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Tal como uma ilha está cercada de água por todos os lados, Nagorno-Karabakh está envolvida pelo Azerbaijão, a antiga república soviética que, para todos os efeitos, é quem governa aquela região. Na verdade, e apesar de a Arménia também reivindicar o território — uma disputa que vem desde os tempos do Império Russo —, o enclave governa-se a si próprio, desde que proclamou a independência, depois da queda da União Soviética. Mas a República de Artsakh, onde mais de 75% da população é arménia, nunca foi reconhecida pela comunidade internacional. Em 2020 foi assinado um cessar-fogo entre Arménia e Azerbaijão, o que não impediu que mais de 1.200 pessoas tenham morrido ou ficado feridas desde então, segundo os números do think tank Crisis Group.
O que é que fez reacender a violência?
Nesta terça-feira, enquanto a Assembleia Geral das Nações Unidas discutia o conflito na Ucrânia, o Azerbaijão lançou o seu ataque, com uma série de bombardeamentos a atingir a capital da região, Stepanakert. O argumento foi dar início a uma “campanha anti-terrorista”, “limitada”, e “necessária” para restaurar a ordem no enclave.
Em comunicado, o Ministério da Defesa do Azerbaijão afirmou ser seu objetivo “desarmar e conseguir a retirada das forças armadas arménias” dos seus territórios e neutralizar as infraestruturas militares.
Já a Arménia, também através de comunicado do seu Ministério da Defesa, afirmou não ter tropas no Karabakh. Além disso, garantiu que a situação na fronteira com o Azerbaijão está estável e acusou o vizinho de estar a levar a cabo uma limpeza étnica.
O conflito é novo?
Não. Pelo contrário, o conflito “é o mais antigo da Eurásia pós-soviética”, descreve o Crisis Group. Depois da Revolução Russa de 1917, que pôs fim ao império dos czares, Arménia e Azerbaijão disputaram o enclave, onde os dois maiores grupos étnicos são os arménios e os azeris (ou azerbaijanos).
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Nessa altura, o Azerbaijão ficou sob controle dos bolcheviques e Karabakh viu as suas fronteiras serem redesenhadas para incluir o maior número possível de arménios. Ganhou um estatuto especial dentro da República Socialista Soviética do Azerbaijão: apesar de estar inserida dentro dela, era uma região autónoma, já então chamada de Nagorno-Karabakh.
Durante a União Soviética houve problemas?
Sob o controlo do Partido Comunista, as disputas entre as repúblicas vizinhas amenizaram, mas assim que a URSS começou a dar sinais de estar moribunda, o conflito armado regressou. Ainda antes de 1991, quando a União Soviética colapsou, teve início a Primeira Guerra de Nagorno-Karabakh (1988-1994).
O que é que aconteceu durante a guerra de 1988-1994?
O saldo dessa primeira guerra foi de mais de 30 mil mortos, a que se somaram mais de um milhão de refugiados: os azeri fugiram da Arménia, os arménios deixaram o Azerbaijão.
Em 1988, os arménios — que eram a maioria da população da região autónoma — exigiram que Nagorno-Karabakh passasse das mãos do Azerbeijão para as da Arménia. O que começou por ser tensão política escalou para um conflito armado, e, antes de a guerra chegar ao fim, em 1991, o enclave autoproclamou a sua independência, intitulando-se República de Artsakh.
No final da guerra, em 1994, o enclave (bem como outros distritos vizinhos) eram, em parte, controlados pelos arménios, mas o Azerbaijão nunca desistiu de recuperar o território.
Mesmo sem reconhecimento internacional, a República de Artsakh, com o apoio da Arménia, tem, desde 1991, governado o seu território.
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Quando é que o conflito armado regressou?
Foi em 2020 que teve início a Segunda Guerra de Nagorno-Karabakh, iniciado com uma operação militar dos azeri. Se, na primeira guerra, foi a Arménia quem ficou com territórios do país vizinho, neste segundo conflito, com ajuda de drones comprados à Turquia e Israel, o Azerbaijão conseguiu uma vitória esmagadora, recuperando sete distritos e um terço do enclave.
A guerra durou 44 dias e a Rússia ajudou nas negociações de paz.
Qual foi o papel de Vladimir Putin em 2020?
O Presidente da Rússia envolveu-se pessoalmente na negociação de um cessar-fogo: Vladimir Putin mantinha uma aliança sólida com a Arménia e tinha boas relações com o Azerbaijão.
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O acordo entre as duas antigas repúblicas soviéticas implicou que fossem enviadas forças de manutenção da paz para a região: 2.000 militares russos que garantiam a segurança do corredor de Lachin — a única estrada que liga Nagorno-Karabakh à Arménia.
O corredor de Lachin ficou seguro?
Era essa a intenção ao enviar tropas russas para o local, além de que o Azerbaijão se comprometeu a garantir a segurança de todo o trânsito no corredor de Lachin, fosse em que direção fosse. A verdade é que os combates nunca terminaram, apesar de ter sido assinado o cessar-fogo.
Dois anos mais tarde, no final de 2022, o corredor foi encerrado alegadamente por ativistas ambientais azeris. Os únicos que tinham carta branca para passar eram as tropas de manutenção de paz russas e as equipas da Cruz Vermelha.
Novos confrontos entre Arménia e Azerbaijão antes das negociações de paz
Já este ano, em abril, o Azerbaijão criou um novo posto de segurança no corredor que teve, como efeito imediato, estrangular o trânsito de pessoas e bens entre a Arménia e o enclave. Na sua perspetiva, a medida serve para pôr fim ao fornecimento de armas arménias à administração separatista de Nagorno-Karabakh.
A Arménia considerou que a manobra foi uma violação clara do cessar-fogo de 2020.
Há paz à vista?
União Europeia, Estados Unidos e Rússia têm tentado, através de sucessivas negociações, que os dois países assinem um tratado de paz definitivo. Mas, nas últimas semanas, tanto a Arménia como o Azerbaijão têm feito acusações mútuas: há um aumento de forças militares do país vizinho a serem enviadas para a zona de tensão.
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Esta terça-feira, o Azerbaijão garantiu que vai levar a operação militar “até ao fim”, a menos que as forças arménias se rendam, o que faz temer que a terceira guerra de Nagorno-Karabakh esteja prestes a começar.