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Autoridades e especialistas pedem cautela durante a noite porque as condições do tempo vão agravar
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Autoridades e especialistas pedem cautela durante a noite porque as condições do tempo vão agravar

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Autoridades e especialistas pedem cautela durante a noite porque as condições do tempo vão agravar

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Tempestade era mesmo imprevisível? IPMA diz que sim, mas especialista fala de uma "falta de sorte" que podia ter sido prevista à tarde

Climatologista diz ter encontrado sinais do agravamento do estado do tempo ainda durante a tarde de quarta-feira, mas presidente do IPMA insiste que redes de alerta não soaram alarmes.

O agravamento da tempestade que se abateu sobre o território nacional na noite passada, colocando o distrito de Lisboa sob níveis de precipitações de que não havia registo nos últimos oito anos, tornou-se previsível três horas antes do pico de precipitação, por volta das 17h. Mas o aviso vermelho do Instituto Português do Mar a da Atmosfera (IPMA) só foi emitido no fim do pico de chuva, às 23h.

É o que afirma ao Observador o climatologista Mário Marques, diretor executivo da Planoclima, uma empresa privada que presta serviços de previsão meteorológica a empresas, quase todas na área do turismo:

Eu avisei os meus clientes com três horas de antecedência que, a partir da hora de jantar, a situação ia agravar“, afirma.

O pico de precipitação veio mesmo a verificar-se por volta das 20h e arrastou-se por mais três horas.

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Miguel Miranda, presidente do IPMA, recusa que tenha havido capacidade para prever com tanta antecedência a evolução dos sistemas meterológicos. Em declarações à CNN Portugal, o meteorologista justificou que o aviso vermelho foi emitido quando “os sistemas de radar e descargas elétricas indicaram que estavam a caminho de Lisboa células muito ativas com grande capacidade para grandes picos de chuva”.

Se o aviso podia ter sido emitido mais cedo? “Era ótimo que fossemos capazes de fazer isto com muito mais antecedência”, mas “não somos”, responde Miguel Miranda:

Com toda a franqueza, mesmo que tivesse sido possível um pouco mais cedo, o que se espera de um sistema sofisticado de meteorologia mundial como o que existe, isso não depende apenas da água que chove mas também da capacidade de a escoar”.

Ou seja, “os efeitos não seriam essencialmente diferentes” se o IPMA tivesse antecipado o aviso vermelho.

As previsões que permitem antecipar o agravamento do estado do tempo são obtidos através de um modelo chamado “nowcasting”. Com base nas características da atmosfera, os cientistas preveem as condições meteorológicas que se verificarão dali a, no máximo, duas a seis horas. Mas, para Mário Marques, as informações que existiam sensivelmente a meio da tarde eram suficientes para emitir mais cedo  os avisos meteorológicos mais graves e estendê-los a regiões mais alargadas do território nacional. Nem que fosse por precaução.

Eu diria uma frase, sem querer ofender ninguém: eu não sou muito forte a fazer previsões para o dia de ontem, nem para o dia de anteontem. Essa não é mesmo a nossa especialidade. Nós gastamos a nossa energia a prever da melhor maneira que podemos os dias que veem".
Miguel Miranda, presidente do Instituto Português do Mar e da Atmosfera

As trocas de acusações (e contradições) entre a Proteção Civil, IPMA e Governo

A troca de acusações envolve também o ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, que apesar de estar em Bruxelas, pediu “responsabilidade a todos”, já que “nas próximas horas as condições climatéricas serão equivalentes“. Quanto a uma eventual ação tardia do IPMA na declaração de alerta laranja na região, o ministro diz que “todas as forças e serviços foram acionados assim que houve conhecimento da gravidade da intempérie que se abateu sobre a área metropolitana de Lisboa”.

Só o IPMA é que poderá responder tecnicamente a essa pergunta“, respondeu também o ministro à mesma pergunta: “A Proteção Civil fez o primeiro alerta à população a 4 de dezembro”. Na quarta-feira fez o mesmo às oito, dez da noite e à meia noite, lembrou José Luís Carneiro. Depois, age consoante o nível de alerta determinado pelo IPMA, segundo explicou o próprio ministro.

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Questionado pela Rádio Observador sobre como responde às críticas que acusam o IPMA de ter tardado a emitir o aviso meteorológico mais grave, Miguel Miranda respondeu:

Eu diria uma frase, sem querer ofender ninguém: eu não sou muito forte a fazer previsões para o dia de ontem, nem para o dia de anteontem. Essa não é mesmo a nossa especialidade. Nós gastamos a nossa energia a prever da melhor maneira que podemos os dias que veem”.

Miguel Miranda confirmou que o IPMA vai estudar este episódio, como é prática dos cientistas naquela instituição, e que o relatório será tornado público. Assumiu que “existiram situações que vão ter de chamar a nossa atenção” — incluindo o facto de os modelos de previsão não terem mostrado claramente os picos de precipitação que ocorreram na noite passada; e a acumulação de dezenas de milímetros de chuva que caiu em períodos muito curtos, inferiores a uma hora. Será assim “para podermos tentar compreender se são situações que são habituais e apenas não foram previstos, porque não foram; ou se estamos a falar de uma situação que tem alguma coisa de novo”.

Mas pouco antes, a secretária de Estado a Proteção Civil, Patrícia Gaspar, tinha assumido que não tinham existido falhas na articulação entre o instituto meteorológico e a autoridade que tutela. “Não se trata de falhas“, disse a secretária de Estado: “São fenómenos difíceis de prever”. A articulação é permanente entre a Autoridade Nacional e o IPMA, assegurou, e “os alertas são ajustados ao timing em que é possível fazer a previsão destes fenómenos que, de facto, se desenvolvem com muita rapidez”, detalhou Patrícia Gaspar.

“A coordenação com o IPMA funcionou”, garantiu também o comandante nacional da Proteção Civil, garantindo ainda que as medidas e os avisos foram adequados a cada momento. “Temos de nos adaptar e aceitar a notificação que é feita, impondo as medidas de auto-proteção. Resgates feitos foram de pessoas que arriscaram”, diz.

O distrito, mais precisamente a região entre a Grande Lisboa e Lisboa Oriental, ficou no caminho da região mais carregada desta gigantesca nuvem: uma linha com 60 quilómetros de comprimento, mas apenas 10 a 15 quilómetros de largura, que estava carregada de chuva e que demorou perto de uma hora a atravessar o país longitudinalmente, de sul para norte. Ou seja, caiu muita chuva durante muito tempo, sempre na mesma região.

Não é essa a versão da diretora da Proteção Civil lisboeta, que se queixou que o aviso vermelho do IPMA só surgiu quando “o fenómeno estava mais que implementado”: “Foi um aviso amarelo, no dia 7 o aviso passou a laranja, e ontem só por volta das 23h00 é que o aviso passou a vermelho”, disse Margarida Castro Martins.

Ainda assim, a quantidade de ocorrências registadas pela Proteção Civil — o balanço das sete da manhã falava de 849 no total do território — tem outra justificação, acredita Margarida Castro Martins: “O que sentimos é que as pessoas começam talvez a desvalorizar os avisos que recebem do IPMA”. E os alertas da própria Proteção Civil, que diz ter avisado a população para as possíveis consequências do mau tempo na terça-feira ainda durante a manhã.

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Num balanço sobre o mau tempo que realizou esta manhã, o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Carlos Moedas, deixou um pedido à população para não arriscar perante um risco de inundação. O autarca diz ter testemunhado casos em que os condutores colocaram a vida em perigo ao tentarem atravessar lençóis de água e poças em túneis. E apelou: “Se voltar a acontecer, não arrisquem”.

A nuvem com 9.000 metros que passou por Lisboa por “falta de sorte”

Na noite de quarta-feira, pairou sobre Lisboa uma nuvem com nove quilómetros de espessura.  Foi o resultado de um bloqueio — isto é, uma vasta área de pressões atmosféricas elevadas, normalmente associadas a bom tempo — que está praticamente parado no norte do Atlântico. E que tem dois efeitos: ao colidir com uma massa de ar mais frio, satura a atmosfera de humidade; e empurra para sul as depressões (áreas de baixa pressão atmosférica, associadas ao mau tempo) que existiam a oeste.

No caso do distrito de Lisboa, onde se registou mais de 70% de todas as ocorrências comunicadas à Proteção Civil, houve “falta de sorte”, entende Mário Marques. É que o distrito, mais precisamente a região entre a Grande Lisboa e Lisboa Oriental, ficou no caminho da região mais carregada desta gigantesca nuvem: uma linha com 60 quilómetros de comprimento, mas apenas 10 a 15 quilómetros de largura, que estava carregada de chuva e que demorou perto de uma hora a atravessar o país longitudinalmente, de sul para norte. Ou seja, caiu muita chuva durante muito tempo, sempre na mesma região.

Quando se preparam os avisos meteorológicos, devemos ter em conta uma vasta região. Não podemos dizer que foi num bairro ou no outro. Nestas situações pode chover muito na casa de um vizinho e na nossa nem tanto".
Mário Marques, climatologista e diretor executivo da Planoclima

De facto, segundo o climatologista, “é difícil indicar o local exato em que podem ocorrer fenómenos extremos”. E isso é algo que o presidente do IPMA já tinha recordado na noite de quarta-feira, quando explicou na SIC Notícias que as depressões a caminho de Portugal são sistemas “muito pequenos” e que “torna-se mais difícil prever em que pontos exatos do território vão ocorrer”.

Como o “comboio das tempestades” chegou “repentinamente” a Lisboa

A questão, insiste Mário Marques, é que “quando se preparam os avisos meteorológicos, devemos ter em conta uma vasta região”: “Não podemos dizer que foi num bairro ou no outro”, exemplifica, até porque “nestas situações pode chover muito na casa de um vizinho e na nossa nem tanto“.

Temos de abranger e alargar toda esta área de intervenção para salvaguardar a população. Isso era o que devia eventualmente ter sido feito”, defendeu o climatologista.

Nova tempestade passa esta noite. Não deve ser tão forte, mas “a atmosfera é volátil”

Vai voltar a acontecer. Fenómenos como este, em que o mesmo território é fustigado por várias depressões meteorológicas em cadeia, tendem a acontecer nesta altura do ano e vão repetir-se, mas eram mais comuns nos anos 80 e 90 do que são agora.

Segundo Mário Marques, e em concordância com o que Carlos Moedas já tinha indicado esta manhã, as alterações climáticas parecem estar a mudar este padrão meteorológico: há menos “comboios de tempestades” (um termo que não está no dicionário científico, mas que é normalmente usado coloquialmente), mas tendem a ser mais intensos.

Na verdade, uma nova carruagem pode voltar a abater-se sobre Lisboa já esta noite. O autarca lisboeta tinha previsto uma noite mais calma do que a anterior, mas os meteorologistas avisam para um agravamento do estado do tempo e a Proteção Civil está a postos para novas inundações.

O IPMA emitiu avisos meteorológicos para todo o território de Portugal Continental e Madeira: há avisos de nível laranja para precipitação entre a meia-noite e as nove da manhã em Faro, Leiria, Lisboa, Santarém e Setúbal, com todos os outros distritos e o arquipélago dos Açores sob aviso amarelo. Também há aviso amarelo para agitação marítima em todo o país.

Se, nessa rede, nós virmos de forma inequívoca que esses acontecimentos vão ter lugar, avisaremos o mais depressa que pudermos. Pode não ser suficientemente cedo, mas será aquilo que a ciência nos permite fazer.
Miguel Miranda, presidente do Instituto Português do Mar e da Atmosfera

Esta é, pelo menos, a avaliação possível da meteorologia a esta hora. Em declarações à CNN, Miguel Miranda explicou que os avisos amarelos parecem ser os mais adequados neste momento, mas que “isso não quer dizer que não haja evolução rápida de alguns sistemas meteorológicos”. É, de resto, algo que Mário Marques também sublinha: “Não existirá tanta severidade, embora tenhamos de ir acompanhando. A atmosfera é de tal maneira volátil e dinâmica que pode resultar noutras situações”.

À Rádio Observador, o presidente do IPMA admitiu que os avisos meteorológicos podem ser elevados até ao nível vermelho se as condições do tempo piorarem. Diz que não pode afirmar se se irão registar novos picos de precipitação como os desta madrugada  — “Não temos capacidade de prever”, insiste —, mas os meteorologistas estão de olho na rede de descargas elétricas e na rede de radares.

Se, nessa rede, nós virmos de forma inequívoca que esses acontecimentos vão ter lugar, avisaremos o mais depressa que pudermos. Pode não ser suficientemente cedo, mas será aquilo que a ciência nos permite fazer.

De acordo com a previsão de Mário Marques, as próximas horas e até ao início da madrugada trarão um desagravamento do estado do tempo, apenas com alguns aguaceiros dispersos. Mas entre as duas e as cinco da manhã, “poderá haver uma linha de instabilidade a passar com esta depressão” que causará aguaceiros mais fortes e localizados. De qualquer modo, “não serão tão extensos na sua escala temporal”: “São menos morosos a passar”.

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O dia de sábado será “um dia de transição”, embora no domingo à tarde se possa vir a ter a entrada de uma nova depressão que afetará a região sul e sudoeste do território. Depois, entre os dias 12 e 14 de dezembro, um temporal que irá afetar os Açores (sobretudo o grupo ocidental) no dia 10 vai passar pela Europa ocidental e afetar a região norte. A partir do dia 15, o anticiclone dos Açores, escudo natural que tende a proteger o continente do mau tempo severo, deve regressar gradualmente a ocupar o seu lugar. E depois da tempestade, virá a bonança.

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