896kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

i

HUGO AMARAL/OBSERVADOR

HUGO AMARAL/OBSERVADOR

Secretário-geral adjunto da NATO: "Relação com a Rússia está muito mais instável e perigosa"

Alexander Vershbow, secretário-geral adjunto da NATO, diz que é possível travar o Daesh através de um "combate forte" e que a máquina de propaganda de Putin é "muito sofisticada". Leia a entrevista.

Alexander Vershbow, atual secretário-geral adjunto da NATO, é um dos diplomatas norte-americanos mais experientes no que diz respeito à Rússia e afirma que a relação entre Moscovo e a organização “está muito mais instável e perigosa”, considerando que os exercícios surpresa e os voos rasantes dos aviões russos juntos a meios da Aliança Transatlântica têm contribuído para maior tensão entre os dois blocos. Recusa, no entanto, que se esteja perante uma nova Guerra Fria e diz que a NATO tem um poder militar e uma coesão política que dissuade qualquer ação militar da Rússia para com um Estado-membro da Aliança.

O norte-americano esteve em Lisboa para fazer uma antecipação da Cimeira de Varsóvia que vai acontecer no próximo dia 8 e 9 de julho e vai reconciliar os interesses dos países de Leste e de Sul numa única estratégia de segurança para o continente europeu. Antes de ocupar o cargo de secretário-geral adjunto da NATO, Vershbow teve uma carreira diplomática de mais de 30 anos, tendo sido embaixador dos Estados Unidos na Rússia, na Coreia do Sul e junto da NATO. O responsável — que será substituído em outubro pela sua compatriota Rose Gottemoeller –, defende que um dos papéis do seu país na organização é servir de mediador, já que “é um poder europeu, sem ser europeu”.

Sobre o regime de Putin, diz que depois de ter falhado em dar boas condições de vida à população russa, encontrou um inimigo na NATO e que a organização não está interessada numa nova Guerra Fria, avisando que a aliança será paciente, mas “não vai comprometer” os seus princípios. Leia a entrevista. (Esta entrevista foi feita no dia 23 de junho e pode ler os comentário do secretário-geral adjunto ao possível Brexit aqui.)

Não é possível falar em segurança na Europa, e também nos Estados Unidos, sem mencionar o terrorismo. Acha que é possível prevenir os ataques terroristas ou é uma realidade à qual tanto europeus como norte-americanos vão ter de se habituar?

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Não podemos ser fatalistas em relação ao terrorismo. Não há soluções fáceis e provavelmente vamos ter mais ataques revoltantes como vimos em Paris, Bruxelas ou até Orlando. Ankara também tem sido muito fustigada por ataques terroristas. O que temos de fazer é unificar a comunidade internacional para derrotar o Daesh e há uma dimensão militar nesta questão que está a ser liderada pelos Estados Unidos e aí a prioridade é travar o controlo do território que têm no Iraque e na Síria. Uma das razões pelas quais eles conseguem atrair tantas pessoas, incluindo cidadãos dos nossos países, é porque dizem que são o futuro e que estão a construir o califado. Temos de reverter essa mensagem. E essa é só a primeira parte. Temos de combatê-los ideologicamente e cortar o financiamento da organização. Nos nossos países temos de promover a tolerância em vez de permitir que as interpretações radicais das religiões se tornem comuns. É a batalha de uma geração. Mas se travarmos um combate forte, vamos conseguir diminuir a frequência dos ataques e vencer este conflito que opõe o bem e o mal.

Falou no papel dos Estados Unidos na organização das forças da coligação. Acha que é preciso mais cooperação entre os países não só a nível militar, mas também a nível das informações para travar os ataques terroristas? Qual é o papel da NATO?

A NATO tem muita experiência na partilha de informação sensível, mas neste momento foca-se mais nas informações militares e desenvolvimentos políticos do que em trocas de informação em tempo real no que diz respeito a grupos terroristas. A NATO pode ser mais usada nesse sentido. Outra área em que a NATO está a tentar desenvolver é a ajuda a países do Médio Oriente e do Norte de África, para construírem o seu próprio setor de defesa e tentarem usar as informações de vários pontos para se protegerem e lutarem contra o terrorismo. A União Europeia também tem um papel nisto, já que uma das formas de resistir à radicalização é sendo sociedades melhores e ter Governos mais responsáveis pelos seus atos com os quais as pessoas se identifiquem.

O que é que correu mal na luta contra o terrorismo? Onde é que se falhou?

Podia falar-se muito sobre este tema, mas penso que nos anos 90 não tivemos atenção à radicalização que estava a acontecer e que só nos começou a afetar verdadeiramente depois do 11 de setembro. Nesses anos, a Al Qaeda cresceu e a sua visão global já era uma ameaça no Afeganistão. Mas até nós, os americanos, antes de sermos atacados não ligávamos muito. Se olharmos mais para a frente, houve muitos erros na guerra do Iraque, mas talvez tanto os Estados Unidos como outros países deveriam ter ajudado o Iraque a criar uma capacidade que fizesse frente à radicalização de 2014. Aconteceu o mesmo na Líbia. Conseguimos salvar milhares de líbios da morte, mas quando Khadafi deixou de estar no poder, a comunidade internacional saiu do país. Quando os líbios disseram que controlavam tudo, devíamos ter dito que não era bem assim e que precisavam de ajuda. A lição é que estamos nisto a longo prazo e não há soluções fáceis. Mas também não cabe ao Ocidente responder a isto sozinho, o mundo islâmico tem de lidar com esta ameaça também. Mas esta é uma guerra dentro do Islão e os elementos mais moderados têm de se mobilizar para combater o radicalismo.

Alexander Vershbow esteve em Portugal para participar numa conferência sobre a Cimeira de Varsóvia

HUGO AMARAL/OBSERVADOR

Acha que a solução na Síria é a mais indicada?

É difícil ser otimista numa solução para a Síria, mas temos de começar por algum lado. A diplomacia que está a tentar levar a um cessar-fogo permanente é a única maneira óbvia de enfrentar a situação. Infelizmente, a intervenção dos russos fez com que isto se tornasse mais difícil ao apoiar o regime de Assad, que é responsável por milhares de mortes. E isso fez com que o acordo diplomático se tornasse mais complicado, já que o regime de Assad não tem qualquer incentivo para negociar por estar agora numa posição muito mais forte.

Até quando é que acha que será possível manter um diálogo político com a Rússia?

Estamos a manter uma distinção clara entre a cooperação prática, onde as possibilidades são limitadas devido à agressão que a Rússia continua a fazer contra a Ucrânia, e o diálogo e a comunicação para que esta relação se torne mais estável. Tomámos uma posição forte depois da anexação ilegal da Crimeia, porque foi a violação mais flagrante do direito internacional e das regras no pós-Segunda Guerra Mundial. Agora temos de manter esta posição, incluindo as sanções até que a Rússia implemente os acordos de Minsk. Ao mesmo tempo, a relação está muito mais instável e perigosa do que há dois anos. Os russos estão a levar a cabo exercícios surpresa e não nos avisam com antecedência. Temos aviões russos muito perto do nosso espaço aéreo e muito recentemente os aviões russos passaram a rasar no destroyer Donald Cook, da Marinha norte-americana. Estamos a tentar persuadir os russos da necessidade de algumas ferramentas da Guerra Fria, como o controlo das armas e a redução do risco, de forma que o agravamento de algum pequeno incidente possa ser minimizado. É disso que falamos no Conselho NATO-Rússia. Tudo o que estamos a fazer é defensivo, é limitado, é proporcional à ameaça e não faz parte de uma conspiração contra Rússia, como diz a televisão russa.

Mas não é assim que Vladimir Putin vê as coisas. O presidente russo já disse publicamente que as medidas da NATO “são um grande perigo” e que ele se está apenas a defender do sistema antimísseis colocado à sua porta…

Ele também disse que a Rússia se estava a defender ao anexar um bocado da Ucrânia.

Mas até onde é que a NATO pode ir? Até onde é que vai a escalada militar dos dois lados?

Nada do que estamos a fazer pode ser qualificado como uma escalada militar. É uma resposta prudente e proporcional ao ambiente em mudança com o qual estamos a lidar. Na Cimeira de Varsóvia, vamos anunciar a colocação de um batalhão na Letónia, um na Estónia, um na Lituânia e outro na Polónia. Quatro batalhões não é uma força de invasão. Não há qualquer ameaça possível à Rússia. Mas eles criam os seus próprios factos. Eles dizem que o nosso sistema antimísseis, que tem um novo posto na Roménia, é uma ameaça para a Rússia. É um sistema de defesa, abate mísseis, não serve para rebentar cidades. Tem uma capacidade limitada e serve para defender a Aliança de ameaças como o Irão ou a Síria.

Estamos a assistir a uma nova Guerra Fria?

Espero que não. E não é isso que a NATO quer. Não queremos voltar à Guerra Fria, nem criar uma nova Guerra Fria. Estamos a tentar criar estabilidade, respeito pelas regras, pelo direito internacional e podemos ser pacientes, mas não vamos comprometer os nossos princípios. O verdadeiro perigo é que os líderes russos — por razões nacionais, de modo a preservarem o seu regime que não consegue dar condições de vida decentes ao seu povo –, lançaram um golpe ilegal e estão armar, treinar, financiar o conflito na Ucrânia. Já morreram 623 ucranianos desde o início do ano e isto é uma agressão que está a acontecer agora. Tentamos ser o adulto nesta relação e cumprimos as nossas obrigações. É do interesse de Putin criar uma imagem da NATO como um inimigo e não há muito que possamos fazer para prevenir isso. A máquina de propaganda deles é muito sofisticada e dizem todos os dias que somos fascistas e que queremos destruir a Rússia. Isso é uma falsificação da história e um dos maiores fatores para que este problema se prolongue durante muito tempo.

Para Vershbow, Portugal contribui muito para a NATO

HUGO AMARAL/OBSERVADOR

A Rússia é uma ameaça para a NATO?

A Rússia mostrou que é uma ameaça para os seus vizinhos mais próximos como Ucrânia, Geórgia, Moldávia e não acredita que estes vizinhos mereçam soberania. A Rússia descreve o seu modelo de democracia como uma nação soberana, mas só aceita isso para si e não para os outros. Não vemos a Rússia como uma ameaça imediata porque somos fortes. Temos capacidades militares fortes e uma coesão política que dissuadiria qualquer ação militar por parte da Rússia. A ameaça da Rússia é ao direito internacional e ao sistema em vigor depois da Segunda Guerra Mundial e da Guerra Fria. Uma Europa sem regras é um sítio muito perigoso.

Em Itália, um espião português foi apanhado a vender segredos da NATO à Rússia. A NATO está a investigar o caso? Portugal é um país vulnerável?

Estes casos são responsabilidade dos Estados e sei que há uma investigação a decorrer. É um assunto muito sério e muitos países europeus são vítimas da espionagem russa. Também acontece nos Estados Unidos. Temos de ser vigilantes para proteger as nossas informações e temos de aumentar a nossa segurança informática. Estamos satisfeitos que neste caso a pessoa tenha sido detida e esperamos que a Justiça faça o seu trabalho.

Mas a NATO está a investigar? A NATO mudou os procedimentos com os serviços de informação portugueses?

Estamos sempre a rever os nossos procedimentos porque partilhamos informações muito sensíveis sobre as nossas políticas e planos. Temos tecnologia de ponta, mas também temos consciência que mesmo esses sistemas podem ser atacados.

O Governo português tem o apoio parlamentar de partidos que são contra a pertença de Portugal à NATO. Isso enfraquece a posição do país dentro da organização?

A política doméstica vai para além do meu mandato. Portugal continua a ser um Estado que contribui muito para a NATO, tanto no domínio marítimo como no envio de aviões para o patrulhamento dos Bálticos. O equilíbrio que vamos mostrar em Varsóvia entre os países de Leste e o Sul é devido à proatividade de Portugal.

Sendo que hoje a NATO é constituída por esses dois blocos, Leste e Sul, como é que é possível manter os dois grupos de países satisfeitos? É possível conciliar estas duas visões geopolíticas do mundo?

Sim, acho que sim. É um desafio permanente, mas em Varsóvia vamos ter uma manifestação de unidade e de apoio à estratégia 360 que está destinada ao Norte, ao Sul ao Leste. Temos de nos manter vigilantes porque as ameaças são reais. O que torna a NATO eficaz é que consegue equilibrar o interesse de todos os seus Estados. Em parte, isto é mérito do secretário-geral, que serve como mediador entre as partes — e também é minha responsabilidade como secretário-geral adjunto — e, como antigo líder da delegação dos Estados Unidos na NATO, posso dizer que esse também é o papel dos Estados Unidos desde a fundação da organização, talvez por sermos um poder europeu, sem sermos europeus. Damos a mesmo importância a um aliado pequeno e a um aliado grande. Apesar de gastarmos muito na Defesa, talvez até demais, damos atenção tanto aos mais pequenos como aos maiores.

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça até artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.