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Clube Desportivo de Mafra tem trabalhado com menos jogadores devido à Covid-19
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Clube Desportivo de Mafra tem trabalhado com menos jogadores devido à Covid-19

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

Clube Desportivo de Mafra tem trabalhado com menos jogadores devido à Covid-19

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

Marcelo disse que o Mafra era "organizado", do lado do clube nada se ouve e os adeptos elogiam José Cristo. Mas há zum zum no Convento

Jogador do Real Madrid afirmou que tinha adquirido o clube mafrense. Dirigentes do emblema da zona de Lisboa, muito elogiados e tidos em boa conta pelos locais, não falam. Câmara é importante.

Os que estavam disponíveis treinavam pela manhã às ordens de Ricardo Sousa. O barulho da bola nos passes, o deslizar dos carrinhos, o palavreado de quando em vez impróprio para ser reproduzido, ouvia-se tudo no campo Dr. Mário Silveira, com meia dúzia de sócios a assistirem ao treino. À primeira vista, um dia normal na vida do Mafra, clube que ocupa o meio da tabela na Segunda Liga e, como é apanágio desta competição nacional, não está a muitos pontos dos lugares de subida, nem dos lugares que já quase assustam um pouco. Treinados por Ricardo Sousa (filho de António Sousa, ex-internacional português e campeão europeu pelo FC Porto), os mafrenses treinavam com peças a menos, devido a um surto de Covid-19 no plantel que, segundo a imprensa desportiva nacional, terá afetado pelo menos cinco jogadores, ficando inclusivamente apenas um guarda-redes disponível para a deslocação a Matosinhos, esta quarta-feira, para mais uma jornada do Campeonato. Pelas vicissitudes do vírus, o encontro foi adiado.

Mas claro, houve treino com quem podia (e devia) estar no relvado. Afinal, o Mafra tinha sido também notícia esta segunda-feira por bons motivos: ao ser uma das duas equipas da Segunda Liga presentes no sorteio da Taça de Portugal, ficou a saber que, ao jogar os quartos de final no campo do Portimonense, se vencer segue-se o vencedor do Rio Ave-Tondela. Isto, claro, depois de uma histórica vitória por 3-1 frente ao Moreirense, a jogar sensivelmente uma hora com menos um jogador. Numa altura em que se discutem já lugares muito próximos do encontro decisivo, não apanhar Sporting e FC Porto não deixa de ser, em teoria, positivo. E era dia de treino mesmo que, no domingo anterior, o clube tivesse denunciado o que indica ser (mais) um assalto às instalações do seu complexo.

Era também, na manhã desta terça-feira, o raiar de sol seguinte à situação MarceloO do Real Madrid, o internacional brasileiro, o vencedor de quatro Ligas dos Campeões e de um total de 22 troféus pelos merengues, nos quais se incluem ainda cinco Ligas espanholas e outros sete títulos internacionais.

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Não, Marcelo não vem jogar para o Mafra, mas disse sim que teria adquirido o clube da zona de Lisboa que conta com seis Campeonatos de Portugal e quatro títulos na 3.ª Divisão, que se encontra organizado numa Sociedade Desportiva Unipessoal por Quotas (SDUQ) ao contrário das habituais SAD. Foi o próprio jogador de 33 anos a dizer que, por sempre ter possuído uma “visão bem clara” de como “expandir” a sua marca, “a aquisição de clubes foi uma oportunidade clara de investimento”.

Segundo Marcelo, “tudo começou em 2017 com a aquisição do Azuriz [clube brasileiro do Paraná] “. “O objetivo era torná-lo referência na formação de atletas e foi o que fizemos. Atualmente começamos a colher os frutos desse trabalho iniciado há quatro anos e podemos dizer que estamos em um processo de expansão de nossos clubes, agora com meu grupo, DOZE, a representar os meus interesses. A nossa mais recente aquisição foi o Mafra, clube da II Liga do campeonato português. A ideia é implementar nele uma estrutura que nos permita dar um salto no mercado europeu, traçando um elo com o Azuriz no Brasil. Assim temos o Azuriz a formar atletas e o Mafra a funcionar como uma vitrine para esses jogadores na Europa. E digo que estamos só a começar, vem muita coisa por aí nos próximos anos”, disse o defesa esquerdo, um dos melhores das últimas duas décadas, numa entrevista ao TNT Sports.

"O Mafra foi a nossa primeira aquisição e representa o start no mercado europeu. Os planos agora passam pela aquisição de mais um clube flagship, com uma torcida grande e de tradição"

Comentando ainda que existe um “potencial elo de ligação entre os mercados europeu e brasileiro”, Marcelo referiu ainda que o Mafra é “bem organizado financeiramente e sem nenhuma dívida”. “Agora estamos a investir nas suas infraestruturas e temos a expectativa que alcance o break even já em 2023″, disse. Isto tudo através da DOZE, uma holding que o jogador está a “estruturar e tem inauguração marcada para início de 2022”. Pegando nas palavras do jogador, a DOZE vai ser “a marca guarda chuva de todas as frentes de negócios”. “O Mafra foi a nossa primeira aquisição e representa o start no mercado europeu. Os planos agora passam pela aquisição de mais um clube flagship, com uma torcida grande e de tradição. Isso deve acontecer no segundo semestre de 2022, depois de uma nova captação. A nossa ideia é que esse novo clube seja complementar aos que já possuímos, de maneira a que um jogador formado no Azuriz e adquirido pelo Mafra depois possa ser comprado por esse clube flagship”, referiu ainda.

Marcelo já terá comprado Mafra. “Estava bem organizado financeiramente e sem nenhuma dívida”, diz lateral do Real Madrid

A situação pode ser surpreendente mas, em junho, o jornal O Jogo, pegando numa notícia avançada pelo site UOL Brasil, já havia confirmado que havia a hipótese de um envolvimento com o craque brasileiro e o Azuriz. “Há aqui uma possibilidade de fazermos uma parceria com a Azuriz onde o Marcelo também está envolvido. É tudo ainda muito embrionário e nada está feito”, declarou então o presidente do Mafra José Cristo, há cerca de três décadas na liderança do clube. No entanto, no verão, o responsável foi claro relativamente a uma possível alienação da maioria do capital social de uma SAD, se esta fosse eventualmente criada: “Se passarmos a SAD, será sempre com a maioria em poder do Mafra. As conversas com o Marcelo podem ajudar na vinda de jogadores e num apoio financeiro. A maneira antiga de trabalhar tem funcionado bem no Mafra e vai continuar, sem qualquer problema. Somos um clube sem dívidas, certinho, honesto, organizado, que paga a horas e por vezes temos visto clubes onde as coisas correm mal. Agora, se este acordo for fechado será muito bem vindo”, disse na altura.

E esta terça-feira, num dia típico para a altura e zona do país, cinzento, o Observador deslocou-se à terra que alberga o imponente e belo Palácio Nacional de Mafra para tentar falar com os responsáveis do clube mafrense. Ouvia-se tudo (os carrinhos, os passes, os palavrões), mas dos responsáveis do clube nem por isso, que pretenderam assim não revelar qualquer reação ao que foi dito pelo jogador do Real Madrid. Restavam, por altura do não, três adeptos nas bancadas do Dr. Mário Silveira. Sabendo das notícias do dia, demonstraram algum desconhecimento perante a situação, na medida em que frisaram várias vezes (e isto não foi virgem ao longo do dia) a necessidade de levar este tipo de situações a “Assembleia”. “Talvez um protocolo ainda vá, agora comprar…”, afirmou um dos homens.

Posto isto, não foi difícil encontrar em Mafra, sobretudo junto ao Convento (calhau, como lhe chamam vários dos locais, aprendemos), adeptos do clube ou, até, grupos que discutiam futebol.

O primeiro homem a falar com o Observador foi Francisco, que aos 80 anos gabou-se de ter jogado “14 anos no Mafra, a custo zero e sem razões de queixa“. Mesmo em idos anos, recorda que o clube já era “bem organizado” e que na altura “havia sempre um miminho“, leia-se “uma sandes ou assim”, no final dos jogos. “Jogava-se por amor à camisola, porque eu ganhei dinheiro foi a jogar à bola em Moçambique”, frisou. Mas, saindo de Moçambique e voltando a Mafra, porque é que o clube é apetecível a investidores? É que, recorde-se, não foi assim há tantos anos que o Mafra teve uma ligação a jogadores chineses que, contam os adeptos, terminou quando o principal investidor quis a maioria numa futura SAD.

“O jogador chinês normal demora três ou quatro anos para ficar com uma qualidade boa”

Sobre o clube da terra, Francisco destaca mais uma vez a “organização” do mesmo, mas também a importância do presidente José Cristo, “um bom presidente sem o qual o clube já teria acabado, porque não haveria organização, dinheiro, nada”. E, ainda, o apoio da Câmara Municipal, sempre muito próxima do clube, “não só no futebol”. “Há o pavilhão para o andebol”, enumera. E mesmo sem Francisco dizer, é de realçar que o Mafra joga no campo municipal que está no Parque Desportivo Engenheiro Ministro dos Santos. Este recorda ainda que quando o Mafra jogava nas distritais “eram quatro ou cinco autocarros a levar adeptos” para os jogos. “Agora não há amor à camisola. As pessoas que antes viviam com o Mafra estão velhas. É só malta nova que veio para cá viver. Se não fosse a Câmara…”.

Francisco, de 80 anos, jogou 14 no Mafra

Esta relação próxima entre clube e Câmara Municipal já tinha sido abordada por uma outra fonte, pelo que fazia sentido contactar o município, visto que, segundo o jornal A Bola desta, o valor do negócio que envolveria Marcelo e o Mafra ascenderia a mais de sete milhões de euros. Mesmo sendo uma soma quiçá avultada, seguramente para um clube de Segunda Liga, sem qualquer desprimor, não houve qualquer comentário por parte de dois departamentos diferentes da Câmara Municipal de Mafra, que remeteram qualquer tipo de informação sobre o clube para o clube, mesmo que de caráter geral ou indiscriminada.

Perto do quiosque com a melhor vista para o Convento de Mafra encontrava-se Elias Rodrigues que, esteve “cerca de 20 anos na Direção” do Mafra, “para aí a partir de 1996”. Com melhor conhecimento da situação do clube, mesmo que anterior e pelo menos em teoria, Elias disse “que já tinha ouvido um zum zum” sobre a situação em questão, “que eles tinham falado”. “Conheço bem o Zé [Cristo]”, disse com um sorriso de quem quer deixar ali a frase. Mas adiantou: “Fui convidado este ano para fazer parte da Direção mas não pude aceitar”.

"O problema é que há pouco dinheiro. O José Cristo suportava sempre tudo, durante muitos anos, até os ordenados dos jogadores"

“Com investidor tem de ser uma SAD e eu estive na Assembleia em que os investidores chineses queriam que houvesse uma. Ninguém aceitou e eles foram embora”, explicou. Como Francisco, elogiou muito o trabalho de José Cristo, com quem o “clube tem evoluído e está organizado, bem gerido e sem dívidas”, o que julga ser hipoteticamente atrativo para algum investidor. Se acha bem um possível negócio? “Acho, mas depende dos contornos. Já ouvi falar em sete milhões. Depois eles é que mandam e isso não sei se é bom. O clube pode chegar mais longe, mas o investimento não diz tudo”, disse, voltando depois a José Cristo: “O problema é que há pouco dinheiro. O José Cristo suportava sempre tudo, durante muitos anos, até os ordenados dos jogadores”. “O Mafra agora tem muitos escalões de formação e é toda paga, ou seja, dá lucro ao Mafra. Os equipamentos dos miúdos, da cabeça aos pés, são eles que pagam”, referiu.

Elias esteve “20 anos” na direção do Mafra

E com o Natal a já ter dito adeus e 2021 a aproximar-se da mesma atitude, um mercadinho natalício, com pequenas casas de madeira, com comércio, artesanato ou, por exemplo, licores ou Ginja de Óbidos, pintavam o outro lado da estrada em frente ao Convento. Aí, Castro Rita falava com um amigo. Abordado para falar sobre Marcelo e o Mafra, ficou sozinho, porque o companheiro de conversa cedo se afastou, pouco interessado em falar. Castro Rita ficou e disse que era “adepto de futebol”. “Um adepto à inglesa” adjetivou-se, um fã que vê os jogadores como “artistas” e “operários do futebol”, o desporto rei como uma arte. Além disso, assumindo-se “benfiquista”, explicou de forma perentória: “Se o Sporting jogar lá fora, sou do Sporting. FC Porto igual”.

Castro Rita admitiu não saber quem é Marcelo, mas garantiu uma coisa sobre o Mafra, independentemente do que acontecer: “O Mafra tem gente competente, uns carolas. Fazem sem receber nada em troca. São carolas e vivem em função da carolice”Pode não saber quem defendeu muitos anos a ala esquerda do Real Madrid, mas frisou com veemência o quão capazes eram os homens ao leme do Mafra. Vinha novamente ao de cima a noção de existir competência no clube.

Ao virar da esquina, bem perto da porta de uma conhecida pastelaria de Mafra, quatro homens conversavam. Quando um deles disse mais alto a palavra “Benfica” ficou no ar que podiam ser interessados no futebol. Ou, por eventualidade, apenas estar a comentar a questão Jorge Jesus. Neste caso, eram ambas as hipóteses. A conversa rapidamente animou e, questionados sobre o Mafra, culparam a “pandemia que estraga tudo” por não verem tantos jogos no estádio da casa, até mesmo porque “agora dão quase todos na televisão”.

Voltando à baila a questão da necessária “Assembleia”, disseram (e mais uma vez…) que clube tem “sempre tudo organizado e não deve nada a ninguém”, pelo que “não admira” que alguém queira investir no Mafra. Por esta altura discutia-se, mas agora em grupo, o porquê do Mafra, voltando-se a ouvir os argumentos que eram já prato do dia: organização, pagamentos em dia, tudo no sítio. Enquanto um dos homens referia que “não interessa subir de divisão” e outro dizia que “não há condições para a Primeira Liga, mas com dinheiro nunca se sabe”.

“Os sócios não vão nessa de ficar sem maioria. O Mafra tem de ficar com pelo menos 51%”, ouviu-se de um lado do grupo. Do outro houve discórdia, porque afinal o investimento – e o bom investimento – muito podiam trazer ao clube e à cidade, mas era mesmo uma questão em que dois indivíduos do grupo não concordavam.

“Há arestas para limar, o Zé Cristo ainda não está 100% convencido”, garantiu serenamente um dos participantes da conversa que faz parte de uma discussão maior, sobre a qual, por agora, apenas se pode falar.

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