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Há cerca de uma semana que têm vindo a público denúncias de abuso e assédio sexual visando o meio musical português, em particular o jazz

Anadolu via Getty Images

Há cerca de uma semana que têm vindo a público denúncias de abuso e assédio sexual visando o meio musical português, em particular o jazz

Anadolu via Getty Images

Músico demite-se de associação de jazz dirigida por professor afastado do Hot Clube, alvo de mais denúncias de assédio

Um dos nomes mais mencionados no canal de denúncias de assédio na música dirige escola e orquestra em Leiria, da qual se demitiu um músico que não se revê na "posição" daquela instituição.

Paulo Jorge Batista Santo decidiu cessar funções enquanto músico na Orquestra de Jazz de Leiria e enquanto professor da Escola de Jazz de Leiria. Motivo: não se rever na “posição” da Associação de Leiria, ligada a ambas as entidades e presidida por um músico e professor que foi afastado há dois anos de uma outra escola de jazz, o Hot Clube de Portugal, por uma “situação de assédio”. A situação surge depois de uma semana de denúncias de abusos no mundo da música, com epicentro no jazz.

“Não me revendo na posição que a AJL — Associação Jazz de Leiria adotou, sinto-me obrigado a cessar todas as minhas funções para com esta entidade”, escreveu Paulo Jorge Batista Santo numa publicação na rede social Instagram esta terça-feira. “Abandonei assim o cargo de vogal da direção, músico da Orquestra Jazz de Leiria e professor na Escola Jazz de Leiria.” Em declarações ao Observador, o músico acrescentou: “Não me revejo na posição que a AJL toma. Estar em silêncio é por si já uma posição. Não me revejo nisso”.

Batista Santo confirmou ainda que comunicou a saída das estruturas no sábado, dia 9 de novembro, depois das muitas denúncias de assédio no meio do jazz português. Algumas das denúncias visam precisamente um dos professores afastados da escola do Hot Clube de Portugal (HCP), escola de jazz de Lisboa (e uma das principais escolas de música do país, que entretanto abriu um inquérito interno para “apurar quaisquer situações que possam ter ocorrido no contexto dos factos denunciados”, através de uma comissão criada para o efeito, como revelado pela instituição em comunicado e como já tinha sido noticiado), no ano letivo de 2021/2022. O também músico — saxofonista — é atualmente presidente da Associação de Jazz de Leiria, diretor pedagógico da Escola de Jazz de Leiria, e fundador e maestro da Orquestra Jazz de Leiria. O saxofonista não respondeu às várias tentativas de contacto do Observador.

Nas redes sociais, têm-se multiplicado denúncias ligadas à comunidade de jazz, muitas delas centralizadas num grupo do Telegram e num e-mail (testemunhasdamusica@proton.me), criado por Liliana Cunha — que apresentou uma denúncia na Justiça — e Maia Balduz — ex-aluna do Hot Clube e atualmente cantora e professora de música. Nessa recolha de denúncias de assédio e abusos cometidos por pessoas da área da música constam queixas contra vários músicos, sendo o do saxofonista “um dos nomes mais focados”, confirma Maia Balduz ao Observador. “Temos cinco menções [sobre o músico em questão], apesar de sabermos que é muito maior do que este número.”

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Tratar-se-á de “um caso de agressão sexual e outros de assédio”, todos relacionados com “alunas” e “nenhuma delas menor”. Maia Balduz acredita que, tal como sucedeu com o primeiro nome avançado publicamente, o número pode aumentar com a exposição mediática. “Sei que existe um número muito maior de pessoas que não se chegaram à frente porque ainda não saiu nenhuma notícia. Há muita gente que ainda não teve coragem de nos contactar. Mas, tendo eu própria estado na escola do Hot Clube, era uma coisa que entre mulheres sabíamos, sabíamos que era uma pessoa com quem não nos metermos”, descreve a jovem.

[a publicação de Paulo Jorge Batista Santo no Instagram:]

“Tomámos medidas. Todos os professores ficaram unidos. As pessoas ficaram horrorizadas”

Na semana passada, no rescaldo de uma acusação de violação contra o pianista João Pedro Coelho, que reclama “total inocência”, o Hot Clube veio demarcar-se do caso anunciando, contudo, e por usa própria iniciativa, que tinha afastado dois outros professores no ano letivo de 2021/2022 por “situações de assédio”. O Observador noticiou que os casos foram “reportados de forma informal com a direção pedagógica e com a intervenção de uma professora” levando “ao afastamento de duas pessoas”. Segundo o presidente da instituição, Pedro Moreira, que está no cargo desde fevereiro de 2023, houve um relatório interno e “no relatório [final], em ambos os casos se conclui que houve um abuso na relação de professor e aluna”.

Inês Homem Cunha, então presidente do Hot Clube, garante agora ao Observador que “na altura as denunciantes decidiram que não queriam avançar para a justiça” e que a instituição “foi alvo de um inquérito interno, e tomou as medidas que achou proporcionais”. “Falou-se com as denunciantes e perguntou-se se queriam tomar mais alguma medida ou diligência. Acharam que queriam ficar por ali”, diz, garantindo que esse ponto “está documentado em relatórios internos”.

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Maia Balduz: “Sei que existe um número muito maior de pessoas que não se chegaram à frente porque ainda não saiu nenhuma notícia. Há muita gente que ainda não teve coragem de nos contactar"

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“Durante algum tempo havia rumores e não se sabia quem eram as pessoas. Lançou uma aura de suspeita. Fizemos várias reuniões, conversámos muito”, explica ao Observador Gonçalo Marques, atual diretor pedagógico da Escola de Jazz do Hot Clube. O responsável chegou à instituição no “momento de transição” e assistiu às “conversas finais” que levaram à saída de dois professores em julho de 2022. “Tomámos medidas. Todos os professores ficaram unidos. As pessoas ficaram horrorizadas. Ninguém se reviu”, descreve.

Bruno Santos, diretor pedagógico na época e hoje professor no Hot Clube, confirma que foi uma “decisão difícil” a de afastar dois professores. “É uma decisão radical, mas que tinha de ser tomada”, começa por dizer ao Observador. “Os dois tomaram a iniciativa de enviar cartas a todos os colegas a pedir desculpa pela situação” antes da decisão que culminou na saída de ambos da instituição. “Estas cartas chegaram aos professores antes de haver uma decisão sobre se eles continuavam ou saíam da escola. [Foi] um pedido de desculpas pelas ações individuais que tinham posto em causa um grupo alargado de gente”, recorda sobre o que considera uma “boa iniciativa, de pedir desculpas em nome pessoal a todo o corpo docente e ao Hot, no fundo”. Foi o diretor pedagógico que fez circular a informação pelo corpo docente.

Os dois casos foram tratados em conjunto pois “eram similares”, esclarece o responsável. “Tinham os dois um problema que era um ultrapassar da comunicação entre um aluno e professor. Entendemos que nesses dois casos esse limite foi ultrapassado”, elucida. No caso específico do professor em questão, Bruno Santos descreve alguém que “tinha um grande peso na escola, dava aulas há muito tempo” e que “do ponto de vista profissional não tinha nada a apontar”. Ainda assim, “decidimos agir com firmeza”, nota, frisando que “não houve resistência” à saída da escola. “Tive uma conversa dura com ele, mas ele acatou. Percebeu que tinha passado o risco. Acredito, conhecendo-o há muitos anos, que não repetirá a lição”.

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A desvinculação de um músico de uma instituição é uma das primeiras consequências do clima instalado desde a última semana, que começou com as alegações sobre o pianista João Pedro Coelho

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Antes de ser afastado do Hot Clube, o músico fazia parte da Orquestra do Hot Clube de Portugal, anteriormente denominada Big Band do Hot Clube de Portugal, que surgiu em 1991, reunindo alguns dos melhores músicos de jazz nacionais. Deixou de o fazer em 2022, como é possível confirmar na listagem de concertos disponibilizada no site do artista. A última atuação com a Orquestra Jazz do Hot Clube de Portugal foi em 1 de julho de 2022, no Capitólio — o último mês em que este foi professor na escola ligada ao clube de jazz lisboeta.

Após a saída do Hot Clube, o músico e professor fundou a Escola de Jazz de Leiria, cujo primeiro ano letivo foi em setembro de 2023. “O Plano de Estudos do curso, inspirado no funcionamento do Hot Clube, de Lisboa, tem uma duração de quatro anos, ao longo dos quais, além das aulas em cinco disciplinas – Instrumento, Combo, Teoria, Treino Auditivo e História do Jazz – haverá avaliações regulares, recitais e convites para participar em jam sessions“, pode ler-se no Jornal de Leiria, que noticiou a recém-criada escola, uma iniciativa da Associação de Jazz de Leiria. Atualmente, o músico dirige também a Orquestra de Jazz de Leiria, que criou em fevereiro de 2011, e é ainda professor de saxofone jazz e formação auditiva na Licenciatura de Jazz na Universidade de Évora.

O Observador sabe que os alunos foram convocados pela direção da Escola de Artes da Universidade de Évora para uma reunião sobre “acontecimentos do foro mediático” recentes esta quinta-feira.

Hot Clube de Portugal demarca-se de “denúncia de alegado abuso”, mas confirma afastamento de dois professores no ano letivo de 2021/2022

A desvinculação de um músico de uma instituição — como aconteceu com Paulo Jorge Batista Santo enquanto músico na Orquestra de Jazz de Leiria e enquanto professor da Escola de Jazz de Leiria — é uma das primeiras consequências do clima instalado desde a última semana, que começou com as alegações sobre o pianista João Pedro Coelho, acusado na justiça pela DJ e música Liliana Cunha (nome artístico Tágide) e que se alargou ao meio musical, com contornos semelhantes ao despontar do movimento #MeToo na música portuguesa (#EuTambém, em português).

João Pedro Coelho, que nega as acusações de que é alvo, na quarta-feira, dia 6 de novembro, cancelou o concerto no Távola Bar, em Alvalade, Lisboa, depois de a acusação que o visava ter sido tornada pública nas redes sociais. A decisão foi tomada pelo músico, conforme confirmou ao Observador o dono do bar de jazz, Nuno Seabra. O concerto, que era para ser de um quarteto e passou a trio, decorreu sem o pianista, mas não sem um protesto de dezenas de pessoas à porta do bar com cartazes anti-assédio.

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