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Life Along The Lithuanian Border With Russia's Kaliningrad Exclave
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A fronteira entre a Lituânia e Kaliningrado

Getty Images

A fronteira entre a Lituânia e Kaliningrado

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Kaliningrado. O bloqueio parcial ao enclave pode levar a uma invasão russa da Lituânia?

Após bloqueio parcial de mercadorias para Kaliningrado, o Kremlin ameaçou que a Lituânia sofrerá represálias que não serão apenas diplomáticas. País Báltico tem razões para temer invasão?

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O aumento da escalada de tensão entre a União Europeia (UE) e a Rússia nunca tinha sido tão evidente. Na origem dos problemas está Kaliningrado, um território russo banhado pelo mar Báltico, cercado por dois Estados-membros da UE, a Polónia e a Lituânia. As autoridades lituanas decidiram bloquear parcialmente o envio de mercadorias para o enclave, o que enfureceu o Kremlin.

O Ministério dos Negócios Estrangeiros lituano garantiu, em resposta ao Observador, não estar a aplicar qualquer sanção individual contra Moscovo, explicando que está apenas a colocar em prática as “medidas restritivas” decretadas por Bruxelas decorrentes das “ações desestabilizadoras da Rússia na Ucrânia”. Algumas das sanções incluem exatamente a proibição da circulação de certas mercadorias oriundas da Rússia que “estão proibidas de entrar na União Europeia”. 

Mas isso não acalmou os dirigentes russos, que acusaram estas medidas de “não terem precedentes” e de consistirem numa “violação do direito internacional”. As autoridades de Moscovo prometem retaliar, garantindo que a resposta será “extremamente dolorosa” para a população da Lituânia e não se ficará apenas pelo campo diplomático — conjeturando-se uma possível resposta militar.

O início de uma invasão à Lituânia? Senador russo já fala em “casus belli”, EUA apoiam Lituânia

Para já Kaliningrado abriu uma nova frente de guerra entre a União Europeia e a Rússia. Mas não só: porque as ameaças russas contra os lituanos têm-se repetido. O senador russo Andrei Klishas já admitiu que a Lituânia está a “violar a soberania da Rússia” e que o bloqueio parcial se configura como um “casus belli”, ou seja, é um motivo suficientemente grave para iniciar uma guerra. 

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Ora como parte da NATO, qualquer resposta de âmbito militar contra a Lituânia desencadeada pela Rússia obrigaria a invocar o artigo 5.º da aliança militar, que estipula que um ataque a um significa um ataque a todos. Neste cenário, irromperia uma guerra não na Europa, não apenas uma “interveção militar, mas mundial — que oporia diretamente os Estados Unidos à Rússia.

Washignton, aliás, já se pronunciou sobre o assunto. O porta-voz da diplomacia norte-americana, Ned Price, disse, na terça-feira, que os Estados Unidos estão “ao lado dos aliados da NATO e da Lituânia”, garantindo que o “compromisso” firmado sobre o artigo quinto é para se manter, independentemente das circunstâncias. “A Lituânia tem sido um parceiro fiel”, assegurou ainda o responsável.

Ned Price

Ned Price, porta-voz da diplomacia norte-americana, disse que EUA apoiam a Lituânia

Agência Lusa

O especialista em Estudos Europeus, Henrique Burnay, desdramatiza. Em declarações à Rádio Observador, assinala que “a Rússia tem noção de que, se a resposta ao embargo da Lituânia, que é um embargo europeu, fosse uma resposta militarizada, isso seria atacar um país-membro da NATO”, sendo que Moscovo está consciente das consequências que provocaria. Além disso, Burnay salienta que um ataque militar em território lituano também originaria uma resposta de Bruxelas, uma vez que o Tratado da União Europeia prevê a “cooperação entre os Estados-membros em matérias de segurança ainda por cima no que diz respeito a uma sanção europeia”.

Ouça aqui o episódio do podcast “Gabiente de Guerra” sobre a tensão entre a Lituânia e a Rússia.

“A Rússia tem noção de que a Lituânia é membro da NATO”. A análise de Henrique Burnay à tensão no exclave de Kaliningrado

Ainda assim, Henrique Burnay ressalta que “nada nos indica que a Rússia tenha agido sempre de forma absolutamente racional e contida“, ainda que também coloque como hipótese que a situação se resolva pela via diplomática.

Por sua vez, Ramūnas Vilpišauskas, diretor e professor universitário no Instituto de Relações Internacionais e Ciência Política na Universidade de Vilnius, não antevê uma resposta militar por parte da Rússia contra a Lituânia. Em declarações ao Observador, o especialista afirma que Moscovo está antes a tentar “pressionar” o país Báltico a “mudar a sua política de apoio à Ucrânia e às sanções da União Europeia”. 

Ouça aqui o episódio do podcast “A História do Dia” sobre as ameaças russas a Vilnius.

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O Presidente da Lituânia, Gitanas Nauseda, também não acredita numa ofensiva militar, embora ressalvando que o país está preparado “para algum tipo de retaliação por parte da Rússia”. “Seria benéfico que a Comissão Europeia explicasse algum do conteúdo das sanções às autoridades russas, provavelmente removeria alguma da tensão que paira atualmente”, disse.

Presidente da Lituânia diz que país está preparado para uma retaliação russa. Mas descarta agressão militar

Também não é esperada uma retaliação do Kremlin que incida sob o domínio económico, segundo Ramūnas Vilpišauskas. “Em termos de instrumentos económicos, a Rússia não tem grande influência, porque a Lituânia parou de importar petróleo e gás natural da Rússia há meses”, explica.

Kaliningrado, a base militar da Rússia no Báltico

Em termos políticos, Kaliningrado é “um território separado da Rússia” que está “rodeado de União Europeia por todos os lados”, descreve Henrique Burnay, que clarifica que, com o bloqueio parcial da Lituânia ao transporte de algumas mercadorias por via terrestre, o envio destes bens apenas passou a ser possível através do Mar Báltico. Assim sendo, o especialista descreve a situação como “tensa”.

É que além de os países fronteiriços poderem servir como uma força de bloqueio, Henrique Burnay destaca como Kaliningrado é “importante do ponto de vista da estratégia militar” para a Rússia. O porto do enclave é o único que não fica congelado no inverno — o que lhe permite ser uma das sedes da frota russa —, permitindo também uma ligação por via marítima à segunda maior cidade russa, São Petersburgo.

O enclave funciona também como um elemento dissuasor aos avanços da NATO na região. Vários países, entre os quais a Lituânia, acusam a Rússia de ter colocado armas nucleares em Kaliningrado, apesar de Moscovo nunca o ter admitido. “De um ponto de vista da segurança, a militarização do enclave tem sido a principal preocupação para a Lituânia e também para a Polónia”, assume Ramūnas Vilpišauskas, acrescentando que o aumento da presença militar russa começou “há mais de uma década”.

"De um ponto de vista da segurança, a militarização do enclave tem sido a principal preocupação para a Lituânia e também para a Polónia"
Ramūnas Vilpišauskas, diretor e professor universitário no Instituto de Relações Internacionais e Ciência Política na Universidade de Vilnius

Kaliningrado representa uma ameaça direta ao Ocidente e à NATO até do ponto de vista geográfico. Exemplo disso é que, num programa da televisão pública russa, um painel de comentadores discutiu, no final de abril, que o lançamento do míssil intercontinental Sarmat (com capacidade nuclear, um dos mais avançados do mundo e o último com que Putin ameaçou a Europa) desde o enclave demoraria 106 segundos a atingir Berlim, 200 segundos para chegar a Paris e 202 segundos para atacar Londres, não havendo sistema de defesa na Europa que capaz de o intercetar.

Berlim, Londres e Paris. Canal estatal russo exibe imagens de possíveis ataques a capitais europeias

“As tropas russas e as armas em Kaliningrado devem ainda ser vistas em conexão com o aumento da influência russa na Bielorrússia”, aponta ainda Ramūnas Vilpišauskas, que dá o exemplo dos ataques dirigidos à Ucrânia por parte da Rússia em território bielorrusso.

Da Prússia à Rússia: a história de Kaliningrado

Kaliningrado fez parte de várias entidades políticas ao longo dos séculos, como o Reino da Polónia ou da Suécia. Antes da unificação da Alemanha em 1871, o enclave pertencia à Prússia. Até ao final da I Guerra Mundial, a região estava unida ao restante território alemão, mas a derrota da Alemanha em 1918 levou a que o território ficasse separado através do corredor de Gdansk.

Mais tarde, com o final da II Guerra Mundial, e com outra derrota alemã, a União Soviética apoderou-se do controlo de Kaliningrado, expulsando a população alemã que lá residia. Desde aí, a estratégia de Moscovo passou pela militarização da região, concedendo grande importância ao seu papel geopolítico.

Bevölkerung UdSSR: Marktszene

Kaliningrado em 1988, ainda sob o domínio soviético

ullstein bild via Getty Images

Após a queda da União Soviética, Kaliningrado manteve-se como parte integrante da Federação Russa. A independência de vários países, como a Lituânia, criou várias problemas logísticos à região. Tal como no período entre 1918 e 1946, em que o enclave ficou novamente separado do país que integrava. E as dificuldades aumentaram ainda mais com a entrada de várias ex-repúblicas soviéticas na União Europeia e na NATO.

A Rússia sempre deu “importância à região de Kaliningrado e ao trânsito através da Lituânia”, diz Ramūnas Vilpišauskas, diretor e professor universitário no Instituto de Relações Internacionais e Ciência Política na Universidade de Vilnius, que frisa que as regras da passagem de mercadorias “foi um dos temas abordados” nas negociações para a adesão à União Europeia. A solução encontrada passou pela facilitação da emissão dos vistos para os cidadãos que residem no enclave.

O trânsito de bens e as sanções da União Europeia

Tendo passado despercebido aos olhos da maioria dos europeus, o enclave apenas ganhou mediatismo depois de a Lituânia ter bloqueado parcialmente o trânsito por via terrestre de algumas mercadorias para Kaliningrado na semana passada.

O anúncio foi feito pelo governador da região de Kaliningrado, Anton Alikhanov, na sua conta pessoal do Telegram, numa publicação em que sinalizava que esta medida obrigaria a uma diminuição de 40 a 50% de transporte de mercadorias (tais como carvão, metais e materiais de construção) que a região importa do restante território da Rússia.

Russian President Vladimir Putin visits Kaliningrad Oblast

O governador de Kaliningrado disse que medida obriga a uma diminuição de 40 a 50% de transporte de mercadorias para o enclave

Getty Images

O governo da Lituânia destaca, em resposta ao Observador, que o trânsito de pessoas e os restantes bens não foi “interrompido” nem “banido” e realça que está a aplicar as “medidas restritivas tomadas pela União Europeia em conformidade com as regulação do Conselho e consultando a Comissão Europeia”. O Ministério dos Negócios Estrangeiros lituano justifica que a decisão teve como base o “quarto pacote de sanções contra a Rússia, que impôs uma proibição à importação de produtos de ferro e aço”, acrescentando que a 17 de junho terminou o período de adaptação decorrente de antigas “obrigações” contratuais, o que motivou o bloqueio parcial.

Kaliningrado. Governo da Lituânia garante não estar a aplicar qualquer “sanção unilateral” à Rússia

O chefe da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell, já veio confirmar esta versão — o país Báltico está apenas a cumprir as diretivas europeia: “A Lituânia não adotou quaisquer restrições unilaterais ou nacionais. Não é verdade. Aplica sanções da UE”. “O trânsito terrestre entre a Rússia e Kaliningrado não foi interrompido nem proibido. O trânsito de passageiros e mercadorias continua. Não há bloqueio.”

Ainda assim, a Rússia continua a exigir uma “restauração imediata do trânsito para Kaliningrado” e a ameaçar a Lituânia com “represálias” — sem ser ainda claro o que vai acontecer nos próximos dias.

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