O número 4 mundial que esteve em duas finais de Grand Slam em 2022, três antigos vencedores de 2018 para cá, um antigo número 3 da hierarquia mundial, alguns dos jogadores que melhor se dão na terra batida, dois portugueses que serão o centro das atenções do público. O Estoril Open arranca este sábado com as qualificações (segunda-feira com o quadro principal) tendo o norueguês Casper Ruud como figura de proa de uma edição que acontece mais cedo do que é normal no calendário mas que conseguiu “ganhar” aos outros dois torneios ATP 250 da semana, em Marraquexe e em Houston, e nem mesmo as desistências por questões físicas de Stan Wawrinka e Pablo Carreño Busta baixam as expetativas de João Zilhão, diretor do torneio que tem ainda mais novidades para trazer através de dois wild cards que continuam em aberto.
Estoril Open assegura constelação de antigos top 10 – e ainda pode receber estrela maior
Em entrevista ao “Nem tudo o que vai à rede é bola” da Rádio Observador, o responsável pelo principal torneio de ténis nacional admite que Rafa Nadal e Novak Djokovic chegaram a ser hipóteses que caíram por começarem mais tarde a sua época na terra batida, explica quando fechou a presença de Casper Ruud pela primeira vez em Portugal, fala numa venda de bilhetes muito interessante que coincide também com o facto de ser a semana de Páscoa, recorda o momento da vitória de João Sousa no Estoril como o ponto mais alto como diretor e revela uma espécie de sonho proibido para a edição de 2024: Carlos Alcaraz, atual líder do ranking mundial que jogou no torneio na única edição que não contou com público nas bancadas.
[Ouça aqui a entrevista de João Zilhão no programa “Nem tudo o que vai à rede é bola” da Rádio Observador]
Como é que está toda a preparação para o Estoril Open de 2023 quando estamos a poucos dias do arranque desta edição, alguma coisa diferente dos anos anteriores?
Há uma primeira grande diferença que é a data, vamos iniciar e vamos estrear a época de terra batida na Europa e por isso estamos muito entusiasmados por estarmos na semana da Páscoa para aproveitarmos tanta gente de férias, das universidades e das escolas, e também tantos turistas que visitam Portugal nesta semana. A venda de bilhetes tem corrido muitíssimo bem, temos já várias sessões esgotadas e temos um elenco muito forte para dar o melhor ténis do mundo a quem nos visitar.
Temos já uma novidade desta semana, neste caso a desistência do Stan Wawrinka e o Carreño Busta que também vai ficar de fora. Ainda há margem para haver alguma surpresa de última hora no quadro, tendo em conta que em Miami também há eliminações mais cedo no torneio?
Gostava de começar por dizer que os jogadores só saltam mesmo de um torneio quando não se sentem a 100% e infelizmente todas as semanas em todos os torneios do mundo, inclusivamente em Grand Slams, temos jogadores que não se sentem a 100% ou porque estão lesionados ou porque sentem alguma mazela no corpo e não podem mesmo arriscar para piorar. O Carreño Busta está lesionado há muito tempo e não ficou bom a tempo do evento, para pena dele e nossa. Vamos anunciar ainda dois wild cards nos próximos dias que vão dar muito interesse ao Estoril Open e fortalecer o quadro. O primeiro wild card foi ao João Sousa, o melhor português de todos os tempos, o segundo foi para o Wawrinka mas infelizmente não está em condições e teve de saltar fora de Miami Masters 1.000 e agora ficámos com dois wild cards para fortalecer o quadro. Acho que os portugueses vão ficar muito contentes com os jogadores que vão enriquecer este plantel.
Este Estoril Open conta com um Nuno Borges a atravessar um grande momento, com a vitória no challenger de Phoenix e a entrada no quadro principal de Miami além de entrar no top 70 do ranking. Era a maior coroação ter um português de novo a ganhar e a subir no ranking como aconteceu com o João Sousa em 2018?
Lembro-me que foi talvez um dos momentos mais felizes da minha carreira ou mesmo o momento mais feliz ver o João Sousa a ganhar aquele último ponto e a cair para o chão. Ainda outro dia vi essas imagens e vêm lágrimas aos olhos porque foram momentos indescritíveis de emoção e alegria. No ano passado, ver o Nuno Borges e o Kiko [Francisco] Cabral a ganharem também em pares também foi algo surpreendente e espectacular. Poder ter o Nuno Borges, que está num pico de forma, a ganhar os singulares este ano era uma alegria fantástica para mim e para todos os portugueses.
Temos aqui também o Dominic Thiem, que já foi número 3 do mundo e já ganhou um Grand Slam em 2020. Depois daquela lesão que teve e que o afastou por muito tempo não voltou a ser o mesmo, admitindo mesmo fazer alguns challengers depois do Estoril Open. Pode ser aqui uma espécie de ressurreição, uma rampa de lançamento que parece andar à procura?
Tenho estado a acompanhar os jogos dele e sinceramente acho que está muito perto de fazer esse clique e voltar às grandes vitórias e aos grandes palcos. Tem perdido jogos a 7-6 no tie break do terceiro jogo, tem perdido sets que podia ter ganho, está a faltar um pouco de confiança e às vezes basta uma ou duas vitórias para poder retomar o caminho de grande jogador e campeão de Grand Slam. Ele já tem um US Open, fez duas finais de Roland Garros. Gostava muito que o Dominic Thiem tivesse aqui o ponto de viragem no Estoril. Está muito motivado, espero que tenha também o apoio do público para fazer um bom trajeto e voltar com confiança às vitórias que teve durante muito tempo antes da lesão, quando era um dos melhores jogadores do mundo.
O Nuno Borges e o Francisco Cabral ganharam no ano passado em pares, algo inédito também na história do torneio. Por ter sido uma dupla portuguesa, acredita que pode haver um maior interesse na variante de pares este ano como em 2022?
Absolutamente, não tenho dúvidas. O público português vai querer muito ver todos os jogos dos campeões em títulos, vamos ter mais portugueses na variante de pares que não foram ainda anunciados fruto de dois wild cards de pares. Em princípio teremos três pares com portugueses. Os detentores do título serão um ponto de grande interesse em 2023 e toda a gente vai querer ver os jogos para perceber se conseguem repetir o brilharete que conseguiram no ano passado.
Este ano vai marcar também a estreia do Casper Ruud, que é a grande figura deste torneio em 2023 depois de fazer duas finais de Grand Slam no ano passado, Roland Garros e US Open. Foi sempre este o grande alvo ou ambicionou um bocadinho mais acima, neste caso de forma inevitável Nadal e Djokovic?
Chegou a haver hipóteses e foi aflorada a possibilidade de quererem começar aqui, tanto o Nadal como o Djokovic, mas acabou por não confirmar-se e não ser possível dentro da sua programação e vão começar um pouco mais tarde em Monte Carlo, na semana seguinte. Em relação a Casper Ruud, na altura em que fechei, que foi na altura do US Open, ele estava a um jogo de chegar a número 1 do mundo. Fechei nas reuniões do US Open, embora só tenha anunciado mais tarde por estratégia, chegou à final e se tivesse ganho contra o Alcaraz seria ele o número 1 do mundo. O Casper Ruud foi um jogador de eleição que foi fechado para este ano, andou sempre ali entre os três primeiros do mundo e estamos muito felizes por ter um jogador tão credenciado e que é nesta altura o vice-campeão de Roland Garros e vem jogador o Estoril Open. É um grande ponto de interesse.
Djokovic, nesta fase e até maio, continua de fora dos torneios norte-americanos por não estar vacinado e Nadal está no processo de recuperação a pensar em Roland Garros. Mesmo não estando em cima da mesa a possibilidade de virem em 2023, acredita que um pelo menos ainda poderá voltar a Portugal até ao fim da carreira?
Bem… Foi o próprio Nadal que no ano passado disse que gostava de ter começado aqui no Estoril, depois de estar lesionado… Este ano voltou a estar em cima da mesa a possibilidade de começar ou não aqui… Essa hipótese já aconteceu. Adorava poder dizer que sim mas não consigo antever o futuro e não sei quantos mais anos vai o Nadal conseguir competir ao mais alto nível. Temos de esperar para ver o que vai acontecer mais seria um sonho ter qualquer um dos dois a disputar o Estoril Open.
Mesmo sem o Wawrinka e o Carreño Busta, e não se sabendo ainda quem serão os últimos dois wild cards, há Casper Ruud, Fognini, Korda, Sebastián Baez, Nuno Borges, João Sousa… O que espera da competição deste ano? Consegue ver algum outro jogador a ter o percurso do ano passado de Sebastián Baez?
Acho que há um jogador que está lentamente a voltar ao seu melhor e a começar a ganhar jogos novamente que é o Diego Schwartzman. Já foi número oito do mundo, é um jogador muito perigoso em terra batida. O Davidovich Fokina também é muito perigoso em terra batida e no ano passado derrotou o Djokovic em Monte Carlo e chegou à final do Masters 1.000 de Monte Carlo. Depois há sempre surpresas que não estamos à espera, vejo por exemplo um Dusan Lajovic que também já foi finalista de Monte Carlo. Diria ou apontava os favoritos a Casper Ruud, Fognini e Korda, por aí, sendo que o Nuno Borges é capaz de tudo, vai ter um grande apoio do público e o João Sousa, que já conseguiu ganhar o torneio, que derrotou Medvedev, Tiafoe e Tsitsipas e que conseguiu salvar matcht points contra o Pedro Sousa. Já foi capaz de fazer magia. Nunca se sabe o que é que o público pode fazer aos jogadores da casa.
A final está marcada para o dia 9 de abril. A preparação para a edição de 2024 começa logo no dia 10? Como é que funciona: primeiro são assegurados os patrocinadores todos para ir à procura de nomes ou é preciso garantir logo um ou dois dos maiores nomes para depois fechar o resto?
Diria que trabalhamos 51 semanas para aquela semana, estamos sempre a trabalhar para a edição futura. Durante a edição deste ano já vamos estar a afinar coisas que achamos que podem ser melhores no ano seguinte, no próprio evento vamos estar a pensar em melhorias para o ano seguinte. Algo que não está bem pensado ou que podia estar melhor. Em relação aos patrocínios, é um trabalho que é feito ao longo de todo o ano, fechamos patrocínios ao longo de todo o ano nas mais diferentes áreas. É um trabalho contínuo que acontece em simultâneo com a contratação de jogadores para a edição seguinte. A contratação de jogadores é importante mas também é importante ter a capacidade financeira para os poder pagar, como é óbvio. As duas coisas estão de mãos dadas. E o que é certo é que o evento tem conseguido convencer as grandes marcas a estar ao nosso lado. Vamos para o oitavo ano com o Millennium BCP e temos mais dois de contrato, vamos completar uma década com eles enquanto title sponsor e isso dá uma sustentação muito forte ao projeto. Para além disso, temos uma família de sponsors fortíssima, que mantém este projeto vivo e com saúde e que nos permitiu atravessar aqueles dois anos fatais de pandemia, um ano cancelado e outro ano sem público. Mas este ano, ao longo de todo o ano, já vamos estar a tentar encontrar os apoios necessários para que 2024 possa ser ainda melhor do que foi 2023.
Sente que existe um apoio crescente, em termos institucionais, àquele que é o maior torneio de ténis em Portugal? E consegue imaginar, existindo espaço e possibilidade para isso, ver este Estoril Open crescer para se tornar um ATP 500 ou um ATP 1.000?
Já abordei essa questão várias vezes ao longo dos últimos anos e ela prende-se com as licenças. Para podermos ter um ATP 500 ou um ATP 1.000 teríamos de comprar uma licença existente. Ora, o preço de uma licença existente para um 500 anda na casa das muitas dezenas de milhões de euros, enquanto que para um 1000 — e não há nenhuma à venda neste momento — anda na casa das centenas de milhões de euros. A licença de Madrid, por exemplo, foi vendida por 200 e muitos milhões de euros. Para o mercado português, para a economia portuguesa, julgo que um ATP 250 está muito bem adaptado à nossa realidade. Um ATP 500 tem todo um novo caderno de encargos, tem um custo astronomicamente superior, uma exigência maior em termos de infraestruturas, em termos de bancadas do court 2 e do court 3, em termos de prize money. Mas começa logo por essa questão fulcral: um dos ATP 500 existentes teria de nos vender a sua licença. Dubai, Tóquio, Rio de Janeiro, Barcelona… E o custo é astronómico. Seria difícil justificar e seria muito difícil conseguir que os sponsors que já estão connosco duplicassem, triplicassem ou quadruplicassem os seus níveis de investimento. Acho que conseguimos realizar um excecional ATP 250, muitas vezes com excelentes jogadores do top 10. Já estive muito perto de fechar vários nomes do top 10, do top 20, do top 30. Acho que isso é que é importante, ter um torneio sustentável e adaptado à nossa realidade económica e ao interesse que o ténis tem em Portugal, à força do ténis no nosso país.
O Estoril Open é um evento muito mediático e, por vezes, parece que muita gente se esquece da importante vertente desportiva daqueles dias. Acha que isso pode ser uma consequência de alguma ausência de cultura desportiva em Portugal?
Eu espero que não. Aliás, vê-se uma coisa muito interessante e que não acontece em muitos países: nós temos o qualifying esgotado, os dias 1 e 2 de abril estão esgotados. Isto quer dizer que as pessoas gostam de vir ver o ténis, as primeiras rondas. Historicamente, sempre esgotámos a final e as meias-finais, que neste momento também já estão esgotadas. Este torneio tem um custo de bilhete muito acessível, começamos nos 10 euros nos primeiros dias e depois sobe até aos 20, 25, por aí fora. Temos um evento que aproxima as pessoas dos jogadores e do ténis e acho que isso é muito importante. Somos dos poucos torneios do mundo em que duas das laterais do court não têm camarotes, ou seja, o público está nas primeiras filas a poder ver o ténis de perto, a poder ver os seus principais ídolos de perto. Acho que essa proximidade é muito importante. E isto atesta a vertente desportiva do evento, a possibilidade de ver os melhores tenistas de perto.
Na última Web Summit, o Patrick Mouratoglou apresentou aquilo que pode ser o futuro do ténis, mais adaptado às novas gerações, com menos paragens, mais interação entre os jogadores e até com os árbitros. Adicionalmente, existe o projeto do Ultimate Tennis Showdown. O ténis está a passar por um processo de transformação?
É sempre bom ver que o ténis e o circuito ATP têm tentado reinventar-se com novas regras, novos formatos, a testar muitos e novos formatos no ATP Next Gen Finals, que são os oito melhores do mundo Sub-21 e que tem sido jogado em Milão. E algumas dessas inovações têm sido introduzidas no Tour e nos eventos principais para tentar tornar o jogo mais mediático, mais dinâmico, com mais intervenção dos treinadores, menos tempo entre pontos. Tudo isso é importante para o espetáculo desportivo. O electronic line-calling, em que as pessoas estão em casa sentadas no sofá a ver se a bola é dentro ou fora às vezes por um cabelo, por um milímetro. Tudo isto tem de ser pensado e o ténis tem de se reinventar constantemente mantendo, obviamente, a tradição toda que está à volta da modalidade, sem estragar isso. Mas tem de se reinventar para as novas gerações e para todo o tipo de fãs que consomem a modalidade.
O Open de Marraquexe não tem nenhum jogador do top 20 no quadro, Houston tem o Frances Tiafoe e o Tommy Paul mas a verdade é que estão ambos fora dos 15 primeiros do ranking ATP. Pode dizer-se que, nesse particular, o Estoril Open ganhou à concorrência direta?
Sim, podemos dizer que sim. Nesse prisma, sim. Até o próprio Frances Tiafoe ficou extremamente dividido, eu estive reunido com ele presencialmente em Nova Iorque. Disse-lhe que percebia perfeitamente que ele tinha de jogar em casa, em Houston, mas que aqui era tratado praticamente como um local, é praticamente um português no Estoril Open. Disse-lhe que teria muito gosto de que viesse novamente ao Estoril, onde já foi muito feliz, chegou a duas finais. Deixei a bola do lado dele, não entrei em nenhuma loucura de disputa de cachet com Houston, até por respeito a Houston, e deixei nas mãos do próprio Francis a decisão de vir ao Estoril ou jogar lá. A decisão foi muito difícil e ele optou por ficar em casa. Mas acho que sim, temos um jogador muito credenciado no nosso quadro, top 5 mundial e que esteve a um encontro de ser número 1 do mundo [Casper Ruud], naquela final do US Open que disputou no ano passado. Temos um quadro fortíssimo, mesmo com uma ou outra baixa. Temos nomes muito sonantes, como o Fabio Fognini, que ganhou o Monte Carlo Masters há pouco tempo, e o Dominic Thiem, vencedor de Grand Slams. A grande pena foi mesmo o Wawrinka não estar em condições para jogar, mas isso acontece. Não está bem para jogar na nossa semana e vivemos com o quadro excecional de outros talentos e de outros nomes muito, muito bons.
Olhando já para 2024, existe algum alvo especial que gostava de trazer ao Estoril no próximo ano?
É evidente que o Carlos Alcaraz, que esteve cá em 2021, seria um excecional jogador para voltar a trazer ao Estoril. Até porque em 2021 não pudemos ter público nas bancadas, estávamos em plena pandemia, o Alcaraz jogou apenas para as câmaras de televisão e para os milhões de fãs em todo o mundo que estavam a assistir ao torneio. É evidente que hoje em dia, como número 1 do mundo e com todo o carisma que tem, tem um valor de cachet muitíssimo elevado que faz com que seja muito difícil termos capacidade financeira para o pagar. Mas podemos sempre sonhar que será possível, um dia, voltar a convencê-lo a regressar ao Estoril.