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JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

O arrependimento, o "desconforto" com o filho de Marcelo e os 190 mil pedidos a Belém. As conclusões da audição a Frutuoso de Melo

Chefe da Casa Civil foi ao Parlamento explicar caso das gémeas. Afastou "tratamento de favor" e garantiu que filho de Marcelo não conseguiu o que queria, mas acabou a admitir que hoje faria diferente.

Quatro horas de audição, várias revelações e uma palavra chave: “desconforto”. O chefe da Casa Civil da Presidência da República, Fernando Frutuoso de Melo, colaborador de há muitas décadas de Marcelo Rebelo de Sousa, foi ao Parlamento para ser ouvido pelos deputados na Comissão Parlamentar de Inquérito sobre o caso das gémeas e admitiu ter sentido “desconforto” com o pedido de ajuda vindo do filho do Presidente da República, recusando que tenha havido “tratamento de favor” neste caso.

Assim, boa parte da audição foi dedicada a assegurar que Nuno Rebelo de Sousa não conseguiu o que queria: se as gémeas foram favorecidas, não foi graças à intervenção do Presidente; a “ajuda maior” que o filho de Marcelo pediu por e-mail nunca chegou; e a Presidência descarta-se de qualquer intervenção na marcação das consultas, que pode, sim, ter sido “irregular”. Ainda assim, Frutuoso de Melo teve mais dificuldades em explicar porque é que na altura referiu que existia uma “lista de espera” — uma informação errada e que, defendeu, resultou apenas de uma “dedução” sua — e porque é que o caso teve respostas tão rápidas de Belém, que encaminhou o caso para o Governo em dez dias.

Neste ponto, o Chefe da Casa Civil revelou que Belém já recebeu cerca de 190 mil pedidos desde que Marcelo Rebelo de Sousa tomou posse pela primeira vez, em 2016, assegurando repetidamente que tratou este caso como qualquer outro. No entanto, no final das quatro horas, acabou por fechar a audição com um desabafo: se fosse hoje, nem esse tratamento lhe teria dado — ter-se-ia limitado a encaminhar os pais para as urgências do SNS, pondo fim aos contactos com Belém.

O “desconforto” de um caso com origem no filho do Presidente e o nome omitido no email para o Governo

O chefe da Casa Civil da Presidência da República admitiu que sentiu “algum desconforto” com o facto de o contacto sobre o caso das gémeas ter vindo da parte do filho de Marcelo Rebelo de Sousa. É “óbvio” que há sempre “algum desconforto” neste tipo de situações, disse Frutuoso de Melo em resposta a uma pergunta de Paulo Muacho, deputado do Livre.

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Foi, aliás, essa a razão que levou Fernando Frutuoso de Melo a omitir o nome do remetente da informação quando encaminhou a informação para o Governo. O chefe da Casa Civil explicou, ao longo de uma audição de cerca de quatro horas, que os muitos pedidos que Belém recebe da parte de cidadãos são sempre analisados, respondidos e encaminhados para as entidades mais apropriadas para cada situação. Neste caso, contudo, para evitar interpretações erróneas sobre a situação, Frutuoso de Melo decidiu deliberadamente omitir o nome de Nuno Rebelo de Sousa.

Na audição, o chefe da Casa Civil recordou a data de 21 de outubro de 2019, o dia em que Marcelo Rebelo de Sousa lhe encaminhou o primeiro email que tinha recebido do filho com os detalhes sobre este caso. Segundo Frutuoso de Melo, o procedimento foi igual a “muitos outros casos”, exceto num aspeto: “Decidi deliberadamente omitir a identificação de quem tinha feito chegar tal solicitação.” O objetivo de encaminhar o email sem dar conhecimento ao Governo de quem tinha feito o pedido foi, justificou Frutuoso de Melo, evitar que o envio daquela informação fosse interpretado como “qualquer forma de pressão”.

Frutuoso de Melo garantiu que o filho do Presidente da República não teve qualquer tratamento de favor, revelando também que este não foi o primeiro pedido que Nuno Rebelo de Sousa dirigiu a Belém. A atitude deixou o chefe da Casa Civil "desconfortável"

“Sim, a Presidência da República foi contactada por Nuno Rebelo de Sousa”, disse durante a sua declaração inicial. “Não, não foi dado qualquer tratamento de favor”, contrapôs, acrescentando que houve até um “cuidado” para evitar qualquer interpretação de que isso podia ter acontecido — cuidado que se traduziu na omissão do nome de Nuno Rebelo de Sousa do contacto com o Governo.

Mais à frente, perante mais perguntas dos deputados, Fernando Frutuoso de Melo reconheceu que não foi a primeira vez que Nuno Rebelo de Sousa contactou a Presidência da República para informar de casos ou pedir ajuda. “Para mim era sempre desconfortável”, sustentou Frutuoso de Melo, dizendo lembrar-se da política de Marcelo Rebelo de Sousa de não misturar a família com a política e aplicar uma frase que o chefe da Casa Civil repetiu por diversas vezes: “Filho de Presidente não é Presidente”. “Todas as vezes que alguma coisa vinha daí, a primeira coisa que me vinha à memória era isso.”

Os deputados pressionaram várias vezes Frutuoso de Melo para explicar quais os outros casos em que Nuno Rebelo de Sousa tinha recorrido a contactos com a Presidência da República — e o chefe da Casa Civil garantiu que não queria especular, mas prometeu que irá procurar essa informação nos arquivos da Presidência e entregá-la à comissão de inquérito. Assegurou, contudo, que Nuno Rebelo de Sousa já tinha contactado a Presidência da República no âmbito de visitas a Portugal de grupos de empresários brasileiros, na sua condição de presidente da câmara de comércio em São Paulo. Frutuoso de Melo sublinhou, aliás, que é “recorrente” que haja pedidos de várias câmaras de comércio para audiências em Belém quando há visitas de “missões de empresários de outros países”, nomeadamente na época da Web Summit.

Durante a audição, Frutuoso de Melo explicou que o envio deste caso para o Governo foi feito seguindo um procedimento normal. O chefe da Casa Civil de Marcelo fez uma linha do tempo dos dez dias em que o caso esteve em Belém, começando com o primeiro email em 21 de outubro de 2019 (enviado por Nuno Rebelo de Sousa ao Presidente da República, que o encaminhou para o chefe da Casa Civil), e terminando com o envio do caso para o Governo de “forma habitual”.

Se, numa primeira fase, depois de se inteirar do modo como estes casos eram tratados (no SNS, por decisão da equipa médica, do hospital do Infarmed), Frutuoso de Melo pensava que a prioridade seria dada a pessoas que residem ou se encontrem em Portugal (enquanto luso-descendentes no Brasil, as crianças seriam cobertas pela convenção de Segurança Social entre os dois países), numa segunda fase percebeu que o Governo estava a acompanhar um caso semelhante de uma bebé portuguesa no Canadá, pelo que encaminhou este caso também para o Governo.

“Não houve qualquer tratamento de favor”, repetiu múltiplas vezes ao longo da audição Fernando Frutuoso de Melo, que se esforçou por explicar que a política de Belém é dar resposta e seguimento a todos os contactos que recebe por parte de cidadãos, mas que acabou por não detalhar que acompanhamento a Presidência fez no caso de um homem — exemplo que o próprio Frutuoso de Melo apresentou na comissão de inquérito — que desde 2019 se tem dirigido a Belém por não conseguir o acompanhamento desejado dos cuidados de saúde.

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Filho de Marcelo “não teve o que esperava”, mas hoje Frutuoso de Melo agiria de outra forma

A pergunta repetiu-se uma e outra vez: será que Nuno Rebelo de Sousa, que pediu ajuda ao pai, conseguiu o que desejava quando enviou o primeiro e-mail a Marcelo Rebelo de Sousa? Os diferentes grupos parlamentares foram insistindo neste ponto ronda após ronda, com Joana Cordeiro, da Iniciativa Liberal, a terminar a audição sentenciando que, a julgar pelo resultado do caso — as gémeas obtiveram, de facto, o tratamento pedido pela família –, o filho do Presidente da República chegou mesmo a alcançar o resultado desejado, mesmo que não tenha sido especificamente através da Presidência da República.

Ainda assim, apesar de muitas hesitações e recusas em avaliar as “motivações” de Nuno Rebelo de Sousa, Frutuoso de Melo haveria de disparar, num registo que descreveu como um desabafo: “O doutor Nuno Rebelo de Sousa não teve a resposta que esperava.” Até porque, fora outras considerações, o próprio Frutuoso admitiu que “todos percebemos” qual era a intenção do filho do Presidente da República ao pedir a tal “ajuda maior” ou ao queixar-se, noutro e-mail dirigido à Casa Civil, da quantidade de burocracia envolvida no processo, perguntando se não haveria forma de “acelerar a análise” do mesmo.

Ou seja: o que o filho do Presidente queria, e tentou, obter era uma intervenção direta do pai, e segundo a Casa Civil não conseguiu — qualquer irregularidade no processo, insistiu Frutuoso de Melo, aconteceu já na fase de marcação das consultas, alheia a Belém. Marcelo Rebelo de Sousa já tinha, de resto, defendido que o encontro do filho com o ex-secretário de Estado da Saúde António Lacerda Sales prova que Nuno Rebelo de Sousa “não conseguiu chegar onde queria” via Belém.

Marcelo diz que encontro com Lacerda Sales prova que filho “não conseguiu chegar onde queria” via Belém

Ainda assim, e após quatro horas de audição, o chefe da Casa Civil acabou por reconhecer que atualmente seria mais cauteloso na gestão do processo. Depois de ouvir a deputada do Chega Cristina Rodrigues perguntar-lhe, a minutos do fim da audição, porque é que não optou simplesmente por encaminhar os pais das duas crianças para o SNS, Frutuoso de Melo concordou: “Se eu soubesse o que sei hoje, teria respondido outra coisa e teria dito: se querem resolver o vosso problema, apresentem-se na urgência.” Nessa altura, não tinha noção de qual seria o procedimento mais correto a seguir, admitiu.

E ainda reconheceu outra possível falha, admitindo “refletir” sobre se faz sentido responder a pedidos de terceiros sem entrar em contacto direto com quem precisa de ajuda (neste caso, os pais das gémeas).

Os 190 mil pedidos, o concorrido e-mail pessoal de Marcelo e a denúncia de solicitações “falsas”

Uma das questões principais que os deputados levaram para a audição tinha a ver com o tratamento que Belém deu a este caso a partir do momento em que recebeu um e-mail que vinha assinado pelo filho do Presidente da República, comparativamente com o tratamento que deu a outros. Por isso, as diferentes bancadas empenharam-se em perceber qual é, afinal, o procedimento e a rapidez de resposta habitual que a Casa Civil dá aos pedidos que lhe chegam.

Frutuoso de Melo trazia as estatísticas na ponta da língua: desde o início do primeiro mandato de Marcelo Rebelo de Sousa, em março de 2016, a Presidência da República já recebeu cerca de 190 mil solicitações, o que equivale a 80 por dia de trabalho. Dessas, 40 mil têm a ver com Saúde. E uma “boa parte” desses casos tem resposta num prazo de 15 dias, embora, como admitiu, nem sempre seja esse o caso.

O que a Casa Civil costuma fazer, foi explicando e repetindo Frutuoso de Melo, é tentar “perceber do que se trata” e quem é a “entidade competente” que pode resolver o problema: “Sempre que se trata da competência de outras entidades, reenviamos e informamos o cidadão.”

Foi neste contexto que Frutuoso de Melo passou a dar alguns exemplos caricatos, desde o tal senhor que costuma andar por Belém para pedir ajuda com a marcação de uma consulta e que até tem “uma página de Facebook curiosa” onde partilha fotografias de Marcelo Rebelo de Sousa, até pessoas que lhe pedem ajuda para tirar os filhos, que “só venderam um bocadinho de droga”, da prisão. Na maior parte dos casos, são pessoas “modestas”, que não têm “vidas fáceis” e têm problemas por resolver, que sabem que o Presidente é “próximo” e, por isso, procuram a Presidência em busca de respostas. “Olho para isto como um direito dos cidadãos”, considerou Frutuoso de Melo, acrescentando que é “uma obrigação” responder-lhes – uma obrigação legal, acrescentaria, citando o artigo 42.º do Código de Processo Administrativo.

O problema, como apontou desde logo João Almeida, do CDS, é que nenhum desses cidadãos “modestos” e com pouco conhecimento sobre o funcionamento da Presidência da República é Nuno Rebelo de Sousa, ou seja, o filho do Presidente. E é isso que distingue este caso dos demais, foram concordando os deputados, enquanto Frutuoso de Melo insistia que neste caso não houve nenhuma “orientação para fazer diferente”.

Coisa distinta, aproveitou para relatar, foi a “onda de pedidos sistemáticos” que Belém começou a receber a partir de junho. “Uma onda de pedidos sistemáticos, todos com o mesmo texto, a dizer ‘preciso de uma consulta de otorrino, pode-me marcar?’ Algumas com comentários desagradáveis. Alguns eram certamente falsos e foram enviados à Procuradoria-Geral da República”, contou, com a IL a prometer fazer um pedido para que a comissão tenha acesso a estes pedidos.

Não demorou a que começasse a circular pelos WhatsApps da comissão um vídeo publicado a 24 de junho na página do Chega, protagonizado por André Ventura e Cristina Rodrigues. Nele, os dois deputados do Chega encorajam quem “quer uma consulta” a preencher o formulário de contacto do site da Presidência da República, enchendo a caixa de e-mail de Belém com pedidos.

A outra caixa de e-mail que pode estar cheia é a caixa de e-mail pessoal de Marcelo Rebelo de Sousa: com os deputados a lembrarem que Nuno Rebelo de Sousa contactou o pai recorrendo ao seu endereço pessoal, o chefe da Casa Civil desvalorizou esse dado, lembrando que “muitos milhares” de pessoas têm o e-mail privado do Presidente da República.

Os ditados populares sobre o corte entre Marcelo e o filho: “Quem tem filhos tem cadilhos”

Para assegurar que Marcelo Rebelo de Sousa não teve intervenção direta neste caso, nem nunca teve intenção de beneficiar o filho, Frutuoso de Melo foi buscar uma frase que o próprio Presidente da República já usou repetidas vezes, incluindo em público: “Filho de Presidente não é Presidente, e família de Presidente não é Presidente.”

A máxima é mais do que uma frase repetida por Marcelo: é uma “orientação” que o Presidente deu desde o “primeiro dia” em Belém, e que a Casa Civil garante que tenta cumprir à risca (daí o “desconforto” que Frutuoso de Melo disse sentir quando surgem situações como esta).

Na verdade, esta ideia atravessa o percurso e a postura de Marcelo na política — daí que o tema seja particularmente delicado para o Presidente. Como conta a biografia “Marcelo Rebelo de Sousa”, assinada pelo jornalista Vítor Matos, a ideia surgiu cedo na vida de Marcelo, quando corria o ano de 1955 e estava com o pai, o então subsecretário de Estado Baltazar Rebelo de Sousa, numa prova de hipismo onde também marcou presença o Presidente da República, Craveiro Lopes.

Foi durante a prova que o Presidente de então cumprimentou Baltazar Rebelo de Sousa, perguntando sobre Marcelo: “Quem é o menino?” E sentenciou: “Senhor subsecretário de Estado, recorde uma coisa, filho de subsecretário de Estado não é subsecretário de Estado. Ora, o menino vai para outro sítio! Lá foi Marcelo, levado por um ajudante de campo para fora do camarote presidencial. Ao Expresso, Marcelo assumiria que ficou “marcado na infância”: “Nestas questões eu levo o rigor a um ponto que às vezes peco por excesso.”

“Não é bom misturar família com política”. E a de Marcelo?

Talvez por isso o corte tenha sido radical: o Presidente assumiu, no polémico jantar com correspondentes estrangeiros, que cortou relações com o filho depois deste episódio: “É imperdoável, porque sabe que tenho um cargo público e político e pago por isso”, justificou.

Já Frutuoso de Melo garantiu que é “conhecido”, mas não “amigo”, de Nuno Rebelo de Sousa e não quis comentar a relação pessoal de Marcelo com o filho, preferindo recorrer a um ditado popular: “Quem tem filhos tem cadilhos…”. Os deputados riram-se e o socialista João Paulo Correia ajudou: “Filhos criados, trabalhos dobrados.”

O caso da bebé Matilde, que “comoveu o país” e abriu o precedente para usar o Zolgensma em Portugal

Logo no início da audição, Fernando Frutuoso de Melo procurou enquadrar o caso das gémeas luso-brasileiras no tempo e recuou até ao verão de 2019, quando o caso da bebé Matilde “comoveu o país”. Diagnosticada com atrofia muscular espinhal, a bebé esteve na origem de uma campanha de angariação de fundos que correu Portugal de norte a sul e que resultou na recolha de mais de dois milhões de euros.

“Os portugueses mobilizaram-se e angariaram mais de 2 milhões de euros”, recordou, lembrando que na altura este medicamento — o Zolgensma — só estava disponível nos Estados Unidos. Frutuoso de Melo lembrou também a atuação do Parlamento, nomeadamente do deputado Moisés Ferreira, do Bloco de Esquerda, que permitiu que o Estado português acabasse por assumir o encargo com o medicamento.

Na sequência deste caso, Portugal terá sido o primeiro país europeu a administrar o medicamento. “Tal permitiu tratar em Portugal outras crianças, incluindo estas duas”, assinalou Frutuoso de Melo.

Desde o início do primeiro mandato de Marcelo Rebelo de Sousa, em março de 2016, a Presidência da República já recebeu cerca de 190 mil solicitações, o que equivale a 80 por dia de trabalho. Dessas, 40 mil têm a ver com Saúde.

Foi também na sequência deste caso muito mediatizado que, em outubro de 2019, apenas três meses depois do tratamento da bebé Matilde, Nuno Rebelo de Sousa fez chegar a Belém a história das gémeas luso-brasileiras, perguntando se haveria possibilidade de também elas — que tinham direito à nacionalidade portuguesa — serem tratadas com o mesmo medicamento em Portugal.

O caso da bebé Matilde também passou pela Presidência da República, numa altura em que o que estava em causa era uma ideia de solidariedade social — a possibilidade de financiar a viagem da família até aos Estados Unidos. A propósito do caso, o líder do Chega, André Ventura, pediu a Frutuoso de Melo que entregasse à comissão os cerca de 60 emails trocados sobre o caso, já que foi ele a inaugurar o precedente do uso do medicamento em Portugal. O chefe da Casa Civil disse que respeitaria o pedido, mas alertou múltiplas vezes para o facto de os casos não serem comparáveis.

O erro de Frutuoso de Melo sobre as supostas listas de espera para o medicamento

Foi uma das contradições em que os deputados mais pegaram, especialmente a bancada do Chega. Frutuoso de Melo recordou que, depois de ter chegado a informação sobre o caso a Belém, a assessora Maria João Ruela contactou o hospital para perceber como os casos eram tratados e a informação que foi passada a Nuno Rebelo de Sousa foi a de que haveria uma lista de espera para a administração daquele medicamento e que a prioridade era dada a residentes em Portugal.

Contudo, Frutuoso de Melo diz ter percebido mais tarde, pelas declarações de Lacerda Sales, que afinal não havia lista de espera para o Zolgensma em Portugal. Foi, disse Frutuoso, um “erro de perceção” do próprio chefe da Casa Civil.

André Ventura pegou neste assunto para insistir com Frutuoso de Melo: afinal, se acreditava que havia uma lista de espera e que havia prioridade aos residentes em Portugal, porque é que Frutuoso de Melo contactou o Governo, em vez de simplesmente indicar que o caso devia seguir os trâmites normais no hospital? Frutuoso de Melo considerou que não havia razão para tirar “tantas conclusões” do seu erro de perceção quanto às listas de espera.

Gémeas tinham direito a nacionalidade portuguesa e ao SNS

O chefe da Casa Civil do Presidente da República deixou claro, na sua intervenção, que não há qualquer dúvida sobre a legitimidade do tratamento dado às crianças luso-brasileiras. “As crianças tiveram ou não uma vantagem indevida? Acho que não. Têm nacionalidade portuguesa, têm acesso ao Serviço Nacional de Saúde, têm direito ao tratamento”, destacou.

No entender de Frutuoso de Melo, o caso deixa em evidência questões sobre o acesso ao SNS. “Neste momento, é perfeitamente claro que as duas crianças tinham direito à nacionalidade portuguesa originária, eram filhas de portugueses”, destacou. “É também perfeitamente claro que qualquer titular de cartão de cidadão tem direito ao acesso ao SNS, viva onde viva. É o sistema que temos.”

“As crianças, estivessem onde estivessem, fossem beneficiárias do sistema de Segurança Social que fossem, tinham, de acordo com a lei, acesso ao SNS”, sublinhou o chefe da Casa Civil de Marcelo, rejeitando que tenha havido qualquer aproveitamento por parte da família para obter a nacionalidade e desvalorizando as questões levantadas, essencialmente, por André Ventura, sobre o modo como a nacionalidade foi obtida.

“Todos sabemos que este assunto começa num artigo de novembro de 2023 cujo título é ‘Duas brasileiras vêm roubar quatro milhões de euros aos portugueses”, disse, rejeitando a tese e lembrando que agora se sabe perfeitamente que eram portuguesas e que tinham direito ao tratamento.

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