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Ex-provedor Edmundo Martinho assumiu "os défices sistemáticos" na saúde e falou nos riscos da "privatização" dos jogos sociais
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Ex-provedor Edmundo Martinho assumiu "os défices sistemáticos" na saúde e falou nos riscos da "privatização" dos jogos sociais

LUSA

Ex-provedor Edmundo Martinho assumiu "os défices sistemáticos" na saúde e falou nos riscos da "privatização" dos jogos sociais

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O "benefício próprio" (que a ministra tem de provar) e a "coincidência" nos NFT. As audições sobre a Santa Casa em 7 pontos

Na primeira ronda de audições urgentes, houve divergências sobre quem tinha pelouro da internacionalização, um choque sobre a reestruturação sem plano e um pedido de esclarecimento à nova ministra.

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Na primeira ida ao Parlamento após sair da Santa Casa e de virem a público alegadas “irregularidades” sobre o processo de internacionalização que levou a cabo, Edmundo Martinho, ex-provedor da instituição, reiterou que informou a tutela sobre os investimentos na vertente internacional, disse que não esperava que o negócio tivesse lucro logo ao início — uma posição assumida também pelo ex-gestor da Santa Casa Global, que imputou à atual gestão a responsabilidade de 30 milhões de euros em perdas — e garantiu que foi “coincidência” que no caso da incursão nos NFT tivesse sido contratada uma empresa para a qual trabalhava o filho.

O foco foi além da internacionalização, com a vice-provedora demissionária a responder às críticas da atual ministra do Trabalho que acusou a mesa de “total inação”, de não ter um plano de reestruturação e de ter atuado em benefício próprio. Ana Vitória Azevedo desafiou Rosário Palma Ramalho a fundamentar essa acusação e garantiu que embora não houvesse um plano propriamente dito, estavam em curso medidas de urgência que implicavam contenção orçamental, incluindo no corte das chefias (mais ambicioso do que a ministra fez querer, assegura) e a implementação da regra “dois por um”.

Mas, para a vice-provedora que há um mês não tem acesso a documentação da instituição, não é correto atribuir à internacionalização a culpa de todos os problemas da Santa Casa. Os problemas são estruturais, de uma contínua perda de receita agravada pela alteração nos hábitos de jogo, numa instituição com “défices sistemáticos” na saúde.

Ex-gestor da Santa Casa Global culpa mesa de Ana Jorge por perdas de 30 milhões na internacionalização

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A série de audições incluiu ainda Ricardo Gonçalves, ex-administrador da Santa Casa Global suspenso pela gestão exonerada por este Governo, que atirou responsabilidades para a mesa de Ana Jorge pela espiral de prejuízos gerada com a saída precipitada das operações no Brasil.

Rosário Ramalho desafiada a provar “benefício próprio” atribuído por gestores da Santa Casa

A vice-provedora demissionária desafiou a ministra da Segurança Social, Rosário Palma Ramalho, a fundamentar a acusação feita à mesa da Santa Casa de ter atuado em benefício próprio. A ministra, disse Ana Vitória Azevedo em audição no Parlamento, tem todo o direito de substituir os gestores, mas “não tem o direito de dizer coisas que não são verdadeiras e de desvalorizar as pessoas do ponto de vista profissional”.

Ana Vitória Azevedo confessou que até se sentia chocada com a acusação de que a mesa se atribuiu um benefício próprio. “Eu gostava que a ministra explicasse que benefício foi esse”, admitindo que pode ter que ver com o aumento das remunerações ao abrigo do estatuto de gestor público — que se aplica à mesa da Santa Casa. “Mas extrair daí benefícios próprios é grave”. O gabinete da ministra da Segurança Social recusou dar mais explicações ao Observador. A acusação foi também alvo de desmentidos por parte da provedora exonerada, Ana Jorge, que veio a público reagir às declarações de Rosário Palma Ramalho, ainda antes de ir dar explicações ao Parlamento.

“É mentira”: Ana Jorge nega acusações de inação e benefício próprio na Santa Casa e responde a ministra: “Farei prova no Parlamento”

Os números das contas da Santa Casa mostram de facto um aumento dos encargos com os vencimentos da mesa — que é o órgão de administração da instituição. E esses valores subiram em 2023 para 522,4 mil euros, mais 20% do que os 325,5 mil euros pagos em 2022. Mas o número de membros que compõem a mesa cresceu com a nomeação de Ana Jorge, para seis. Nos anos anteriores a mesa era composta por cinco membros. Os salários individuais dos gestores da Santa Casa não são divulgados e são aprovados por despacho do Governo tendo em conta os valores previstos no estatuto do gestor público. A vice-provedora demissionária admite que terão sido atualizações a este diploma que determinaram o aumento das remunerações da administração, mas garante que a gestão da qual fez parte implementou várias medidas para reduzir os custos com as chefias.

Em entrevista à RTP na véspera de se iniciarem as audições no Parlamento, a ministra do Trabalho e Segurança Social, Rosário Palma Ramalho, referiu que a administração tinha sido aumentada no atual contexto, o que “estranhou” e falou em benefícios aos dirigentes mais bem pagos e a si próprios (aos administradores).

Vice-provedora e ministra em choque sobre cortes de chefias

A vice-provedora demissionária reconhece que não havia um plano “estrutural” de reestruturação da Santa Casa, pelo menos no “sentido” que a ministra Rosário Palma Ramalho mostrou querer. Ana Vitória Azevedo explicou que dada a necessidade “urgente” de medidas várias, até pelos problemas na internacionalização, “não havia tempo para gizar um plano mais robusto” e detalhado. Mas isso não quer dizer que não tivessem sido tomadas medidas de “sustentabilidade financeira” e medidas “urgentes que permitissem conter a urgência da regularização das contas”.

A vice-provedora, Ana Vitória Azevedo, que se demitiu em fevereiro contraria ministra e diz que foram tomadas medidas para cortar custos

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Enquanto vice-provedora, Ana Vitória Azevedo teve o pelouro dos recursos humanos e recusa as acusações feitas pelo governo de que houve um aumento das despesas de pessoal não sustentado. Por um lado, diz que com a provedora foram resolvidos “problemas adiados” como a revisão do acordo de empresa que implicou atualizações salariais médias de 6,5%, e, por essa via, aumentos da despesa. Aliás, viria a defender que o acordo era essencial para a paz laboral na instituição e a responder à crítica da nova ministra: “Se é esse aumento [de custos] que a senhora ministra critica é um aumento bom”.

Mas garantiu que foi acompanhado por um “conjunto de medidas de contenção orçamental”, como a redução das estruturas orgânicas, incluindo de cargos dirigentes, ou a implementação da regra da contratação de apenas um trabalhador por cada duas saídas — conhecida na administração pública como “dois por um”. “Entre outras medidas”.

Em entrevista à RTP na segunda-feira, a ministra do Trabalho, que tem a tutela da Santa Casa, desvalorizou essa reestruturação orgânica, dizendo que resultou na redução de apenas 19 cargos dirigentes, sendo que são de pessoas que não saíram da instituição, mas aí se mantiveram sem os suplementos remuneratórios da função. Segundo o relatório e contas de 2023, os gastos com pessoal aumentaram cerca de 2,3%, de 147,6 milhões para 151 milhões. Esse aumento foi uma das críticas apontadas pela nova tutela.

Ana Vitória Azevedo refutou esses números — não foram 19 mas 40 cargos (15%), no valor de um milhão de euros. Esta foi “a redução efetiva de cargos dirigentes ou equiparados”, uma vez que havia situações de chefias que “não tinham equipa, eram chefes deles próprios”. “Isso terminou”, afirmou.

Nesta frente, acrescenta que foi suspensa a contratação de pessoas que saíam com licença sem vencimento, o que obrigava a Santa Casa a fazer substituições temporárias. Foram também suspensos os programas de formação para dirigentes e alterados os critérios de contratação com a introdução de júris. As medidas que foram adotadas em 2023 terão também efeito em 2024, acrescentou Ana Vitória Azevedo.

Quem tinha o pelouro da internacionalização? Vice-provedora diz que não era ela e atira responsabilidade a Edmundo Martinho

Ana Vitória Azevedo, que se demitiu este ano por não concordar com as opções da atual gestão, quis deixar claro que, ao contrário do que foi escrito e dito nos últimos meses, não tinha o pelouro da internacionalização, pelo que afastou responsabilidades na operação polémica.

Por um lado, insistiu que iniciou funções em janeiro de 2021, quando já tinham sido tomadas várias decisões e estavam avançados os projetos ligados à internacionalização. Remete, aliás, “toda a responsabilidade” de tomada de decisões a Edmundo Martinho e o então vice-provedor, João Correia.

Outro argumento que usa para sustentar que não tinha responsabilidades na internacionalização foi o facto de não lhe terem sido enviadas pela anterior gestão as due diligence à compra da MCE, a empresa que venceu o concurso para explorar a lotaria no Estado do Rio de Janeiro. Essas due diligence tinham sido prometidas pela anterior gestão à tutela, mas mesmo a ex-ministra Ana Mendes Godinho tinha dito no Parlamento, em janeiro, que não as recebeu.

“Não me foi dada a conhecer, o que é surpreendente, se de acordo com o senhor provedor eu era responsável pela internacionalização”, disse Ana Vitória Azevedo, esta terça-feira, na audição parlamentar. A vice-provedora demissionária conta que questionou Edmundo Martinho sobre o facto de a empresa ter uma prestação de serviços de cinco anos para exploração de jogo no Rio de Janeiro, em que o primeiro ano “já era deficitário”. Edmundo Martinho terá respondido, segundo Ana Vitória Azevedo, que esse primeiro ano foi o da Covid, mas a então vogal da SCML, garante que ainda assim considerou excessivo. O ex-provedor terá dito que o que valia na empresa era a “rede de distribuição física que já detinha”. “Eu não tinha maneira de questionar.”

Ana Vitória Azevedo diz que manifestou “dúvidas, reservas e divergências” nas reuniões da mesa e junto da então ministra, de quem é amiga, sobre as opções de gestão de Edmundo Martinho e da operação internacional, incluindo sobre riscos no mercado do Brasil, dificuldades de contratação local e pela escala de investimento “dificilmente compatível com a complexa situação financeira da Santa Casa”.

Mas apesar de defender que se deve investigar tudo até às últimas consequências, considera que não é rigoroso atribuir à internacionalização a origem dos problemas da instituição. A Santa Casa, argumenta, tem um problema estrutural de perda de receita, agravado pela pandemia sem que tivesse sido beneficiada por alguma alteração na distribuição do jogo. “Apesar da almofada financeira, a situação a prazo estaria sempre comprometida”, referiu, lembrando que foram sendo transferidos equipamentos sociais com défices de exploração para a Santa Casa sem acautelar o respetivo financiamento. Uma conjugação de fatores que levaram a que o saldo de tesouraria caísse de mais de 200 milhões de euros para 40 milhões de euros.

NFT. Empresa em que trabalhava filho de ex-provedor foi contratada pela Santa Casa mas foi “coincidência”

Edmundo Martinho foi questionado sobre o alegado envolvimento do filho no negócio dos NFT (sigla para non-fungible token, um ficheiro único ou imagem digital encriptada), em que a Santa Casa entrou no final de 2021. O anúncio tinha sido feito num dos palcos da Web Summit e Edmundo Martinho mostrava-se confiante com os resultados. “É uma oportunidade única não apenas para mostrar o nosso trabalho e a nossa herança artística, mas também abri-la ao mundo e torná-la conhecida”, disse então.

A coincidência que envolveu o filho de Edmundo Martinho no negócio dos NFT da Santa Casa

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O investimento chegou aos 500 mil euros, segundo chegou a ser noticiado, mas o retorno terá sido residual. Segundo uma análise do Observador aos relatórios e contas da Santa Casa, em 2021 os NFT renderam à instituição 1.040 euros em vendas; em 2022, 565 euros. De acordo com os relatórios, estes valores tratam-se do rédito de vendas de NFT.

Edmundo Martinho reconheceu, na audição, que a aposta nos NFT agora pode parecer estranha, mas na altura diz que fez sentido pela “febra das criptomoedas e dos NFT”. Uma febre que não durou muito.

Sobre o alegado envolvimento do filho na decisão de a Santa Casa investir no negócio, noticiada pelo Público esta terça-feira, o ex-provedor explicou que o filho trabalha na área do marketing e que ele, Edmundo Martinho, lhe pediu para a título “meramente gratuito podermos fazer uma apresentação” à mesa da SCML sobre “a questão do blockchain, das criptomoedas e dos NFT”. Foi “apenas isso que se passou”.

Mas “coincidência das coincidências”, a empresa onde o filho trabalhava, a UTrust, foi a escolhida pela Santa Casa para prestar o serviço de conversão das criptomoedas — o negócio apenas aceitava o pagamento através de cripto — em euros. Edmundo Martinho diz que a empresa sediada em Braga era a única autorizada a fazer essas conversões.

“Felizmente ou infelizmente não deu nenhum resultado, tivemos muito poucas vendas de resultado”, reconhece. As receitas “não foram as que se esperavam”, o que associa à “queda abrupta das criptomoedas”.

Os “défices sistemáticos” na saúde e como a Santa Casa financia hospital da Cruz Vermelha sem o apoio da Parpública

Edmundo Martinho justificou a compra da sociedade gestora do hospital da Cruz Vermelha em 2020 com a convicção de que este hospital de referência não devia ir para o setor privado nem fechar, mas sim ser mantido na esfera pública ou no setor social. A iniciativa partiu da Cruz Vermelha que não queria manter o hospital (por falta de recursos financeiros), mas que colocou a proposta à tutela antes de avançar. Inicialmente prevista para 100% do capital, a Santa Casa acabou por comprar 55% da sociedade gestora, já que o edifício do hospital e os terrenos ficaram com a Cruz Vermelha.

Edmundo Martinho indicou que a Santa Casa fez reforços de capital e deu garantias bancárias para financiar o hospital, mas não quantificou.

O parecer do conselho de auditoria indica que a SCML efetuou “prestações acessórias” ao Hospital da Cruz Vermelha de oito milhões de euros e reconheceu “imparidade” de 6,9 milhões de euros em 2022. Em 2023 realizou, ainda, “prestações de capital” no montante de 6,1 milhões de euros e reconheceu “imparidade” de 2,5 milhões de euros.

Santa Casa avançou com compra do Hospital da Cruz Vermelha “sem avaliações e estratégias racionais e sustentáveis”

O órgão de fiscalização da Santa Casa alerta para o facto de ser a SCML em exclusivo de manter as condições de financiamento do hospital, através de garantias bancárias. E sem a participação da Parpública (que tem 45% da sociedade) considerando que a atual situação financeira da Santa Casa não lhe permite suportar responsabilidades que são do Estado/Parpública. E recomenda que seja reposto o equilíbrio no financiamento ao hospital. Sob pena da atual situação agravar a falta de racionalidade que a gestão de Ana Jorge reconhece ter existido nesta aquisição realizada pelo seu antecessor.

Ao contrário do que defendeu esta quarta-feira Edmundo Martinho, a Santa Casa quer vender a participação no Hospital da Cruz Vermelha. Apesar dos resultados negativos de 4,1 milhões de euros em 2023, uma redução face aos prejuízos dos anos anteriores, o ex-provedor disse que que a sociedade gestora está a funcionar com resultados positivos. “Há muito para recuperar, mas a expectativa é que essa recuperação possa ser feita em dois anos”.

Edmundo Martinho reconheceu ainda que a expansão da oferta da Santa Casa na prestação de cuidados na área da saúde acrescenta “sistematicamente défice”. E deu como exemplo o centro de reabilitação de Alcoitão que só tem financiamento garantido até setembro. Nos últimos três meses, é por conta da capacidade da Santa Casa o que significa um défice de exploração.

Também a vice-provedora demissionária expôs o défice de cobertura por parte do SNS dos serviços prestados pelas unidades de saúde. O centro de reabilitação de Alcoitão e o hospital ortopédico de Sant’Ana apresentaram défices de oito a nove milhões de euros por ano porque, explicou Ana Vitória Azevedo, o Ministério da Saúde pagava um valor fixo limitado, independentemente do número de serviços prestados que não recebiam a devida compensação. Essa situação foi já corrigida este ano com acordos feitos com o SNS para estas entidades, aprovados pelo anterior Governo e permitem receita adicional de 16 milhões de euros para a Santa Casa.

Interesses pessoais ou interesses para privatizar jogos?

Edmundo Martinho acredita que o surgimento da polémica em redor da Santa Casa, inclusive sobre os problemas na internacionalização, pode ter razões subjacentes “pessoais”, contra si próprio, “o que vê como possível e admissível”, ou razões que “não têm nada a ver com o funcionamento da Santa Casa” e que passam pelo renascer de uma “tese antiga” de que a exploração dos jogos sociais deve ser dada aos privados.

“Os jogos não são da Santa Casa, são do Estado, cabe ao Estado procurar a melhor solução para a exploração dos jogos. É ai que me junto a esta suspeita, que o Dr. [Pedro] Santana Lopes levantou, que esteja por detrás a intenção de privatizar os jogos da Santa Casa, na medida em que tudo isto que aconteceu ao longo deste ano”.

Tal como já tinha dito ao Observador, o ex-provedor reiterou que não pediu autorização para todos os investimentos individualmente porque constavam nos planos de atividades e orçamentos que, segundo diz, foram aprovados pela tutela. Esses documentos “estavam sempre sujeitos à aprovação prévia da tutela e lá estava expresso os montantes e destinos desses investimentos”. “O julgamento que fizemos é que não havia lugar a pedidos de autorização”, acrescenta. Edmundo Martinho remeteu para os estatutos da Santa Casa, segundo os quais “só os investimentos superiores a 10% do orçamento, da ordem dos 25 milhões de euros, exigem uma autorização especial do Ministério da Segurança Social”. “Não foi o caso”, garante.

Ex-provedor da Santa Casa responde a ministra: tutela foi informada e aprovou valores para internacionalização

Apesar das polémicas, o ex-provedor mantém a convicção de que a estratégia de internacionalização “é o caminho adequado para a Santa Casa”. Mas também diz que não esperava que a internacionalização tivesse resultados positivos logo ao início.

Erro crasso ou prudência? A divergência no valor dos imóveis que o Tribunal de Contas foi chamado a esclarecer

Ana Vitória Azevedo atacou os resultados e o impacto nas contas da Santa Casa da reavaliação de imóveis conduzido por um auditor no ano passado e que “deitou abaixo o justo valor desses imóveis”. Esta auditoria, diz, desvalorizou o património imobiliário avaliado desde 2014 por avaliadores independentes e certificados pela CMVM. “Nem tenho palavras para explicar a leviandade e os erros técnicos crassos cometidos por estes auditores” que diz terem sido contratados pelo departamento financeiro da Santa Casa.

Fachada do Tribunal de Contas, em Lisboa 25 de novembro de 2022. ANTÓNIO COTRIM/LUSA

Tribunal de Contas tem pedidos de auditoria à Santa Casa (feitos pela própria) e questões sobre valorização de imóveis

ANTÓNIO COTRIM/LUSA

Em causa estão divergências sobre a valorização contabilístico dos imóveis em função dos proveitos potenciais máximos ou de valores mais conservadores. Estas avaliações têm impacto no ativo e balanço contabilístico da Santa Casa e foi por isso que Ana Vitória Azevedo se recusou a assinar as contas de 2023, o que contribuiu para a sua demissão.

A reavaliação retirou 57 milhões de euros aos valores dos imóveis registados no balanço de 2022. Isto porque foi considerado que o registo do valor mais alto indicado pelos avaliadores não era o critério mais prudente face à incerteza nos resultados da exploração comercial desses imóveis.

Esta opção foi reconhecida pelo conselho de auditoria que já tinha alertado para os riscos de uma valorização por cima.

“Considerando a realidade e os desafios da SCML e atento esse princípio, sublinha-se que as componentes do ativo (v.g.: imóveis) devem ser determinadas e relevadas pelo menor valor e as componentes do passivo (v.g. responsabilidades financeiras), pelo valor que assegure a adequada cobertura de todos os riscos, ou seja, pelo maior valor.  Em suma, deve ser rigorosamente observado o princípio da prudência como suporte de uma ação cautelar e que assegure que os ativos (bens e direitos) registados no balanço não sejam sobrestimados e que os passivos (obrigações) não sejam subestimados”.

Essa revisão em baixa foi parcialmente corrigida nas contas de 2023, tendo sido usado um valor intermédio no intervalo das avaliações mínima e máxima dos referidos imóveis. Não sendo avaliadora, apesar de ter o pelouro do património, a ex-vice-provedora diz que pediu a opinião do Tribunal de Contas sobre esta divergência, mas que o esclarecimento  ainda não terá sido dado.

Ana Vitória Azevedo criticou ainda a opção da Santa Casa de colocar essa desvalorização nos documentos financeiros, nomeadamente nos planos de atividades e relatórios, dando a ideia de que a instituição inflacionou o património para melhorar as contas, antes da clarificação do Tribunal de Contas.

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