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Shirlaine Forrest

Shirlaine Forrest

O futuro da música está nas nuvens

O negócio da música está a mudar velozmente. A Internet trouxe novas possibilidades mas, também, muita pirataria. Existirá um modelo perfeito? Os serviços de "streaming" querem ser a resposta.

Sem música, a vida seria um erro“. A frase, atribuída ao filósofo Friedrich Nietzsche, ilustra na perfeição a importância da arte musical para as sociedades humanas, o que é aplicável a todas as gerações e em todos os cantos do mundo. Uma arte que é, também, uma indústria cuja evolução acelerou vertiginosamente nas últimas décadas, muito por força da Internet.

As vendas de discos estão a cair há várias décadas e, recentemente, até as vendas de música “à unidade” através de serviços como o iTunes, da Apple, estão a dar sinais claros de uma tendência de queda provavelmente irreversível. A mudança dos hábitos de consumo e, claro, a pirataria, há muito que estão a causar introspeção sobre qual será o modelo perfeito – se é que ele existe – para a distribuição de música na era digital. Os serviços de “streaming” a partir da “nuvem” da Internet, em que o Spotify é líder em Portugal, querem ser a resposta e têm conquistado muitos adeptos mas, também, adversários de peso.

Taylor Swift, uma cantora “pop” de 24 anos cuja carreira começou na música “country”, anunciou no início de novembro que iria retirar toda a obra do Spotify e que o seu novo álbum, “1989”, não iria estar disponível na plataforma que é líder nos serviços de música por “streaming” em Portugal e também lá fora. “A música está a mudar tão rapidamente, e o panorama da indústria musical está a mudar tão rapidamente, que todas essas coisas novas, como o Spotify, tudo isso me parece ser uma grande experiência“, afirmou Taylor Swift, em declarações ao portal da Yahoo. E “não estou disposta a entregar o trabalho da minha vida a uma experiência que, na minha opinião, não compensa adequadamente os escritores, produtores, artistas e criadores de música. Não aceito que se perpetue a perceção de que a música não tem qualquer valor e deve ser gratuita“, rematou.

"Todas as coisas novas, como o Spotify, tudo isso me parece ser uma grande experiência", disse Taylor Swift, na foto acompanhada por Scott Borchetta, presidente da editora Big Machine

Getty Images for ACM

Este é um debate que subiu de tom nos últimos anos, com a popularidade dos serviços de música por “streaming” a disparar graças à proliferação dos “smartphones” e das ligações rápidas à Internet móvel e por fibra ótica. Como funciona? Ao contrário do que acontece com o serviço comum do iTunes, em que cada música é descarregada da Internet para o computador (ou outro dispositivo) e paga à unidade ou por álbum, nestas novas plataformas o utilizador acede, pela Internet, a uma gigantesca base de dados de música que está na “nuvem” – ou seja, em servidores acessíveis remotamente – e ouve o que quiser, as vezes que quiser, pagando por isso uma subscrição mensal que, no caso do Spotify, é de 6,99 euros por mês. À semelhança de outros concorrentes, como o francês Deezer, é também disponibilizado um serviço gratuito para o utilizador, com algumas limitações, em que existe publicidade.

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O que acontece a esse dinheiro? “O Spotify entrega 70% de todas as suas receitas, tanto referentes à versão ‘free’ (gratuita para o utilizador e subvencionada pela publicidade) como as receitas por subscrição (versão ‘premium’) aos proprietários dos direitos (discográficas, distribuidoras e artistas independentes), de acordo com a popularidade da sua música no serviço”, explica ao Observador fonte oficial da empresa sueca. O modelo tem alguma complexidade mas, em termos simples, cada vez que um utilizador inicia a audição de uma determinada música, há uma pequena quantia que é entregue à editora respetiva. “A forma como as editoras distribuem o dinheiro entre os seus artistas dependerá de cada um dos contratos individuais entre artista e discográfica”, acrescenta o Spotify.

"O Spotify paga 70% de todas as suas receitas, tanto referente à versão 'free' como das receitas por subscrição aos proprietários dos direitos (discográficas, distribuidoras e artistas independentes). A forma como as editoras distribuem o dinheiro entre os seus artistas dependerá de cada um dos contratos individuais entre artista e discográfica".
Fonte oficial do Spotify

Já em julho, num artigo de opinião no The Wall Street Journal, Taylor Swift comentava que “a pirataria, a partilha de ficheiros e o ‘streaming’ reduziram drasticamente as vendas de álbuns”. “A música é arte, e a arte é importante e rara, e as coisas valiosas devem ser pagas“, escrevia a artista. Nas vésperas do lançamento do novo álbum, foi, então, tomada uma posição: Taylor Swift sai do Spotify. De imediato, a empresa tentou responder de forma airosa, brincando com a letra de uma música de Taylor Swift para lhe dizer que “nós adoramos a Taylor Swift e os nossos mais de 40 milhões de utilizadores adoram-na ainda mais”, pedindo-lhe que voltasse atrás na sua decisão.

Mas a resposta oficial chegou esta semana, pela mão do presidente-executivo do Spotify, Daniel Ek, que se diz “farto desta ideia de que o Spotify está a ganhar dinheiro à custa dos artistas”. “Taylor Swift tem toda a razão: a música é arte, a arte tem um valor real, e os artistas merecem ser pagos por ela”, afirmou Daniel Ek, numa entrada no blog oficial do Spotify. É por isso, revelou o responsável, que o Spotify já entregou dois mil milhões de dólares à indústria discográfica e o dinheiro recebido por Taylor Swift e outros artistas de topo “caminha para ultrapassar os seis milhões de dólares por ano”, calcula o presidente-executivo. “Estamos a pagar enormes quantias às editoras discográficas para distribuirem pelos artistas. Se o dinheiro não está a fluir para os criativos de uma forma atempada e transparente, isso é um grande problema“.

"Se o dinheiro não está a fluir para os criativos de uma forma atempada e transparente, isso é um grande problema", diz Daniel Ek, fundador do Spotify.

Getty Images

Em resposta aos números de Daniel Ek, a editora de Taylor Swift garantiu na quarta-feira que a cantora recebeu do Spotify menos de 500 mil dólares nos últimos 12 meses por audições da sua música no território norte-americano. À revista Time, o Spotify prefere falar nos dois milhões de dólares pagos a Taylor Swift a partir das audições da sua música a nível global. Scott Borchetta, o presidente da editora de Taylor Swift, a Big Machine, justificou a saída do Spotify com o desejo de não querer “embaraçar” nenhum “super-fã” da Taylor Swift.

Embaraçar? “Sim. Se um fã compra o álbum, em CD ou através do iTunes, e depois os amigos dizem-lhe: ‘Porque foste pagar por isso? É gratuito no Spotify.’ estamos a ser desrespeitosos para com o super-fã que quer investir” na música de Taylor Swift, explicou Scott Borchetta em entrevista ao BillBoardBiz. O presidente da editora acrescentou que a retirada da música de Taylor Swift do catálogo do Spotify se deveu à recusa, por parte da empresa sueca, de disponibilizar o álbum apenas aos utilizadores pagantes do Spotify.

"Se um fã compra o álbum, em CD ou através do iTunes, e depois os amigos dizem-lhe: 'Porque foste pagar por isso? É gratuito no Spotify...' estamos a ser desrespeitosos para com o super-fã que quer investir" na música de Taylor Swift, justificou Scott Borchetta, presidente da editora Big Machine.

Nas lojas, “1989” vendeu 1.287 milhões de cópias na primeira semana, a estreia mais bem-sucedida de um álbum em formato físico nos últimos 12 anos. É impossível determinar se as vendas teriam sido tão elevadas se o álbum tivesse ido para o Spotify. Há comentadores que acreditam que sim, sobretudo porque entre os milhões de apreciadores da música de Taylor Swift estão os fãs de “country music”, tradicionalmente compradores de discos em formato físico, e muitos fãs de música “pop” que compram e oferecem muitos discos. Contudo, o que escapa ao controlo de Taylor Swift e do presidente da sua editora é a perda de vendas para a pirataria, em especial através da Internet. E é para esse problema que as plataformas de música na “nuvem”, como o Spotify, querem ser a solução.

“Adoramos música e a pirataria estava a matá-la”

A empresa, criada em 2008, distingue-se de plataformas como o “velho” Napster, em que a partilha de ficheiros de música ocorria de forma completamente alheia a artistas e editoras. “Criámos o Spotify porque adoramos música e a pirataria estava a matá-la”, escreveu Daniel Ek no blog do Spotify na quarta-feira. “A pirataria paga zero aos artistas” e “trabalhamos dia e noite para recuperar dinheiro para os artistas e para a indústria musical, dinheiro que a pirataria estava a roubar”, acrescentou o fundador do Spotify. A pirataria é o outro vértice do debate sobre os modelos de distribuição de música na era digital, colocando a questão essencial: O que significa uma audição de uma música no Spotify (ou noutro serviço)? Menos um CD vendido? Ou menos um álbum pirateado? Ou, pelo contrário, mais um fã a aplaudir no concerto ao vivo desse artista?

A pirataria é o outro vértice do debate sobre os modelos de distribuição de música na era digital, colocando a questão essencial: O que significa uma audição no Spotify (ou noutro serviço)? Menos um CD vendido ou menos um álbum pirateado?

A resposta será um misto das várias hipóteses, conforme as situações, e ainda não há estudos académicos que respondam a estas questões de forma satisfatória. Mas a questão é crucial para o debate acerca do que representam os serviços de música por “streaming” e como podem contribuir para a solução de um problema antigo. O que são serviços como o Spotify, o Deezer, o Beats Music (que marca a entrada da Apple neste segmento) e, agora, até o “gigante” Youtube, que quer entrar neste mercado? São uma solução para diminuir a pirataria? São uma ameaça para o equilíbrio da indústria da música ou, eventualmente, um complemento e uma nova ferramenta?

O Observador perguntou à cantora portuguesa Luísa Sobral, que tem toda a obra no Spotify, a sua opinião: “Acho que temos de saber viver com o presente e temos de saber adaptar-nos”, diz a artista. “Acho, por isso, que os serviços ‘streaming’ podem servir de complemento aos meios tradicionais e fazer com que a nossa música chegue a mais pessoas“. Luísa Sobral reconhece, contudo, que “se vendesse o mesmo numero de álbuns que a Taylor Swift talvez também não os quisesse ter em ‘streaming'”.

O que também agrada a Luísa Sobral no crescimento da música na “nuvem” é que as pessoas tendem a ouvir álbuns inteiros e não canções avulsas. “Hoje em dia, com o YouTube, as pessoas partilham canções e está a perder-se o conceito de álbum. Ouvimos apenas os ‘hits’ e achamos que conhecemos o artista”, diz a cantora. Com serviços como o Spotify, tendemos mais a “escolher um disco e ouvir, do inicio ao fim como se fazia ‘antigamente’, o que me faz ter alguma esperança que as pessoas voltem a dar valor ao álbum em si”.

"Os serviços 'streaming' podem servir de complemento aos meios tradicionais e fazer com que a nossa música chegue a mais pessoas", diz Luísa Sobral.

JOSE SENA GOULAO/LUSA

Pela popularidade da artista, a saída de Taylor Swift está por estes dias a aquecer o debate sobre qual o papel que podem ter os serviços de música na “nuvem” para moldar o futuro da indústria musical. Mas o Spotify e seus concorrentes há muito que enfrentam as críticas de vários artistas conhecidos como David Byrne, dos Talking Heads, e Thom Yorke, dos Radiohead. Este último chegou a considerar estes serviços como “a derradeira flatulência de um corpo moribundo“, acusando o Spotify de querer assumir-se como o “gatekeeper” da música. Em resposta a um artigo académico da London School of Economics que defendia a partilha de música pela Internet, Nigel Godrich, que faz música com Thom Yorke, alertou que “se o Spotify atingir o seu objetivo de tomar o controlo da distribuição de música, será criado um novo precedente e será banalizada a ideia de que a música tem um valor praticamente nulo”.

A pergunta “o que tem a dizer sobre a música ‘streaming’?” tem sido feita a centenas de artistas internacionais de renome, e todos têm uma opinião, que nem sempre é negativa. O músico Moby comparou Thom Yorke e as suas críticas a um “velhote a berrar a um comboio de alta velocidade”. “Adoro Thom Yorke e David Byrne. Génios criativos. Mas não vejo qual é a vantagem em lutar contra um futuro que já está entre nós“, escreveu Moby, no Twitter. Bono Vox também se juntou a este debate, colocando-se do lado dos defensores do “streaming” de música. “A verdadeira batalha não é entre os ‘downloads’ digitais e o ‘streaming’, a grande batalha é entre a opacidade e a transparência”, afirmou o vocalista dos U2. “Para que este novo modelo tenha sucesso e se possa enraizar, tem de haver transparência e algum tipo de justiça. Quando isso acontecer, a indústria musical subirá como uma maré que ergue todos os barcos“, afirmou.

Os serviços de distribuição por "streaming" são "a derradeira flatulência de um corpo moribundo", afirmou Thom Yorke, vocalista dos Radiohead.

Getty Images

O Spotify está em Portugal há quase dois anos. A empresa não presta dados atualizados sobre mercados locais, mas na altura do primeiro “aniversário”, em fevereiro, deu algumas notas sobre a implantação do serviço no país. “Durante o primeiro ano do Spotify em Portugal, os portugueses que usaram a nossa rede social ouviram o equivalente a 2.100 anos em música, cerca de 19 milhões de horas de faixas, tendo para isso contribuído as 3,4 milhões de ‘playlists’ criadas”, diz fonte oficial da empresa. Entretanto, a marca Meo criou o serviço Meo Music, disponível para os clientes da operadora e que, como fizeram outros concorrentes, também celebrou acordos com as editoras para a distribuição por “streaming” da música de centenas de artistas.

"Durante o primeiro ano do Spotify em Portugal, os portugueses que usaram a nossa rede social ouviram o equivalente a 2.100 anos em música, cerca de 19 milhões de horas de faixas, tendo para isso contribuído as 3,4 milhões de 'playlists' criadas"
Fonte oficial do Spotify

Ao Observador, o Spotify diz que “o consumo de música evoluiu de forma considerável durante os últimos dez anos. A maneira como se consome e como se acede à música está cada vez mais fragmentada. Cada vez mais pessoas querem ter acesso a toda a música existente no mundo, e tornou-se mais importante para o consumidor ouvir música do que ser proprietário da mesma“. Saídas de grandes nomes como Taylor Swift e Thom Yorke? A empresa prefere olhar para quem está a entrar. “Cada vez há mais artistas que estão a juntar-se, como os Red Hot Chili Peppers, Pink Floyd, Led Zeppelin, Metallica, Bob Dylan, John Lennon, Paul McCartney, entre outros”.

“Sempre que a indústria musical passou por um período de transição, verificámos que existiram artistas e agentes que resistiram à mudança – desde os vinis às cassetes e aos ‘downloads’ e, agora, ao ‘streaming'”, diz fonte oficial do Spotify. “Todos concordamos que os fãs querem acesso instantâneo à música e que os artistas têm todo o direito a ser compensados justamente. Desta forma, podemos construir, juntos, algo realmente especial para os artistas e para os fãs e ajudar a que a indústria musical, no seu conjunto, cresça”.

À medida que a tecnologia evolui e se torna possível enviar música para qualquer lado, através de “bits e bytes”, a expectativa é a de que a distribuição de música a partir da “nuvem” continue a crescer. O próximo filão a ser seguido será, possivelmente, a transmissão de música em ‘alta fidelidade’ através da Internet, ou seja, além dos formatos compactados – e, claro, com perda de qualidade mais ou menos percetível – a que esta primeira vaga de música na “nuvem” habituou a maioria dos consumidores de música. Que, na verdade, somos todos nós.

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