De norte a sul do país, passando pela imprensa e consultores internacionais, fomos à procura das novidades e das tendências da gastronomia e da restauração para este ano. Os chefs Miguel Laffan, Rui Sequeira, Rodrigo Castelo e Tiago Bonito deram-nos uma ajuda.
Do triunfo dos Panasiáticos às tascas bistro
A cozinha japonesa de autor, acompanhada pela emergência dos sabores coreanos, tailandeses e vietnamitas é tendência do ano para o chef, e vencedor de uma estrela Michelin, Miguel Laffan. “A Ásia está claramente em expansão, o que não é novidade. Há uma cozinha de autor, num trajeto de alta gastronomia, é que é novo é o bom nível. Já não estamos a falar só se sushi e sashimi.”
Das fajitas às quesadillas, as influências sul-americanas também vão continuar no mapa. “Tendência, tendência”, aponta Miguel Laffan, “são a nova geração de tabernas, tascas, espaços de inspiração e cultura portuguesa — bem decorados e inteligentes, muito ao estilo bistro – lançados por chefes de cozinha, que rompem um bocadinho com as experiências do fine dining e se encontram numa cozinha mais próxima.”
Experiências, procuram-se
Em formato fine dining — com menus de degustação que podem incluir entre quatro, sete a doze pratos –, bartenders convidados ou dj’s, “a constante novidade e a diversidade de experiências — sejam elas gastronómicas ou sociais, vieram para ficar”, sublinha o chef algarvio Rui Sequeira. “Hoje em dia, sair para jantar envolve toda a logística da segurança e dos testes da pandemia. Deixou de ser fortuito. O cliente sai menos vezes e a tendência é procurar experiências que diferenciem”, traça o chef do Alameda e do recém criado restaurante asiático Monky, ambos em Faro.
Cada vez mais em voga “para quem pode” e “especialmente na linha de Cascais, Lisboa e Comporta”, as experiências gastronómicas de luxo ao domicílio são, de resto, o mote do Once in While do chef Miguel Laffan. “Há cada vez mais residentes estrangeiros em Portugal que não se importam de pagar para ter serviços gastronómicos personalizados, que vão desde as compras com o chef ao acompanhamento in loco do processo.”
O que é da terra é bom
“O regionalismo é cada vez mais transversal”, vinca Rodrigo Castelo. O chef do Balcão, em Santarém, fala num ano de continuidade, onde a proximidade com os produtores da terra e a reinterpretação dos sabores da regionais são protagonistas. Mais acima, em Amarante, Tiago Bonito implementou a mesma linha na Casa da Calçada. “Quando nos visitam, as pessoas estão à procura dos nossos sabores, da nossa oferta regional, então, apoiar a localidade e os produtores é o foco que se reflete no prato”, assegura o chef ao Observador.
Na prática é o regresso do terroir e da relação íntima entre o solo e o micro-clima na confeção única dos pratos. “Não conseguimos cozinhar o mesmo prato em duas localidades diferentes. A água de Amarante é a água de Amarante, o clima e atmosfera também são diferentes. Tudo faz parte do ADN da região e a tendência é preservar e enaltecer estas origens. ”
Mais. Esta ligação direta à terra está a inundar os cardápios de opções verdes. Sem cortar com a proteína animal, os restaurantes têm cada vez mais pratos de origem vegetal.
Olá, hibisco
Do chá para os biscoitos, o hibisco vai temperar saladas, gelados, iogurtes e bebidas gaseificadas. A Forbes já lhe chama o “sabor do ano” e nem a gigante da distribuição alimentar Whole Foods Markets lhe fica indiferente. De resto, o hibisco figura entre as 10 maiores tendências alimentares de 2022, traçadas pela equipa de produtores, compradores e especialistas em gastronomia da cadeia mais procurada quando o assunto são produtos naturais e orgânicos.
A dose extra de vitamina C e outros antioxidantes explicam o sucesso do ingrediente que já era usado para refrescar o corpo e acalmar o espírito dos faraós do antigo Egito.
E por falar em beleza
Beleza, imunidade, saúde mental… tudo numa garfada ou numa bowl, para sermos mais realistas. Mais do que as preocupações de saúde levantadas pela pandemia, a descoberta do colágeno, ácido hialurónico, biotina, proteína ou vitamina C nas chamadas superfrutas abriu um novo capítulo na comida saudável, estima a thefoodpeople. Granola, sementes goji, chia, banana, kivi, morango, mirtilos, mel ou manteiga de amendoim combinam com açaí, pitaia ou acerola.
Tomate, sementes, bagas, azeite e chocolate negro estão na lista de alimentos que ajudam a combater cancro e demência, dos chefs que ajudam a cozinhar a lista ‘What’s Hot 2022′.
Carne sim, da cultivada também e… leite de batata
Entre os vegetarianos e os que não concebem um prato sem as devidas porções de proteína animal — passando, claro, pelas preocupações com o meio ambiente — a cultura do reducionismo propõe o meio termo: cortar carne, peixe e laticínios, sem erradicá-los da dieta.
A tendência já tinha começado a dar sinais nas prateleiras e nas etiquetas “criado ao ar livre”. Com opções cada vez mais atrativas, a corrente que quer reduzir impactos ambientais reforça-se no mundo das opções com leite de batata ou nuggets à base de vegetais. Pelo menos é o que preveem, em simultâneo, os consultores norte-americanos da Baum+Whiteman e os britânicos da thefoodpeople. “Os menus à base de plantas são uma alternativa à escassez de proteína animal”, também alerta a National Restaurant Association na previsão ‘What’s Hot 2022’.
Pegada ecológica e as novas calorias
Os QR-Codes que nos permitem medir a pegada ecológica dos ingredientes vieram para ficar nas embalagens e nos cardápios. A thefoodpeople já lhe chama a nova contagem de calorias. Mais do que a descrição exata do percurso e da composição dos produtos, reciclar está na ordem do dia e já não se trata apenas de reaproveitar a casca da batata para fritar. A tecnologia está aí para transformar casca de camarão em condimentos naturais, e por aí fora.
A recém criada estrela verde dos Michelin distingue práticas sustentáveis na cozinha, desde maio. Em Nova Iorque, o Eleven Madison Park, inaugurou a época alta vegana na alta cozinha. “O que poderia ter-se tornado restritivo, provou ser infinitamente expansivo. A prova mais vibrante está no prato: os nossos nunca foram tão saborosos”, escreve o chef Daniel Humm, na nova carta de apresentação do restaurante que foi eleito melhor do mundo em 2017.
Outros resquícios da pandemia: em casa, na esplanada ou nas redes sociais
No restaurante ou em casa, a cozinha não tem dado sinais de abrandamento. Impulsionadas pelos confinamentos, as aplicações de delivery vieram para ficar. Este ano, os chefs vão continuar a entrar-lhe casa a dentro. Ainda no verão passado, a dona da Uber Eats inaugurou uma nova sede em Portugal e a Bolt também se juntou à Glovo na entrega de comida.
Remetidas durante anos à sazonalidade, as esplanadas vão manter-se na paisagem. Livro de receitas dos tempos modernos, as redes sociais prometem continuar a acrescentar seguidores à cozinha do faça você mesmo. Recentemente, um relatório da Intacart Year in Groceries, mostrava que 90% dos inquiridos inspirava as rotinas alimentares nos feeds do TikTok, Instagram, Facebook ou Twitter.