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O Chega garante que o Parlamento “perdeu a vergonha” com a aprovação daquilo que considera ser o “aumento dos salários dos políticos”. Protestou com faixas lançadas das janelas da Assembleia da República o que causou uma acesa polémica e atrasou cerca de uma hora o debate e última votação do Orçamento no plenário. Aliás, já sem as tarjas nas janelas, retiradas pelo partido quando os bombeiros se preparavam para as remover, a contestação não acabou aí, com os deputados da bancada do partido liderado por André Ventura a erguer cartazes com a mesma mensagem contra a medida proposta pela AD e aprovada pelo PS.
Lutam contra o que dizem ser um aumento, mas é na verdade uma reposição de 5% da remuneração mensal dos titulares de cargos políticos em Portugal. O corte salarial remonta a 2010, ainda antes da troika chegar e a sua eliminação era reclamada, há vários anos, por exemplo pela Associação Nacional dos Municípios Portugueses.
O que está em causa?
Esta quinta-feira, no penúltimo dia de votações na especialidade do Orçamento do Estado para 2025 (OE2025), o plenário da Assembleia da República aprovou uma proposta de alteração da autoria do PSD e CDS-PP que prevê “a revogação da redução em 5% do vencimento mensal ilíquido” dos políticos, a produzir efeitos a partir de janeiro.
O PS fez uma proposta distinta, mas que surgiu no mesmo sentido. Os socialistas propuseram que só mandatos iniciados em janeiro de 2025 fossem abrangidos pela revogação do corte nos salários, mas acabaram por chegar a acordo com PSD. Assim, a medida vai abranger os mandatos atualmente em vigor.
Quando e porque tinham sido cortados os salários dos políticos?
Em 2010, quando estava no poder o governo liderado por José Sócrates, foi aprovada uma lei que previa um conjunto de medidas adicionais de consolidação orçamental que visavam reforçar e acelerar a redução de défice excessivo e o controlo do crescimento da dívida pública em Portugal. Entre elas a redução em 5% do vencimento mensal ilíquido dos titulares de cargos políticos e dos gestores públicos executivos e não executivos.
A crise financeira que assolava o país determinou, no ano seguinte, um pedido de ajuda internacional. A troika acabaria por aterrar em Lisboa em 2011 e só sairia do país em 2014.
Os anos da troika. Portugal foi o único país a sair da crise com menos desigualdade
“Volvidos mais de 10 anos, todas as medidas aprovadas no âmbito da consolidação orçamental de redução de défice excessivo e de controlo do crescimento da dívida pública foram revogadas, com exceção destas duas”, lê-se na proposta de alteração do OE 2025 apresentada por PSD e CDS. Os dois partidos consideram ser “da maior justiça a reposição da situação remuneratória”.
Quem votou a favor e contra a proposta?
Os partidos da coligação do Governo avançaram com a proposta de alteração ao orçamento para reaver os 5% do salários dos políticos, votada esta quinta-feira.
Foi aprovada com os votos contra do Chega, Iniciativa Liberal, Bloco de Esquerda e Livre. O PCP absteve-se e o PSD, CDS, PS e PAN votaram favoravelmente, fazendo com que a proposta fique inscrita no Orçamento do Estado para 2025.
O Chega já se tinha antecipado no anúncio ao voto, tendo André Ventura garantido que todos os deputados do partido vão prescindir desta reposição salarial. Na manhã desta sexta-feira, enquanto prestava declarações aos jornalistas sobre o protesto do seu partido o líder do Chega estende a abdicação “a todos os eleitos” do partido. “É uma decisão minha, tomada para todos os eleitos do Chega, sejam nacionais, locais, regionais ou europeus. É a minha ordem e indicação”, refere, frisando que “no Chega há sempre consequências para quem não cumpre”.
Quanto custa a reposição aos cofres do Estado?
Em resposta à Iniciativa Liberal, o ministro das Finanças indicou no Parlamento, no debate do OE 2025 na especialidade de 15 de novembro, que o fim do corte de 5% nos vencimentos dos cargos políticos, gestores públicos e trabalhadores dos gabinetes, como proposto pelo PSD, terá um custo “na ordem dos 20 milhões de euros“.
Joaquim Miranda Sarmento disse que há a intenção de tornar a administração pública mais eficiente na gestão orçamental e garantiu que vai rever a orgânica de todos os ministérios e promover extinções de entidades, acabando com cargos de direção.
Quem está abrangido pela revogação do corte nos salários?
Os políticos que vão deixar de ter o corte de 5% a que estavam sujeitos desde 2011 são os “titulares de cargos políticos e dos gestores públicos executivos e não executivos, incluindo os pertencentes ao sector público local e regional”.
Portanto, são abrangidos o Presidente da República, presidente da Assembleia da República, primeiro-ministro, deputados, membros do Governo, representantes da República para as regiões autónomas, deputados às Assembleias Legislativas das regiões autónomas, membros dos governos regionais, governador e vice-governador civil e presidente e vereadores a tempo inteiro das câmaras municipais.
Além dos políticos também são abrangidos os gestores públicos como, por exemplo, membros dos conselhos diretivos ou de administração de institutos públicos.
Políticos deixam de ter corte de 5% nos salários a partir de janeiro
Quanto vão recuperar o Presidente da República e do Presidente da Assembleia da República?
Os políticos deixam, a partir de janeiro próximo, de ver o seu vencimento mensal reduzido em 5%. No caso do Presidente da República, tal significa que Marcelo Rebelo de Sousa passará a receber, em termos brutos, 8.193,98 euros — o valor do seu vencimento mensal ilíquido. Até agora, recebia 7.784,28 euros, ou seja, recebe mais 410 euros brutos todos os meses.
Isto sem contar com o valor do abono de despesas de representação e ajudas de custo — que coloca o ordenado bruto fixo do Presidente da República a rondar os dez mil euros. Além disso, beneficia, a título variável, de ajudas de custo nas suas deslocações oficiais fora de Lisboa, no país ou ao estrangeiro.
O presidente da Assembleia da República, que recebe mensalmente um vencimento correspondente a 80% do vencimento do Presidente da República, passará a auferir a partir de janeiro, em cada um dos 14 meses, 6.555,18 euros de vencimento bruto em vez dos atuais 6.227,42 euros. Passa a receber mais 328 euros todos os meses. Além disto, José Aguiar-Branco recebe todos os meses um abono mensal para despesas de representação no valor de 2.622 euros. No total passa a auferir, em termos brutos, cerca de 9.178 euros.
Quanto passará a receber Luís Montenegro a partir de janeiro?
De acordo com o estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos, o primeiro-ministro “percebe mensalmente um vencimento correspondente a 75% do vencimento do Presidente da República”. Ou seja, Luís Montenegro auferia, até agora, de salário bruto base, ainda sem as despesas de representação, 5.838,21 euros. Com o fim do corte de 5%, recupera 307 euros, passando a auferir por mês 6.145,49 euros.
Além disso, tem direito a um abono mensal para despesas de representação no valor de 40% do respetivo vencimento. Assim, recebe mais 2.458,20 euros. Tudo somado, o seu vencimento ilíquido situa-se nos 8.60o euros.
Também os ministros do Executivo de Montenegro recuperam 5% do seu salário ilíquido mensal. Neste caso, passam a auferir 5.326 euros ilíquidos, sem contabilizar despesas de representação.
Quanto é que cada deputado vai receber a mais com o fim do corte de 5%?
No caso dos deputados da Assembleia da República, o seu salário mensal ilíquido passará a ser de 4.096,99 euros, o valor do seu vencimento sem o corte de 5%. Até agora auferiam 3.892,14 euros, menos 204,85 euros todos os meses por conta da redução aprovada em 2010.
Isto sem contar com o abono fixo de despesas de representação que varia tendo em conta o cargo que cada deputado ocupa no Parlamento. Enquanto cada um dos quatro vice-presidentes da Mesa da Assembleia da República ganha 1.024,25 euros a mais em despesas de representação, um deputado em regime de exclusividade recebe por mês 409,70 euros ao mesmo título. A isto acrescem subsídios de vária ordem, como o de deslocação, de residência, de função (se for presidente de uma comissão de inquérito, por exemplo), entre outros.
Mariana Leitão, deputada da Iniciativa Liberal, questionou esta sexta-feira o Chega sobre se os deputados do partido, que organizaram o protesto contra a aprovação do restabelecimento do salários dos políticos, irão abdicar, além da reposição dos 5% na base salarial, dos restantes benefícios que auferem a título de despesas de representação e ajudas de custo.
Segundo dados do gabinete da secretaria-geral da Assembleia da República enviados ao ECO em setembro, o Parlamento pagou, em 2023, uma média anual de 29.040,95 euros a cada deputado em ajudas de custo com alojamento, alimentação e deslocação.
Tal corresponde a uma média de mais 2.420 euros mensais, isentos de IRS, que acrescem ao salário bruto de, a partir de janeiro, 4.096,99 euros euros, no caso de um deputado sem exclusividade de funções.