Nuno Graciano entende que André Ventura “abusou” ao utilizar o termo “bandidos” para se referir uma família do Bairro da Jamaica, em pleno debate presidencial. O candidato do Chega à Câmara Municipal de Lisboa entende que o líder do Chega não teve um “momento feliz”, mas corta a eito quando o assunto é o pedido de desculpas a que está obrigado pelo tribunal. “André Ventura tem o direito de não se arrepender. E eu tenho o direito de pensar o contrário.”
Em entrevista ao Observador, o antigo apresentador televisivo defende que existe um problema de “libertinagem” na sociedade portuguesa, demarca-se de Ventura nas críticas à comunidade cigana e insiste na defesa da pena de morte para pedófilos. “No caso da pedofilia, sou a favor da pena de morte. Não me conseguem demover desta opinião. Qual é o problema de ser uma doença? É uma doença incurável”, diz.
Sobre Lisboa, Graciano alega que há problemas de segurança na cidade, fala da falta de higiene e dos problemas da habitação. Mas não adianta propostas concretas. “Faria aqui uma série de promessas que poderia não cumprir”. Sobre o que distingue verdadeiramente de Fernando Medina, uma ideia: “Sou um homem das pessoas”.
[Vídeo. Essencial da entrevista a Nuno Graciano:]
“Nunca vi racismo nos meus companheiros do Chega”
No dia em que apresentou a candidatura disse que a “liberdade não é a mesma coisa que libertinagem” e que defendia “a democracia mas não a libertinagem”. Onde é que acaba a democracia e começa a libertinagem exatamente?
A libertinagem começa exatamente quando começamos a incomodar os outros. Quando confundimos um conceito de liberdade com libertinagem, em que tudo é possível. Faltar ao respeito às forças de segurança não faz mal. Hoje em dia, o juiz primeiro preocupa-se se o polícia deu um calduço a qualquer indivíduo que tenha praticado um delito do que com o crime que ele cometeu. E há uma falta de respeito pelo espaço e pelas ideias dos outros. Que a mim me ferem muitíssimo.
Acha que a sociedade portuguesa está de facto numa deriva de libertinagem?
Sim. Tivemos agora o caso do Sporting campeão, por exemplo…
Não é exatamente isso que se entende por libertinagem.
A festa tinha de ser feita, percebo que era difícil controlar-se as emoções de tantos sportinguistas, mas houve momentos de libertinagem em que se abusou, em que se atiram objetos às forças de segurança, garrafas… Isto para mim é libertinagem, é liberdade a mais.
Mas manifestações com excessos existiram sempre.
Acho que agora é cada vez mais evidente. Mais: não tenho dúvida absolutamente nenhuma que a democracia também é um grande inimigo da própria democracia. Todas estas situações que colocam em causa a paz, o bem-estar e a liberdade dos outros são de muita gravidade.
Então como é que se inverte o estado das coisas?
Com mais respeito.
Sim, mas como é que isso se traduz? Com mais leis?
Com regras. Sou um acérrimo defensor das forças de segurança públicas. A forma como o país se comporta com as forças de segurança públicas é uma vergonha. Não pode haver exageros por parte das forças de segurança mas tem de haver respeito pelas fardas. É um respeito que se perdeu. No meu tempo, havia respeito pela GNR e pela PSP. Hoje em dia não, dizem-se os maiores impropérios e eles têm de aguentar estoicamente.
No caso concreto de Lisboa, o que pretende fazer para aumentar esse respeito pelas fardas que diz ser necessário?
Em Lisboa, ali nas Olaias, existe um bairro que tem uma esquadra onde cada vez que há distúrbios não é chamada para tomar conta de ocorrência, têm de ser outras esquadras de fora a agir para os polícias não ficarem queimados com as pessoas do bairro. É um bairro onde se vendem casas de boca, onde no outro dia uns senhores de mais idade foram parar ao hospital e quando chegaram a casa tinham a casa ocupada.
Mas admite que as forças de segurança também têm problemas?
A polícia tem de cumprir com as suas obrigações, cumprir e fazer cumprir a lei. Desde que a cumpra, está tudo certo. Agora se há casos onde a polícia é extrema na forma como exerce a lei têm de ser castigados. Mas são muito mais os casos em que a polícia é vítima do que agressora. Muito mais. Temos o caso do Hugo Ernano [militar da GNR condenado depois de matar um jovem de 13 anos numa perseguição policial], que é um dos casos que me deixa absolutamente doido.
“Não utilizaria o termo bandidos”
Também disse outra coisa no dia da sua apresentação. “Sou a favor de todas as minorias, nem vejo, nem sei o que são minorias, desde que todos os cidadãos cumpram com regras patrióticas do nosso país”. Quais são as “regras patrióticas do nosso país”?
É cumprirmos a lei. É amarmos o nosso país, é amarmo-nos uns aos outros. Não reconheço minorias porque para mim as raças são todas iguais. É outra acusação imputada ao Chega, de que o Chega é um partido racista. Nunca vi racismo nos meus companheiros do Chega que tenho conhecido até hoje.
Tocou aí num ponto importante quando disse que parte dessas regras patrióticas que diz terem de existir é o respeito pelos outros. Na segunda-feira André Ventura foi condenado em tribunal por chamar “bandidos” a uma família do bairro da Jamaica, na televisão nacional, enquanto mostrava uma foto da dita família. Considera que André Ventura violou as regras patrióticas do país?
Não, não podemos retirar o contexto em que isso se passou.
Qual é o contexto que o justifica?
Estava-se a contar uma história e afinal a história é outra. Se me perguntar se André Ventura abusou no termo, acredito que sim. Eu não teria dito bandidos.
André Ventura devia pedir desculpa?
O André Ventura é que sabe o que é que faz. É um homem muito inteligente, sabe os passos que dá e como é que os quer der.
Foi condenado em primeira instância.
É o Estado de Direito a funcionar.
André Ventura e o partido Chega optaram por recorrer.
Já disse que eu não utilizaria o termo. Eu sou diferente do André Ventura. O André Ventura é o André Ventura, eu sou o Nuno.
Não o deixa desconfortável que o líder do Chega…
Não me deixa desconfortável. Acho que todos nós temos momentos mais felizes, momentos em que não estamos tão bem e o André, na minha opinião, não estará estado tão bem.
Mas André Ventura já disse que não se arrepende.
Tem esse direito. E eu tenho o direito de pensar o contrário. O Chega é uma partido democrático: o André pode pensar uma coisa, e eu posso achar outra.
“Fui presidente da Associação de Estudantes. É um tema gasto porque não há como provar”
Mais uma vez, no dia em que apresentou a candidatura a Lisboa, defendeu-se das críticas sobre a falta de experiência política e de intervenção cívica com o facto de ter sido presidente de uma Associação de Estudantes. Mas os seus colegas de curso dizem que não. Afinal, foi ou não foi?
Fui. Quando a Universidade nasceu, fui eu que fundei a primeira Associação Académica, numa ata que foi redigida pelo professor Esmeraldo Azevedo, onde me foi dado esse poder e a seguir houve eleições. Agora, é um tema que já está completamente gasto porque não há como provar. Infelizmente a Universidade está fechada, não há papéis sobre isso.
Mas qual era especificamente o seu cargo?
Fui presidente da Associação de Estudantes.
Foi presidente do núcleo preparatório, antes de haver uma Associação de Estudantes.
Sim, antes de haver uma Associação de Estudantes. Depois fui vice-presidente de uma Associação de Estudantes mais à frente.
Ou seja, não foi efetivamente presidente da Associação de Estudantes, foi vice-presidente. Insuflar o currículo académico numa questão tão simples…
Não interessa para nada. Essa questão nem se põe, isso não me tira, nem me dá mais direitos.
Mas a pergunta era se isso não é um mau cartão de visita para quem está a começar e se candidata a um cargo político?
Não preciso de empolar isso para nada.
A verdade é que empolou.
A comunicação social é que empolou. Foi fraca.
O que lhe foi perguntado era que experiência política é que tinha. Respondeu que já tinha sido presidente da Associação de Estudantes.
Ter dito que era presidente ou vice-presidente era a mesma coisa. Ia dar precisamente ao mesmo.
Não é a mesma coisa ser presidente ou ser vice-presidente.
Não, o que quero dizer é que para o efeito que queria gerar era mesmo que era dizer que já tinha tido experiência académica de associativismo e no liceu. Fui sempre interventivo. Aqui o termo presidente ou vice-presidente é igual.
“Não sei o que são ciganos. Não faço ideia”
Vamos avançar. Já disse que o Chega tem “umas linhas com as quais concorda”. Que linhas são essas exatamente? O que o aproxima do Chega?
Aproxima-me haver uma voz nova em Portugal que põe o dedo nas feridas e diz aquilo que toda a gente pensa e que não têm coragem de dizer. Nomeadamente no combate à corrupção. Vivemos há 40 e tal anos com corrupção. É uma vergonha. É uma vergonha continuarmos a termos ex-primeiros-ministros com uma série de negócios obscuros. As pessoas viverem de subsídios uma vida inteira é outra coisa com a qual eu estou em total desacordo. Há, de facto, portugueses, subsidiodependentes, que têm vidas paralelas de luxo. É uma vergonha.
E que propostas tem para esse fenómeno de subsiodependência que diz existir?
Tem de existir uma fiscalização como deve ser feita. Tem de se ir bater à porta das pessoas e ver de que forma é que elas vivem. Perceber, de facto, quem é aquela gente. Já se viu que as leis como estão não servem. Têm de se acabar com isso. Tem de se apertar esse cerco para se perceber quem são esses subsidiodependentes.
André Ventura, aparentemente, encontrou uma grande parte desses “subsidiodependdentes” na comunidade cigana, onde, palavras de André Ventura, esse fenómeno é muito mais frequente. Concorda com essa ideia?
Não sei o que são ciganos. Não faço ideia.
Não sabe o que são ciganos? Não conhece a etnia cigana?
Sei. São pessoas iguais a mim.
André Ventura discorda. É ele que muitas vezes faz essa distinção.
Pronto, estamos em desacordo mais uma vez. Acho que são pessoas iguais a mim.
Falámos sobre as suas aproximações ao Chega. Quais são as linhas de que discorda? Este tema é um deles? A questão de existir uma diferenciação em relação à etnia cigana?
É um dos temas com os quais eu não concordo.
Porquê?
Porque não. Para mim, são cidadãos iguais aos outros. As pessoas são todas iguais.
Quais é que são as outras linhas vermelhas?
Acho que, a determinada altura, começaram-se a juntar ao partido algumas pessoas de extrema-direita, com ideias muito radicais e muito perigosas. Essas pessoas, graças a Deus, têm vindo a ser afastadas paulatinamente.
“Executa-se um indivíduo que é pedófilo. São coisas diferentes do que matar uma pessoa”
Lançou um livro sobre parentalidade e na altura disse numa entrevista concordar com a pena de morte para crimes de pedofilia. Só para sermos absolutamente claros: em que casos é que aplicaria a pena de morte?
Em todos os casos de pedofilia. A pedofilia, ao contrário do que se diz, não tem cura. É uma doença sem cura. Quem é pai de quatro filhos, como eu, e aquilo que todos pensam mas que não dizem, sabe que se algum dia fizessem mal a um filho eu matava-o. É o que todo o cidadão comum diz.
O Estado de Direito e as leis não podem ser construídos com base nas emoções.
Isto é sem emoção, é com muita frieza. Aprendi, com várias especialistas ao longo dos anos que fiz televisão, que a pedofilia não tem cura. Um pedófilo é sempre recorrente no mesmo crime. Quando há um indivíduo que viola uma criança de dois ou três anos é uma monstruosidade. Não só terminou com a vida dessa criança, como a vida dos pais dessa criança e com a vida dos filhos que essa criança venha a ter um dia. Entre ferir com uma brutalidade destas três gerações ou aquele indivíduo ser condenado a pena de morte, prefiro condená-lo a pena de morte.
Mas repare: não há evidências conclusivas de que a pena de morte seja sequer um fator dissuasor. Não ia estar a impedir que esses crimes viessem a acontecer.
Acredito que é um fator dissuasor. Pelo exemplo.
E disse que era uma doença. Vai aplicar a pena de morte a uma pessoa que está doente?
No caso da pedofilia, sou a favor da pena de morte. Não me conseguem demover desta opinião. Qual é o problema de ser uma doença? É uma doença incurável.
Portanto, mata-se uma pessoa com uma doença incurável.
Não. Executa-se um indivíduo que é pedófilo. São coisas diferentes do que matar uma pessoa.
Então não defende a castração química como o Chega?
Não resolve nada. Continua a alimentar-se de pornografia. Aqui até estou contra o partido. No caso da pedofilia, sou a favor da pena de morte.
É a favor em mais algum caso?
Não.
Ventura sobre Marisa e Jerónimo. “Não gostei de ouvir”
No dia em que apresentou a candidatura falou também numa esquerda “absolutamente doentia” que “não quer deixar [a direita] falar”, que “quer a vergar”. Que esquerda é esta exatamente?
É a extrema-esquerda, mais propriamente o Bloco de e Esquerda, que não quer deixar que o Chega tenha o seu espaço, o seu caminho, a sua ideologia… Vocês não imaginam o que eu fui violentado nas redes sociais só por ser candidato de um partido a uma Câmara Municipal. É inacreditável. A democracia é sabermos conviver com a liberdade dos outros. As pessoas de extrema-esquerda não sabem respeitar a ideologia de um partido como o Chega.
Parte então do princípio que as ameaças que recebeu são de pessoas ligadas ao Bloco de Esquerda.
Algumas eu conheço.
Que tipo de ameaças recebeu?
De morte. Várias.
Fez queixa à polícia?
Não, estou-me borrifando. Os cães ladram e a caravana passa. As pessoas querem é que se lhes dê essa importância. Não ligo nada e não tenho medo nenhum. Continuo a andar na rua, sem guarda-costas. Até me foi proposto algum tipo de segurança para a campanha… Não quero segurança nenhuma.
Insiste muito na questão do respeito pelas ideias dos outros. Quando André Ventura fala como fala e se refere como se refere ao Bloco de Esquerda e a outros partidos, é uma forma de estar na política com respeito?
Pode estar aqui o resto da entrevista a fazer-me perguntas sobre André Ventura.
É o líder do partido que aceitou representar na candidatura à Câmara de Lisboa. Não é relevante?
É relevante, mas já disse que não concordo com tudo o que André Ventura diz.
Para perceber: está em desacordo com a linguagem utilizada por André Ventura para atingir os seus adversários políticos?
É o estilo dele. Respeito o estilo dele. Mas é só o estilo de André Ventura.
Tivemos uma campanha presidencial que ficou marcada pelas declarações de André Ventura sobre Marisa Matias e também sobre Jerónimo de Sousa.
Não gostei de ouvir.
O Chega não é também responsável pela crispação que existe na democracia portuguesa? E ao aceitar fazer parte desta candidatura não está a aceitar fazer parte desta crispação?
Estou a aceitar fazer parte de um projeto para Lisboa.
São dissociáveis? A sua candidatura e a atuação do Chega?
Acho que sim. Até hoje ninguém me disse que eu tinha de ter determinado tipo de comportamento ou de fazer determinado tipo de coisas. A minha candidatura é uma coisa aquilo que André Ventura diz são coisas completamente diferentes.
“Gosto muito do estilo de Marcelo”
O Chega ficou de fora da grande coligação que Carlos Moedas criou para a cidade de Lisboa, para as autárquicas em Lisboa. A Iniciativa Liberal quis ficar de fora, os restantes partidos de direita quiseram fazer parte. O Chega foi excluído. Sente-se desconfortável por ter sido excluído deste diálogo sem sequer ter sido convidado a conversar primeiro?
Não.
Por que é que acha que Carlos Moedas quis abdicar de ter o Chega na coligação?
Não faço ideia, isso é uma pergunta para o candidato Carlos Moedas. Não faço ideia nenhuma do que é que lhe passou pela cabeça ou por que é que teve essa atitude, não faço ideia. A mim lisonjeou-me o convite que me foi feito sem eu estar à espera. A verdade é essa. É uma coisa que não estava à espera que acontecesse neste momento na minha vida. Sempre gostei muito da vida política, da política autárquicas. Tive convites anteriores para fazer parte, para ser número dois numa determinada candidatura no distrito de Lisboa e não aceitei.
Mas não do Chega?
Não, não. Ainda não existia Chega.
De que partido? Não quer revelar?
Não, não tem importância. Não aceitei, mas não aceitei porque estava com um projeto televisivo novo em mãos. Mas fez-me crescer a vontade e perceber que esta vida autárquica tem uma coisa fantástica: permite-nos estar com as pessoas. É dessa política que eu gosto, é essa política que está despersonalizada em Lisboa. Não existe. Não me lembro de ver o presidente da Câmara de Lisboa a andar a circular por Lisboa a não ser de carro. Não o vejo a andar nas ruas e a andar nos bairros típicos, a conhecer a tia Maria e o ti Manel e eu gosto muito disso.
A Câmara de Lisboa é uma câmara gigantesca, um presidente da Câmara de Lisboa não terá agenda para isso.
Não sei se não terá agenda, é uma questão de criar agenda e criar um estilo político. Se formos ver, comparando com o professor Marcelo Rebelo de Sousa, o nosso Presidente da República, também se diria que não tem agenda para andar no meio da rua.
Identifica-se com Marcelo Rebelo de Sousa, com o estilo?
Gosto muito do estilo.
Só no estilo?
No estilo, gosto muito do estilo. Na verdade é uma pessoa que tem uma agenda muito mais carregada do que o presidente da Câmara Municipal de Lisboa e vemos como ele gosta de estar entre as pessoas e há rotinas que mantém. Mora em Cascais como eu moro, neste momento, e há rotinas que mantém, como ir à praia.
“Se o Chega colocar um ou dois vereadores já será um bom resultado”
Deixe-me só recuar para encerrar um capítulo sobre o cerco sanitário que a coligação de partidos traçou em Lisboa em torno do Chega. Incomoda-o esse cerco sanitário?
Não, não.
Não o incomoda? Acha que o pode ajudar na campanha?
Cá estaremos para ver. Para já os resultados não parecem maus. Na verdade foi uma opção desses partidos, mas o Chega tem poder suficiente sozinho para poder fazer o seu caminho. Neste momento em que falamos, a sondagem que já saiu mostra que o Chega tem sérias possibilidades de ser a terceira força política em Lisboa.
Mas sente-se confortável por representar um partido com quem ninguém quer dialogar? Porque foi o que aconteceu com esta cerca da coligação de direita.
Não querem dialogar até terem de dialogar.
Quando é que terão de dialogar?
Depende dos resultados. Dependendo dos resultados vão ter de dialogar ou não. Também nos Açores não se queria dialogar e teve de se dialogar. Acredito que há uma hipótese de terem de dialogar connosco.
E nessa altura o Chega quererá dialogar com Moedas?
O Chega quer sempre dialogar com toda a gente.
Deixe-me pegar noutro ponto. Falou na questão das sondagens, nessa sondagem em que o Chega está muito longe do PS do PSD, tem pouco mais de 6%, aparece atrás do PCP e do BE. Como é que olha para estes números?
Todo contente porque ainda não fiz nada.
Acha que é um resultado à partida bom porque ainda não começou a trabalhar nas ruas, é isso?
Só neste momento é que estou a começar a conhecer Lisboa e as coisas tão negativas que Lisboa tem, que eu desconhecia e que acho que a maior parte dos lisboetas também conhece, exceto aqueles que infelizmente têm de viver com estas realidades e vivem nisto todos os dias. Acho que é um bom primeiro resultado. Já seria eleito vereador antes de fazer seja o que for. Portanto, é um resultado só do Chega, não é meu.
E o que é que seria um bom resultado nestas autárquicas?
Ganhar, claro.
Acha que tem reais possibilidades de ganhar?
É evidente que se quisermos ser sérios sabemos que é muito difícil. Mas não há impossíveis e eu seguramente não vou estar a trabalhar para ficar em segundo lugar. Vou trabalhar para ganhar.
Mas ser eleito vereador já seria um bom resultado?
Se o Chega colocar um ou dois vereadores já será um bom resultado, até porque é a primeira campanha autárquica em que o Chega está presente.
Não tem experiência política, nunca ocupou um cargo executivo, o que faria de si melhor presidente da câmara do que Fernando Medina?
Sou um homem das pessoas.
Sim, mas isso não qualifica ninguém para governar uma Câmara como Lisboa.
Qualifica, cada vez qualifica mais. Nós temos de andar braços dados uns com os outros, conhecer-nos uns aos outros, estarmos juntos uns dos outros e não sermos burocratas, apenas e só burocratas. A mim o que me qualifica é saber que tenho uma série de problemas em Lisboa que terei de tentar resolver. As pessoas têm de saber que podem contar comigo, que estarei sempre de porta aberta para as receber, que tratarei dos problemas individuais delas. A minha bandeira de campanha vai ter muito a ver com as pessoas e o facto de não ter sido político. Não ter ocupado nenhum cargo executivo até é uma mais-valia do que esta máquina toda que tem 40 anos, em que os players são sempre os mesmos.
Mas é importante existir um conhecimento e um domínio dos dossiês técnicos.
Claro, mas o Fernando Medina também não conhecia os dossiês técnicos antes de ser vice-presidente da câmara, teve uma preparação.
Algo que se vencer as eleições já não terá.
Estou a começar a estudar os dossiês técnicos e depois para cada dossiê técnico terá de haver um técnico especializado na matéria. Por isso é que há uma série de vereadores.
Vamos então às ideias que tem para a cidade de Lisboa. No dia em que apresentou a candidatura disse que estava a estudar as pastas relacionadas com Lisboa, que havia problemas muito graves na cidade e reservou para mais tarde a apresentação de propostas. Já tem ideia do que, de facto, é preciso resolver em Lisboa?
Há coisas que para mim já estão claras. A segurança é um problema que nós temos em Lisboa. Todos achamos que Lisboa é uma cidade muito segura e não é. Há em Lisboa reais guetos.
Que guetos são esses?
Temos na Misericórdia, temos nas Olaias, temos vários.
Mas quer começar por onde? Se amanhã fosse eleito presidente da Câmara Municipal de Lisboa por onde é que começaria?
Entrar lá dentro, saber o que se passa.
Isso é o trabalho que está a fazer agora, pelo que já disse.
É o trabalho que estou a fazer agora e devo dizer-vos que com alguma coragem porque é perigoso. Não tinha ideia de que era tão perigoso. Portanto, há que entrar, há que falar com as pessoas, perceber o que é que se passa com esta gente, quem é esta gente, vive do quê, o que faz, quem são, em que é que podemos ajudar, em que é que podemos resolver esses problemas.
E qual é o passo seguinte para resolver o problema dessas pessoas?
É precisamente inteirar-me dos problemas delas para podermos resolver.
Portanto, ainda não tem soluções para essa questão.
Fazer de conta que não existem estes problemas é que não vale a pena.
Mas que soluções, que propostas tem para resolver esse problema de segurança em Lisboa, nos guetos em particular?
Reforçar o trabalho da assistência social com estas pessoas e as forças de segurança pública poderem estar ao lado desta realidade, poderem intervir nesta realidade. Não podemos fazer de conta que as pessoas não existem, elas existem e estão cá. Tem de se perceber o que é que socialmente se faz com estas pessoas. Agora, estarem todas metidas em guetos, em bairros sem ordem nem lei, é que não me parece que seja uma solução.
E seria necessário reforçar o contingente da Polícia Municipal? É uma proposta que pode surgir?
Pode surgir, pode surgir o voltar do guarda noturno. Acho que é muito importante, no meu tempo tinha guarda noturno e achava imensa graça e adorava o guarda noturno. Desapareceu a figura do guarda noturno e é muito importante porque é uma figura de proximidade, conhece muito bem os seus locais, os fregueses de cada freguesia e acho que era uma belíssima opção voltarmos a ter uma rede grande e boa de guardas noturnos.
E a questão da videovigilância é algo que pode reforçar?
Pode, não sou nada contra.
Mas está nos seus planos?
Não sou nada contra. Acho que tudo o que sirva para melhorarmos as condições de segurança das pessoas de bem deve ser aplicado.
Há pessoas de mal?
Então não há?
Também acredita que há portugueses de bem e de mal?
Não, há pessoas de bem e pessoas de mal em todos os países.
No caso de Lisboa, o que é que distingue um lisboeta de bem e um lisboeta de mal?
Um lisboeta de mal é um indivíduo que se dedica à delinquência, por exemplo, que vive fora da lei.
“Lisboa está suja”
Já percebemos que a segurança será uma das suas bandeiras. Que outras propostas é que tem para Lisboa?
Lisboa está suja, tem problemas graves de limpeza, de higiene. Há muita sujidade na rua, muitos pontos mortos, muitos espaços verdes abandonados, muitas casas devolutas.
Mas concretamente como é que se resolve essa situação?
Tendo uma empresa que para mim seria municipal a tratar disso.
Portanto, municipalizaria os serviços de recolha de lixo.
Sim.
Também tem focado os problemas de habitação, em particular a habitação social.
É uma preocupação que levo para a campanha.
Tem algum número para construção de fogos que possa avançar?
Não tenho e seria ridículo estar aqui a dizer um número só por dizer antes de ter esse assunto completamente estudado. Mas sei que é um problema gravíssimo que a cidade tem. Assim como me preocupa a habitação de rendas acessíveis, nomeadamente para os jovens.
Mas ainda não tem propostas concretas nessas áreas?
Ainda não. Não se pode viver em Lisboa, as pessoas não conseguem alugar uma casa em Lisboa, não têm dinheiro. Um trabalhador normal, com um ordenado de mil euros por mês, não consegue morar em Lisboa.
Nos jovens estão incluídos, por exemplo, os estudantes universitários que vêm para Lisboa?
Os estudantes universitários são roubados na cidade de Lisboa.
Mas há alguma proposta concreta para os estudantes que vêm viver para Lisboa?
Acho que tínhamos de ter habitação de propósito para estudantes.
Aumentar?
Aumentar.
Mas ainda não sabe quanto custa, quantas devem ser criadas?
Não sei dizer ainda números. Não posso é ter estudantes a estudar em Lisboa a pagarem 500 euros por um quarto, 400 euros por um quarto, 300 euros.
Estamos em finais de maio, vamos ter eleições em final de setembro, início de outubro. Não era já avisado ter propostas mais concretas para apresentar aos lisboetas?
Não, faria aqui uma série de promessas que poderia não cumprir. Neste momento o que me cabe fazer é o trabalho que estou a fazer. Andar na rua, ver, falar, conversar, enquanto tenho outras pessoas que já fazem parte da equipa e vão preparando as pastas para me inteirar delas.
Até agora, a única coisa que disse que o distinguia de Fernando Medina, que o tornava melhor, era estar mais próximo das pessoas. Isso não é grande programa político.
Não, não tenho de ter já um programa político. Tenho de estar a preparar um bom programa político, são coisas diferentes. E não digo isso sobre Fernando Medina. Digo que o facto de Fernando Medina ser um homem do aparelho político de há anos e eu não ser também…
André Ventura também fez parte do aparelho político do PSD durante vários anos. Isso não o desqualifica?
Não o desqualifica, mas… Não foi durante vários anos, foi durante alguns anos.
É uma questão de tempo, então?
Mas já com um discurso diferente e uma forma diferente de estar na política. O André Ventura não era visto como uma pessoa do aparelho político, não era um player, só mais tarde é que se tornou um player político.
Falava do que o distingue de Fernando Medina.
Acho que o facto de eu ser um homem em nada dedicado à política é uma vantagem. Acho que sou mais parecido como os demais. Não vejo isso como uma desvantagem.
Nesta altura do campeonato não se exigia mais a um candidato que já está na estrada, que já vai conhecendo os problemas da cidade, que já identificou alguns deles? Não era expectável que existissem mais propostas, coisas concretas e palpáveis para apresentar aos eleitores?
Lá chegaremos a esse tempo, ainda só estamos no início da maratona.
Mas disse exatamente o mesmo há dois meses, no dia 16 de março, quando apresentou a candidatura.
Sim, claro. E não conhecia a cidade como conheço agora. Não tinha o mínimo conhecimento da cidade como tenho agora. Agora já conheço muito bem a cidade.
[Vídeo. A entrevista na íntegra:]