária a consulta prévia, uma ecografia, outra consulta para explicar como se interrompe a gravidez e duas consultas para assegurar que o aborto está completo.

Miguel Oliveira da Silva, ex-presidente do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida e professor de Ética Médica, explicou que há clínicos que estão contra o estatuto “absoluto” de objeção de consciência e defendem uma alteração à legislação: “São poucas, felizmente, mas há mulheres que, por adotarem comportamentos displicentes e não praticarem contraceção, fazem vários abortos por ano. Alguns médicos prefeririam que o estatuto fosse seletivo, para selecionarem. Fariam a maioria das interrupções, mas não estes casos

Ao longo deste processo, “costuma haver o envolvimento de duas ou três pessoas”. É a própria lei do aborto que o exige quando determina que “a verificação das circunstâncias que tornam não punível a interrupção da gravidez é certificada em atestado médico, escrito e assinado antes da intervenção por médico diferente daquele por quem, ou sob cuja direção, a interrupção é realizada”.

Ora, “em hospitais que já têm pouca gente” é preciso optar: “Ou se fazem urgências ou se vão fazer estas consultas”, afirma a médica. Por isso, em alternativa, as mulheres grávidas que pretendem realizar um aborto são encaminhas para clínicas privadas ou para outras entidades dentro do sistema público. “Assim estas pessoas têm acesso na mesma à interrupção da gravidez e não saímos da atividade que importa”, conclui Sara Proença, que não é objetora de consciência, mas que trabalha num hospital em que se encaminham os casos para o privado.

A dirigente da FNAM dá o exemplo da sua especialidade: a ginecologia oncológica. “As pessoas com cancro no útero ou dos ovários andam nove meses para serem operadas. Se eu sair da minha especialidade para fazer interrupções voluntárias da gravidez, elas ficam ano e meio à espera. Não é exequível, por isso encaminhamos [as IVG] para o privado e as pessoas são tratadas”, concluiu.

Também há médicos que se dizem objetores de consciência porque não concordam com os termos da lei do aborto em vigor em Portugal. Em declarações ao Observador, o médico ginecologista Miguel Oliveira da Silva, ex-presidente do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida e professor de Ética Médica, explicou que há clínicos que estão contra o estatuto “absoluto” de objeção de consciência e defendem uma alteração à legislação: “São poucas, felizmente, mas há mulheres que, por adotarem comportamentos displicentes e não praticarem contraceção, fazem vários abortos por ano. Alguns médicos prefeririam que o estatuto fosse seletivo, para selecionarem. Fariam a maioria das interrupções, mas não estes casos que referi”.

“Estamos a favor da legalização da IVG” e “reconhecemos que deve ser feita sob orientação de um profissional de saúde, dentro de uma instituição hospitalar”, assegura a médica Alexandra Matias: “Já todos vimos mulheres que morreram, que sofreram muito ou que ficaram com problemas graves por terem feito isto em vãos de escada”. Mas: “Achamos que deviam ser feitas por profissionais de saúde", como enfermeiros ou pessoas treinadas para isso, "não por um médico obstetra, que foi treinado para fazer nascer uma vida”.

Noutros casos, acrescenta a médica ginecologista Alexandra Matias, os médicos objetores de consciência não são contra a prática do aborto por opção da mulher, mas consideram que ele não deve ser praticado por médicos obstetras: “Nós somos educados no sentido de fazer nascer uma vida. É muito complicado pedirem-nos para matar uma vida”, defendeu em entrevista ao Observador.

Estes clínicos consideram que há uma contradição entre a realização de um ato médico como um parto e a realização de um aborto pelo mesmo profissional de saúde. “Estamos a favor da legalização da IVG” e “reconhecemos que deve ser feita sob orientação de um profissional de saúde, dentro de uma instituição hospitalar”, assegura a médica: “Já todos vimos mulheres que morreram, que sofreram muito ou que ficaram com problemas graves por terem feito isto em vãos de escada”. Mas a solução deveria estar, defende, noutros profissionais de saúde, como enfermeiros ou pessoas treinadas para isso: “Não por um médico obstetra, que foi treinado para fazer nascer uma vida”.

Depois, há profissionais de saúde que, não tendo qualquer objeção de consciência em relação às interrupções voluntárias da gravidez, sentem-se pressionados a declará-la. Em declarações ao Observador, Miguel Areosa Feio, autor do artigo “Lei do Aborto em Portugal: Barreiras Atuais e Desafios Futuros”, que em 2021 estudou “as limitações na implementação da lei” do aborto, explicou que analisou dados dos relatórios anuais da Direção-Geral da Saúde (DGS), reviu informações publicadas noutros artigos científicos e entrevistou profissionais de saúde na área da ginecologia e obstetrícia que trabalham na área da interrupção da gravidez.

“Muitos dos profissionais envolvidos em interrupções da gravidez sofrem ou já sofreram algum tipo de marginalização dentro da sua classe profissional, o que os torna menos disponíveis a realizá-lo, alegando, nessas situações, objeção de consciência”, diz o artigo, publicado no âmbito do mestrado de Miguel Areosa Feio em Políticas Públicas no Instituto Universitário de Lisboa (Iscte).

Descobriu que há médicos e enfermeiros “estigmatizados” por não serem objetores de consciência, tal como lhe relataram especialistas como a médica Maria José Alves, responsável pela medicina materno-fetal da Maternidade Alfredo da Costa (MAC) e coordenadora da Consulta de Gravidez Indesejada do Centro Hospitalar Lisboa Central (CHLC);

“Muitos dos profissionais envolvidos em interrupções da gravidez sofrem ou já sofreram algum tipo de marginalização dentro da sua classe profissional, o que os torna menos disponíveis a realizá-lo, alegando, nessas situações, objeção de consciência”, diz o artigo, publicado no âmbito do mestrado de Miguel Areosa Feio em Políticas Públicas no Instituto Universitário de Lisboa (Iscte).

Uma médica obstetra de Lisboa relatou: “Eu tenho sempre aquele olhar de que estou a fazer algo fora da lei. Isto cria barreiras, é como se fosse uma auditoria interna”. E acrescentou: “Sei de um hospital em que a própria direção do serviço pressionava as pessoas. Para não terem chatices, punham o papel da objeção”.

A Direção Executiva disse ao Observador que está “a trabalhar com todos os hospitais”. E diz que as respostas podem estar “nos próprios hospitais”, “em hospitais próximos do SNS” ou “em hospitais privados convencionados quando o SNS não consegue assegurar uma resposta em tempo adequado”

Questionada sobre o fenómeno das falsas objeções de consciência, a Direção Executiva do SNS respondeu que “desconhece se existem médicos que, não sendo objetores de consciência, não realizam consulta de IVG”. Mas considerou que isso se trata “da gestão normal de recursos humanos, no âmbito e na autonomia das administrações das instituições hospitalares, no sentido da governação mais efetiva dos seus profissionais nas várias tipologias de respostas, seja no serviço de urgência, na consulta externa, no hospital de dia, no internamento, no bloco operatório ou na realização de exames complementares de diagnóstico e terapêutica, da respetiva especialidade, de acordo com as necessidades e a procura de cuidados de saúde”. O Observador contactou a Ordem dos Médicos para obter uma reação a estes relatos e perceber se há algum inquérito em curso, mas não obteve resposta até à hora de publicação deste artigo.

Direção do SNS admite recorrer a “privados convencionados” quando não houver resposta

Em busca de soluções para colmatar os obstáculos que estes constrangimentos colocam no acesso à IVG no sistema pública de saúde, a Direção Executiva disse ao Observador que está “a trabalhar com todos os hospitais”. E diz que as repostas podem estar “nos próprios hospitais”, “em hospitais próximos do SNS” ou “em hospitais privados convencionados quando o SNS não consegue assegurar uma resposta em tempo adequado”. Os cuidados de saúde primários também estão a ser abordados para fomentar “uma cultura de respeito e de humanização de cuidados no atendimento e resposta às utentes”.

Atualmente, há apenas três clínicas privadas reconhecidas e autorizadas pelas autoridades de saúde a realizar abortos por opção da mulher: a Clínica dos Arcos, a Clínica Multimédica e o Hospital do SAMS — todas na região de Lisboa e Vale do Tejo. Os dados mais recentes que constam no relatório preliminar da Direção-Geral da Saúde (DGS) indicam que, entre 2018 e 2021, estas três clínicas realizaram um terço (32,3%) de todos os abortos por vontade da mulher em Portugal.

Essas clínicas já estabeleceram acordos para receberem casos enviados pelo SNS. Aliás, mais de metade de todos os abortos realizados no setor privado no ano de 2021 (53,74%) chegaram às clínicas particulares por encaminhamento dos cuidados de saúde primários; e quase um quarto (23,12%) das mulheres foram reencaminhadas pelos hospitais públicos — caso em que os procedimentos são pagos pelo Estado. Em 23,12% dos casos, as mulheres dirigiram-se diretamente às clínicas. Nesse caso, os preços praticados rondam os 600 a 800 euros. O que estará agora em cima da mesa é alargar esses acordos.

Fernando Araújo admitiu a possibilidade de aprofundar a ligação do SNS com os privados para responder às dificuldades de acesso ao aborto, algumas das quais foram denunciadas pelo Diário de Notícias. “Se não temos capacidade noutras unidades do SNS, que devemos tentar ter a médio e longo prazo, a curto prazo vale a pena ter acordos com outras entidades, mesmo fora do SNS”, disse o diretor executivo do SNS na Comissão de Saúde na passada quarta-feira: “O que temos é de salvaguardar que há uma resposta a tempo para estas mulheres que fazem uma opção fundamentada e isso não pode nem ser protelado, nem ser escondido ou limitado”.

A tutela já prometeu rapidez na resolução dos problemas relativos ao acesso à interrupção voluntária da gravidez: na última quinta-feira, Manuel Pizarro, ministro da Saúde, disse que serão precisas “meia dúzia de semanas” para corrigir as dificuldades de acesso à interrupção voluntária da gravidez. “A minha visão sobre o prazo para resolver este problema é de umas semanas, não vamos andar muito tempo neste debate. É uma correção que vai ser feita rapidamente e admito que, entre várias soluções, em alguns casos, isso possa envolver uma colaboração com o setor privado”, admitiu o governante. Sem recurso a “grupos de trabalho, relatórios, auditorias, coisas que atrasam a resolução do problema”.

O plano da Direção Executiva do SNS para resolver obstáculos como estes no acesso ao aborto no sistema público está a ser delineado em paralelo à investigação que a Inspeção Geral das Atividades em Saúde (IGAS) já está a lançar para verificar o cumprimento das normas relativas a cinco pontos, disse fonte oficial ao Observador: objeção de consciência, cumprimento de dever de nomeação de um responsável para os assuntos respeitantes à interrupção da gravidez, encaminhamento das mulheres grávidas que solicitem a interrupção da gravidez para os serviços competentes dentro dos prazos legais; e a garantia do direito à escolha livre do estabelecimento de saúde oficial onde deseja interromper a gravidez, dentro dos condicionamentos da rede.

O que diz a lei do aborto em Portugal

Desde que o referendo de 2007 aprovou a possibilidade de se realizarem interrupções de gravidez a pedido das mulheres, passou a ser possível realizar um aborto em estabelecimentos de saúde reconhecidos pelas autoridades de saúde para esse efeito em cinco circunstâncias:

  • Em qualquer momento da gravidez, se “constituir o único meio de remover perigo de morte ou de grave e irreversível lesão para o corpo ou para a saúde física ou psíquica da mulher grávida”; ou se o feto for inviável.
  • Até às 24 semanas de gravidez, se houver “seguros motivos” para prever que o bebé “virá a sofrer, de forma incurável, de grave doença ou malformação congénita”.
  • Até às 16 semanas de gestação caso a gravidez “tenha resultado de crime contra a liberdade e autodeterminação sexual”.
  • Até às 12 semanas de gravidez, caso “se mostre indicado para evitar perigo de morte ou de grave e duradoura lesão para o corpo ou para a saúde física ou psíquica da mulher grávida”.
  • Até às 10 semanas de gestação “por opção da mulher”.

O primeiro passo é dirigir-se ao centro de saúde a que pertence, ao hospital da área de residência ou a uma clínica privada reconhecida pelas autoridades de saúde e pedir uma consulta de interrupção de gravidez — a chamada consulta prévia. Alguns hospitais têm contactos diretos e exclusivos para a marcação da consulta prévia, não sendo necessário que o encaminhamento seja feito pelo centro de saúde. Noutros casos, é possível efetuar a consulta no próprio centro de saúde.

Conselho Nacional de Ética está contra o alargamento do prazo legal para o aborto

A consulta prévia é obrigatória, mesmo que a mulher esteja certa de que pretende interromper a gravidez. Este é o momento em que o médico, que tem obrigatoriamente de não ter qualquer objeção de consciência em relação ao aborto,  apresenta à utente toda a informação necessária para a tomada de uma decisão — incluindo sobre os diferentes métodos de interrupção da gravidez. Também é nesta consulta que o profissional de saúde estabelece, por meio de uma ecografia, o tempo de gestação e determina se a mulher ainda não ultrapassou o período permitido para a realização de um aborto.

Entre o momento em que se comunica a intenção de realizar um aborto e a interrupção da gravidez devem decorrer cerca de oito dias. Entre o momento em que a mulher solicita uma consulta prévia até à sua realização não devem passar mais de cinco dias. No fim, fica marcada uma segunda consulta para a realização da interrupção voluntária da gravidez.

Entre uma e outra têm de passar pelo menos três dias, que é o tempo mínimo obrigatório para cumprir um período de reflexão. Esse período pode ser alargado por vontade da utente. Caso contrário, a interrupção voluntária da gravidez tem de ser concretizada o mais depressa possível de modo a cumprir os prazos legais para a realização de um aborto.

Há dois métodos para a interrupção voluntária da gravidez. Quando se opta pela via cirúrgica, a mulher deve ficar uma manhã ou uma tarde no estabelecimento onde está a ser acompanhada: é o tempo necessário para a preparação para a cirurgia e o procedimento para a retirada do embrião, que demora cinco a 20 minutos. Este é o método mais utilizado no setor privado: aliás, 96% dos abortos realizados nas clínicas particulares foram realizado por meio de uma cirurgia.

Neste caso, três horas antes da cirurgia, são administrados, por via vaginal ou derretidos na bochecha, dois comprimidos de uma substância que amolece o colo do útero e favorece as contrações uterinas, facilitando a cirurgia. Já com a utente sob o efeito de anestesia (local ou geral), o médico retira o embrião por meio de uma sonda plástica que aspira o interior do útero. Depois, não há necessidade de internamento: o procedimento é realizado em ambulatório, mas realiza-se uma nova consulta duas a três semanas mais tarde.

Quando a interrupção voluntária da gravidez acontece por via medicamentosa — método escolhido em quase 99% dos casos no setor público —, ela acontece em duas fases. Na consulta para o aborto, toma-se um comprimido ainda no hospital. Este medicamento impede a atividade da progesterona, uma hormona sexual feminina essencial para manter uma gravidez, força o colo do útero a amolecer e o embrião é mais facilmente expulso.

Se por algum motivo um médico objetor acabar por atender uma mulher que pretende abortar, ele está obrigado por lei (Portaria n.º 741-A/2007) a assegurar o encaminhamento para o serviço competente.

A segunda fase realiza-se 36 a 48 horas depois, altura em que a mulher deve tomar em casa (ou no centro de saúde, se preferir) quatro comprimidos de um outro medicamento, que induz as contrações uterinas. Tal como no aborto por via cirúrgica, faz-se uma nova consulta dali a até três semanas.

Ora, à luz da lei nº 16 de 2007, é assegurado a qualquer profissional de saúde o direito à objeção de consciência relativamente a “quaisquer atos respeitantes à interrupção voluntária da gravidez”.  De qualquer modo, se por algum motivo um médico objetor acabar por atender uma mulher que pretende abortar, ele está obrigado por lei (Portaria n.º 741-A/2007) a assegurar o encaminhamento para o serviço competente. E se os estabelecimentos de saúde oficiais em que a existência de objetores de consciência impossibilite a realização da interrupção da gravidez nos termos e prazos legais, deve ser assegurado o encaminhamento para os estabelecimentos de saúde com quem tenha adotado as adequadas formas de colaboração.

Ao que o Observador conseguiu apurar, todos os hospitais da rede de referenciação no Algarve realizam a intervenção voluntário da gravidez. É a única região em que a rede funciona plenamente dentro do SNS.

Neste momento, nem a IGAS, nem a Direção Executiva do SNS sabem ao certo quantos hospitais da rede de referenciação estão impedidos de realizar intervenções voluntárias da gravidez  — ora porque todos os médicos ou enfermeiros declararam ser objetores de consciência, ora por falta de recursos humanos. “No âmbito da inspeção transversal que esta Inspeção-Geral se encontra a executar, um dos objetivos é a verificação da atualização dessa listagem”, disse fonte oficial ao Observador.

Mas, ao que o Observador conseguiu apurar, todos os hospitais da rede de referenciação no Algarve realizam a intervenção voluntário da gravidez. É a única região em que a rede funciona plenamente dentro do SNS. No Norte, 13 hospitais praticam o aborto e um referencia a utente para outras entidades públicas. No Centro, são seis os hospitais onde se fazem abortos e dois os que reencaminham para a rede pública. Em Lisboa e Vale do Tejo, sete hospitais da rede realizam a interrupção da gravidez e seis referenciam para clínicas privadas. No Alentejo, há um hospital que realiza abortos e outro que referencia. Nos Açores, uma instituição faz a interrupção e outra encaminha a mulher. Na Madeira, o único hospital da rede de referenciação realiza abortos.

De acordo com um balanço efetuado em 2011 pela Ordem dos Médicos, pouco depois da entrada em vigor da lei do aborto, havia 1.341 clínicos objetores de consciência — 934 da área da medicina geral e familiar (17,3% dos que havia nessa altura) e 407 da área da ginecologia e obstetrícia (26,5%). 

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