Na segunda semana de debates, a caminho das eleições europeias de 9 de junho, os cabeças de lista do Chega, da Iniciativa Liberal, do PCP e do PAN falaram durante 50 minutos sobre temas já abordados noutros confrontos a quatro, como a defesa, a guerra na Ucrânia, a integração europeia ou a economia. Mas, dias depois da polémica no Parlamento, falaram também de discursos de ódio e de desinformação.
Quem esteve melhor? Ao longo destes dias, um painel de avaliadores do Observador tem dado notas de 1 a 10 a cada um dos candidatos, explicando porquê. A soma surge a cada dia, no gráfico inicial, onde pode ver a classificação geral e saber quem tem estado melhor e quem lidera.
[Já saiu o segundo episódio de “Matar o Papa”, o novo podcast Plus do Observador que recua a 1982 para contar a história da tentativa de assassinato de João Paulo II em Fátima por um padre conservador espanhol. Ouça aqui o primeiro episódio.]
O próximo debate televisivo com quatro candidatos será na terça-feira, dia 21, na RTP, entre Marta Temido (PS), Sebastião Bugalho (AD), Tânger Corrêa (Chega) e João Oliveira (CDU). Pode ver os dias e os canais de todos os debates aqui. Os únicos frente a frente começam já esta semana e serão na Rádio Observador.
Quem ganhou o debate: João Oliveira, Pedro Fidalgo Marques, Tânger Corrêa ou Cotrim de Figueiredo?
Alexandra Machado — A leitura destes debates pode acabar por cair numa escolha de ideias. Mas estas notas não vão por aí. João Oliveira não saiu um centímetro da sua linha de pensamento e das ideias do partido. Demasiado, diria. Mas Pedro Fidalgo Marques, do PAN, esteve melhor do que em anteriores debates (mas tem de se armar com argumentos mais sólidos e novos) e até esteve bem nalguma combatividade que teve com os seus oponentes, em particular do Chega como do PCP, com quem não se esperava que acabasse por travar algumas disputas mais acesas. Na realidade, ambos lutam pelo eleitorado ecologista. João Oliveira defendeu essa sua flor e Fidalgo Marques tentou atirar ao PCP algumas críticas, nomeadamente quando se pôs ao lado de Cotrim de Figueiredo, batendo no peito dizendo que eram os únicos europeístas, em oposição a João Oliveira e a Tânger Corrêa, que seriam antieuropeístas. Também esteve mais ao lado de Cotrim do que os restantes elementos na área da defesa, em particular na questão da Ucrânia. E é aqui que João Oliveira continua a perder pontos. E também Tânger Corrêa se vai afastando da sua família europeia (ID), voltando a ficar no ar a possibilidade de o Chega entrar num grupo diferente, tal como já tinha referido na entrevista ao Observador. Tânger Corrêa, até aqui, foi titubeante, sem se perceber o que espera o Chega nos grupos europeus. Titubeante foi Tânger Corrêa também em quase todos os temas e não basta puxar dos cargos anteriores para querer passar a ideia de que sabe tudo o que se passa e que o seu passado fala por si. Não. O candidato do Chega é que fala, agora, por si (e, alegadamente, pelo partido).
Uma última justificação de nota: Fidalgo Marques e João Oliveira ficaram com a mesma nota, porque, no primeiro caso, as expectativas são baixas e superou-as; no segundo, a experiência tem de garantir um pouco mais e devia ter forçado o confronto com Cotrim de Figueiredo sobre o que se passou nos Países Baixos. João Oliveira e Cotrim de Figueiredo já estiveram num debate anterior e o embate entre ambos está garantido, estão nos antípodas.
E uma última referência para a moderação: bem, a introdução de um tema novo, o da desinformação. Nenhum candidato pareceu especialmente preparado para o tema. Cotrim esteve melhor. Fidalgo Marques passou completamente ao lado. E Tânger Corrêa foi Tânger Corrêa.
Ana Sanlez — Prometeu pouco no arranque e acredito que os primeiros minutos tenham feito muitos eleitores mudar de canal. Mas acabou por ser um bom debate, muito graças a duas coisas: João Oliveira e João Cotrim de Figueiredo, que manifestamente se pelam por um frente a frente, e pelos temas deixados para o fim. O tema da desinformação foi, finalmente, trazido para a discussão e, pelo que vimos hoje, espero que os partidos tenham percebido que têm muito trabalho pela frente. Poucas ideias concretas, soluções nem vê-las. Ouvimos, sem surpresa, que Tânger Correia despreza a cultura “woke” e que “as maiorias são para ser respeitadas”, naquele que terá sido o tema a provocar o maior revirar de olhos nos três adversários. Falou para o seu eleitorado. Tal como João Oliveira na sua fase “miss mundo” em que defendeu flores nas espingardas ao invés de armas para acabar com a guerra na Ucrânia (pausa para violinos). Foi aqui que Cotrim de Figueiredo e o candidato do PCP proporcionaram os melhores minutos do debate (com Cotrim a ter um inesperado aliado em Pedro Fidalgo Marques, que quis ser o “adulto na sala” mas foi apenas uma boa cobaia).
Miguel Santos Carrapatoso — Sempre que Tânger Corrêa começa uma frase com “eu acho que…”, o mundo pára. Ninguém sabe exatamente o que virá dali. Ao terceiro debate em que participa, o candidato do Chega continua a trazer-nos pérolas como “nós [Chega] respeitamos as minorias desde que continuem a ser minorias”. Admitindo que tenha um pensamento estruturado sobre a Europa, ainda não o conseguiu explicar – e o mais certo é que nunca, mesmo nunca, saibamos qual é. Pedro Fidalgo Marques, pelo contrário, tem muitos pensamentos. Tantos que até tropeça neles. A uma pergunta sobre o que deve fazer a UE no combate à desinformação, quando se deu por ele já o candidato do PAN falava em licença menstrual. O domínio dos dossiês (ou a falta dele) não dá para mais do que umas frases soltas que vão sendo encavalitadas. Por tudo isto, o campo ia estando obviamente inclinado a favor de João Oliveira e de João Cotrim Figueiredo, de longe mais experimentados e mais bem preparados do que os adversários. Numa primeira metade do debate, foram esgrimindo argumentos interessantes sobre visões muito diferentes do projeto europeu. A coisa mudou de figura quando o tema passou a ser Ucrânia. Para lá da já confrangedora incapacidade de distinguir agressor de agredido, para lá de sugerir implicitamente que a UE está a provocar a Rússia ao emprestar armas à Ucrânia, para lá de depositar uma estranha fé nas reais intenções de Moscovo, João Oliveira parece pouco convencido de que os ucranianos estejam a perder a vida a lutar por aquilo em que verdadeiramente acreditam – um país, uma identidade, um projeto de liberdade –, menorizando a coragem e determinação de um povo ao dizer simplesmente que “estão a ser usados como carne para canhão”. Teve de ser um esclarecido Pedro Fidalgo Marques a tentar chamar João Oliveira à razão, que evidentemente não gostou e admoestou o adversário: o papel dos ecologistas é pôr “cravos nas espingardas”, sugeriu-lhe. Tudo demasiado grave. A partir daí, Cotrim Figueiredo, que já tinha sido o mais esclarecido até então, ganhou o debate por esmagadora vantagem. Estar do lado da decência tem dessas coisas.
Pedro Jorge Castro — Eu show Cotrim. Passadeira estendida para o candidato da Iniciativa Liberal, que conseguiu reinar neste debate sem se esforçar muito, com muita serenidade, e com o valor extra de ter deixado em casa um bocadinho do excesso de confiança que transpira — e que alguns eleitores interpretarão como uma arrogância quiçá irritante. Os temas ajudaram, claro, do crescimento económico à liberdade de expressão. E ainda deu para atacar a jugular do PCP com a guerra na Ucrânia. De João Oliveira, com tanta experiência, esperava-se mais eficácia, mesmo perante temas difíceis para a CDU. Acabou por ficar nivelado pelos outros dois participantes. Novidade: Tânger respondeu a ataques, finalmente, mas de forma pouco eficaz. E transformar o Chega em vítima do discurso do ódio é o cúmulo da lata política. Quanto a Fidalgo, não sai disto, que é poucochinho.
Quem ganhou o primeiro debate das europeias? Temido, Bugalho, Cotrim ou Paupério? Veja as notas