O Presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk Yeol declarou esta terça-feira uma “lei marcial de emergência” para proteger a “ordem democrática constitucional”, acusando a oposição de controlar o parlamento e simpatizar com a Coreia do Norte. Mas, apenas cinco horas e meia depois, sem o apoio da Assembleia Nacional e com muitos protestos nas ruas, Suk Yeol voltou atrás e levantou a medida.
Agora, com uma crise instalada na Coreia do Sul, milhares pedem a demissão ou destituição de Yoon Suk Yeol. Mas quem é esta figura, novata da política, que pode estar prestes a abandonar a presidência da 10.ª maior economia do mundo?
Nascido em Seul a 18 de dezembro 1960, filho de um casal de professores universitários, Yoon é relativamente novo na política, tendo passado 27 anos como procurador antes de se candidatar à presidência. Depois de estudar Direito, tornou-se procurador do Ministério Público e ganhou notoriedade graças a investigações sobre alguns dos maiores escândalos de corrupção do país. Em 2017, liderou uma equipa de investigação que culminou numa ação judicial para destituir a então presidente Park Geun-hye do cargo, por corrupção e abuso de poder.
Entre 2019 e 2021, Yoon desempenhou o cargo de procurador-geral da Coreia do Sul. Depois de expor casos de corrupção que implicavam membros do Governo de Moon Jae-in, ganhou popularidade entre os conservadores e foi assim que acabou a aderiu ao Partido do Poder Popular a 30 de julho de 2021.
Tendo trabalhado no setor da justiça toda a vida, um ano depois era candidato pelo partido (após ter anunciado a intenção de concorrer como independente) à presidência. Foi eleito a 9 de março de 2022, numas eleições que permitiram que os conservadores voltassem a liderar a Coreia do Sul e afastaram do poder o progressista Moon Jae-in. Mas a curta margem de vitória (cerca de 1%) foi vista como “uma condenação do seu antecessor e não como um apoio entusiástico a Yoon”, escreveu o The New York Times sobre as eleições que ficaram conhecidas como “eleições squid game” (numa referência à série sul-coreana da Netflix), dado o nível de agressividade entre os candidatos.
Anti-feminista e pelas 120 horas de trabalho
A vitória eleitoral do candidato do Partido do Poder Popular (direita), com 48,56% dos votos, deveu-se em parte ao apoio de jovens eleitores do sexo masculino que se disseram alienados pela pressa do país em abraçar a emancipação das mulheres — apesar do parco desenvolvimento da Coreia do Sul em matéria de igualdade de género, reportou o jornal The Guardian. Declaradamente “anti-feminista”, Yoon Suk Yeol teve mesmo como promessa eleitoral a abolição do Ministério da Igualdade de Género e da Família, alegando que as mulheres sul-coreanas não sofrem uma discriminação sistemática. A medida reuniu críticas internacionais, num país onde o movimento feminista enfrenta oposição e até ameaças. Embora o ministério se mantenha, o cargo de ministro está vago desde fevereiro.
Não é a única posição controversa de Yoon, que durante a campanha eleitoral defendeu também a abolição do salário mínimo e a semana laboral de 52 horas, defendendo que “os trabalhadores devem poder trabalhar 120 horas”.
Quando assumiu a presidência, Yoon Suk-yeol disse que tinha como objetivo retomar as conversações com a “vizinha” Coreia do Norte — mesmo tendo defendido, durante a campanha, ataques preventivos contra o país como única forma de conter o perigo dos novos mísseis hipersónicos. Depois disse querer estabelecer um canal de diálogo tripartido entre as duas Coreias e os EUA, escreveu na época a agência Reuters. Inicialmente, Suk-yeol defendia também os princípios da liberdade e da democracia, mas, pouco tempo depois de ser eleito, começou a reprimir os órgãos de comunicação. Foram levadas a cabo várias operações em casas de jornalistas e em redações, sob acusação de espalharem fake news.
A popularidade de Yoon tem caído a pique ao longo do mandato, marcado por uma uma série de escândalos e controvérsias. Na última semana, uma sondagem da Gallup Korea mostrou que o seu índice de aprovação tinha caído para apenas 19%.
Em abril, nas eleições para o Parlamento sul-coreano, o partido de Yoon Suk Yeol enfrentou uma dura derrota, com a oposição a conseguir a maioria parlamentar. Desde então, Yoon tem-se esforçado por implementar uma agenda contra um parlamento controlado pela oposição e num mandato marcado por vários escândalos.
As gafes e os bloqueios às leis
Yoon é conhecido também pelas suas gafes, como explica a BBC. Durante a campanha eleitoral de 2022, Yoon Suk Yeol teve de se retratar depois de ter dito que Chun Doo-hwan, antigo ditador sul-coreano e responsável por um massacre de ativistas pró-democracia nos anos 90, tinha sido “bom em termos de política”. Pouco depois, foi forçado a negar ter insultado o Congresso dos EUA, numa série de comentários feitos depois um encontro com o presidente americano Joe Biden, em Nova Iorque. Uma câmara e microfone que ainda estavam ligados mostram o que aparentava ser Yoon a chamar aos parlamentares dos EUA algo em coreano que pode ser traduzido como “idiotas”. A gravação tornou-se viral na Coreia do Sul.
Críticos do Presidente sul-coreano também o acusam de querer usar a lei marcial — imposta esta terça-feira e que durou cerca de cinco horas — para fugir ao escrutínio democrático. O chefe de Estado tem usado o veto presidencial para impedir leis aprovadas pelos deputados e inquéritos a escândalos que envolvem a mulher, Kim Keon-hee.
Kim e Yoon são suspeitos de terem exercido influência indevida na seleção de candidatos do Partido do Poder Popular, de que são militantes. No ano passado, o Parlamento, controlado pela oposição, aprovou um projeto de lei que obrigaria um procurador especial a investigar as alegações, mas Yoon vetou esse projeto de lei.
Yoon também foi acusado de utilizar o seu poder para promover os seus próprios interesses. Este ano, foi acusado de pressionar o Ministério da Defesa a branquear uma investigação sobre a morte de um fuzileiro naval sul-coreano em 2023, tendo ainda vetado um projeto de lei apresentado no Parlamento pela oposição, que pedia a nomeação de um procurador especial para investigar a alegação, noticiou o The New York Times.
Também este ano, uma nova polémica com Kim Keon-hee abalou a Coreia do Sul. A primeira-dama sul-coreana foi filmada a receber uma carteira da Dior — especificamente o modelo Lady Dior Pouch — cujo valor ascende a dois mil euros. Kim Keon Hee terá aceitado o objeto de luxo como um presente, numa situação que suscitou dúvidas, obrigando o chefe de Estado a pedir desculpas publicamente. A lei anti-suborno da Coreia do Sul proíbe os funcionários públicos, assim como os familiares diretos, de receberem presentes de valor superior a 700 euros.