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ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

Olivier Rolin: "Escrevemos sempre contra a morte de alguma coisa. A morte é um grande adversário"

Visitou os 4 cantos do mundo. Esteve na América, na Ásia e agora está em Portugal para escrever. Olivier Rolin, o celebrado autor francês que acha Proust irritante, falou com o Observador em Cascais.

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Nos últimos 30 anos, Olivier Rolin reuniu, em mais de seis dezenas de pequenos cadernos, o rosto das pessoas que conheceu nas suas muitas viagens. Através delas, espera agora conseguir construir o mundo inteiro nas páginas de um só livro. Enquanto realiza essa tarefa monumental, Rolin, vencedor do Prémio Femina e finalista do Goncourt, espera ter forças para criar ainda um outro retrato: o de si próprio.

Nem poderia ser de outra forma. Para o escritor nascido em França mas com muitos anos de África, a literatura não existem sem o tempo em que é escrita, e também sem o seu criador. Quase todos os seus livros (há exceções, claro) são baseados na sua própria experiência, enquanto pessoa e enquanto cidadão. É por isso que nunca ficou totalmente satisfeito com Um Caçador de Leões, obra de 2008 sobre Eugène Pertuiset, um aventureiro pinga-amor que chegou a servir de modelo ao pintor francês Edouard Manet. Personagem “ridícula”, Pertuiset não é deste tempo, o que significa que não é do tempo de Rolin. E isso é importante. Para o autor, “um escritor, um artista, um general, é, antes de mais, um homem solitário que luta contra a sua própria época”. Essa luta consiste muitas vezes em presentear o leitor com coisas desagradáveis, mas é esse o trabalho de quem escreve: oferecer comida amarga aos que o leem.

Os livros de Olivier Rolin são muitas vezes amargos. O último que foi publicado em Portugal, Porto-Sudão (1994), no âmbito da coleção “Miniatura” da editora Livros do Brasil, é negro. Fala da morte, do luto e da depressão (Rolin escreveu-o depois de um desgosto de amor, internado numa clínica psiquiátrica), mas o autor francês afasta a ideia de ser um “tipo melancólico”. O problema, explicou em entrevista ao Observador, é que a morte está sempre à espreita, como dizia um controverso mas importante escritor francês do início do século XX. E “a morte é um grande adversário”.

Foi em Cascais que o Observador falou com Olivier Rolin, onde o autor tem estado em residência literária desde outubro, a convite da Fundação Dom Luís I. Sentado numa sala despida com vista para o mar, rodeado pelos seus 60 cadernos, Rolin tem trabalhado todos os dias no seu novo livro, que começa precisamente em Portugal, nos Açores. Mas não são só as primeiras linhas que são dedicadas ao território português. Portugal é, segundo o escritor francês, o país que mais páginas ocupa.

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A morte sempre à espreita

Em Porto-Sudão, o seu último livro publicado em Portugal, aborda temas que são recorrentes na sua obra: o amor, a literatura e a morte. O que é que o faz voltar a eles?
Porque sou um tipo melancólico [risos]. À literatura é normal. Sou escritor, e sou um escritor que escreve muito a partir de outros livros, de outros escritores. Por outro lado, a morte é um grande tema. Escrevemos sempre contra a morte de alguma coisa — contra a morte dos outros, contra a morte de nós próprios. Da literatura, do pensamento, da língua. A morte é um adversário. Há um escritor que detesto, o Céline. É um tonto, um antissemita, mas também é um escritor [francês] importante. Ele dizia que escrevemos sempre com a morte a espreitar por cima do nosso ombro. Quase não conheço escritores que escrevam sobre coisas alegres. Estou a começar a ler um livro do António Lobo Antunes, e a morte está sempre lá. O Faulkner também só escrevia sobre a morte.

Acha que um escritor está condenado a ser triste, melancólico, como referiu?
Não. Na minha vida pessoal, estou muitas vezes feliz, sou alegre. E acho que escrevo livros que são cómicos. A Invenção do Mundo é um livro extremamente cómico. Um Caçador de Leões é a história de um tipo ridículo, um aventureiro francês do século XIX. É uma personagem cómica, e [Um Caçador de Leões] é um livro engraçado. Porto-Sudão é sombrio, mas tenho livros que têm mais luz.

"Escrevemos sempre contra a morte de alguma coisa — contra a morte dos outros, contra a morte de nós próprios. Da literatura, do pensamento, da língua. A morte é um adversário."
Olivier Rolin

Essa tendência para a melancolia não está relacionada com o facto de os escritores olharem para o mundo com outros olhos? De forma mais crítica, com outra profundidade.
Sim, espero que sim.

Muitas vezes diz-se que são capazes de ver as coisas antes delas acontecerem, de sentirem a mudança antes dela se concretizar.
Quase todos os escritores escrevem sobre o tempo, sobre as coisas que desaparecem. Há uma frase de Borges de que gosto muito, que diz: “O que morrerá comigo quando eu morrer”. É uma questão que se coloca aos escritores em particular. Penso que a responsabilidade de quem escreve é justamente a de falar das coisas que morrem connosco, que desaparecem connosco. Por exemplo, o meu livro que se chama O Tigre de Papel é sobre uma história que, com a morte da minha geração, será muito difícil de compreender. Nesse sentido, é um livro contra a morte.

Escreve sempre com base nas suas experiências pessoais?
Justamente por isso é que, quando escrevi Um Caçador de Leões, não fiquei muito contente. Fiquei satisfeito com o livro, mas não fiquei totalmente contente porque não tinha quase nada a ver comigo, com o meu tempo. Escrevo no meu tempo, sobre a minha presença no meu tempo. É por isso que sou menos apegado a esse livro.

Em Porto-Sudão, a literatura surge sobretudo através da figura de A., que é escritor. Depois da sua morte, o seu amigo, o narrador, regressa a França e é obrigado a conviver com o mundo literário parisiense. Este é descrito como muito superficial, de aparências e invejas, talvez ao contrário do que seria de esperar.
Porto-Sudão é um livro particularmente sombrio. Escrevi mais de metade numa clínica para depressivos.

"Há uma frase de Borges de que gosto muito, que diz: 'O que morrerá comigo quando eu morrer'. É uma questão que se coloca aos escritores em particular. Penso que a responsabilidade de quem escreve é justamente a de falar das coisas que morrem connosco, que desaparecem connosco."
Olivier Rolin

Como aquela em que esteve A. antes de morrer.
Sim. Logo, é um livro muito marcado pela depressão. Há um excesso de negritude. Mas, por outro lado, é verdade que o mundo intelectual parisiense é muito mesquinho, mas talvez seja assim em todo o lado. É um mundo onde as pessoas apenas se interessam pela glória, por parecer bem. É um mundo de que não gosto. Talvez apareça no livro de uma forma marcadamente negativa, mas é isso que penso. Isso não significa, porém, que seja um misantropo, tenho muitos amigos que são escritores. Um deles esteve cá na semana passada a visitar-me. Acho que todos os meios profissionais são mesquinhos, mas talvez no caso dos artistas e escritores isso aconteça porque têm necessidade de matar os outros para existirem. Mas um escritor, um artista, um general, é, antes de mais, um homem solitário que luta contra a sua própria época.

A arte faz-se sozinho?
Sim. Vivemos com os outros, mas a produção artística é um ato solitário. Não se faz apenas sozinho, mas muitas vezes contra os outros. Há uma frase do [poeta belga] Henri Michaux que diz que um escritor, um poeta, não é um rapazinho bem comportado, que serve comidinhas deliciosas aos outros. Não, em vez disso, um escritor dá-lhes alimentos mais amargos.

Porto-Sudão e Veracruz: duas cidades, dois abandonos

A. vai para uma clínica psiquiátrica depois de ser subitamente abandonado por uma mulher. Esta é também a história de um outro livro seu, Veracruz, editado em Portugal no ano passado. Porquê o mesmo enredo nos dois livros? Disse que se inspira sempre na sua própria experiência…
Escrevi os dois livros depois de uma rotura muito dolorosa.

Que aconteceram precisamente da mesma forma?
Não exatamente da mesma forma [risos]. Da segunda vez não fui parar a uma clínica psiquiátrica [risos]. Para mim, estes dois livros estão muito próximos — são livros curtos, muito sombrios, partem de um desaparecimento, passam-se num porto que existe mas que descrevi de forma fictícia. Quando escrevi sobre Porto-Sudão, nunca tinha estado em Porto-Sudão. Depois, fui lá quatro vezes. Quando escrevi sobre Veracruz, nunca tinha estado em Veracruz. Só tinha visto a cidade na Internet. Quis que fosse uma cidade real mas imaginária.

Olivier Rolin está instalado junto à livraria Deja Lu, em Cascais

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

Uma vez que não conhecia nenhum dos dois lugares, porque é que os escolheu?
Na história da literatura francesa, o Mar Vermelho é um bocadinho o inferno. Rimbaud esteve entre Áden [no atual Iémen] e a Abissínia, e há outro autor, que é pouco conhecido mas que foi muito lido pela minha geração, que se chama Paul Nizan. Nizan, que era comunista e morreu nos primeiros dias da Segunda Guerra Mundial, escreveu um pequeno livro chamado Áden Arabie. Nele descreve o Mar Vermelho como um canal vermelho dos infernos. Foi por isso que escolhi o Mar Vermelho, e Porto-Sudão porque gostava do nome. Por outro lado, na tradição islâmica, Sudão quer dizer “o país dos negros” e, para eles — os negros –, equivale ao inferno.

Com Veracruz foi diferente. Para dizer a verdade, não sei porque é que escolhi essa cidade. A história desse livro é um bocadinho complicada. Escrevi o primeiro texto, aquele do padre que deixa de ser padre, há 20 anos. Pensei que nunca não ia escrever mais nada, mas acabei por escrever. E foi há 20 anos que escolhi [que a história] se passaria em Veracruz. Já foi há muito tempo e esqueci-me do porquê [risos]. Mas, de qualquer modo, o México é um país muito violento — é um país de tráfico de droga, de mortes violentas –, mas também [o escolhi] por causa de um livro de que gosto particularmente, o Under the Volcano, de Malcolm Lowry. Ainda há bocado estive a escrever sobre Malcolm Lowry, sobre o último sítio onde ele viveu, perto de Vancouver, depois de sair do México [onde se passa Under the Volcano].

Isso significa que o seu próximo livro vai ser sobre Malcolm Lowry?
Não exatamente sobre Malcolm Lowry, mas tem uma passagem onde falo nele e no lugar onde ele esteve.

O mal nasceu no México

Paralelamente à história do narrador, em Veracruz, conta-se a história de uma mulher, Susana, consecutivamente violada pelo pai, que se envolve com um homem, Miller, que também é violento. Apesar da história trágica de Susana, ela nunca é descrita como uma mulher frágil ou uma vítima. Porquê?
Ela é muito dura, até no capítulo onde fala. Ela vai matá-los. Pelo menos assim o espero. Não queria fazer dela uma vítima, embora seja uma vítima. Não queria que estivesse com o estado de espírito de uma vítima. A certa altura ela diz: “Sou a devastação a aproximar-se”.

A tempestade.
Sim, ela é tudo isso.

Ela não é apenas dura, também é cruel. Matou o próprio filho.
Não podia fazer outra coisa. Ela também diz que, se formos sempre como um jardim bonito, podemos ser doce. Quando se nasce numa lixeira, isso não é possível. Ela nasceu numa lixeira humana. O seu filho era filho daquele homem [Miller]. Queria evitar que ela fosse apenas uma vítima porque, se fosse, seria um livro banal. Queria que ela fosse mais forte do que todos os outros.

De onde é que surgiu a ideia para esta história de violência? Disse que tudo começou há 20 anos, com o padre.
Vemos isso [a violência] todos os dias nos jornais. Quando escrevo um livro, mesmo que seja assim, curto como esse, não sei muito bem o que é que vou fazer. Não sou político, não sou engenheiros. Sei a direção em que vou, mas nunca tenho um plano. Sabia que queria escrever um livro sobre o mal. E uma face desse mal é o pai incestuoso. Mas devo dizer que o escrevi antes de [o assédio sexual] se tornar num assunto mundial.

Disse que nunca tem plano. Isso significa que, quando começa a escrever, não sabe bem onde como é que a história vai terminar?
Sei para onde a história vai vai, que direção tenho de seguir, mas é tudo.

A história de Susana desenrola-se ao som dos poemas de Francisco de Quevedo, que são lidos por Inácio, o padre. Quevedo é, ele próprio, uma personagem controversa e violenta. Ele teve uma vida que quase parece ficção. Foi por isso que o escolheu?
Sim. Admiro muito os poemas de Quevedo, que comprei numa edição bilingue espanhol-francês em Havana, há muito tempo. Há poemas dele que fazem lembrar Mallarmé, um poeta francês muito difícil, do início do século XX. Por outro lado, teve uma vida muito agitada, muito romanesca. [Apesar de Quevedo ser um poeta barroco], há coisas que se cruzam.

"[Proust] diz que um artista não deve perder nem sequer uma hora a falar com um amigo, que o que conta é a obra. Isto é de uma secura insuportável. Não quero ser artista se ser artista é isto."
Olivier Rolin

Francisco de Quevedo não é a única referência literária que existe em Veracruz. Também se fala de Proust, por exemplo. O narrador diz que o poeta francês o irrita. Acha Proust irritante?
Bem, admiro-o imenso mas há coisas que detesto nele, incluindo na sua escrita. Por exemplo, nos textos em que fala daquilo que pensa, diz que um artista não deve perder nem sequer uma hora a falar com um amigo, que o que conta é a obra. Isto é de uma secura insuportável. Não quero ser artista se ser artista é isto. Há coisas [em Em Busca do Tempo Perdido] que são de uma vulgaridade burguesa [enorme]. [O narrador] chama pequenos trabalhadoras para dormir com ele e depois dá-lhes uma moedinha. Têm sempre de ser pobres. Este podia ser um gesto satânico, mas não, no livro é apresentado como um hábito burguês normal. A minha estética é totalmente diferente. Ele gosta do cor de rosa, de tudo o que é cremoso, suave. Ou seja: há muitas coisas em Proust de que não gosto [risos]. Mas, apesar de isso tudo, é um escritor genial. É de uma maledicência absolutamente maravilhosa. Fico espantado por não se referir mais vezes quão divertido Proust é. Os jantares, as soirés, aquelas pessoas, aquele snobismo [que ele descreve]… É absolutamente maravilhoso de cómico.

É descrito como um escritor demasiado sério?
Sim, e não se sublinha que ele é divertido. Há dez, 15 anos, foi publicada uma nova tradução de Ulisses de James Joyce e fui convidado para falar [sobre o romance] juntamente com outros escritores e universitário. Estava lá o neto dele, e eu disse que [Ulisses] é, entre outras coisas, [um livro] muito divertido. E ele ficou muito contente, e disse: “Finalmente, alguém diz isto!”. Os académicos falam de uma forma demasiada séria sobre literatura.

Acha que isso afasta os leitores? Essa aura de seriedade e dificuldade que se criou em torno de certas obras, como Ulisses ou Em Busca do Tempo Perdido?
Sim, certamente. Respeito o trabalho dos académicos, mas esses são livros divertidos.

Ler é divertido.
Pelo menos não é um castigo.

Um retrato do mundo inteiro

Todos os seus livros são marcados por uma paisagem específica, e tem vários que se passam na Rússia. O que é que o fascina tanto neste país?
Porque é um país bom. Gosto do espaço em si. Quando era pequeno — já contei esta história antes –, havia em casa da minha avó um mapa do mundo, e eu ficava a olhar para aquela mancha enorme que começava na Europa e termina perto do Alasca. Desde os sete, oito anos, que queria ir ali. E como era absolutamente impossível, ainda tinha mais vontade de ir — isto é proustiano! Por fim lá fui à Rússia. Quando começou a ser possível.

Quando é que visitou o país pela primeira vez?
Em 1986. Há essa explicação pelo espaço, mas também porque foi na Rússia que aconteceu um dos grandes acontecimentos do século XX; um dos maiores sinais de esperança que a humanidade teve e, ao mesmo tempo, um dos maiores dramas, um dos maiores massacres. Nasci no século XX, vivi a maior parte da minha vida no século XX. Uma grande parte da História do meu tempo teve origem nesse país. Depois há outras razões [por ter um fascínio pela Rússia]: gosto muito da língua russa e também gosto de não encontrar franceses nos sítios a onde vou [risos]. É por isso compreensível porque é que vou à Sibéria.

Para fugir dos franceses?
Sim, mas dos americanos também [risos].

É por a Revolução de Outubro ser um dos eventos mais importantes do século XX que decidiu escrever O Metereologista, um romance que se passa durante o tempo de Estaline e que fala sobre a brutalidade dos campos de trabalhos forçados?
Sim, sim. Mas também porque essa história em particular, desse pai e dessa filha [, que aconteceu realmente], é comovente. Talvez tivesse escrito na mesma sobre ela se se tivesse passado noutro sítio que não a Rússia. Mas, de qualquer forma, a loucura do processo estalinista é algo que me deixa estupefacto, e que me interessa. Muito poucas pessoas no meu país, no ocidente, sabem que foram fuzilados 750 mil inocentes num ano. Na Primeira Guerra Mundial, morreram 1,5 milhões de soldados franceses. [As vítimas russas são] metade disso. E foi só num ano! Esta história é muito pouco conhecida, e fascina-me. Como é que a esperança que havia, no mundo inteiro, se transformou nesta explosão de sangue? É por isso que esta história me interessa.

"Toda a gente sabe os nomes dos campos de concentração nazis. E ainda bem, fico contente com isso, mas quase ninguém ninguém dizer citar um só nome de um do Gulag. Sabemos que aconteceu, e é só."
Olivier Rolin

Acha que, de um modo geral, as pessoas não sabem o suficiente sobre os crimes que foram cometidos na Rússia? Acha que não existe uma verdadeira consciencialização para o que aconteceu depois da revolução?
Enfim, [o que aconteceu] é conhecido, mas pouco. Toda a gente sabe os nomes dos campos de concentração nazis. E ainda bem, fico contente com isso, mas quase ninguém ninguém dizer citar um só nome de um do Gulag. Sabemos que aconteceu, e é só. E, além do mais, há pessoas que pensem que isso nem sequer acontece. Fui agredido num encontro público por um velho estalinista que achava que o Gulag não tinha existido. “Calúnias!”

Com o Holocausto acontece a mesma coisa. Há quem ache que nunca aconteceu.
Sim, há idiotas em todo o lado.

Assinalou-se em 2017 o centenário da Revolução de Outubro. Isso não deveria ter sido uma oportunidade para repensar o que aconteceu em 1917 e nos anos seguintes?
O pior é que na Rússia todos tiveram membros da família que sofreram, mas, no geral, as pessoas não querem falar nisso.

Têm medo.
Sim, sim.

Olivier Rolin está em Cascais para uma residência literária organizada pela Fundação Dom Luís I

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

Visita regularmente a Rússia desde 1986. O que é que mudou?
As cidades mudaram muito. Hoje em dia, são semelhantes às de qualquer outro sítio. Mas, noutros pontos do país, a vida é por vezes pior do que era antes. Antes ainda havia uma série de coisas públicas que funcionavam mais ou menos [bem]. Agora, as pessoas estão abandonadas. Mudou nos dois sentidos. Também conheço um pouco da China e, atualmente, existe uma ditadura pior do que a russa. Apesar de tudo, na Rússia ainda há oposição. É atacado, mas existe. Isso não acontece na China. Este livro, O Meteorologista, foi banido lá. Foi traduzido, chegou às livrarias mas depois retiraram-no.

Com que justificação?
Nenhuma. Encontrei-me com a minha editora e ela disse-me que nem lhe deram uma explicação por escrito, foi só um telefonema. E foi isso. Mas penso que a justificação esteja no facto de falar sobre crimes cometidos por um partido comunista.

Está em Cascais numa residência literária organizada pela Fundação Dom Luís I. Pode revelar um bocadinho do trabalho que tem feito aqui?
Isto são cadernos que escrevi nos últimos 30 anos. São quase 60. Dentro deles há muitas histórias de pessoas, retratos que escrevi um pouco por todo o mundo. Estou a tentar fazer um retrato do mundo a partir dessas histórias, mas que seja também um retrato de mim. É mais ou menos isso que tenho estado a fazer. Não é fácil.

Um retrato do mundo todo? O mundo é lugar muito grande.
Sabe, o Cristóvão Colombo diz que o mundo, afinal, é pequeno.

E concorda com ele?
Não, não concordo. Este livro tem coisas de um texto muito pequenino de [Jorge Luis] Borges. Quando comecei a escrevê-lo e não sabia muito bem para onde ia, de repente, lembrei-me desta frase [dele] que diz: “Um homem se propõe a tarefa de desenhar o mundo. Ao longo dos anos, povoa um espaço com imagens de províncias, de reinos, de montanhas, de baías, de naus, de ilhas, de peixes, de moradas, de instrumentos, de astros, de cavalos e de pessoas. Pouco antes de morrer, descobre que esse paciente labirinto de linhas traça a imagem de seu rosto”. Isto corresponde àquilo que estou a tentar escrever.

Vai haver espaço, nesse grande emaranhado de linhas, para um bocadinho de Portugal?
A primeira página é sobre os Açores. [Portugal] é talvez o país de que falo mais.

Fotografia de André Dias Nobre / Observador

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