Na vida de João Cutileiro, escultor português que morreu esta terça-feira com 83 anos, há um momento definidor que muitos conhecem, mas que ganhou uma interpretação algo mística.
Era João Cutileiro um adolescente, em trânsito rumo a Cabul, Afeganistão, com o resto da família que se mudava de Portugal devido a um “problema político-profissional” do pai no início dos anos 50 — em pleno Salazarismo — quando se despediu do progenitor, da mãe e dos dois irmãos e decidiu apanhar um comboio para Florença.
O local onde todos estavam no momento em que o bilhete foi comprado era Genéve. E era ali que a família ficaria alguns dias, à espera de uns papéis que permitissem que os Cutileiros prosseguissem para Cabul. “Íamos ficar em Genève entre o Natal e o ano [novo], de certeza. Disse à família: boa tarde, apanho ali o comboio e vou para Florença”, recordaria o escultor muitos anos depois, em entrevista a Carlos Cruz no programa “Carlos Cruz — Quarta-Feira”, que o apresentador tinha então na RTP.
Ao longo dos anos, o momento foi visto por alguns como “A” altura em que João Cutileiro se apercebeu de que queria ser escultor. Tendo em conta que tinha apenas 14 anos, é tentador especular e imaginar que ao chegar a Florença, vendo as obras de Miguel Ângelo, o jovem ficara apaixonado pela escultura e decidira que seria esse o seu futuro. Mas esse futuro, na verdade, estava decidido — na medida em que o futuro de alguém de 14 anos pode estar decidido.
A viagem para Florença, que realmente o marcou e que antecipou o que viria a ser uma vida profundamente marcada pela escultura, aconteceu porque João Cutileiro estava já tão interessado nas artes que viajou por interesse artístico. O próprio o confirmou na longa entrevista que deu à RTP em 1999, onde explicava a curiosidade por Florença: “Era o sítio da escultura. Já que Atenas estava um bocado mais longe, [Florença] estava ali a uma dúzia de horas, se tanto, de comboio”.
Foi inclusivamente já a escultura que permitiu essa viagem feita aos 14 anos. Sem pedir dinheiro à família, viajou para Florença com dinheiro próprio, que conseguira com obras que, apesar de muito novo, já fizera e vendera, “uma ou duas em pedra, o resto ainda em barro”. Numa entrevista dada ao Jornal da Universidade de Évora no ano 2000, disponibilizada entretanto online, corroborava: “Fui a Florença porque já estava mais do que determinado em ser escultor. Fui exatamente porque queria ver ao vivo tanta coisa que me pesava na história da escultura ocidental”.
A viagem para Florença aos 14 anos viria a ser importante para o percurso do escultor português. Sê-lo-ia pelo contacto com as obras de Miguel Ângelo, que teve como referência — embora considerasse a sua primeira Pietà “demasiado lambida”, demasiado perfeitinha e polida, demasiado “acabada”, citava regularmente a ideia de Miguel Ângelo de que a escultura tinha de ser depurada, que a boa escultura era aquela que era atirada por um monte abaixo e que na queda perdia as “gorduras” que tinha a mais. “E eu atrás, a apanhar os bocados e a fazer esculturas com os bocados”, brincava.
Cristão mas não católico — dizia identificar-se com os princípios humanistas e fraternos do cristianismo, mas não com a valorização do auto-sacrifício, com a valorização do sofrimento como redenção e salvação dos outros e com a ligação da Igreja Católica ao Estado Novo —, procurou crescentemente ao longo do seu trajeto depurar as suas obras, simplificá-las e sintetizá-las. Dizia que cada escultura nova que fazia resultava em parte dos “falhanços” e erros que identificara na anterior. E opunha-se terminantemente a uma ideia “fascizante” de escultura, que para ele consistia em usar monólitos e obras de arte para louvar simplisticamente ideais ou personalidades. Como vincava, “não há ideais e pessoas suficientemente sólidos para sem falsidade se lhes fazer uma escultura monolítica”.
João Cutileiro morreu esta terça-feira, deixando um legado incontornável na história das artes portuguesas. Incontornável, sim, mas não consensual: como reiterava tantas vezes citando Sartre, ser compreendido por toda a gente e adorado por toda a gente era um sinal de deficiência qualitativa. Teve obras questionadas, criticadas, vexadas, mas era também na provocação e subversão do classicismo que se preenchia.
O “irmão do meio” com ambição de artista
Enquanto crescia, colecionou moradas. Nasceu em Évora, em 1937, filho de Amália, dona de casa, e de José Cutileiro, médico — que deu o mesmo nome ao seu primeiro filho, que tinha mais três anos do que João e que se tornaria diplomata e embaixador. A família teve quatro filhos, mas um deles morreu muito novo, tornando o escultor o “irmão do meio”.
Entrevista de vida ao embaixador José Cutileiro: “Cantei o hino para um casal de amantes em Cabul”
A sua infância foi passada parcialmente nos Açores: viveu ali entre os quatro e os seis anos, ou seja, entre 1941 e 1943, anos em que ainda decorria a II Guerra Mundial. A deslocação resultou, como tantas vezes aconteceu enquanto crescia, do exercício profissional do pai: José fora exercer medicina militar, tendo sido mobilizado então para dirigir o Hospital Militar da Terceira.
Em Lisboa, regressado dos Açores, cresceu numa casa na Avenida Elias Garcia, onde se discutia política no auge do Estado Novo. Tanto a discussão era habitual que uma das primeiras memórias do escultor até foi anterior à vida em Lisboa: à RTP, contou que se recordava do pai contar em casa que os alemães se tinham retirado de Stalingrado. Tinha quatro anos quando isso aconteceu. Mais tarde, acabou mesmo por passar brevemente pelo Movimento de Unidade Democrática (MUD) e pelo Partido Comunista Português (PCP).
O pai era um homem de oposição, republicano e avesso ao Salazarismo. E foi pelas relações do pai que cresceu rodeado de figuras intelectuais da época, a ponto de dizer no final dos anos 90 que bastava passar por Telheiras que encontrava nos nomes das ruas as personalidades que eram presença habitual em casa dos seus pais, ou a cuja casa ele próprio se deslocara com a família.
Sarcástico como tantas vezes, responderia assim em 2000 numa entrevista publicada no Jornal da Universidade de Évora, a uma pergunta sobre se ter “contactado com pessoas como Vieira da Silva, Lopes Graça ou António Pedro” fora importante para “construir o João Cutileiro que conhecemos hoje”: “Suponho que sim… Não tenho outro ‘João Cutileiro’ que não tenha convivido com essas pessoas para comparar…”
As relações sociais do pai ajudam no entanto a explicar a sua precocidade na relação com as artes: com apenas 9 anos, já era levado pelo ator, encenador, escritor, artista plástico e membro do Grupo Surrealista de Lisboa António Pedro da Costa para o ateliê deste, desenhando. E aos 8 anos já fazia “um programa infantil da Nestlé”, como “locutor”. O pai frequentava o histórico café A Brasileira e isso, como lembrava João Cutileiro na entrevista de vida dada a Carlos Cruz, era meio caminho andado para criar relações com gente das artes: “Bastava uma pessoa estar minimamente interessada nas artes, começando a pescar… bastava sentar-se numa mesa d’A Brasileira e entrar em contacto com um. Depois os outros vinham de arrasto”.
Foi assim que João Cutileiro cresceu em Lisboa, começando desde cedo a trabalhar em escultura — o facto de aos 14 anos ter dinheiro para viajar para Florença só com as vendas de peças é sintomático disso. Nos dois anos anteriores, com 12 e 13, frequentara o estúdio do pintor e ceramista António Barradas. Aos 14 teria a sua primeira exposição individual em Reguengos de Monsaraz, numa pequena loja onde exibiu peças variadas, entre esculturas, pinturas, aguarelas e cerâmicas. E viria ainda a trabalhar dois anos como assistente de canteiro — tendo, assim, o seu primeiro contacto mais sério com o trabalho em pedra — no ateliê do escultor António Duarte.
A viagem para o Afeganistão na adolescência, da qual fizera um desvio para visitar Florença, explicava-se novamente pelas mudanças de trabalho do pai. Este, sofrendo retaliações no acesso a cargos académicos e profissionais pela conhecida opinião negativa do regime, decidira mudar-se para Cabul, onde trabalharia durante um ano como professor de higiene e saúde pública, ao serviço da Organização Mundial da Saúde.
Regressado a Portugal do Afeganistão, João Cutileiro ainda completaria o liceu no Colégio Valsassina e frequentaria a Escola Superior de Belas Artes de Lisboa, mas abandonou a última a meio, agastado com aquilo que considerava serem restrições e visões avessas ao experimentalismo artístico.
A ida posterior para Londres, para estudar na Slade School of Art, aconteceu em parte por causa da pintora Paula Rego, que a frequentava à época. A história foi contada por Cutileiro a amigos e a jornalistas, em entrevistas. Sabendo que a pintora frequentava a escola, de boa reputação, aproveitou uma ida de Paula Rego a Portugal numas férias de Natal para lhe perguntar como se entrava para a Slade. A pintora pediu-lhe uns papéis, Cutileiro entregou-lhe um dossiê em que apresentava alguns dos seus trabalhos e ideias e a escola londrina aceitou-o como aluno.
A estadia em Londres foi artisticamente proveitosa, com os seus espinhos: o pai morreu três meses depois de João Cutileiro começar a estudar em Londres. Mas o escultor por ali continuou, aliando à frequência das aulas vários biscates para poder viver na capital inglesa. Foi, entre coisas, professor de português, locutor da BBC em português, descarregador de caminhos de ferro, trabalhou no cais com comboios de carga de peixe e ainda foi modelo em outras escolas. O último trabalho, habitual nos alunos de Belas Artes de Londres, consistia em que os alunos fossem a outras instituições de ensino que não a sua servir de modelos nus a colegas.
O biscate de modelo era aquele de que João Cutileiro menos gostava, não por ser modelo de nus mas porque, como disse em entrevista, “era horroroso estar três quartos de horta na mesma posição, doíam-me os músculos todos de estar parado, era terrível”.
Depois de terminar o curso na Slade School of Arts, no qual teve como um dos principais professores o britânico Reg Butler — conhecido pelas suas esculturas de figuras femininas e importante nome da arte do Reino Unido no pós-guerra — permaneceu na capital britânica. Casou-se ainda durante a estadia em Inglaterra e do segundo casamento teve dois filhos, Tiago e João.
Se até ao final dos anos 50, em que frequentou a escola de artes britânica (terminou o curso em 1959), teve várias exposições — integrou a I Exposição de Artes Plásticas da Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, em 1957, e expôs por duas vezes na galeria Young Contemporaries, em Londres —, foi a partir dos anos 60 que a sua produção artística se começou a intensificar.
Nos anos 1960, sucederam-se as exposições e João Cutileiro começou a usar máquinas elétricas para corte de pedra, o que seria uma mudança importante na sua produção. Fez diversas exposições em Lisboa e no Porto, passou a viver em trânsito e em 1970 voltou a Portugal em definitivo, instalando-se em Lagos, no Algarve, onde viveu durante os anos 70 e até meados dos anos 80. Como chegou a explicar, “aquilo”, e aquilo era Inglaterra, era às vezes “demasiado pesado”. Além de que a dada altura perdeu o “ateliê em Londres” e “os miúdos [filhos] entraram em idade escolar”, como disse ao semanário Sol.
Antes disso João Cutileiro voltava já a Portugal para “recarregar baterias” e como “tinha uns amigos em Lagos”, era para casa deles que muitas vezes ia. Até que decidiu comprar a sua própria casa na localidade algarvia e “por lá fui [foi] ficando”. Quinze anos. Só saiu para se mudar para Évora em 1985, cidade onde nascera e onde viveu daí em diante, trabalhando no seu ateliê. Ao jornal da universidade local, explicou a última mudança: “Évora é muito bonita e é uma espécie de principado. Tem uma força própria muito grande. (…) Nós temos aqui a maior parte das coisas, Lisboa não tem muito mais para nos oferecer, nem o Porto. Mais, só em Nova Iorque. ‘Évora ou Manhattan‘, é o que eu gostava de ter nas t-shirts!”.
“As forças que me moldaram”
Ao longo de décadas de produção artística, nas suas esculturas predominavam alguns temas, como ele próprio reconhecia: as mulheres, as árvores, as flores, os guerreiros e seus comandantes, os poetas, o amor. O grosso da sua produção passa por esculturas de mármore de corrente figurativa. E recentemente assumia em declarações gravadas em vídeo: “A sexualidade e a fome, as fome, portanto a fome sexual e a fome gastronómica, são as forças que me moldaram. E que se refletem, certamente, em todo o traço que faça”.
João Cutileiro dedicou-se, entre outras coisas, a criar obras sobre figuras e momentos importantes, quase míticos, da história nacional, como D. Afonso Henriques (há uma escultura sua inspirada pelo rei em Guimarães, mais especificamente no Largo da Misericórdia), Luís Vaz de Camões (concebeu uma estátua em mármore e pedra granítica representando o poeta, que pode ser vista no Centro Cultural de Cascais), o 25 de abril (que inspirou uma obra polémica que está no Parque Eduardo VII), D. Sancho I (em Torres Novas) ou Dom Sebastião (outra obra polémica, colocada na praça Gil Eanes, em Lagos), entre tantos outros.
A escultura de D. Sebastião, colocada em Lagos e inaugurada em 1973 — ainda durante o Estado Novo —, foi uma das suas primeiras obras polémicas. Confrontando os valores do regime, que não só celebrava o nacionalismo (de que D. Sebastião era referente messiânico) como uma produção artística significativamente mais convencional, ilustrou o rei perdido em combate na sua escultura com traços infantis, nada divinos, não lhe acentuando traços de coragem ou nobreza.
Esse Dom Sebastião foi aliás parcialmente oferecido por João Cutileiro, que apenas recebeu as horas de trabalho e o material que usara para conceber a escultura (não a vendendo). Ao Jornal da Universidade de Évora, garantiu que não teve “a mais pequena intenção de fazer uma rutura com a escultura portuguesa” mas explicou a oferta: “Queria fazer e não queria estar sujeito às pressões deles. De forma que cada vez que eles me vieram chatear ‘não seria melhor assim ou assado?’, eu dizia: ah não querem? De forma que continuei com a liberdade toda”.
Mais recentemente, em declarações à margem da exposição “Pós-Pop” da Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, apontava: “A estátua [de Dom Sebastião] não era bem aquilo a que as pessoas estavam habituadas. E eu tenho tido essa perseguição, se assim se pode dizer. Para mim é um orgulho”. E muito antes, ao Expresso, já brincara: “Eu costumo dizer por graça que o MFA, em 73, veio ter comigo e pediu-me: ‘fazes uma estátua controversa, pões na praça de Lagos e, ao fim de seis meses, se ainda lá estiver, é porque isto já está podre e nós podemos entrar’. Embora seja uma graça, também é a realidade: tenho a impressão de que, cinco anos antes, aparecia uma grua e aquilo vinha abaixo”.
Já sobre o Memorial ao 25 de Abril colocado no Parque Eduardo VII, muito criticado pelo seu aspeto fálico e esse sim vendido, chegou a recordar uma conversa com João Soares, que lhe dissera não queria ver maquete alguma e que lhe deu toda a liberdade para fazer o que quisesse. “Achei isso fantástico vindo de um tipo do poder, dos que gostam sempre de ver ‘mais ou menos como é que vai ficar’, que não querem condicionar o artista ‘mas‘…”.
Na entrevista de 1999 à RTP, comentara assim a polémica em torno do memorial colocado em Lisboa: “Não posso ser juiz de mim próprio. (…) Já tinha tido várias solicitações no passado de fazer memoriais ao 25 de abril. Sempre pensei em termos de fonte, em água e água a mexer, porque o 25 de Abril não foi um movimento com uma intenção positiva, foi um movimento com uma intenção negativa, de resposta a algo que não agradava à maioria dos portugueses, para depois fazermos a nossa vida e construirmos a nossa sociedade” (…) Acho que o 25 de abril foi uma fonte, uma fonte de vida para todos nós”.
Paralelamente às obras já citadas, João Cutileiro teve esculturas e mosaicos expostos em Wuppertal e em Dortmund, na Alemanha, expôs em Washington D.C., em Nova Iorque (na Jones Gallery) e em São Paulo (na XV Bienal Internacional da cidade) e foi alvo de diversas exposições antológicas, como aconteceu em 1990, na Fundação Calouste Gulbenkian, por exemplo, entre outros momentos marcantes de carreira. Pelo contributo artístico, foi condecorado em 1980 com a Ordem de Sant’Iago da Espada, Grau de Oficial e recebeu o Doutoramento Honoris Causa pela Universidade de Évora e pela Universidade Nova de Lisboa. Já em 2018, foi-lhe atribuída pelo Governo a medalha de mérito cultural. A última condecoração marcou também a formalização da doação do espólio de Cutileiro ao Estado.
Mais recentemente, o seu legado artístico foi refletido na exposição “Constelação Cutileiro”, que pôde ser vista entre outubro de 2018 e fevereiro de 2019 no Centro Internacional das Artes José de Guimarães e que pretendia mapear “a duradoura e ampla influência que João Cutileiro teve na arte portuguesa dos anos 1960 a 1990”, nomeadamente no “grupo de Évora (Charrua, Bravo, Lapa, Palolo) e a geração de artistas surgidos na década de 1980 (Manuel Rosa, José Pedro Croft, entre outros)”.
A sua influência em artistas plásticos e escultores de gerações mais jovens, que em alguns casos foram recebidos e apoiados por José Cutileiro no seu ateliê em Évora, é um dos contributos que o tornam decisivo na evolução da escultura nacional das últimas décadas. Chegou aliás a promover na cidade, em conjunto com o Ar.Co — Centro de Arte e Comunicação Visual, a realização do I Simpósio Internacional de Escultura em Pedra, juntando escultores internacionais (como Sergi Aguillar, Minoru Niizuma e Pierre Szekely, entre outros) com jovens escultores portugueses como José Pedro Croft, Brígida Arez, Manuel Rosa ou António Campos Rosado.
Apesar das condecorações públicas e dos elogios do Estado e do ministério da Cultura — após a doação do espólio, foi elogiado pelo ministério como “indiscutivelmente um dos mais singulares artistas portugueses do século XX” —, João Cutileiro garantira que nunca andara de braço dado com o poder. Em 1993, dizia ao Expresso: “Talvez por uma herança de passado antifascista, como se diz, repugna-me andar a esfregar os ombros com o poder para sacar as estátuas. Há pessoas responsáveis com quem tenho o maior dos prazeres em lidar, há outras que não, e eu transmito, um pouco como os cães, um cheiro que diz às pessoas que não gosto delas, e eles não me encomendam. De facto, as grandes coisas nunca vêm para mim”.
Também fotógrafo, fã de poesia (chegou a escrever versos, que só publicou — poucos — avulsamente em revistas e jornais) e de desenho em aguarelas, lembrava que “todos os artistas fazem peças de decoração” e que se desenganasse quem achava o contrário, porque “quando o cliente as compra e põe em casa, é uma peça de decoração”. Mas demorava algum tempo, muitas vezes cinco anos, a desfazer-se das obras que fizera e a vendê-las. Não mais o poderá fazer, mas o seu nome estará inevitavelmente inscrito nas primeiras linhas da história portuguesa.